Por maioria, STF condenou o pastor Francismar Aparecido da Silva, que incitou "guerra" nas redes sociais e, posteriormente, foi preso em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília, no dia seguinte aos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023.
O réu foi condenado à pena de um ano de reclusão - substituída por medidas restritivas de direitos - pelos crimes de associação criminosa e incitação à animosidade das Forças Armadas contra os Poderes da República. Ele também foi condenado à multa e indenização de R$ 5 milhões por danos morais coletivos.
Prevaleceu o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes, seguido pela maioria do Plenário. Divergiram os ministros André Mendonça e Nunes Marques, que votaram pela absolvição, ao entenderem que o STF não era competente para julgar o caso, e que a denúncia não individualizou adequadamente a conduta do acusado.
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Participação
Francismar se apresenta como pastor presidente no Ministério Evangelístico Apascentar.
Em dezembro de 2022, antes dos ataques de 8 de janeiro, publicou nas redes sociais uma live do então presidente Jair Bolsonaro com a legenda:
"A mensagem foi dada a quem quer a paz. Se prepare para a guerra!."
Poucos dias depois, viajou de Itajubá/MG a Brasília e foi preso em flagrante no acampamento montado em frente ao Quartel-General do Exército, já no dia 9 de janeiro de 2023.
Segundo a denúncia, o réu associou-se a um grupo com estrutura estável e propósito golpista.
Voto do relator
Ministro Alexandre de Moraes, ao votar, classificou os atos como "crimes multitudinários", caracterizados pela influência recíproca dos envolvidos, que agem como massa de manobra em ações contra o Estado Democrático de Direito.
"[...] assiste inteira razão ao Ministério Público em relação a co-autoria em crimes multitudinários praticada por FRANCISMAR APARECIDO DA SILVA aos crimes de associação criminosa e incitação ao crime, equiparada pela animosidade das Forças Armadas contra os Poderes Constitucionais, no contexto dos crimes multitudinários, pois em crimes dessa natureza, a individualização detalhada das condutas encontra barreiras intransponíveis pela própria característica coletiva da conduta, não restando dúvidas, contudo, de que TODOS contribuem para o resultado, eis que se trata de uma ação conjunta, perpetrada por inúmeros agentes, direcionada ao mesmo fim [...]."
No relatório, Moraes narrou que o acampamento possuía organização funcional, com tendas destinadas à alimentação, saúde, internet e até culto religioso, e que nele circulavam faixas e cartazes convocando "intervenção militar" e atacando os Poderes da República.
A incitação à ruptura institucional, portanto, foi entendida como pública, reiterada e com potencial lesivo real.
A defesa alegou nulidades, atipicidade e ausência de provas, mas todos os pedidos foram rejeitados. Moraes afirmou que o réu aderiu dolosamente à finalidade golpista e permaneceu no local mesmo após os ataques do dia 8, visando manter o movimento ativo.
A pena foi fixada em um ano de reclusão, substituída por prestação de serviços à comunidade, curso sobre democracia, proibição de uso de redes sociais, restrição de saída da comarca, manutenção da suspensão do passaporte e revogação de eventual porte de arma.
A multa foi estipulada em 20 dias-multa de meio salário mínimo, e a indenização milionária será paga solidariamente com outros condenados.
S. Exa. foi acompanhado pela ministra Cármen Lúcia e pelos ministros Cristiano Zanin, Flávio Dino, Edson Fachin, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes e Luiz Fux.
- Veja o voto do relator.
Divergência
Ministros Nunes Marques e André Mendonça divergiram e votaram pela absolvição.
Para ambos, o STF é incompetente para julgar o caso, uma vez que o réu não tem prerrogativa de foro.
Segundo Nunes Marques, não houve demonstração concreta de conexão com investigados que tenham foro na Corte, e a denúncia deveria ser encaminhada à 1ª instância da Justiça Federal.
- Veja o voto de Nunes Marques.
Ministro André Mendonça, além de reiterar a incompetência do STF, considerou a denúncia inepta por falta de individualização das condutas.
Para S. Exa., a simples presença no acampamento não é suficiente para configurar associação criminosa ou incitação ao crime:
"[...] penso que há, no mínimo, dúvida razoável quanto à homogeneidade de métodos, intenções, atitudes, e, especialmente, quanto ao dolo de cada um dos réus, o que macula a tese de que todos, apenas por estarem lá, pertenciam a uma mesma associação criminosa. E essa dúvida há de ser resolvida nos termos do milenar adágio latino “in dubio pro reo”, o qual, por mais grave que sejam os fatos, não pode ser invertido ou desconsiderado", afirmou.