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Aprovação do PLP do Devedor Contumaz pode contribuir para erradicar agentes criminosos da economia formal

O avanço do crime organizado no mercado formal expõe falhas fiscais. O PLP 125/22 busca isolar devedores contumazes e conter o financiamento ilícito.

8/12/2025
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Desde agosto deste ano, a sociedade brasileira tem acompanhado com apreensão aos sobressaltos o noticiário sobre o crime organizado e sua estratégia para ingressar no mercado formal em diferentes setores, em especial combustíveis, tabaco, bebidas alcoólicas, entre outros.

No caso do setor de combustíveis, a ação das organizações criminosas deu um salto impressionante. Antes limitada à revenda, a Operação Carbono Oculto, por exemplo, mostrou o que o mercado já sabia: a presença do crime em toda a cadeia abrangendo desde usinas de cana, refinarias, distribuidoras até revendedores.

Mais grave: a Operação Poço de Lobato, desencadeada no final de novembro, mostrou que os criminosos lançaram mão de sofisticados instrumentos como offshores, holdings e fundos de investimento para adquirir patrimônio e ocultar uma movimentação financeira de mais de R$ 70 bilhões em um ano.

O atrativo: a sonegação de impostos reiterada, até o momento não contemplada nem punida com o devido rigor pelo arcabouço jurídico vigente no país. Somente em nosso setor, a dívida acumulada por esse grupo restrito de devedores contumazes no setor atinge a impressionante marca de R$ 174,1 bilhões (União e Estados).

Esse valor astronômico é a prova da rentabilidade dessa prática ilegal, que sufoca empresas idôneas e gera um lucro criminoso de R$ 62 bilhões anuais para as organizações criminosas – cifra que supera em quatro vezes a receita do tráfico de cocaína, segundo o FBSP - Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

O Legislativo brasileiro dispõe de uma ferramenta que pode representar uma importante contribuição para ajudar a interromper a presença de agentes do mercado ilegal na economia formal. Além de sonegar, tais agentes drenam recursos que poderiam ser investidos em segurança, saúde e educação. 

A oportunidade de mudança se traduz no PLP 125/22. A matéria, proposta pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e relatada no Senado pelo colega Efraim Filho (União-PB), onde foi aprovada por unanimidade, atualmente tramita na Câmara dos Deputados sob a relatoria do deputado Federal Antônio Carlos Rodrigues (PL-SP). 

O texto tem como principal objetivo estabelecer um marco regulatório de conformidade fiscal que protege, sobremaneira, o bom contribuinte. Mais do que isso: isola o agente que utiliza a sonegação reiterada e intencional como modelo de negócio.

Importante ressaltar: o devedor contumaz não configura o cidadão que não consegue pagar a prestação da casa própria, a mensalidade da faculdade do filho ou fatura do cartão de crédito. Esse agente possui grande volume financeiro e, intencionalmente, não paga impostos para poder concorrer com vantagem desleal contra seus pares.

Quando olhamos para o ambiente jurídico e regulatório, a aprovação imediata do PLP 125/22 se apresenta tão crucial quanto urgente. O projeto define com clareza a caracterização do devedor contumaz e cria sanções para quem se apoia no não recolhimento reiterado de impostos para concorrer com vantagens contra seus concorrentes. 

Pela lei, “considera-se devedor contumaz o sujeito passivo cujo comportamento fiscal se caracteriza pela inadimplência substancial, reiterada e injustificada de tributos”.

O texto também detalha o conceito de inadimplência contumaz. No âmbito Federal, por exemplo, contempla a existência de créditos tributários em situação irregular, inscritos em dívida ativa ou constituídos e não adimplidos, em âmbito administrativo ou judicial, de valor igual ou superior a R$ 15 milhões e equivalente a mais de 100% (cem por cento) do seu patrimônio conhecido.

Nos âmbitos estadual, distrital e municipal, aplica-se a regra para créditos tributários em situação irregular, inscritos em dívida ativa ou constituídos e não adimplidos conforme previsto em legislação própria, a qual poderá prever valores distintos dos previstos. 

A matéria frisa que a manutenção de créditos tributários em situação irregular deve ocorrer em, pelo menos, quatro períodos de apuração consecutivos, ou em seis períodos de apuração alternados. Quando este comportamento persistir por 12 meses, a dívida passa a ser considerada reiterada. O PLP 125 considera a ausência de motivos objetivos que afastem a configuração da contumácia como injustificada.

O texto estabelece ainda penalidades severas contra os sonegadores, tais como o impedimento de acesso a benefícios fiscais e a participação em licitações promovidas pela administração pública; vedação à formalização de vínculos com a Administração Pública (autorização, licença, habilitação, concessão de exploração ou outorga de direitos) e bloqueio de acesso à recuperação judicial. 

Importante salientar que o texto, em seu art. 12, frisa o amplo direito de defesa desses agentes. Serão observados a indicação dos créditos tributários que dão causa ao enquadramento como devedor contumaz; a concessão de prazo de 30 (trinta) dias, contado a partir da data da notificação, para regularização total ou parcial dos créditos tributários ou para apresentar demonstração de patrimônio conhecido em valor igual ou superior aos créditos tributários que motivaram a sua notificação. O devedor contumaz só será caracterizado como tal se não regularizar sua situação nem apresentar defesa no prazo previsto. 

O texto tem a chancela técnica de órgãos de controle e o apoio maciço do setor produtivo, incluindo grandes frentes parlamentares e associações como o MBC - Movimento Brasil Competitivo, FCS - Frente do Comércio e Serviços e a FPA - Frente Parlamentar da Agropecuária. Essa convergência de interesses demonstra que o projeto transcende a pauta setorial para se tornar uma política de Estado no combate à economia subterrânea.

O Câmara dos Deputados tem em mãos um texto maduro, técnico e que reflete um consenso construído com muito diálogo e aprovado por unanimidade no Senado. O PLP 125/22 atinge em cheio o financiamento do crime organizado. Confiamos que o Parlamento aprovará a matéria, encerrando o ciclo de enriquecimento ilícito via sonegação, que hoje sustenta e blinda as organizações criminosas no país.

Autor

Emerson Kapaz Presidente do Instituto Combustível Legal (ICL).

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