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Intoxicações por bebida acendem alerta; MJ aponta consequências legais

Autoridades reforçam orientações e intensificam fiscalização após mortes e internações.

30/9/2025

Casos de intoxicação por metanol em bebidas alcoólicas acenderam alerta em São Paulo. Jovens foram hospitalizados após consumirem produtos adulterados, com relatos de perda temporária da visão, coma prolongado e ao menos duas mortes confirmadas.

O metanol, substância de uso industrial e altamente tóxica, pode causar falência múltipla de órgãos. Um dos pacientes contou que acordou no dia seguinte ao consumo sem conseguir enxergar – a cegueira está entre as complicações mais graves. Outro permanece em coma há quase um mês em decorrência da contaminação. As ocorrências foram reveladas em reportagem exibida pelo Fantástico no último domingo.

Segundo o CVS - Centro de Vigilância Sanitária de SP, até a noite de segunda-feira, 29, seis casos de intoxicação foram confirmados e dez estão em investigação.

Casos de intoxicação por metanol em bebidas acendem alerta em SP.(Imagem: Freepik)

O que é o metanol?

O metanol é um tipo de álcool incolor e inflamável, com aparência e cheiro muito semelhantes ao etanol — o álcool presente em bebidas. A diferença está na composição química: enquanto o etanol é metabolizado pelo organismo de forma menos agressiva, o metanol, ao ser ingerido, se transforma em ácido fórmico, substância que envenena as células e pode causar lesões graves no fígado, no sistema nervoso e no nervo óptico.

Embora seja usado legalmente em processos industriais, como na fabricação de solventes, plásticos, tintas e biodiesel, o metanol não é seguro para consumo humano. Mesmo pequenas doses podem provocar sintomas como visão turva, dor abdominal, náusea, confusão mental, convulsões e, em casos mais graves, cegueira e morte.

Alerta do governo

Diante da gravidade, o ministério da Justiça e Segurança Pública emitiu nota técnica reforçando a necessidade de ação conjunta entre governo, setor privado e sociedade. O documento orienta bares, restaurantes, casas noturnas, mercados, distribuidores e plataformas de e-commerce a:

Entre as orientações ao setor privado estão a compra segura, a conferência de produtos e o fortalecimento da rastreabilidade dos produtos. O documento também destaca que preços anormalmente baixos, lacres tortos, erros grosseiros de impressão, odor semelhante a solventes e relatos de consumidores com sintomas como visão turva, dor de cabeça intensa, náusea ou rebaixamento da consciência devem ser tratados como suspeita de adulteração.

Nesses casos, os estabelecimentos devem interromper imediatamente a venda do lote; isolar fisicamente os produtos; preservar garrafas, caixas, rolhas e rótulos como evidência; e manter ao menos uma amostra íntegra por lote para possível perícia.

Se houver consumidores sintomáticos, a recomendação é encaminhar para atendimento médico urgente e acionar o Disque-Intoxicação (0800 722 6001), serviço da Anvisa. Também é indicado comunicar a Vigilância Sanitária local, Polícia Civil (197), PROCON e, quando aplicável, o Ministério da Agricultura e Pecuária.

Consequências legais

O MJSP reforça que a comercialização de produtos adulterados é crime previsto no artigo 272 do Código Penal, com pena de reclusão e multa. Além disso, colocar no mercado produto impróprio para consumo é crime contra as relações de consumo, conforme a lei 8.137/90.

De acordo com o CDC, cabe ao fornecedor garantir a segurança dos produtos e fornecer informações claras e adequadas. Em caso de risco, podem ser necessárias medidas de recall.

A recomendação tem aplicação imediata em São Paulo, podendo ser ampliada para outros Estados conforme novos achados das autoridades sanitárias e policiais.

Colaboração público-privada

O advogado Rafael Rocha, da banca Daniel Advogados, explica que a venda de bebidas falsificadas é um crime sob múltiplas perspectivas.

"Não se trata apenas de uma infração de propriedade industrial, que atinge diretamente as marcas pirateadas, mas também de uma grave questão de saúde pública e de proteção ao consumidor."

Ele destaca que, entre todas essas dimensões, a mais relevante é, sem dúvida, o risco à saúde do consumidor.

"Esses crimes infelizmente são recorrentes, porém hoje contamos com uma estrutura robusta de investigação e persecução, conduzida tanto por empresas e associações quanto pelas autoridades públicas. Trata-se de uma situação típica de colaboração público-privada, em que titulares de marcas e órgãos de fiscalização unem forças para combater a pirataria e proteger a sociedade."

Intensificação da fiscalização em São Paulo

No âmbito estadual, o Procon/SP anunciou a intensificação de fiscalizações em bares, supermercados, adegas e casas noturnas, em parceria com o Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania (DPPC). As equipes verificam notas fiscais, informações obrigatórias em rótulos e embalagens, além de apreender produtos suspeitos para análise laboratorial.

O órgão também divulgou orientações preventivas aos consumidores:

Enquanto as investigações buscam identificar a origem das bebidas adulteradas, especialistas reforçam que a rápida procura por atendimento médico pode ser decisiva para evitar sequelas permanentes.

Caso Backer

A recente contaminação por metanol em São Paulo reacendeu lembranças do episódio da cervejaria Backer, em Belo Horizonte. Em 2020, a cerveja Belorizontina foi associada a uma intoxicação causada por dietilenoglicol e monoetilenoglicol, substâncias tóxicas usadas como anticongelantes.

O resultado foi devastador: dez pessoas morreram e ao menos 19 ficaram com sequelas permanentes. Cinco anos depois, as vítimas ainda não receberam as indenizações previstas em acordo com o Ministério Público, e o processo criminal contra os responsáveis segue sem decisão judicial.

Na esfera cível, a empresa firmou compromisso de pagar até R$ 500 mil a cada vítima e R$ 150 mil a familiares de primeiro grau, mas o prazo foi suspenso devido à recuperação judicial da cervejaria. Até hoje, as reparações não foram pagas.

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