STJ mantém menção contra advogado em estudo sobre violência de gênero
Ministros entenderam que citação a caso amplamente divulgado, sem juízo de valor ou afirmações próprias, não configura abuso da liberdade de expressão.
Da Redação
terça-feira, 12 de agosto de 2025
Atualizado às 16:36
A 3ª turma do STJ decidiu, por unanimidade, permitir que um trabalho acadêmico mantenha referência a uma postagem feita em rede social em que um advogado foi acusado de cometer crime contra ex-aluna.
O profissional pedia a exclusão integral do trecho, alegando tratar-se de narrativa caluniosa e sem respaldo fático, cuja reprodução violaria direitos da personalidade.
Na sustentação oral, a defesa argumentou que a postagem em rede social, excluída 72 horas após a publicação, fora reproduzida na obra sem qualquer apuração, perpetuando conteúdo falso.
Sustentou que, embora outros veículos de comunicação, após notificação extrajudicial, tenham removido o material e sido condenados por danos morais quando se recusaram a fazê-lo, as autoras e a editora optaram por manter o relato.
O acórdão de origem havia determinado apenas a supressão do nome do advogado, preservando a narrativa, sob fundamento de tratar-se de texto informativo, científico e didático.
Para a defesa, a decisão não reparou integralmente o dano e contraria o art. 17 e o art. 117 do CC, que protegem nome e honra de qualquer pessoa contra exposição ao desprezo público.
Interesse público
Ao votar, ministra Nancy Andrighi destacou que a questão central era definir a possibilidade de responsabilização civil de autoras de artigos científicos por menção a acusação criminal não comprovada.
Ressaltou que as liberdades de informação, expressão e imprensa, embora essenciais, não autorizam abusos nem críticas com propósito exclusivo de atacar a honra, sendo imprescindível a apuração diligente dos fatos.
Para a relatora, no caso, não houve "externalização de ideias, opiniões, juízos de valor ou comentários" sobre a conduta ou a pessoa do professor.
Veja o voto:
A citação foi inserida em contexto de análise acadêmica de fenômenos sociais relacionados à violência contra mulheres, com finalidade didática e sem caráter lucrativo.
A ministra também observou que o interesse público, presumido na divulgação de informações verídicas pela imprensa, ganha relevo adicional em trabalhos acadêmicos, e que o Tema 995 do STF, que trata da responsabilização pela reprodução de imputações falsas, não se aplica automaticamente quando o material integra produção científica.
Além disso, a publicação ocorreu em momento em que, segundo o tribunal de origem, o caso ainda poderia estar sob investigação, sem comprovação de má-fé das autoras.
A turma, acompanhando o voto da relatora, conheceu parcialmente do recurso especial e deu-lhe parcial provimento apenas para afastar a multa imposta nos embargos de declaração, mantendo-se íntegra a decisão que rejeitou a exclusão do trecho da obra.
Entenda o caso
O episódio que originou a controvérsia remonta a um relato publicado em rede social por uma estudante universitária, no qual acusava seu então professor de condutas abusivas.
Poucos dias após a postagem, a jovem tirou a prória vida, fato que gerou ampla repercussão na imprensa e mobilizou debates sobre assédio e violência contra mulheres no ambiente acadêmico.
A narrativa foi posteriormente citada, de forma resumida e sem identificação completa, em um livro de cunho acadêmico escrito por pesquisadoras, que analisavam padrões e dinâmicas de violência de gênero.
Embora não tenha havido instauração de ação penal ou comprovação judicial da acusação, a menção ao episódio foi entendida pelas autoras como parte relevante da abordagem científica.
- Processo: REsp 2.208.312