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Proteção insuficiente

Ministro Barroso permite atuação de enfermeiros em aborto legal

Ministro reconheceu déficit assistencial e ampliou atuação de profissionais de enfermagem em casos de aborto legal. A decisão aponta falhas estruturais no sistema público e assegura proteção jurídica aos profissionais envolvidos.

Da Redação

sábado, 18 de outubro de 2025

Atualizado às 12:05

O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, concedeu liminar autorizando enfermeiros e técnicos de enfermagem possam prestar auxílio na interrupção da gravidez nas hipóteses em que o aborto já é legalmente permitido no Brasil - risco à vida da gestante, gravidez resultante de estupro e gestação de feto anencefálico.

A decisão, proferida nas ADPFs 989 e 1207, será submetida a referendo do Plenário em sessão virtual extraordinária até 24 de outubro. Barroso também determinou que órgãos públicos de saúde se abstenham de criar restrições não previstas em lei, como limite de idade gestacional ou exigência de registro de ocorrência policial para o atendimento.

Segundo o ministro, a medida não dispensa o atendimento médico, mas busca afastar a possibilidade de punição criminal de profissionais de enfermagem que atuem conforme sua formação e dentro da complexidade do caso. 

Ao fundamentar a decisão, Barroso afirmou existir no país um déficit assistencial e proteção insuficiente que impedem mulheres e meninas de acessarem um direito reconhecido há mais de oito décadas.

"Repita-se: o Brasil registra, em média, mais de 16 mil partos por ano de meninas menores de 14 anos, número que chega a 49.325 partos entre 2020 e 2022. Toda gestação nessa faixa etária decorre de estupro de vulnerável, e cada parto representa uma falha do Estado  em garantir o direito de não ser mãe na infância." 

 (Imagem: Freepik)

Barroso reconhece déficit assistencial e autoriza enfermeiros a auxiliar em aborto legal.(Imagem: Freepik)
 

Entenda

As liminares foram concedidas nas arguições de descumprimento de preceito fundamental 989 e 1207.

Na ADPF 989, ajuizada por entidades da sociedade civil - entre elas a Sociedade Brasileira de Bioética (SBB) e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) -, as autoras pediram o reconhecimento de um "estado de coisas inconstitucional" na saúde pública, devido às barreiras administrativas e institucionais que dificultam o acesso ao aborto legal, especialmente em casos de estupro.

Já a ADPF 1207, proposta pelo Psol e associações de enfermagem, buscou interpretação conforme à CF do art. 128 do CP, para que o procedimento não seja prerrogativa exclusiva de médicos. O pedido se baseou em recomendações da OMS, segundo as quais a interrupção legal da gestação pode ser realizada com segurança por diversos profissionais de saúde, inclusive da área da enfermagem.

O Ministério da Saúde reconheceu nos autos que, embora o aborto seja autorizado em três hipóteses, há apenas 166 hospitais habilitados para realizá-lo, o que evidencia falhas estruturais e desigualdade de acesso. 

As ações também apontaram práticas indevidas, como a exigência de boletim de ocorrência e a limitação arbitrária de idade gestacional, que têm levado vítimas a serem revitimizadas ou a recorrer a procedimentos clandestinos.

 

Barroso reconhece proteção insuficiente e amplia rol de profissionais

Em seu voto, Barroso afirmou que, embora não se configure um "estado de coisas inconstitucional", há violação à dignidade humana, à saúde e ao livre exercício profissional, diante da omissão estatal em garantir o aborto nas hipóteses já previstas em lei.

O ministro destacou que a interpretação literal do art. 128 do CP, que menciona apenas "médico", é anacrônica e incompatível com a evolução científica e com a Constituição.

"Em um cenário de vazio assistencial, limitar o espectro de profissionais que podem atuar no cuidado dessas meninas e mulheres contribui para que seus direitos sejam violados."

Barroso citou estudos que indicam mais de 16 mil partos por ano de meninas com menos de 14 anos, todos presumidamente decorrentes de estupro, e afirmou que a ausência de políticas públicas adequadas "submete meninas e mulheres a intensa tortura psicológica". Dessa forma, a falta de estrutura de atendimento, somada à exigência de registros e autorizações indevidas, "obriga meninas e mulheres a suportar uma gestação forçada, configurando revitimização e sofrimento contínuo".

Direitos violados

O ministro também apontou violação ao princípio da vedação à tortura e a tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes (art. 5º, III, da Constituição), citando relatórios da ONU que reconhecem a recusa de acesso ao aborto em casos de estupro como forma de violência institucional.

Outro ponto enfatizado foi a proteção integral da criança e do adolescente (art. 227 da CF). Barroso lembrou que toda gestação em menores de 14 anos é juridicamente considerada resultado de estupro de vulnerável, e que "cada parto de uma menina nessa faixa etária representa uma falha do Estado em garantir o direito de não ser mãe na infância".

Além disso, o relator reforçou que o direito à saúde deve ser interpretado à luz de parâmetros técnico-científicos reconhecidos pela OMS, que recomenda a ampliação dos profissionais aptos a realizar o aborto medicamentoso e classifica a restrição apenas a médicos como "arbitrária e não baseada em evidências"

Por fim, recordou precedentes do STF, como a ADPF 54 (feto anencefálico) e a ADIn 6.586 (vacinação compulsória), para sustentar que o Tribunal deve pautar-se em critérios científicos e racionais na concretização de direitos fundamentais.

Legítima e necessária

Com base nessas premissas, Barroso considerou legítima e necessária a ampliação da rede de atendimento e fixou interpretação conforme à Constituição para afastar a punição de enfermeiros e técnicos de enfermagem que auxiliem nos procedimentos, especialmente em casos de aborto medicamentoso no início da gestação.

Além disso, determinou a suspensão de procedimentos administrativos, processos e decisões judiciais contra esses profissionais e reafirmou que cabe ao Poder Executivo, por meio do Ministério da Saúde e da Anvisa, estruturar políticas públicas eficazes que garantam o direito à interrupção da gestação nas hipóteses legais.

"Em razão do déficit assistencial que torna insuficiente a proteção de mulheres e, sobretudo, de meninas vítimas de estupro, fica facultado a profissionais de enfermagem prestar auxílio ao procedimento necessário à interrupção da gestação, nos casos em que ela seja lícita (CP, art. 128 e ADPF 54)."

A decisão foi assinada em 17 de outubro de 2025, e enviada para referendo do Plenário. Confira a íntegra.

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