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A desconsideração da personalidade jurídica e a proposição de reforma do CC

terça-feira, 8 de julho de 2025

Atualizado em 7 de julho de 2025 12:25

1. Introdução

Como se sabe, a desconsideração da personalidade jurídica da pessoa coletiva "é a retirada episódica, momentânea e excepcional da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, a fim de estender os efeitos de suas obrigações à pessoa de seus titulares, sócios ou administradores, com o fim de coibir o desvio da função da pessoa jurídica, perpetrado por estes".1

Noutros termos, com a desconsideração da personalidade jurídica da pessoa coletiva, os bens particulares de quem faz parte da pessoa coletiva podem responder pelos danos causados a terceiros, ou seja, "o véu ou escudo, no caso da pessoa jurídica, é retirado para atingir quem está atrás dele, o sócio ou administrador. Bens da empresa também poderão responder por dívidas dos sócios, por meio do que se denomina como desconsideração inversa ou invertida."2

O art. 50 do CC cuida da desconsideração da personalidade jurídica da pessoa coletiva nas relações civis e empresariais e traz a teoria maior3 subjetiva (desvio de finalidade) e objetiva (confusão patrimonial).4

Nessa senda, o presente artigo tem por objeto trazer à baila a proposição feita no PL 4/25, atualmente em tramitação no Senado Federal5, acerca da desconsideração da personalidade jurídica que, no CC, se encontra no art. 50, cuja comparação entre os textos é a seguinte:

Art. 50 do CC

Art. 50 da PL do CC

Art. 50.  Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. (Redação dada pela lei 13.874, de 2019)

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens de propriedade de administradores, sócios ou associados da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.

 

§ 1º  Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza. (Incluído pela lei 13.874, de 2019)

§ 1º O disposto neste artigo se aplica a todas as pessoas jurídicas de direito privado, nacionais ou estrangeiras, com atividade civil ou empresária, mesmo que prestadoras de serviço público.

§ 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por: (Incluído pela lei 13.874, de 2019)

I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; (Incluído pela lei 13.874, de 2019)

II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e (Incluído pela lei 13.874, de 2019)

III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial. (Incluído pela lei 13.874, de 2019)

§ 2º Na hipótese de desconsideração da personalidade jurídica de associações, a responsabilidade patrimonial será limitada aos associados com poder de direção ou com poder capaz de influenciar a tomada da decisão que configurou o abuso da personalidade jurídica.

 

§ 3º  O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica. (Incluído pela lei 13.874, de 2019)

§ 3º É cabível a desconsideração da personalidade jurídica inversa, para alcançar bens de sócio, administrador ou associado que se valeram da pessoa jurídica para ocultar ou desviar bens pessoais, com prejuízo a terceiros.

§ 4º  A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. (Incluído pela lei 13.874, de 2019)

§ 4º Para os fins do disposto neste art., desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores ou para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza, inclusive a de abuso de direito.

 

§ 5º  Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica. (Incluído pela lei 13.874, de 2019)

§ 5º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação dos patrimônios, caracterizada:

I - pela prática pelos sócios ou administradores de atos reservados à sociedade, ou pela prática de atos reservados aos sócios ou administradores pela sociedade;

II - pelo cumprimento repetitivo pela pessoa jurídica de obrigações do sócio, associados ou administradores, ou vice-versa;

III - pela transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e

IV - por outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.

 

§ 6º Aos sócios e aos administradores da pessoa jurídica também se aplicam o que dispõem o caput e os §§ 1º e 2º deste art.

 

 

§ 7º A mera existência de grupo econômico, sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste art. não justifica a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica.

§ 8º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica.

 

Passa-se à análise da proposição posta na reforma do CC.

2. Alguns pontos de reflexão sobre a proposição da reforma do art. 50 do CC

Como linha geral, a proposição de reforma do CC visou apor para o texto codificado construções doutrinárias e judicativas dos Tribunais, mormente STJ6, realizadas desde a entrada em vigor em 11/1/2003 do CC em vigor.

Foram mantidos no caput do art. 50 do CC os dois requisitos não cumulativos desvio de finalidade ou confusão patrimonial - para fins de desconsideração da personalidade jurídica abarcou a teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica.7

O caput do art. 50 do CC não sofreu muitas alterações, tendo sido acrescido ao texto somente que associados da pessoa jurídica também podem sofrer os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica da pessoa coletiva.

A subcomissão da Parte Geral do CC, no relatório final dos trabalhos afirmou que "foi incluída previsão, no art. 50, da possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica das associações, a qual será limitada aos associados com poder de direção ou capazes de influenciar na tomada da decisão"8, como se infere da redação proposta do § 2º do art. 50 do CC. Tal mudança nos parece adequada para deixar induvidosa a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica no âmbito das associações.

A mudança propalada no § 1º do art. 50 do CC visa deixar bastante claro que a desconsideração da personalidade jurídica é possível para "todas as pessoas jurídicas de direito privado, nacionais ou estrangeiras, com atividade civil ou empresária, mesmo que prestadoras de serviço público" e tal mudança também deve ser aplaudida, uma vez que concretiza a perspectiva da operalidade9 do CC.

O § 3º do art. 50 do CC cuida expressamente e em nome da operabilidade, segundo a subcomissão da Parte Geral do CC, "da desconsideração da personalidade jurídica inversa e esclarecido que os bens a serem eventualmente constritos são 'de propriedade' do atingido pela desconsideração, harmonizando o texto atual com o CPC".10

Existe doutrina no Direito Empresarial que entende não ser possível falar de desconsideração inversa da personalidade jurídica, pois tais hipóteses seriam enquadradas como responsabilidade de quem controla a pessoa coletiva:

Uma pretensa novidade nesse campo teria surgido com a chamada desconsideração inversa da personalidade jurídica, que se caracteriza pela imposição de responsabilidade do patrimônio social diante de abusos praticados por seu controlador e administradores. No entanto, trata-se ao somente do desconhecimento do sistema de responsabilidade previsto na lei, tanto em relação à sociedade limitada, quanto à anônima, que se coloca no plano da teoria dos atos abusivos do controlador e dos administradores (itens 1.14 e 1.14.2, infra).11

Indubitavelmente este é um bom debate, uma vez que o instituto da desconsideração da personalidade jurídica inversa foi consagrado na doutrina e em julgados brasileiros.

O § 4º do art. 50 do CC, de acordo com a redação proposta pela subcomissão de juristas, objetivou delimitar parâmetros de aferição do desvio de finalidade e, de novo em nome da operabilidade, incluiu expressamente o abuso do direito e isso é salutar, pois o critério de imputação do abuso do direito posto no art. 187 do CC é objetivo, ou seja, não se afere culpa ou dolo.

O § 5º do art. 50 do CC, na redação proposta, repete as hipóteses do atual § 2º do art. 50 do CC e inclui, como hipótese de confusão patrimonial, a "prática pelos sócios ou administradores de atos reservados à sociedade, ou pela prática de atos reservados aos sócios ou administradores pela sociedade".

O § 6º do art. 50 do CC, na redação sugerida, realiza pequenas alterações na redação do atual § 3º do art. 50 do CC ao indicar que: "Aos sócios e aos administradores da pessoa jurídica também se aplicam o que dispõem o caput e os §§ 1º e 2º deste art.".

Este é um ponto interessante de se debater, uma vez que parte da doutrina do direito empresarial sustenta que não se pode confundir a desconsideração da personalidade jurídica com as hipóteses de responsabilidade direta de membro da pessoa coletiva, como expressamente previsto nos arts. 117 e 158 da lei 6.404/76, 135 da lei 5.175/66 (CTN) e dos arts. 1.009, 1.016 e 1.080 do CC, visto que não "foi a pessoa jurídica que teve sua finalidade desvirtuada, foram as pessoas físicas que agiram de forma ilícita e, por isso, têm responsabilidade pessoal".12

Além disso, é possível responsabilizar membro ou administrador da pessoa coletiva, sem que se desconsidere a personalidade desta, se membros ou administrador da pessoa coletiva extrapolam os poderes ao violar a lei ou o estatuto ou o contrato social, a ensejar a responsabilidade direta do membro ou do administrador13, como explica a doutrina:

Em tal caso, há simplesmente uma questão de imputação. Quando o diretor ou o gerente agiu com desobediência a determinadas normas legais ou estatutárias, pode seu ato, em determinadas circunstâncias, ser inimputável à pessoa jurídica, pois não agiu como órgão (salvo problema de aparência) - a responsabilidade será sua, por ato seu. Da mesma forma, quando pratique ato ilícito, doloso ou culposo: responderá por ilícito seu, por fato próprio.14

Portanto, quando a lei cuida de responsabilidade solidária, ou subsidiária, ou pessoal dos sócios, por obrigação da pessoa jurídica, ou quando ela proíbe que certas operações, vedadas aos sócios, sejam praticadas pela pessoa jurídica, não é preciso desconsiderar a empresa, para imputar as obrigações aos sócios, pois, mesmo considerada a pessoa jurídica, a implicação ou responsabilidade do sócio já decorre do preceito legal. O mesmo se diga se a extensão da responsabilidade é contratual.15

Parece que o debate sobre o tema continuará acesso no Direito Privado brasileiro sobre o tema, porque julgados, por exemplo, já acolheram a desconsideração da personalidade jurídica inversa, a partir das construções da doutrina.16

O § 7º do art. 50 do CC, com o texto proposto, reforça o § 4º do art. 50 atual e aponta que: "A mera existência de grupo econômico17-18, sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não justifica a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica".

O § 8º do art. 50 do CC, com a redação proposta, espelha o atual § 5º do art. 50 do CC: "§ 8º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica".

Importante ressaltar que a proposição da reforma não cuidou de alguns pontos de relevo sobre o instituto, a saber:

a) A utilização da pessoa coletiva para fins de configuração do desvio de finalidade necessita de conduta dolosa ou intencional de lesar o direito de outrem ou de atos ilícitos?

(a.1) O STJ responde que: "Para fins de aplicação da teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica (art. 50 do CC/02), exige-se a comprovação de abuso, caracterizado pelo desvio de finalidade (ato intencional dos sócios com intuito de fraudar terceiros) ou confusão patrimonial, requisitos que não se presumem mesmo em casos de dissolução irregular ou de insolvência da sociedade empresária" (grifo nosso) (STJ - AgInt no REsp 2.175.692. 3ª T. Rel. min. Ricardo Villas Bôas Cueva. DJEN 28/3/2025).19

(a.2) Este entendimento do STJ é equivocado, uma vez que o desvio de finalidade é espécie de abuso do direito posto no art. 187 do CC, cujo critério de imputação é objetivo "sem qualquer menção ao elemento subjetivo do dolo ou da culpa, e que fundamenta o instituto da desconsideração da personalidade jurídica".20

(a.3) O STJ entende que a hipótese de abuso do direito alinhavada no art. 187 do CC enseja critério de imputação objetivo de responsabilidade: "O desrespeito aos limites legais na utilização do sistema, configurando abuso no exercício desse direito (art. 187 do CC), enseja a responsabilidade objetiva" (STJ - RESP 2.122.455. Rel. min. Marco Aurélio Belizze. Publ. 1/3/2024).

(a.4) Desse modo, por que os demais casos de abuso do direito são valorados pelo critério de imputação objetivo de responsabilidade, sem análise de culpa e dolo, e o caso de desvio de finalidade na desconsideração da personalidade jurídica da pessoa coletiva, sendo hipótese de abuso do direito, o mesmo STJ exige "ato intencional dos sócios com intuito de fraudar terceiros"? (STJ - AgInt no REsp 2.175.692)

(a.5) Lembra-se de que o STJ exigia o dolo somente nos casos de encerramento irregular das atividades da pessoa coletiva sem adimplir com as dívidas e com as obrigações e com a modificação forma das informações perante os órgãos competentes (STJ, EREsp 1.306.553/SC, 2.ª Seção, Rel. min. Maria Isabel Gallotti, j. 10/12/2014, DJe 12/12/2014).

(a.6) Além disso, o mesmo STJ entende que não "se tratando de execução de dívida ativa, mas de título extrajudicial fundado em nota promissória (vinculado a contrato de abertura de crédito) - relação jurídica de natureza civil-empresarial -, não pode ser admitido o redirecionamento da execução, ou a desconsideração da personalidade jurídica, com base na simples dissolução irregular da empresa" (ex: no AgInt no REsp 2.175.692).

b) por que manter, no caso da confusão patrimonial, a exigência de que haja o cumprimento repetitivo da pessoa coletiva de deveres dos(as) sócios(as) ou do(a) administrador(a), visto que "a confusão patrimonial poderia estar configurada por um único cumprimento obrigacional da pessoa jurídica em relação aos seus membros; por um ato isolado, é possível realizar um total esvaziamento patrimonial com o intuito de prejudicar credores"21?

c) deixar explícito, em nome da operabilidade que o § 7º do art. do CC projetado acolheu a desconsideração da personalidade jurídica econômica ou indireta ou expansiva22, já admitida pelo STJ (ex.: Ag. Int. no REsp 1.837.435);

d) acolher a desconsideração da personalidade jurídica positiva, já admitida pelo STJ em 2023 (ex.: Ag. Int. no AREsp 1.868.007).

3. Conclusão: a reforma proposta melhorou a redação do art. 50 do CC e, ao mesmo tempo, manteve candente o debate sobre temas que envolvem a desconsideração da personalidade jurídica.

As inovações propostas para o art. 50 do CC pela subcomissão de Parte Geral da reforma do CC são relevantes e efetivam o que doutrina e julgados dos Tribunais têm debatido desde a entrada em vigor do CC em 2003.

Não obstante isso, temas que circundam os requisitos e o próprio instituto da desconsideração da personalidade jurídica, como apontado no tópico anterior deste texto continuam efervescentes e manterão o debate pela comunidade jurídica brasileira, a tornar, mais do que imprescindível, o papel da literatura jurídica em apor parâmetros adequados à interpretação dos assuntos e dos institutos que envolvem a desconsideração da personalidade jurídica posta no art. 50 do CC.

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TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial - Teoria Geral e Direito Societário-vol.1. 16. ed. Rio de Janeiro: SRV, 2025. E-book. p.225.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil Vol.1. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2025. E-book. p. 282.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil Vol.1. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2025. E-book. p. 283.

4 Nesse sentido: "a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, medida excepcional prevista no art. 50 do Código Civil, pressupõe a ocorrência de abusos da sociedade, advindos do desvio de finalidade ou da demonstração de confusão patrimonial. A mera inexistência de bens penhoráveis ou eventual encerramento irregular das atividades da empresa não enseja a desconsideração da personalidade jurídica". STJ - Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial 2.159.188. 4ª T. Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira. DJe de 15.12.2022. Idem: STJ - Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial 924.641.

5 Disponível aqui.

6 TARTUCE, Flávio. Direito Civil Vol.1. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2025. E-book. p. 295.

7 TARTUCE, Flávio. Direito Civil Vol.1. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2025. E-book. p. 283.

8 BRASIL. FEDERAL SENADO. Relatório Final dos trabalhos da Comissão de Juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil. Disponível aqui.

9 A operabilidade vai ao encontro da "tendência de facilitar a interpretação e a aplicação dos institutos nele previstos. Procurou-se assim eliminar as dúvidas que imperavam na codificação anterior, fundada em exagerado tecnicismo jurídico. Nesse ponto, visando à facilitação, a operabilidade é denotada com o intuito de simplicidade. Como exemplo, pode ser citada a distinção que agora consta em relação aos institutos da prescrição e da decadência, matéria que antes trazia grandes dúvidas pela lei anterior, que era demasiadamente confusa. Facilitadas as previsões legais desses institutos pelo Código Civil de 2002, poderá o estudioso do direito entender muito bem as distinções existentes e identificar com facilidade se determinado prazo é de prescrição ou de decadência (arts. 189 a 211 do CC/2002)". TARTUCE, Flávio. Direito Civil Vol.1. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2025. E-book. p. 81.

10 BRASIL. FEDERAL SENADO. Relatório Final dos trabalhos da Comissão de Juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil. Disponível aqui.

11 Verçosa, Haroldo Malheiros Duclerc. Direito Comercial: Sociedades: Teoria Geral do Direito Societário - As Sociedades em Espécie do Código Civil - Volume II. 4.ed. São Paulo: Dialética, 2022, p. 149-150.

12 TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial - Teoria Geral e Direito Societário-vol.1. 16. ed. Rio de Janeiro: SRV, 2025. E-book. p.232.

13 TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial - Teoria Geral e Direito Societário-vol.1. 16. ed. Rio de Janeiro: SRV, 2025. E-book. p.231.

14 OLIVEIRA, José Lamartine Côrrea. A dupla crise da pessoa jurídica. São Paulo: Saraiva, 1979, p. 520.

15 AMARO, Luciano. Desconsideração da pessoa jurídica no Código de Defesa do Consumidor. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n. 5, jan./mar. 1993, p. 172.

16 Nesse sentido: "Embargos de declaração. Contradição. Inocorrência. Desconsideração inversa da personalidade jurídica. Responsabilização da sócia da empresa requerida, genitora do executado. Impossibilidade. Art. 50, § 3º, do Código Civil. Doutrina. Desconsideração inversa da personalidade jurídica. Inclusão da sociedade e de sua sócia, mãe do executado, no polo passivo da execução. Agravo parcialmente provido para indeferir a inclusão da sócia no polo passivo. Acórdão que reconhece a atuação da agravante como 'interposta pessoa' na sociedade, mas dá parcial provimento ao agravo para indeferir a sua inclusão no polo passivo da execução. Inexistência de contradição. Ausência de comprovação de desvio de finalidade ou confusão patrimonial por parte da sócia agravante. A desconsideração inversa visa a responsabilização da pessoa jurídica pelas obrigações do seu sócio, nos casos em que este abusa da personalidade jurídica daquela, seja mediante desvio de finalidade ou confusão patrimonial. Art. 50, § 3º, do Código Civil. Doutrina. Embargos de declaração rejeitados" (TJSP - ED 2153987-85.2024.8.26.0000, 4-10-2024, Rel. J.B. Paula Lima). "Agravo de instrumento - Incidente de desconsideração da personalidade jurídica - Decisão que reconhece a formação de bloco econômico e a responsabilidade solidária das empresas autorizadas a constarem no polo passivo da demanda - Inconformismo que aduz a inexistência dos requisitos autorizadores da desconsideração da personalidade jurídica - Argumentos que não convencem diante das circunstâncias fáticas comprovadas nos autos - Observância do artigo 50, § 3º, do Código Civil, bem como disposto no artigo 28, §5º, do Código do Consumidor - Recurso desprovido" (TJSP - AI 2036227-52.2023.8.26.0000, 31-3-2023, Rel. José Carlos Ferreira Alves). "Recurso - Agravo de instrumento - Responsabilidade civil - Acidente de trabalho - Ação de reparação de danos materiais e morais - Cumprimento de sentença - Incidente de desconsideração da inversa da personalidade jurídica. Insurgência contra respeitável decisão que indeferiu pedido de desconsideração inversa da personalidade jurídica dos executados (agravados), fundada na ausência de demonstração dos requisitos legais para tanto. Alegação de desvio de bens dos sócios da executada para outras empresas com sócios comuns, com o intuito de fraudar credores, não demonstrada. Exegese do artigo 50, § 3º, do Código Civil, com a redação dada pela Lei 13.874/2019. A ausência de bens da executada passíveis de penhora, ou mesmo o seu encerramento irregular, não bastam para o deferimento da desconsideração, sendo necessária a prova do abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade e/ou confusão patrimonial, na forma da lei. Precedentes do C. STJ e deste E. TJSP. Decisão mantida. Recurso de agravo de instrumento não provido" (TJSP - AI 2204436-52.2021.8.26.0000, 4-11-2021, Rel. Marcondes D'Angelo)".

17 O sentido de grupo econômico é trazido pela literatura jurídica: "Os grupos econômicos podem ser de fato ou de direito. No grupo econômico de fato existe uma relação entre sociedades controladas/controladoras e sociedades coligadas, porém não existe a constituição regular do grupo econômico. Na área trabalhista, o grupo econômico de fato é conhecido como grupo econômico horizontal. Com a Reforma Trabalhista, não caracteriza grupo econômico a mera identidade de sócios, sendo necessárias, para a configuração do grupo, a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes (art. 2º, § 3º, da CLT). No grupo econômico de direito existe uma convenção para a constituição do grupo econômico, e então ocorre o registro do grupo na Junta Comercial. Quando um grupo econômico é constituído, podemos encontrar a figura da holding. A holding pode ser uma sociedade constituída puramente para participar das outras sociedades. Também pode ser chamada de holding a sociedade constituída para participar de outras sociedades, além de exercer uma atividade econômica. De qualquer forma, o grupo econômico não constitui uma nova personalidade jurídica, e cada sociedade responderá com seu patrimônio pelas obrigações assumidas, ou seja, não há solidariedade entre as sociedades que constituem o grupo econômico (art. 266 da Lei n. 6.404/76)". VIDO, Elisabete. Curso de Direito Empresarial. 13. ed. Rio de Janeiro: SRV, 2025. E-book. p.246.

18 O STJ aponta: "na linha do que vem entendendo o STJ: (...) 2. O tipo de relação comercial ou societária travada entre as empresas, ou mesmo a existência de grupo econômico, por si só, não é suficiente para ensejar a desconsideração da personalidade jurídica. 3. No caso, a extensão da responsabilidade pelas obrigações da falida às empresas que nela fizeram investimentos dependeria, como sustentado pelo Ministério Público em primeira instância, da "eventual concentração de prejuízos e endividamento exclusivo de apenas uma, ou algumas, das empresas participantes falidas", o que, todavia, não foi comprovado pela perícia para tal fim determinada, a qual o acórdão recorrido consignou não haver "apontado, ou descartado, a existência dos critérios mencionados pelo MP, nem elaborado o histórico de pagamento e a comparação pedida". 4. Para ensejar a desconsideração da personalidade e a extensão da falência, seria necessário demonstrar quais medidas ou ingerências, em concreto, foram capazes de transferir recursos de uma empresa para outra, ou demonstrar o desvio da finalidade natural da empresa prejudicada.

5. Fatos assentados pelo acórdão recorrido que não configuram abuso de personalidade, desvio de finalidade ou confusão patrimonial, pressupostos necessários, à luz do art. 50 do Código Civil, para a desconsideração das personalidades jurídicas das empresas envolvidas nas transações, a fim de justificar lhes fosse estendida a falência. (...) (STJ - RESP 1.897.356. 4ª T. Rel.ª Min.ª Maria Isabel Gallotti. J. 03.09.2024. No mesmo sentido: RESP 1.900.147). DIREITO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA. RECONHECIMENTO DA EXISTÊNCIA DE GRUPO ECONÔMICO. MODIFICAÇÃO DAS PREMISSAS FÁTICAS. INVIABILIDADE. SÚMULA 7 DO STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, uma vez "reconhecido o grupo econômico e verificada confusão patrimonial, é possível desconsiderar a personalidade jurídica de uma empresa para responder por dívidas de outra, inclusive em cumprimento de sentença, sem ofensa à coisa julgada" (AgRg no AREsp 441.465/PR, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/06/2015, DJe de 03/08/2015). (...) (STJ - 4ª T. AgInt no AREsp 2454382. Rel. Min. Raul Araújo. DJE 04.06.2024)".

19 Neste sentido: MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Roberta C. Manual de Direito Empresarial. 19. ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2025. E-book. p.245; VENOSA, Silvio de S.; RODRIGUES, Claudia. Direito Empresarial. 13. ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2025, p. 114. A "distorção intencional da verdade com o intuito de prejudicar terceiros" (Couto Silva, Alexandre. Aplicação da desconsideração da personalidade jurídica no direito brasileiro. São Paulo: LTr, 1999, p. 36).Julgados de Tribunais seguem esta linha: "Direito processual civil. Agravo de instrumento. Execução de título extrajudicial. Reconhecimento de grupo econômico. Desconsideração da personalidade jurídica. Art. 50 do Código Civil. Ausência de prova de confusão patrimonial ou desvio de finalidade. Requisitos não preenchidos. Recurso não provido. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de reconhecimento de grupo econômico e desconsideração da personalidade jurídica. O agravante sustenta a existência de confusão patrimonial e a prática de atos que justificariam a desconsideração da personalidade jurídica, requerendo a inclusão da empresa coligada no polo passivo da ação de execução. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se estão presentes os requisitos para o reconhecimento de grupo econômico entre as empresas; (ii) determinar se há elementos que justifiquem a desconsideração da personalidade jurídica, nos termos do art. 50 do Código Civil, nesta fase processual. III. Razões de decidir 3. O artigo 50 do Código Civil prevê que a desconsideração da personalidade jurídica exige a comprovação de desvio de finalidade ou confusão patrimonial, caracterizados pelo uso abusivo da pessoa jurídica para lesar credores. 4. No presente caso, as provas apresentadas pelo agravante, como a existência de atividades comerciais similares, localização próxima e o uso de e-mails semelhantes entre as empresas, não são suficientes para caracterizar a confusão patrimonial ou o desvio de finalidade, elementos necessários para a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica. 5. Embora as empresas tenham proximidade física e atuem no mesmo ramo, esses fatos, por si só, não comprovam a prática de atos fraudulentos ou o uso indevido da personalidade jurídica com o objetivo de prejudicar credores. 6. A desconsideração da personalidade jurídica é medida excepcional, cabível somente quando comprovada a prática de abuso de direito por meio de fraude ou confusão patrimonial, o que não restou demonstrado no caso concreto. 7. O entendimento jurisprudencial majoritário, incluindo precedentes desta Câmara, reforça que a desconsideração da personalidade jurídica exige prova cabal de abuso, o que não foi apresentado pelo agravante. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso não provido. Tese de julgamento: 1. A desconsideração da personalidade jurídica, nos termos do art. 50 do Código Civil, exige a comprovação de confusão patrimonial ou desvio de finalidade, sendo inadmissível sem a demonstração efetiva de abuso de direito. 2. A mera existência de proximidade física e atuação em ramos semelhantes entre empresas não é suficiente para justificar a desconsideração da personalidade jurídica ou o reconhecimento de grupo econômico. Dispositivos relevantes citados: CC/2002, art. 50. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1647362/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, j. 03.08.2017; TJSP, AI nº 2234819-08.2024.8.26.0000, Rel. Des. Vicentini Barroso, j. 24.09.2024; TJSP, AI nº 2030246-08.2024.8.26.0000, Rel. Des. Ramon Mateo Júnior, j. 16.04.2024" (TJSP - AI 2328372-12.2024.8.26.0000, 4-11-2024, Rel. Achile Alesina).

"Agravo de instrumento - desconsideração da personalidade jurídica. Decisão que acolheu o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, para, com fulcro no artigo 50 do Código Civil, declarar a desconsideração da personalidade jurídica da executada. Cabimento. Demonstração de desvio de finalidade e confusão patrimonial por parte da empresa executada. Ausência prolongada de movimentações financeiras e deslocamento irregular de endereço sem devida comunicação. Princípio da boa-fé objetiva violado pela conduta da empresa que omite informações relevantes e se esquiva de responsabilidades. Necessidade de medidas efetivas para garantir a satisfação das execuções judiciais e resguardar direitos dos credores. Decisão mantida. Recurso desprovido" (TJSP - AI 2204804-90.2023.8.26.0000, 11-11-2023, Rel. Israel Góes dos Anjos). "Incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Rejeição do incidente, diante da prova de que a inclusão do suposto sócio no quadro societário da empresa foi fraudulenta. Exequente sequer manifestou interesse em produzir prova contrária. Ainda, ausentes os requisitos estabelecidos no art. 50, do Código Civil. Medida excepcional que reclama indispensável demonstração do abuso da personalidade jurídica com o intuito fraudulento ou confusão patrimonial, vale dizer, prova concreta e bastante no sentido de que a empresa tenha agido com dolo ou intuito de fraudar credores. Circunstância não evidenciada nos autos. Falta de provas consistentes a apoiar as alegações genericamente aduzidas pela exequente/agravante. Manutenção da r. decisão agravada. Recurso não provido" (TJSP - AI 2107900-76.2021.8.26.0000, 10-9-2021, Rel. Cauduro Padin). "Desconsideração da personalidade jurídica. Embargos à execução. Cerceamento de defesa por falta de designação de perícia e oitiva de testemunhas. Inocorrência. Execução de escritura pública de confissão de dívida com pacto adjeto de hipoteca. Fraude negocial constatada no decorrer da ação - o imóvel não existe. Embargante que é sócio da empresa. Caracterizado o dolo dos administradores da empresa na condução dos negócios, abuso da personalidade jurídica e fraude visando lesar credores, nos termos do artigo 50, do Código Civil. Precedentes. Sentença mantida. Recurso desprovido" (TJSP - AP 1000931-79.2015.8.26.0286, 18-8-2021, Relª Anna Paula Dias da Costa)".

20 TARTUCE, Flávio. Direito Civil Vol.1. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2025. E-book. p. 283.

21 TARTUCE, Flávio. Direito Civil Vol.1. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2025. E-book. p. 284.

22 TARTUCE, Flávio. Direito Civil Vol.1. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2025. E-book. p. 291.