Migalhas Quentes

Ministério da Justiça regulamenta uso de IA em investigações criminais

A pasta informou que a iniciativa “busca modernizar a atuação das forças de segurança brasileiras, sem abrir mão da proteção aos direitos fundamentais dos cidadãos”.

1/7/2025

O ministério da Justiça e Segurança Pública publicou nesta segunda-feira, 30, no DOU, a portaria 961/25, que autoriza o uso de tecnologias da informação, incluindo ferramentas baseadas em inteligência artificial, por servidores dos órgãos de segurança pública, no contexto de investigações criminais.

As diretrizes se aplicam às forças federais — PF, PRF, Polícia Penal Federal, Polícia Penal Nacional e Força Nacional de Segurança Pública — além de órgãos estaduais, distritais e municipais que recebem recursos dos FNSP - Fundos Nacionais de Segurança Pública e FPN - Penitenciário. A norma também abrange o Cade - Conselho Administrativo de Defesa Econômica, a ANPD - Autoridade Nacional de Proteção de Dados e as Senasp - secretarias nacionais de Segurança Pública e de Senappen - Políticas Penais, vinculadas ao ministério.

Em nota, o ministério afirmou que a medida “busca modernizar a atuação das forças de segurança brasileiras, sem abrir mão da proteção aos direitos fundamentais dos cidadãos”. O texto da portaria justifica a regulamentação com base na necessidade de assegurar “a legalidade, a adequação, a necessidade e a proporcionalidade como condições do uso de sistemas de tecnologia da informação nas atividades de investigação criminal e inteligência de segurança pública que possam gerar riscos à privacidade e a outros direitos fundamentais”.

Além das investigações, a norma autoriza o uso dessas tecnologias para reforçar a segurança em estabelecimentos prisionais. As ferramentas poderão ser utilizadas para detectar, localizar e bloquear sinais de dispositivos móveis (como celulares, smartphones e tablets), bem como para acessar informações armazenadas nesses aparelhos, quando forem apreendidos.

No entanto, o uso das soluções tecnológicas para obtenção de dados sigilosos dependerá de autorização judicial e deverá estar vinculado a investigação criminal ou à instrução processual. A norma determina ainda que, “sempre que tecnicamente viável”, sejam descartadas informações sigilosas relativas a pessoas sem relação com os fatos investigados ou obtidas fora do período autorizado judicialmente. Dados fortuitamente encontrados e que configurem crime fora do escopo da autorização deverão ser comunicados ao juízo competente.

Lewandowski destaca limites legais para investigação e uso da IA

Em entrevista ao Migalhas, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, afirmou que a portaria tem como objetivo estabelecer parâmetros claros para o uso de tecnologias de inteligência em atividades investigativas e de inteligência. Segundo ele, foi feita uma distinção entre investigação formal e atividade de inteligência, sendo que “a atividade de investigação só pode ocorrer dentro de um processo formal ou dentro de um inquérito formal e a invasão da privacidade e da intimidade de uma pessoa só mesmo com autorização judicial”.

O ministro explicou que a norma determina o registro do momento em que dados pessoais forem acessados, o motivo do acesso e a identificação do responsável, vedando a realização de investigações anônimas. Também destacou que “a atividade de inteligência é distinta da investigação” e não pode “penetrar justamente nesse círculo mais íntimo da pessoa humana que é protegida constitucionalmente”.

Sobre o uso de inteligência artificial, Lewandowski afirmou que seu emprego está autorizado, desde que feito “com muita parcimônia, muito cuidado, respeitando os direitos fundamentais”. Ele também alertou para a necessidade de que a IA “não saia do controle do investigador” durante seu uso nas atividades de investigação ou inteligência.

Regras para o uso de inteligência artificial

Quanto ao uso de inteligência artificial, a portaria estabelece que ele deverá ser “proporcional, observar o dever de prevenção de riscos e as leis aplicáveis à espécie”. A regulamentação veda o emprego de sistemas que permitam identificação biométrica à distância, em tempo real, e em espaços públicos. As exceções são casos de busca por vítimas de crimes, pessoas desaparecidas ou situações que envolvam ameaça grave e iminente à vida ou à integridade de pessoas.

Também serão permitidos esses recursos em contextos de instrução de inquérito ou processo criminal, flagrante delito de crimes com pena superior a dois anos, cumprimento de mandados de prisão ou recaptura de réus ou detentos.

Os órgãos que fizerem uso dessas ferramentas deverão adotar medidas de controle de acesso, de modo que somente agentes no pleno exercício de suas funções e previamente autorizados possam utilizá-las. Os meios de autenticação deverão incluir certificados digitais, biometria ou autenticação multifator.

Segundo o ministério da Justiça, a portaria é a primeira norma específica sobre os parâmetros para uso da inteligência artificial na segurança pública. “A medida representa um avanço significativo na modernização das forças de segurança brasileiras, posicionando o país na vanguarda da aplicação responsável de tecnologia para proteção da sociedade”, destacou a pasta em nota.

O evento

Nos dias 30 de junho e 1º de julho, acontece em Coimbra, Portugal, o Seminário de Verão. Com o tema “Descortinando o Futuro: 30 Anos de Debates Jurídicos”, o evento reúne autoridades e acadêmicos do universo jurídico e de diversas outras áreas.

Veja a versão completa

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