STF julga omissão do Congresso em tributar grandes fortunas
PSOL aponta inércia do Congresso na criação do imposto previsto desde 1988.
Da Redação
quinta-feira, 23 de outubro de 2025
Atualizado às 18:16
STF voltou a julgar, em sessão plenária, nesta quinta-feira, 23, se há omissão do Congresso em não regulamentar o imposto sobre grandes fortunas, previsto no art. 153, VII, da CF.
O processo, relatado pelo ministro Marco Aurélio (atualmente aposentado), começou a ser julgado no plenário virtual, mas voltou à pauta presencial após pedido de destaque do ministro Gilmar Mendes.
O decano da Corte cancelou o destaque no último dia 20, mas a ação foi mantida na pauta pelo presidente do Supremo, ministro Edson Fachin.
A sessão desta tarde foi destinada à sustentação oral da advogada do PSOL e, devido ao adiantado da hora, foi suspensa e será retomada oportunamente.
Entenda o caso
A ação foi ajuizada pelo PSOL, para que o Supremo reconheça a omissão inconstitucional do Congresso Nacional em editar a lei complementar que institua o imposto sobre grandes fortunas.
O partido sustenta que, mais de três décadas após a promulgação da Constituição de 1988, o dispositivo permanece sem regulamentação, impedindo a efetividade dos objetivos fundamentais da República, como a redução das desigualdades sociais.
A AGU e a PGR manifestaram-se pela improcedência da ação, afirmando que a instituição do tributo constitui faculdade política da União, não um dever constitucional, e que eventual fixação de prazo legislativo afrontaria o princípio da separação dos poderes.
Sustentação oral
Em sustentação oral no STF, nesta quinta-feira, 23, a advogada Bruna de Freitas do Amaral, representante do PSOL, defendeu que há mais de três décadas o Congresso Nacional permanece omisso em regulamentar o IGF - Imposto sobre Grandes Fortunas, previsto no art. 153, VII, da CF.
Segundo a advogada, a ausência de regulamentação do tributo viola mandamentos constitucionais de justiça e solidariedade fiscal, comprometendo a efetividade dos princípios da igualdade tributária e da capacidade contributiva.
Bruna destacou que o sistema tributário brasileiro é marcadamente regressivo, com forte incidência sobre o consumo e baixa tributação sobre o patrimônio, o que perpetua desigualdades históricas.
A causídica afirmou que o imposto sobre grandes fortunas não se trata de uma penalidade aos mais ricos, mas de um instrumento de equilíbrio social, destinado a financiar políticas públicas de erradicação da pobreza - conforme previsto na EC 31/00, que vinculou sua arrecadação ao Fundo de Combate à Pobreza.
Citando estudos econômicos, Bruna ressaltou que menos de 5% da carga tributária brasileira incide sobre a propriedade, enquanto 45% recaem sobre o consumo, onerando desproporcionalmente as camadas mais pobres.
Para a advogada, a instituição do IGF é um dever constitucional, e não uma opção política.
"A ausência do imposto sobre grandes fortunas é uma negação prática do princípio da solidariedade. A Constituição não autoriza que a riqueza se dissocie da responsabilidade", concluiu, pedindo que o Supremo reconheça a mora inconstitucional do Congresso Nacional e determine a adoção das medidas legislativas necessárias à criação do tributo.
Voto do relator
No plenário virtual, o relator, ministro Marco Aurélio, entendeu configurada a omissão inconstitucional do Congresso Nacional.
Para S. Exa., a falta de deliberação sobre projeto de lei que trate do tema "revela inatividade incompatível com a Constituição Federal".
O ministro citou precedente do STF na ADIn 3.682, de relatoria de Gilmar Mendes, segundo o qual a demora irrazoável na apreciação de proposições legislativas pode caracterizar mora inconstitucional.
"Não é admissível transformar a Lei das leis, que é a Constituição Federal, em 'sino sem badalo', na dicção do professor José Carlos Barbosa Moreira, sob pena de ter-se o prejuízo à força normativa do texto e a perda de legitimidade do Judiciário", afirmou Marco Aurélio.
Segundo o relator, o imposto sobre grandes fortunas - único entre os impostos ordinários previstos na Constituição ainda não implementado - é instrumento apto a promover justiça social e reduzir desigualdades, especialmente diante da crise fiscal e social agravada pela pandemia.
"Passados 31 anos da previsão constitucional, que venha o imposto, presente a eficácia, a concretude da Constituição Federal. Com a palavra, o Congresso Nacional", concluiu.
Apesar de reconhecer a mora legislativa, Marco Aurélio recusou-se a fixar prazo para atuação do Congresso, sustentando que tal medida extrapolaria a função jurisdicional.
"É perigoso, em termos de legitimidade institucional, uma vez que, não legislando o Congresso Nacional, a decisão torna-se inócua", advertiu.
Assim, votou pela procedência da ação, sem impor prazo ao Legislativo para regulamentar o tributo.
- Veja o voto.
No Congresso
Em outubro de 2024, a Câmara dos Deputados concluiu a votação do PLP 108/24, segundo projeto da reforma tributária, que trata da administração e cobrança do IBS - Imposto sobre Bens e Serviços - o novo tributo que substituirá o ICMS e o ISS.
Durante a sessão, os parlamentares rejeitaram emenda do deputado Ivan Valente que propunha a instituição do IGF - Imposto sobre Grandes Fortunas, incidente sobre patrimônios superiores a R$ 10 milhões.
A proposta visava ampliar a progressividade do sistema e reforçar a arrecadação de altos rendimentos, mas não obteve apoio da maioria.
Com a conclusão dessa etapa, o PLP 108/24 seguiu para o Senado, consolidando, no âmbito legislativo, a opção política de não incluir o imposto sobre grandes fortunas na reforma tributária em curso - exatamente o ponto central da omissão questionada no STF.
- Processo: ADO 55





