Barroso recorre a silogismo e Dino brinca: "Não é linguagem simples"
Falácia envolvendo "pato e navio" surgiu em meio à análise da Convenção da Haia.
Da Redação
quinta-feira, 21 de agosto de 2025
Atualizado às 17:31
Nesta quinta-feira, 21, durante julgamento no STF em que se discutia a aplicação da Convenção da Haia e o retorno de crianças ao exterior em casos envolvendo suspeita de violência doméstica, ministro Barroso recorreu a um silogismo envolvendo "navio" e "pato" que levou ministro Flávio Dino a reconhecer a complexidade do recurso retórico.
Enquanto proferia voto, ministro Fux comentou a prática comum de concessão de liminares sem a prévia oitiva da parte contrária.
Dirigindo-se a Dino, perguntou se, como juiz, ele próprio já não havia adotado esse procedimento.
Dino respondeu que sim, mas fez a ressalva de que não em casos de repatriação de crianças.
Foi então que Fux recordou a expressão usada por Barroso. "Bom, aí é aquela história que o ministro Barroso comenta sobre o pato, né?", sugeriu.
Na sequência, Barroso explicou a anedota:
"O que é navio? Navio é tudo que boia. Pato é navio? Navio é tudo que boia, menos pato."
A comparação buscava exemplificar situações em que uma regra geral comporta exceções.
Dino, em seguida, reagiu:
"Presidente, isso não é linguagem simples."
Veja o momento:
Fundo lógico-aristotélico
Embora soe como uma simples anedota, a fala remete a um raciocínio clássico da tradição lógica.
Ao afirmar que "navio é tudo que boia", constrói-se uma definição excessivamente ampla, logo desmentida pela exclusão do "pato". O exemplo lembra a estrutura de um silogismo, isto é, um raciocínio dedutivo em que, a partir de duas premissas, chega-se a uma conclusão necessária.
Aqui, as premissas seriam:
- Premissa maior: "Todo navio é aquilo que boia."
- Premissa menor: "O pato boia."
- Conclusão: "Logo, o pato é um navio."
A aparente lógica, no entanto, desmorona. O problema está na premissa maior, mal formulada.
Quando a conclusão decorre de premissas falsas ou de generalizações equivocadas, o raciocínio deixa de ser um silogismo válido e se aproxima de uma falácia, isto é, um erro de raciocínio.
Se usado de forma intencional para convencer ou manipular, transforma-se em sofisma: um argumento enganoso que parece correto, mas não é.
Em termos retóricos, o exemplo funciona como demonstração didática de que toda regra admite exceções.
Assim como nem tudo que boia é navio, nem todo caso de repatriação de crianças deve resultar em retorno automático ao país de origem, sobretudo quando há indícios de violência doméstica.