Juíza suspende cobrança de dívida rural por frustração de safra
Decisão reconheceu o direito ao alongamento do débito com base no manual de crédito rural do Bacen e na súmula 298 do STJ.
Da Redação
quarta-feira, 18 de junho de 2025
Atualizado às 09:38
A juíza de Direito Letícia Brum Kabbas, da 2ª vara Cível de Uruaçu/GO, concedeu tutela de urgência para suspender a exigibilidade de dívida rural contraída por produtor que comprovou frustração de safra e desvalorização na comercialização da soja. A magistrada reconheceu o direito ao alongamento do débito com fundamento no manual de crédito rural do Bacen e na súmula 298 do STJ, que asseguram tal medida em situações de adversidades climáticas e dificuldades de mercado.
Entenda o caso
O produtor rural, ingressou com ação requerendo o alongamento da Cédula de Crédito Rural firmada em setembro de 2022, no valor de R$ 280 mil, destinada à aquisição de maquinário agrícola.
Segundo os autos, a safra de soja 2023/2024 foi gravemente prejudicada por estiagem em Goiás, resultando em perda de 62% da produtividade, com impacto em 300 dos 480 hectares plantados. Houve ainda queda de aproximadamente 15% no preço da saca da soja, o que levou a um prejuízo estimado de R$ 1,056 milhão.
Com base na resolução CMN 5.123/24 do Bacen, que autoriza a renegociação de dívidas em razão de eventos climáticos adversos, o produtor tentou, sem êxito, negociar administrativamente a prorrogação do contrato junto à instituição financeira.
Diante da negativa, ajuizou a ação com pedido de tutela de urgência para obter: suspensão da exigibilidade do contrato, cancelamento de débitos automáticos, afastamento dos efeitos da mora, abstenção de negativação do nome do autor e da avalista, e preservação das garantias vinculadas ao crédito.
O banco não se manifestou antes da decisão liminar.
Risco à atividade produtiva
Ao analisar o pedido, a magistrada reconheceu que os documentos juntados aos autos demonstraram a frustração da safra, a redução no valor da soja e a tentativa de renegociação administrativa.
"A redução substancial da capacidade de pagamento do autor encontra-se adequadamente demonstrada pelos documentos técnicos apresentados, que comprovam tanto a frustração da safra por fatores climáticos adversos quanto a redução significativa dos preços de comercialização. Embora a resolução CMN 5.123/24 estabeleça que a renegociação fica a critério da instituição financeira, o Manual de Crédito Rural e a consolidada jurisprudência do STJ reconhecem o alongamento como direito do produtor rural quando preenchidos os requisitos objetivos."
Nesse sentido, a juíza citou a súmula 298 do STJ, que dispõe que o alongamento da dívida rural "não constitui faculdade da instituição financeira, mas direito do devedor nos termos da lei". Além disso, apontou os riscos sociais e econômicos que a manutenção da cobrança poderia causar.
"A manutenção da exigibilidade integral da dívida, sem consideração à reduzida capacidade de pagamento demonstrada, expõe o autor aos riscos de execução forçada, perda de bens essenciais à atividade produtiva, negativação creditícia e impossibilidade de acesso a novos financiamentos necessários ao próximo ciclo produtivo. Tais consequências podem inviabilizar definitivamente a continuidade da atividade agrícola."
Com base nisso, a juíza deferiu o pedido de tutela de urgência para:
- Suspender a exigibilidade da cédula de crédito;
- Determinar o cancelamento de débitos automáticos;
- Proibir a negativação do nome do autor e da avalista;
- Preservar as garantias oferecidas, impedindo penhora ou execução de bens essenciais à atividade rural.
Também foi fixada multa diária de R$ 1 mil em caso de descumprimento da decisão.
O escritório Túlio Parca Advogados atua pelo produtor rural.
- Processo: 5009966-31.2025.8.09.0152
Leia a decisão.