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STJ não vê dano e mantém obra de tirolesa entre Urca e Pão de Açúcar

2ª turma considerou entendimento do Iphan de que a obra não ensejaria impacto significativo na estrutura dos morros.

10/6/2025

2ª turma do STJ decidiu pela continuidade de obras da tirolesa entre os morros do Pão de Açúcar e da Urca, no Rio de Janeiro/RJ. 

Entenda

Trata-se de ação civil pública movida pelo MPF contra o Iphan e a empresa CCAPA - Cia Caminho Aéreo Pão de Açúcar para suspender a execução das obras da tirolesa nos morros do Pão de Açúcar e da Urca.

Em 1ª instância, o pedido foi acolhido em liminar. Contudo, o TRF da 2ª região reformou a decisão, argumentando que, com 95% da obra concluída, a paralisação causaria mais prejuízos do que a finalização.

O MPF recorreu, alegando, entre outros pontos, que a decisão privilegiou interesses privados em detrimento do interesse público, vez que a obra altera gravemente o aspecto da estrutura dos morros, causando dano irreversível ao meio ambiente. 

Diante disso, o TRF da 2ª região concedeu efeito suspensivo para manter a suspensão das obras até a análise definitiva pelo STJ.

Histórico

Em sessão da 2ª turma no dia 18 de março, as defesas da empresa e do Iphan - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional sustentaram que a obra foi submetida à análise do instituto em três ocasiões, sendo aprovada em todas elas com a conclusão de que não haveria impacto significativo na estrutura dos morros.

Nesse sentido, argumentaram que não houve mutilação do patrimônio tombado e que as intervenções realizadas foram mínimas e necessárias para garantir a acessibilidade no ponto turístico. Também enfatizaram que os cabos instalados possuem espessura reduzida, sendo visualmente menos intrusivos do que os do bondinho, o que minimizaria qualquer alteração na paisagem.

Ainda, ressaltaram que a manutenção da suspensão das obras causaria prejuízos, comprometendo o turismo e a utilização do espaço, enquanto a finalização do projeto garantiria a plena funcionalidade da estrutura, sem comprometer a integridade do patrimônio tombado.

Periculum in mora reverso

Em voto, o relator, ministro Francisco Falcão, destacou que, com 95% das obras já executadas, a manutenção da suspensão traria mais prejuízos do que a conclusão, configurando o chamado "periculum in mora reverso".

Segundo S. Exa., a paralisação das obras impactaria negativamente a paisagem, já que o local permaneceria coberto por tapumes e lonas, prejudicando o turismo. Também argumentou que a parcela restante do projeto é mínima e que, caso seja constatada alguma ilegalidade ao final do processo, seria possível determinar a reversão das alterações já realizadas.

"Com a execução de 95% das obras previstas, o periculum in mora reverso é mais danoso, prejudicando a paisagem local, o que, sem dúvida, é mais lesivo ao turismo do que a própria conclusão da parcela ínfima restante do projeto em execução."

Além disso, o ministro ressaltou a ausência de respaldo jurídico para a pretensão do MPF, ao observar que a portaria 420/10 do Iphan, apontada como fundamento para a nulidade da autorização da obra, não se enquadra no conceito de lei Federal. Assim, conforme previsto no art. 105, III, da CF, não poderia ser utilizada como base para a interposição de recurso.

Dessa forma, concluiu que não caberia ao STJ reformar a decisão do TRF da 2ª região que suspendeu a liminar, não conhecendo o recurso.

À época, o julgamento foi suspenso por pedido de vista da ministra Maria Thereza de Assis Moura.

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STJ confirma continuidade de obras da tirolesa entre Pão de Açúcar e Urca.(Imagem: Thenews2/Folhapress)

Divergência

Nesta terça-feira, 10, a ministra votou pela suspensão das obras de instalação da tirolesa. Divergindo do relator, entendeu que a continuidade da intervenção poderia comprometer o resultado útil da ação civil pública, considerando o risco de danos irreversíveis ao meio ambiente.

Além disso, para a ministra, o argumento de que a paralisação traria impactos negativos à paisagem revela uma compreensão limitada do direito ambiental.

Nesse sentido, S.Exa. apontou que os prejuízos decorrentes da conclusão da obra e do início das atividades recreativas ultrapassam a simples obstrução visual e podem comprometer a estrutura dos morros do Pão de Açúcar e da Urca, além de alterar seus aspectos principais.

Segundo afirmou, embora as obras estejam suspensas, o local continua a funcionar como ponto turístico, possibilitando a visita ao monumento mesmo que com restrições de visibilidade em algumas áreas.

Assim, em tom categórico, ressaltou: “Se for concedida a possibilidade de execução da obra, aí sim não haverá mais necessidade de falar em ação civil pública”.

Com esse entendimento, votou pelo provimento do recurso especial para restabelecer a decisão que suspendeu as obras.

Defensor intransigente

Na sequência, o relator rebateu os argumentos da ministra, reafirmando sua posição favorável à continuidade da intervenção e destacando alinhamento com entendimento do Iphan.

Eu julgo o processo pelo que está nos autos (...) Pelo que eu estou vendo nos autos, essa obra já está praticamente concluída. Nós temos tapumes que estão 'enfeiando' aquela vista que hoje é tida no mundo inteiro como um marco importante do Rio de Janeiro. Aqui, o próprio Iphan concorda (...) Como eu posso ficar contra o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional?”, questionou.

Em seguida, concluiu: “Sou um defensor intransigente do meio ambiente e das obras históricas. Pedindo vênia à ministra Maria Thereza, reafirmo todos os termos do meu voto, com a segurança de que estou julgando pelo que está nos autos, e é assim que se deve julgar”.

Confiança no instituto

Ao votar, ministro Marco Aurélio Bellizze reconheceu o receio da ministra Maria Thereza quanto à destruição do patrimônio. No entanto, seguiu entendimento do ministro Falcão ao destacar que acredita que os dirigentes públicos e o próprio Iphan “estão de olho” na questão.

Penso que os pequenos ajustes que fizerem sobre aquele monumento não trarão desconforto visual (...) Confio no Iphan, confio nos dirigentes do Rio de Janeiro, que não trariam um apelo de, em um patrimônio da humanidade, trazer uma obra que só o desfigurasse”.

Também seguindo o relator, ministro Teodoro Silva Santos apontou que os documentos constantes nos autos demonstram a regularidade da obra, sem comprovação de danos ambientais irreversíveis ou de violação ao patrimônio histórico da região.

Ministro Afrânio Vilela concluiu acompanhando os ministros. Em voto, destacou as certidões de aprovação da obra emitidas pelo tribunal de origem e demais órgãos competentes.

Não vejo o meio ambiente atacado com a construção”, afirmou.

Diante disso, por maioria, o colegiado não conheceu do recurso do MPF,  mantendo a decisão do TRF da 2ª região pela manutenção das obras.

Manifestação da defesa da CCAP

A defesa da Companhia Caminho Aéreo Pão de Açúcar reforça que o projeto foi submetido à análise do Iphan em três ocasiões distintas, recebendo aprovação em todas elas.

Para os advogados da companhia, Marcio Vieira Souto Ferreira e Frederico Ferreira, sócios do escritório Bermudes Advogados, o Iphan mostrou que as intervenções em rocha são insignificantes e justificadas.

As intervenções permitirão a acessibilidade plena da tirolesa, o que significa que pessoas com deficiência utilizarão o equipamento sem qualquer restrição de acesso”, afirmou Marcio Vieira.

Quanto às acusações de danos ambientais feitas pelo MPF, os defensores argumentam que a perfuração realizada representa apenas 0,000124% do volume do Morro do Pão de Açúcar, tendo ocorrido no interior de um prédio que existe há mais de cem anos no complexo.

O projeto teve todas as licenças necessárias do Iphan e segue rigorosamente a legislação", destacou Frederico.

Segundo os defensores, o resultado do julgamento é uma vitória para o turismo e para a economia do estado.

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