Ministro Campbell aborda aposentadoria como pena máxima a juízes
Mauro Campbell ressaltou que confisco total da aposentadoria, sem processo judicial, representaria violação de direitos fundamentais.
Da Redação
terça-feira, 1 de julho de 2025
Atualizado às 12:37
Decisões do CNJ e do CNMP que resultam na aposentadoria de magistrados e promotores investigados por condutas graves, mas sem perda imediata de vencimentos, são constantemente alvo de insatisfação popular.
Casos recentes, como o do juiz Marcos Scalercio (acusado de assédio sexual) e do desembargador Eduardo Siqueira (que humilhou guardas durante a pandemia), reacenderam o debate sobre a eficácia das punições e a necessidade de modernização da legislação de regência.
Ao comentar as críticas recorrentes à punição de magistrados por meio da aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais, ministro Mauro Campbell, do STJ, reconheceu a razoabilidade das queixas, mas defendeu um olhar equilibrado sobre o tema.
Para o ministro, embora a pena máxima prevista atualmente na Loman - Lei Orgânica da Magistratura Nacional seja desproporcional diante de condutas gravíssimas, o confisco total da aposentadoria, sem processo judicial, também representaria violação de direitos fundamentais.
"É razoável a crítica, com certeza é razoável a crítica", afirmou Campbell, ao lembrar que a norma que prevê a aposentadoria compulsória é de 1975, anterior à Constituição de 1988.
O ministro destacou que, à época, casos de faltas disciplinares graves entre magistrados eram tão raros que sequer se cogitou adotar a pena de demissão, prevista para servidores públicos comuns, no estatuto da magistratura.
Segundo Campbell, embora a Loman estabeleça a aposentadoria compulsória como sanção máxima no âmbito administrativo, o CNJ já editou resolução prevendo a remessa obrigatória dos autos ao MP e à Advocacia Pública, para ser proposta ação civil de perda do cargo.
Essa medida, de natureza judicial, pode resultar na cassação completa dos direitos funcionais, inclusive a exclusão do regime previdenciário especial da magistratura.
"Isso faria com que, até mesmo a aposentadoria, com a perda do cargo, fosse do regime geral de previdência, ou seja, do INSS. Ele sairia do bolo comum", explicou.
Veja a entrevista:
Ainda assim, o ministro fez uma ressalva importante: até o momento em que o magistrado comete a falta disciplinar, ele já contribuiu para a previdência, e não seria lícito que o Estado confiscasse essas contribuições "sem que fosse uma sanção a mais, por parte do Poder Judiciário e não apenas uma sanção disciplinar".
Campbell reforçou seu posicionamento contrário à aposentadoria compulsória como pena máxima, mas também condenou a ideia de deixar o magistrado faltoso ao desamparo, sem nenhuma garantia previdenciária.
"Não concordo que se viole um direito humano de deixar a figura do condenado disciplinarmente ou até penalmente ao desamparo daquilo que ele verteu para a sua aposentadoria."
O ministro destacou que, apesar de todas as críticas, o sistema já prevê mecanismos para a responsabilização judicial e perda total do cargo e dos proventos.
"Uma norma do CNJ determina que uma ação civil pública deva ser intentada para que ele perca o cargo completamente e aí, sim, vá para o regime de previdência comum a todos os brasileiros."
Aposentadoria compulsória x demissão
No caso da magistratura, no âmbito administrativo, a aposentadoria compulsória é a mais grave das cinco penas disciplinares aplicáveis a juízes vitalícios. Afastado do cargo, o condenado segue com provento ajustado ao tempo de serviço. A penalidade é definida pelo tribunal onde atua, por maioria absoluta dos membros, ou pelo CNJ.
Aplicada a pena de aposentadoria compulsória, os autos serão remetidos ao MP e à AGU ou à Procuradoria estadual competente para, se for o caso, tomar as providências cabíveis, como a instauração de processo judicial que pode resultar em uma condenação criminal e na cassação da aposentadoria.
Nesse ponto é que a população deve mirar suas críticas: é preciso, depois da punição administrativa, cobrar a abertura de processo judicial (no qual se garantirá a ampla defesa), pois só com o trânsito em julgado do processo o magistrado pode ser demitido, e aí, sim, sem os proventos.
No CNMP, o processo é semelhante. O órgão pode punir com demissão, mas a aplicação dessa pena somente se dará após ulterior processo judicial, se a chefia do MP (PGJ ou PGR) propuser a ação e se o Judiciário, nesta ação, decidir pela demissão. "Não é automática", finaliza a professora.
O evento
Nos dias 30 de junho e 1º de julho, acontece em Coimbra, Portugal, o Seminário de Verão. Com o tema "Descortinando o Futuro: 30 Anos de Debates Jurídicos", o evento reúne autoridades e acadêmicos do universo jurídico e de diversas outras áreas.