Martinelli Advogados analisa limite do TJ/SC ao uso da usucapião
Segundo análise de David Monteiro, advogado de Direito Imobiliário no Martinelli Advogados, a Corte passa a inviabilizar estratégia comumente usada para evitar custos tributários e taxas de cartórios.
Da Redação
sexta-feira, 15 de agosto de 2025
Atualizado às 10:38
Uma recente decisão tomada pelo Grupo de Câmaras de Direito Civil do TJ/SC trouxe um alerta importante para o setor imobiliário.
No julgamento de um IRDR - Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, em 22/5/25, foi aprovada por unanimidade a tese que restringe o uso da usucapião em contextos em que existam caminhos viáveis e legítimos para a regularização da propriedade.
Na prática, segundo o Martinelli Advogados, a Corte padronizou a interpretação sobre o tema, inviabilizando uma estratégia que vinha sendo comumente utilizada como alternativa mais barata à formalização imobiliária via escritura e registro, que era a entrada com ação de usucapião mesmo quando havia contrato de compra e venda e possibilidade de regularização administrativa.
As ações de usucapião são frequentemente utilizadas para evitar custos tributários, como o ITBI, além das taxas dos cartórios. "A partir de agora, a tentativa de evitar essas despesas poderá ser interpretada como desvio de finalidade e resultar na extinção do processo, atingindo principalmente os chamados contratos de gaveta, que são os compromissos de compra e venda não levados ao registro, muitas vezes antigos e feitos de forma informal", explica David Monteiro, advogado especialista em Direito Imobiliário no Martinelli.
Segundo ele, a nova orientação não proíbe a usucapião, mas estabelece um filtro rigoroso definindo que a ação só será permitida quando houver um obstáculo real e comprovado que impeça a transmissão da propriedade pelos meios tradicionais, como escritura pública e registro, com base no §2°, do art. 410, do provimento 149/CNJ. Desta maneira, o simples fato de a área ainda não estar desmembrada ou matriculada não basta.
"Até aqui, havia relativa tolerância judicial quanto ao uso da usucapião nesses casos, desde que houvesse posse prolongada e pacífica, mas a tese firmada pelo TJ de Santa Catarina afasta esse mecanismo usado muitas vezes para driblar as regras de parcelamento do solo e ilidir as custas administrativas e tributárias", observa Monteiro.
Em termos imobiliários, o novo entendimento impacta a regularização de imóveis em fase de estruturação, sobretudo quando o histórico de propriedade do bem apresenta lacunas ou informalidades. Loteamentos informais, imóveis em áreas não desmembradas e contratos sem registro passam a exigir maior cautela jurídica por parte dos envolvidos.
Para quem opera no mercado imobiliário, especialmente investidores, loteadores e incorporadores, a mensagem é clara de que estratégias informais de titulação elevam o risco jurídico e podem comprometer o valor de um ativo.
"Em um ambiente de crescente rigor jurisprudencial, não basta a viabilidade econômica de um terreno, é preciso diligência documental e estratégia jurídica estruturada desde a origem, de modo que a segurança registral, antes vista como um detalhe resolvível "depois", passa a ser critério determinante para viabilizar negócios e acessar crédito", afirma o advogado.
Os efeitos da decisão foram modulados, fazendo com que a tese valha apenas para ações de usucapião ajuizadas após a publicação da decisão, o que alivia para os processos em andamento.
Embora decisões pontuais já tenham sinalizado entendimentos semelhantes, o julgamento pelo Grupo de Câmaras de Direito Civil do TJ/SC, em sede de IRDR, é inédito pela sua força vinculante no âmbito estadual e pela sistematização da tese.
Na avaliação do advogado, a tendência é que outros tribunais passem a adotar linha semelhante, sobretudo se o STJ, futuramente, confirmar a diretriz em recurso repetitivo.
"A mensagem do TJ/SC é clara: O Judiciário está disposto a separar o joio do trigo, de modo que a usucapião continua sendo ferramenta legítima de regularização, mas não pode ser banalizada como atalho para escapar de tributos ou etapas legais", afirma Monteiro.
"No novo contexto, o mercado precisa se ajustar e quem quiser garantir segurança jurídica e valorização patrimonial dos imóveis precisa abandonar soluções improvisadas e partir para a formalização tradicional com escritura, pagamento de ITBI, emolumentos e registro volta ao centro da mesa", observa o advogado.
Para ele, a tese fixada é relevante como orientação jurisprudencial para todo o país e deve ser considerada como elemento estratégico na análise de viabilidade da usucapião e, quando aplicável, pode ser invocada em juízo, seja para fundamentar ou afastar a pertinência da ação.
"O importante é que cada caso seja analisado à luz dos seus elementos específicos, considerando sempre a existência ou não de obstáculos reais à via tradicional", finaliza Monteiro.