STF: Advogados rebatem fala de que motoristas podem "ir ver neta no balé"
No julgamento sobre vínculo de motoristas de aplicativo, advogados rebateram a metáfora usada pela defesa da Rappi para ilustrar a suposta autonomia e liberdade dos trabalhadores.
Da Redação
quinta-feira, 2 de outubro de 2025
Atualizado às 17:40
O STF analisa se motoristas e entregadores de aplicativos têm, ou não, vínculo empregatício, nos moldes da CLT, com as plataformas digitais. O julgamento envolve a Rcl 64.018, movida pela Rappi, e o RE 1.446.336, ajuizado por motorista da Uber.
A Corte iniciou a análise nesta quarta-feira, 1º, e a retomou nesta quinta-feira, 2, em sessão dedicada à conclusão da fase de sustentações orais.
A fala do ex-ministro do TST Márcio Eurico Vitral Amaro para exemplificar a liberdade dos motoristas de aplicativo, de que poderiam "desligar o sistema e ir ver a neta no balé", foi rebatida por advogados, que afirmaram se tratar de uma falsa ideia de autonomia, distante da realidade de controle e precarização vivida pela categoria.
Confira:
"Liberdade" para ver a neta no balé
Na defesa da Rappi, o advogado e ex-ministro do TST, Márcio Eurico Vitral Amaro, sustentou que a empresa é mera intermediadora tecnológica, sem os requisitos do vínculo de emprego. Contestou a tese de subordinação algorítmica e citou pesquisa da UnB segundo a qual a maioria dos trabalhadores prefere atuar de forma autônoma.
Para ilustrar a flexibilidade que o trabalhador possui, afirmou:
"Diferentemente de um celetista, que cumpre uma jornada rígida e fiscalizada de no mínimo oito horas diárias, sob tacão, sob a vigilância ferrenha do empregador, aqui esse trabalhador pode, em um determinado momento, dizer, 'hoje é apresentação de balé da minha filha, da minha neta, lá na escolinha em que ela estuda. Eu vou lá assistir', e desliga o sistema."
Distante da realidade
A narrativa da autonomia, exemplificada pelo motorista que poderia desligar o aplicativo para assistir ao balé da neta, foi contestada por advogados representantes dos trabalhadores, que a consideraram distante da realidade cotidiana da categoria.
Pela Atam/DF - Associação dos Trabalhadores por Aplicativo e Motociclistas do Distrito Federal e Entorno, o advogado Gustavo Ramos, da banca Mauro Menezes & Advogados, destacou que motoristas vivem em cenário de insegurança social e econômica, sem proteção previdenciária e sob intenso controle das plataformas.
"Como se vê, excelências, o caso do avô que foi citado aqui, do avô que poderia buscar sua neta em uma apresentação de balé, é bem distante da realidade da grande maioria dos trabalhadores economicamente dependentes que prestam serviço nessa seara."
Segundo Ramos, trata-se de uma falsa ideia de autonomia, que esconde exploração e precarização do trabalho.
No mesmo sentido, o advogado Antônio Escosteguy Castro, pelo Simtrapli/RS - Simtrapli/RS - Sindicato dos Motoristas por Aplicativos do RS, lembrou que cancelamentos de corridas ou redução da jornada levam a punições, como suspensão do aplicativo ou perda de corridas mais vantajosas.
"Se eu começo a trabalhar menos tempo, como o exemplo aqui já citado, desde ontem, hoje eu não vou trabalhar porque eu vou assistir a minha neta no balé, no dia seguinte o algoritmo não distribui para esse trabalhador as boas corridas, como, digamos, uma corrida para o aeroporto", explicou.


