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PM é consumidor ao utilizar arma comprada pela administração

Colegiado entendeu que o policial, mesmo sendo usuário da arma adquirida por uma instituição pública, é considerado consumidor, o que garante sua reparação de danos pelo CDC.

12/2/2025

A 4ª turma do STJ manteve entendimento do TJ/SP no sentido de que, mesmo em caso de aquisição do produto por uma instituição pública, o policial, como usuário, é considerado consumidor para fins de reparação de danos, garantindo a ele as prerrogativas do CDC.

O caso

De acordo com os autos, o policial militar que, em um dia de folga, teve a arma que carregava na cintura disparada acidentalmente. O projétil atingiu sua virilha, causando fratura no fêmur.

A Taurus, fabricante da arma, questionou a aplicação do CDC ao caso, argumentando que o policial não poderia ser considerado consumidor, uma vez que a arma foi adquirida pela PM/SP em uma relação administrativa.

No entanto, o TJ/SP rejeitou o recurso da empresa e manteve a ação, o que levou a Taurus a recorrer ao STJ, reiterando a sua posição.

Voto do relator

Em seu voto, o ministro Antonio Carlos Ferreira destacou que o CDC impõe a responsabilidade objetiva ao fornecedor em casos de defeito no produto, obrigando-o a indenizar o consumidor sempre que for demonstrado o nexo causal entre o defeito e o acidente de consumo.

O ministro ressaltou que, em casos de acidente de consumo, a proteção prevista no CDC se estende a todas as vítimas atingidas pelo defeito no produto, garantindo o direito à reparação dos danos causados pelas falhas na fabricação.

No caso em questão, o ministro considerou que, mesmo sendo uma arma adquirida por uma instituição pública, o policial, como usuário do produto, deveria ser considerado consumidor para fins de reparação, uma vez que o defeito na fabricação do produto causou o acidente.

O ministro reforçou que o CDC garante a indenização não apenas para consumidores diretos, mas também para aqueles que, de alguma forma, são afetados por falhas nos produtos ou serviços.

Portanto, concluiu que a empresa deveria ser responsabilizada pela falha no produto e que a eventual (no STJ não se julgou o mérito) reparação ao policial ferido estava amparada pelo CDC, independentemente da circunstância de a arma ter sido adquirida por uma instituição pública.

Questão de ordem

Levantando questão de ordem, o ministro Raul Araújo argumentou que o caso envolve Direito Público, pois trata-se de um servidor público que, em razão de sua função, é obrigado a utilizar a arma como ferramenta de trabalho.

O ministro destacou que a arma, pertencente ao acervo da PM e adquirida pelo Estado, leva à consideração de que, se houver necessidade de indenização, o policial talvez deva buscar essa reparação com base no art. 37, §6º da CF.

S. Exa., no entanto, ficou vencida na questão de ordem.

Ganhou mas não levou

Embora o STJ tenha reconhecido a aplicação do CDC ao caso do policial, a decisão não teve efeito prático. O mérito da ação já havia sido julgado em primeiro grau, e, mesmo com o entendimento favorável à tese consumerista, a sentença foi contrária ao autor. O juiz da comarca de Barretos concluiu que "a inexistência de problemas nos sistemas de segurança do armamento estava categoricamente comprovada", motivo pelo qual negou qualquer indenização. Como não houve recurso, o caso se encerrou.

Assim, ainda que a tese firmada pelo STJ seja juridicamente relevante, sua aplicação foi esvaziada pelo fato de a Corte não ter sido informada sobre o trânsito em julgado da decisão de primeiro grau.

Errata

Por alguns minutos, a matéria trouxe a informação de que a Taurus havia sido condenada a indenizar o policial pelo disparo acidental. No entanto, essa informação foi prontamente corrigida após contato com a assessoria de imprensa da empresa, que esclareceu o real objeto do julgamento.

Vale destacar que as informações disponíveis no andamento processual do STJ podem ter dado causa à confusão. De acordo com os registros do tribunal, o tema em julgamento está classificado como "DIREITO CIVIL – Responsabilidade Civil – Indenização por Dano Moral".

(Imagem: Reprodução/STJ)
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