TJ/SP declara nula holding familiar criada para excluir herdeira
Tribunal reconheceu simulação na criação de empresa usada para fraudar direito hereditário e determinou que os bens retornem ao espólio.
Da Redação
quinta-feira, 30 de outubro de 2025
Atualizado em 31 de outubro de 2025 11:07
A 4ª câmara de Direito Privado do TJ/SP anulou a constituição de uma holding familiar criada por patriarca pouco antes de seu falecimento, ao reconhecer que o ato teve propósito de fraudar a legítima e excluir uma das filhas da sucessão.
Por unanimidade, o colegiado acompanhou o voto do relator, desembargador Ênio Santarelli Zuliani, que reconheceu a simulação do negócio jurídico e o desvio de finalidade da empresa.
Entenda o caso
A ação foi proposta por uma das herdeiras, que alegou que o pai, já enfermo e próximo da morte, criou uma holding familiar e transferiu a ela seus bens pessoais, deixando-a de fora da sociedade e, por consequência, de parte de sua herança.
Segundo a inicial, o ato societário teria sido praticado de forma simulada, configurando fraude à legítima, a porção mínima da herança assegurada por lei aos herdeiros necessários.
Na contestação, os réus afirmaram que a criação da holding foi legítima e que a transferência de bens aos descendentes se deu de forma regular, por decisão do instituidor ainda em vida, dentro de um projeto de organização patrimonial.
O juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo irregularidades na constituição da sociedade. Ambas as partes recorreram.
Ambas as partes recorreram: os herdeiros pediram a reforma total da sentença e o reconhecimento da validade da holding, enquanto a autora buscou ampliar a condenação dos réus, com pedido de nulidade da empresa, exclusão dos honorários e reconhecimento de litigância de má-fé.
Fraude
Ao analisar os recursos, o desembargador Ênio Zuliani reconheceu que, embora a constituição de holdings familiares seja prática legítima e aceita no ordenamento jurídico, não pode ser utilizada para suprimir o direito de herdeiros necessários.
O relator observou que a empresa foi criada em momento muito próximo ao falecimento e sem a participação de todos os herdeiros, o que evidenciou o intuito de afastar uma sucessora da herança.
"Não existe cartilha ou manual da construção de estratégias fraudulentas, porque a intenção de prejudicar direitos é fruto da imaginação fértil animada pela ilicitude e colocada em prática com métodos surpreendentes ao sentimento de correção e lealdade da pessoa de boa-fé", pontuou Zuliani.
Na decisão, o relator destacou que o ato contrariou os arts. 1.784, 1.846 e 1.847 do CC, que asseguram, respectivamente, a transmissão automática da herança (droit de saisine) e a igualdade entre os herdeiros necessários.
Para Zuliani, a holding foi criada com desvio de finalidade e violação do princípio da igualdade sucessória, impondo a nulidade das alterações contratuais e o retorno dos bens ao espólio.
"O presente processo espelha a exclusão da autora dos direitos da sua herança, preterida com o aparato de ter sido assegurado seus direitos e dos demais filhos do pai falecido, por meio de uma holding familiar, sendo que é defendida a legalidade do que se fez com sofismas e articulados forenses, sem demonstração efetiva de que foram destinados a ela os resultados de sua participação acionária.
É como abrir uma conta corrente conjunta, creditar valores que, em tese, estariam disponíveis para todos, mas que somente alguns privilegiados possuem acesso para exercer a fruição da totalidade do numerário."
Com base nessa fundamentação, o colegiado negou provimento ao recurso dos réus e deu provimento parcial ao recurso da autora, declarando nula a constituição da holding familiar e condenando os requeridos ao pagamento das custas e honorários advocatícios, fixados em 15% sobre o valor atualizado da causa.
Processo tramita em segredo de justiça.

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