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CPC na prática

Questões práticas do CPC/15.

Elias Marques de Medeiros Neto, André Pagani de Souza, Daniel Penteado de Castro e Rogerio Mollica
O relevante artigo 357 do CPC/15 cuida do saneamento e da organização do processo, sendo que é nesse momento que o magistrado: (i) resolverá as questões processuais pendentes, se houver; (ii) delimitará as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos; (iii) definirá a distribuição do ônus da prova, observado o art. 373 do CPC/15; (iv) delimitará as questões de direito relevantes para a decisão do mérito; e (v) designará, se necessário, audiência de instrução e julgamento. Como lembra Cássio Scarpinella Bueno1, "o principal objetivo do art. 357, assim, é o de, reconhecendo que o processo está isento de nulidades - porque as eventualmente ocorrentes foram sanadas - ou de criar condições para que eventuais vícios o sejam, prepará-lo para fase instrutória, após o que será proferida a sentença". Humberto Theodoro Júnior2, por sua vez, salienta que "a decisão de saneamento e organização do processo pode ser havida como uma decisão interlocutória que contém a múltipla declaração positiva de: (i) admissibilidade do direito de ação, por concorrerem as condições da ação, sem as quais não se legitima o julgamento do mérito; (ii) validade do processo, por concorrerem todos os pressupostos e requisitos necessários à formação e desenvolvimento válido da relação processual, e se acharem resolvidas as questões processuais ainda pendentes; (iii) delimitação dos fatos a provar, com especificação dos meios de prova pertinentes; (iv) definição da distribuição do ônus da prova; (v) delimitação das questões de direito relevantes para a decisão do mérito; e (vi) deferimento de prova oral ou pericial, com designação da audiência de instrução e julgamento". O parágrafo primeiro do mesmo artigo 357 do CPC/15 aponta que: "§ 1º Realizado o saneamento, as partes têm o direito de pedir esclarecimentos ou solicitar ajustes, no prazo comum de 5 (cinco) dias, findo o qual a decisão se torna estável". O dispositivo cuida da possibilidade de as partes, e eventuais terceiros, pedirem esclarecimentos quanto aos pontos da decisão de saneamento proferida, sendo uma grande demonstração do modelo cooperativo de processo civil, tão bem delineado no princípio estruturante moldado no artigo 6 do CPC/153. Cássio Scarpinella Bueno4 lembra que esse pedido de esclarecimentos não se confunde com o recurso de embargos de declaração, sendo importante entender essa modalidade de pleito "como elemento cooperativo com vistas a uma prestação jurisdicional ótima, inclusive na perspectiva procedimental e não como recurso. Até porque pode ocorrer, em sentido diametralmente oposto, que não haja, na decisão, nenhum autorizativo para os declaratórios e, mesmo assim, ela precisar ser esclarecida e/ou ajustada para tornar a mais eficiente possível a fase instrutória do processo".   Havendo matéria impugnável por agravo de instrumento e objeto da decisão de saneamento/organização do processo, surge interessante dúvida sobre o momento de interposição do recurso de agravo; notadamente considerando que a redação do parágrafo primeiro do artigo 357 do CPC/15 não prevê que o pedido de esclarecimentos teria o mesmo efeito interruptivo dos embargos de declaração (art. 1026 do CPC/15). Daí a relevância do julgamento, no STJ, do REsp 1703571, ocorrido em novembro de 2022, tendo sido relator o Ministro Antonio Carlos Ferreira; julgamento este em que: "A Quarta Turma do STJ, por maioria, definiu que, havendo o pedido de esclarecimentos ou de ajustes previsto no artigo 357, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil (CPC), o prazo para interposição de agravo de instrumento somente se inicia quando estabilizada a decisão de saneamento, ou seja, após a deliberação do juiz quanto ao requerimento; caso não haja o pedido, o prazo recursal começa após os cinco dias mencionados no dispositivo. Segundo o colegiado, a falta de um entendimento uniforme sobre o tema nas instâncias de origem vem causando insegurança jurídica e prejuízo aos litigantes, que, recorrentemente, não têm o recurso de agravo conhecido por intempestividade"5. Ou seja, para a quarta turma do STJ, o prazo para a interposição do agravo de instrumento contra a decisão de saneamento e organização do processo começa a fluir após a intimação das partes quanto à ulterior decisão referente ao pedido de esclarecimentos de que trata o parágrafo primeiro do artigo 357 do CPC/15. Caso as partes não venham a apresentar pedido de esclarecimentos, o prazo recursal para a interposição do agravo de instrumento começa após os cinco dias mencionados no parágrafo primeiro do artigo 357 do CPC/15. Não há dúvidas de que a posição do STJ demonstra uma busca de segurança jurídica para a contagem dos prazos recursais relativos ao artigo 357 do CPC/15. Mas, vale lembrar, que a matéria ainda não está pacificada, de modo que ainda se mostra prudente o manejo do recurso de embargos de declaração diante da decisão do artigo 357 do CPC/15, caso os respectivos requisitos estejam preenchidos, para fins de segura interrupção do prazo recursal para a posterior interposição de agravo de instrumento (artigo 1026 do CPC/15).  __________ 1 BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 335. 2 THEODORO Jr, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 830 3 BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 336. 4 BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 336. 5 Disponível aqui.
O questionamento de penhora indevida ou avaliação errônea de bem é sempre alvo de preocupação em nosso ordenamento. No cumprimento de sentença temos oportunidade de alegar tais vícios em impugnação ao cumprimento (art. 525, § 1º, IV) ou por simples petição, caso já transcorrido o prazo para impugnação (art. 525, § 11º). Dúvida que surge é sobre a possibilidade de ser alegada diretamente em segunda instância, via Agravo de Instrumento, ou se tal estratégia poderia ser tida como supressão de instância e não poderia ser apreciada pela primeira vez pelo Tribunal. Em recentíssimo julgado, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que a previsão do art. 525, § 11, do CPC seria mera faculdade da parte, que poderia optar pela interposição direta do Agravo de Instrumento nos seguintes termos: "RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA. DECISÃO. NATUREZA JURÍDICA. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. RECURSO CABÍVEL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. APRESENTAÇÃO PRÉVIA DE SIMPLES PETIÇÃO NOS TERMOS DO ART. 525, §11 DO CPC. DESNECESSIDADE. FACULDADE DO DEVEDOR. 1- Recurso especial interposto em 14/1/2022 e concluso ao gabinete em 2/9/2022. 2- O propósito recursal consiste em dizer se, na fase de cumprimento de sentença, é cabível a interposição direta de agravo de instrumento sem a prévia utilização do procedimento de impugnação previsto no art. 525, §11, do CPC. 3- O pronunciamento judicial que determina a penhora de bens possui natureza jurídica de decisão interlocutória e não de simples despacho, notadamente porque não se limita a impulsionar o procedimento, caracterizando inegável gravame à parte devedora. 4- Na fase de cumprimento de sentença, não há óbice à interposição direta do recurso de agravo de instrumento contra decisão que determina a penhora de bens sem a prévia utilização do procedimento de impugnação previsto no art. 525, §11, do CPC. 5- Recurso especial não provido." (REsp n. 2.023.890/MS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 25/10/2022, DJe de 27/10/2022.) Do voto se extraí o referido trecho: "15. Ditou de outro modo, se a finalidade do texto legal é tutelar a posição do executado, cabe a ele o exame da conveniência da utilização do instrumento processual ali previsto antes da interposição de eventual recurso. 16. Além disso, não se pode olvidar que as regras jurídicas que restringem direitos devem ser interpretadas restritivamente, motivo pelo qual aquelas que estabelecem requisitos ou condições para a admissibilidade de recursos devem ser objeto de exegese estrita, pois representam restrição ao direito ao duplo grau de jurisdição e de acesso à justiça, ambos constitucionalmente consagrados." Ao que parece, a mesma conclusão deve ser aplicada à previsão de impugnação prevista no art. 525, § 1º, IV, do CPC, se bem que tal previsão parece praticamente inócua, pois a penhora incorreta ou avaliação errônea são fatos que, na prática, dificilmente serão invocados já na impugnação ao cumprimento de sentença, na medida em que, no prazo que o devedor dispõe para apresentá-la, não terá havido, ainda, qualquer penhora ou avaliação (Cf. APRIGLIANO, Ricardo de Carvalho In MARCATO, Antonio Carlos (Coord.). Código de Processo Civil Interpretado. São Paulo: Atlas, 2022). Desse modo, parece acertado o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que a incorreta penhora ou a avaliação errônea pode ser arguida em impugnação, em simples petição, se já esgotado o prazo da impugnação ou diretamente ao Tribunal pela interposição de Agravo de Instrumento. Cabe ressaltar que interposto o Agravo de Instrumento é facultado ao Agravante requerer ao juiz de primeira instância a reconsideração da decisão agravada (art. 1.018 CPC), desse modo, pode a parte prejudicada concomitantemente tentar corrigir o erro ocorrido na penhora ou na avaliação tanto em primeira como em segunda instância.
quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

Medidas executivas atípicas no âmbito da falência

A aplicação do art. 139, IV, do CPC, referente aos poderes do juiz destinados a determinar medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial é tema repleto de controvérsias e que vem sendo sedimentado mediante construção jurisprudencial. Em outras oportunidades desta coluna pudemos comentar, (i)  a inaplicabilidade na execução fiscal1-2-3, (ii) decisões do STJ e quanto a aplicação subsidiária da medida atípica, observado o contraditório substancial e o postulado da proporcionalidade4, (iii) não cabimento de medidas executivas atípicas destinadas a quebra de sigilo bancário5, (iv) assim como o descabimento de limitação temporal na aplicação do art. 139, IV, do CPC, podendo eventual decisão de indeferimento ser revista pelo magistrado a posteriori.6 Alguns recortes foram traçados ao tema, como (i) a aplicação subsidiária, condicionada a existência de indícios de que exista patrimônio penhorável, (ii) além da necessidade de o magistrado observar os princípios da proporcionalidade, motivação e contraditório quando da utilização do regramento7. E, tal qual anotado pelo colega Elias Marques de Medeiros Neto, noutra oportunidade nesta coluna, quando do julgamento do AgInt no Resp. n. 179.9638/SP, a terceira turma do STJ fixou como requisitos para aplicação dat. 139, IV, (i) a verificação de indício de que devedor possui patrimônio expropriável, (ii) a decisão deve ser fundamentada com base nas especificidades constatadas, (iii) a utilização subsidiária da medida atípica, esgotadas as diligências promovidas para a satisfação do crédito e (iv) há de se observar o contraditório e a proporcionalidade. Por fim, na proposta de afetação do Recurso Especial n. 1.955.539/SP (canalizada no Tema Repetitivo n. 1.137/STJ), com vistas a se formar precedente obrigatório, a Segunda Seção do STJ decidirá sobre a seguinte controvérsia: "Definir se, com esteio no art. 139, IV, do CPC/15, é possível, ou não, o magistrado, observando-se a devida fundamentação, o contraditório e a proporcionalidade da medida, adotar, de modo subsidiário, meios executivos atípicos." Ainda, a questão também será examinada pelo STJ no julgamento da ADI n. 5941, sob o prisma de exame da constitucionalidade do art. 139, IV, do CPC, em especial na proposta apresentada pela Procuradoria Geral da República, para que sua aplicação seja subsidiária e com o escopo de possibilitar medidas de natureza patrimonial, evitando-se a efetivação de medidas que possam gerar restrições de direito8. Recentemente a quarta turma do STJ decidiu pelo cabimento das medidas executivas atípicas no âmbito de processo de falência, uma vez constatados indícios de ocultação patrimonial do falido:  "CONSTITUCIONAL, PROCESSUAL CIVIL E FALIMENTAR. HABEAS CORPUS. FALÊNCIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. APREENSÃO E RETENÇÃO DE PASSAPORTE DO FALIDO. MEDIDA ATÍPICA (CPC/2015, ART. 139, IV). RAZOABILIDADE. ORDEM DENEGADA. 1. A apreensão do passaporte do devedor é medida atípica e restritiva da liberdade de locomoção do indivíduo, podendo caracterizar constrangimento ilegal e arbitrário, susceptível de análise em sede de habeas corpus, como via processual adequada. 2. Em homenagem ao princípio do resultado na execução, inovou no ordenamento jurídico o CPC de 2015 ao prever, em seu art. 139, IV, a adoção de medidas executivas atípicas, tendentes à satisfação da obrigação exequenda. 3. "A adoção de meios executivos atípicos é cabível desde que, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade" (REsp 1.782.418/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, j. em 23/04/2019, DJe de 26/04/2019). 4. Sendo a falência um processo de execução coletiva decretado judicialmente, deve o patrimônio do falido estar comprometido exclusivamente com o pagamento da massa falida, de modo que se tem como cabível, de forma subsidiária, a aplicação da referida regra do art. 139, IV, conforme previsto no art. 189 da Lei 11.101/2005. 5. Na hipótese, verifica-se a razoabilidade da medida coercitiva atípica de apreensão de passaportes, pois adotada mediante decisão fundamentada e com observância do contraditório prévio, em sede de processo de falência que perdura por mais de dez anos, após constatados fortes indícios de ocultação de vasto patrimônio em paraísos fiscais e que as luxuosas e frequentes viagens internacionais do paciente são custeadas por sua família, mas com patrimônio indevidamente transferido a familiares pelo próprio falido, tudo como forma de subtrair-se pessoalmente aos efeitos da quebra. 6. Ordem denegada." (STJ, HC n. 742.879/RJ, Quarta Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 13.09.2022, v.u., grifou-se) Em análise mais detida, proclamou o voto condutor, verbis: "(...) Muitas vezes o exaurimento dos meios executivos relacionados no Código - "meios típicos de execução" - significa que o devedor realmente não dispõe de patrimônio com o qual pague a dívida. Outras vezes, no entanto, a busca persistente de bens do devedor não descortina patrimônio sujeito à execução, mas o comportamento social do executado evidencia incompatibilidade desse dado com a realidade, tais como: sinais de solvência em ambientes e em redes sociais ou públicos, em oposição à indisponibilidade patrimonial alegada e aparentada no processo. Para tais situações, indicativas, aliás, de uma postura processualmente desleal e não cooperativa, o CPC/2015 previu a regra do transcrito art. 139, IV, sem correspondente no revogado CPC/1973. Em suma, as medidas executivas atípicas agregaram-se aos meios típicos de execução a fim de permitir que o juiz, à luz das circunstâncias do caso concreto, encontre a técnica mais adequada para proporcionar a efetiva tutela do direito material violado. Logicamente, existem alguns limites materiais que vêm sendo construídos para orientar a aplicação dos meios atípicos. Um deles, que merece especial atenção, é a necessidade de prévio exaurimento dos meios típicos ou subsidiariedade dos meios atípicos. Não obstante isso, a imposição de prévio exaurimento da via típica é exigência que pode ser relativizada em alguns casos. É o que deve ocorrer quando o comportamento processual da parte, em qualquer das fases do processo, descortina a sua propensão à deslealdade ou à desordem. A boa-fé objetiva é princípio cuja inobservância deve implicar não apenas sanções processuais, como a prevista no caso de conduta atentatória à dignidade da justiça (CPC, art. 774). O descumprimento do princípio, para além da sanção punitiva, deve irradiar efeitos jurídicos para repelir as consequências da atuação maliciosa. (...) "Com efeito, consta da decisão de primeiro grau impugnada: "o esgotamento dos meios de execução/mecanismos de localização de patrimônio expropriável do devedor é presumido pela própria decretação da falência, tratando-se, assim, de quadro de inegável frustração da exigência de créditos"; "os documentos acostados aos autos, que demonstram a realização de viagens internacionais e gastos de grande vulto por parte do falido, somados ao trabalho realizado pelo escritório DFA, contratado no incidente nº 0029364-82.2018.8.19.0001, para investigar a existência de ações fraudulentas realizadas pelo falido a fim de ocultar seu patrimônio em paraísos fiscais por meio de empresas 'offsshores', demonstram haver indícios de que Daniel Birmann possui patrimônio passível de arrecadação neste feito falimentar"; "apesar de oportunizado o contraditório, o falido apenas alega que as viagens luxuosas bem como seus gastos são arcados integralmente por sua congregação religiosa ou por seus familiares, o que definitivamente não se afigura razoável, menos ainda crível"; "note-se, ainda, que deixa o falido de cumprir o dever previsto no inciso VI, do art. 104, da Lei 11.101/05, quando não esclarece os pontos indicados pelo Juízo falimentar, como se vê do item "3", II da decisão de fls. 9863/9866, proferida no feito principal da falência" (e-STJ, fls. 124-125). Em face das circunstâncias retratadas, verifica-se justo motivo para aplicação da medida atípica na situação em análise. (...) Assim, considerando que a falência se caracteriza como um processo de execução coletiva decretado judicialmente, devendo o patrimônio do falido estar comprometido exclusivamente com o pagamento da massa falida, tem-se possível a aplicação do art. 139, IV, do CPC/2015, de forma subsidiária, observando o disposto no art. 189 da Lei 11.101/2005: Art. 189. Aplica-se, no que couber, aos procedimentos previstos nesta Lei, o disposto na Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), desde que não seja incompatível com os princípios desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) Na hipótese, as instâncias ordinárias entenderam evidenciado que o paciente adotou ao longo do processo de falência, iniciado há mais de dez anos, conduta evasiva e não cooperativa. Por oportuno, seguem as esclarecedoras informações da autoridade coatora (e-STJ, fls. 161-163): "No ano de 2008 foi decretada a falência de Sam Indústria, estendida a sua controladora, Boulder, e Daniel Birmann, paciente em favor de que é impetrado o presente Habeas Corpus. Consoante constatado pela Comissão de Valores Mobiliários, e objeto do processo criminal, Daniel Birmann, controlador de Boulder, esvaziou os cofres de Sam Indústria através de uma série de milionários empréstimos feitos a ele mesmo, a ponto de insolvência e de inadimplemento de debêntures emitidas em favor de seu maior credor, um fundo de previdência. Durante quase dez anos após a decretação da falência, nenhum centavo dos falidos foi localizado para pagamento dos credores - essencialmente o Fisco e o dito fundo de previdência. Até que, substituído o administrador judicial, contratou-se escritório paulista especializado em recuperação de ativos localizados no estrangeiro. O que a partir dali foi revelado, ao custo de pesados investimentos do escritório, foi uma rede internacional de ativos ocultos e shell companies com sede em paraísos fiscais. Com efeito, no momento da falência, Daniel Birmann dizia-se o único acionista da offshore chamada Northumbria, lançada em sua declaração do Imposto de Renda pelo simbólico valor de R$ 11.000,00 (onze mil reais). E era nela que se iniciava a cadeia das sociedades aparentemente desprovidas de atividade econômica e necessárias à ocultação de suas riquezas. Foi só então que se descobriu ser Daniel, por meio desta sociedade, o principal acionista da Companhia Brasileira de Cartuchos (cujas ações já foram arrecadadas), além de outras sociedades possuidoras de vasto patrimônio imobiliário, cuja real e perfeita dimensão jamais foi plenamente revelada pelo falido." Além de descortinar a ocultação de vasto patrimônio, as investigações levadas adiante pela massa trouxeram à luz, com farta prova documental, o cometimento de toda sorte de atos, posteriores à falência, visando a apagar os vestígios de patrimônio e dificultar a sua recuperação. Dentre outras ilicitudes, tem-se que Daniel Birmann doou a trust de sua família ações de offshore por ele controladas, declarando falsamente à autoridade estrangeira não possuir impedimento legal à alienação do patrimônio, embora falido fosse. Apreendidas as ações de CBC, Daniel transferiu para Nova Iorque todo o capital possível da referida empresa, rompendo com o padrão histórico de contas da sociedade, que mantinha até então no exterior parcela irrelevante de seu capital de giro. Pois bem, foi nesse contexto que o administrador judicial investigou as circunstâncias das viagens internacionais feitas pelo falido. Descobriu-se que os destinos das viagens não eram aqueles objetos de comunicação ao juízo falimentar, na letra do artigo 104 da Lei 11.101. Ao contrário, Daniel Birmann viajava a paraísos turísticos, dentre os quais Las Vegas, chegando ao ponto de se utilizar de avião particular, construído em 2014 para Northumbia pela empresa francesa Dessault e avaliado em R$ 100.000.000,00 (cem milhões de reais). Portanto, certificada a incapacidade da massa de localizar seus ativos, o paciente, seis anos após a falência, comprou para a empresa por ele controlada avião de que se utiliza para voos internacionais de puro deleite, sem qualquer alteração significativa de seu padrão de vida, que permanece opulento e mantido às custas de seus credores. Foi em semelhante contexto, em que veementes os sinais da prática dos crimes dos artigos 168, 171 e 173 da Lei 11.101 que o eminente juízo a quo e esta 16ª Câmara Cível determinaram a apreensão dos passaportes do falido, a bem da proteção do patrimônio oculto e com base nos artigos 99, VII, da Lei 11.101 e 139, IV, do CPC. Não se objetiva com a medida coagi-lo ao pagamento da dívida, mas impedir a acintosa dilapidação dos ativos da massa, consumada aos olhos de todos." (grifou-se) O comportamento processual adotado pelo falido evidencia justo motivo para o emprego de medida coercitiva atípica. Além da robusta fundamentação da decisão de primeiro grau, houve respeito ao contraditório, quando lhe foi dada a oportunidade de demonstrar a inadequação da técnica processual postulada - e ao fim aplicada. As justificativas apresentadas, no entanto, não esclareceram pontos importantes, como a ocultação de patrimônio em paraísos fiscais, descumprimento de obrigação legal, realização de viagens luxuosas sem evidência de fins religiosos e doação de patrimônio aos familiares que atualmente arcam com suas despesas de viagens. Também o acórdão dito coator goza de fundamentação densa e consistente. Houve análise exaustiva e pormenorizada das circunstâncias do caso, seguida da valoração dos direitos em oposição, a fim de confirmar o deferimento parcial da tutela de urgência que determinou a apreensão e retenção dos passaportes do paciente. Com efeito, a jurisprudência do STJ considera cabível a adoção de meio executivo atípico, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, observada a subsidiariedade da medida, aplicada por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade. (...) Portanto, demonstradas a conduta processualmente temerária do paciente, a consistente fundamentação da decisão e a observância do contraditório prévio, conclui-se que não há constrangimento ilegal à liberdade de ir e vir do paciente. Ante o exposto, denega-se a ordem de habeas corpus, ficando prejudicado o pedido de reconsideração de fls. 176/182. É como voto." (STJ, HC n. 742.879/RJ, Quarta Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 13.09.2022, v.u., grifou-se) Respeitado entendimento em sentido contrário, o julgado acima soa acertado no sentido de manter congruência ao quanto decidido pelo STJ noutros precedentes. Em outras palavras, ao invés de limitar a discussão ao mero palpite se cabe ou não determinar a retenção de passaporte ou qualquer outra modalidade de medida atípica, depreende-se que houve profunda análise (i) das circunstâncias do caso concreto, (ii) em cotejo ao comportamento processual da parte pautado ou não na probidade e boa-fé, (iii) a aplicação subsidiária da medida e, ainda (iv) fundamenta sua necessidade e adequação como melhor meio coercitivo observado às circunstâncias do caso concreto. _________ 1 Disponível aqui. 2 Disponível aqui. 3 Disponível aqui. 4 Disponível aqui. 5 Disponível aqui. 6 Disponível aqui. 7 Nos referimos ao julgamento do Recurso Especial n. 189.6421/SP. 8 Disponível aqui.
quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

Impenhorabilidade do bem de luxo

A impenhorabilidade do bem de família da lei 8.009/1990 remanesce ainda que se trate de imóvel de alto padrão ou de luxo, independentemente do seu valor econômico. Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: "AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. IMÓVEL DE ALTO PADRÃO. PROTEÇÃO LEGAL MANTIDA. 1. Para que se configure o prequestionamento da matéria, há que se extrair do acórdão recorrido pronunciamento sobre as teses jurídicas em torno dos dispositivos legais tidos como violados, a fim de que se possa, na instância especial, abrir discussão sobre determinada questão de direito, definindo-se, por conseguinte, a correta interpretação da legislação federal (Súm. 211/STJ). 2. Conforme jurisprudência do STJ, rever o entendimento do acórdão recorrido quanto às situações em que o Tribunal de origem, examinando as circunstâncias da causa, expressamente afasta a preclusão da questão atinente à impenhorabilidade do bem de família, demanda o reexame de matéria fático-probatória, atraindo a incidência da Súmula 7/STJ. 3. Nos termos da Lei n. 8.009/90 e da jurisprudência consolidada do STJ, a impenhorabilidade do bem de família remanesce ainda que se trate de imóvel de alto padrão ou de luxo. Ressalva de entendimento do Relator. 4. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp n. 1.965.350/MT, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 26/4/2022, DJe de 29/4/2022.)" No mesmo sentido, há os seguintes julgados: REsp 1726733/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/10/2020, DJe 16/10/2020; AgInt no AREsp 1146607/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2020, DJe 07/05/2020; AgInt no REsp 1806654/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 09/12/2019, DJe 13/12/2019; AgInt no REsp 1656079/RS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/12/2018, DJe 06/12/2018; AgInt no REsp 1669123/RS, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 15/03/2018, DJe 03/04/2018. (STJ, "Jurisprudência em Teses", ed. 203, 11/11/2022)1. Em outras palavras, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que o bem de luxo é impenhorável, desde que ele seja de família, nos termos da lei 8.009/90. Este entendimento está claramente baseado no princípio da dignidade da pessoa humana inserto no art. 1º, inciso III, da Constituição Federal. O ideal seria que tal princípio fosse considerado ao lado do princípio do acesso à justiça insculpido no art. 5º, inciso XXXV, do mesmo diploma. Ademais, seria importante que também se levasse em conta a dignidade do credor e não apenas do devedor. Há casos em que o credor tem o seu direito de acesso à justiça violado e também a sua dignidade. Portanto, a jurisprudência firmada no Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o bem de luxo, se for de família, é impenhorável, não pode ser levada a ferro e fogo e devem ser admitidas ponderações a depender da situação fática do credor e do devedor. __________ 1 Disponível aqui.
Conforme já noticiado nessa coluna, o STJ prolatou o Enunciado n. 8, o qual prevê que: "A indicação, no recurso especial, dos fundamentos de relevância da questão de direito federal infraconstitucional somente será exigida em recursos interpostos contra acórdãos publicados após a data de entrada em vigor da lei regulamentadora prevista no artigo 105, parágrafo 2º, da Constituição Federal". Foi em boa hora essa providência do STJ, já que começaram a surgir decisões de tribunais a quo negando seguimento a recursos especiais interpostos após a vigência da emenda constitucional n. 125/2022, com a motivação de que o filtro seletor da relevância não teria sido abordado nos apelos endereçados ao STJ. Nesse sentido, relembre-se, foi a decisão proferida no Recurso Especial n. 5738415-77.2019.8.09.0051, da Vice- Presidência do TJ-GO, e a decisão proferida no Recurso Especial n. 0801223-97.2019.8.12.0027/50000, da Vice-Presidência do TJ-MS.  Todavia, em razão da diretriz adotada pelo STJ, as presidências dos Tribunais a quo já começaram a sinalizar que o filtro seletor da relevância só será aplicável para recursos especiais interpostos diante de acórdãos publicados após a data de entrada em vigor da lei regulamentadora específica. Nessa linha foi a decisão abaixo, proferida no TJMT: "Relevância de questão federal infraconstitucional A EC nº 125/2022 alterou o artigo 105, da Constituição Federal, incluindo para o recurso especial mais um requisito de admissibilidade, consistente na obrigatoriedade da parte recorrente demonstrar a "relevância da questão de direito federal infraconstitucional". Necessário destacar que o art. 1º da EC nº 125/2022 incluiu o § 2º, no art. 105, da CF passando a exigir que "no recurso especial, o recorrente deve demonstrar a relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso, nos termos da lei, (...)" (grifei). Com efeito, o art. 2º da aludida Emenda Constitucional dispôs que "a relevância de que trata o § 2º do art. 105 da Constituição Federal será exigida nos recursos especiais interpostos após a entrada em vigor desta Emenda Constitucional, (...)" (grifei). Apesar de um aparente conflito descrito acima, tem-se na verdade a edição de norma de eficácia contida no próprio texto constitucional, ao passo que a obrigatoriedade da exigência a partir da publicação consignado no art. 2º da EC nº 125 traduz-se como norma de direito intertemporal. Portanto, tem-se por necessária a regulamentação da questão. Diante desse quadro, ainda que ausente preliminar de relevância jurídica nas razões recursais, não há porque negar seguimento ao recurso especial por esse fundamento, até que advenha lei que regulamente a questão, com vistas a fornecer parâmetros necessários acerca da aludida "relevância", inclusive para fins de parametrizar o juízo de admissibilidade a ser proferido nos autos." (TJ-MT, 10064614720218110003, MT, Relator: MARIA APARECIDA RIBEIRO, Data de Julgamento: 17/11/2022, Vice-Presidência, Data de Publicação: 17/11/2022) No TRF da 4ª. Região, há decisão com expressa referência ao aludido Enunciado n. 8 do Pleno do STJ: "Por fim, vale destacar que o Pleno do Superior Tribunal de Justiça aprovou, no dia 19/10/2022, o Enunciado Administrativo 8, que tem a seguinte redação: "A indicação, no recurso especial, dos fundamentos de relevância da questão de direito federal infraconstitucional somente será exigida em recursos interpostos contra acórdãos publicados após a data de entrada em vigor da lei regulamentadora prevista no artigo 105, parágrafo 2º, da Constituição Federal". Ainda, destaca-se que a arguição de relevância da questão federal para admissão do recurso especial - conhecida como filtro de relevância - foi incluída na Constituição pela Emenda Constitucional 125/2022. A proposta da lei regulamentadora da alteração constitucional será elaborada pelo STJ e remetida ao Congresso Nacional para apresentação e deliberação." (TRF-4 - AC: 50018115820154047008, Relator: FERNANDO QUADROS DA SILVA, Data de Julgamento: 26/10/2022, VICE-PRESIDÊNCIA). O TJ-GO, igualmente, fazendo referência ao referido enunciado, decidiu que: "Apesar de esta Vice-Presidência, balizada por uma exegese sistemática e teleológica - que rejeitou a antinomia entre o §2º do art. 105 da CF e os arts. 2º, primeira parte, e 3º, da EC n. 125/2022 -, ter, inicialmente, entendido pela autoaplicabilidade da EC n. 125/2022, exigindo, em termos objetivos, a alegação da relevância infraconstitucional, quando não presumida, para fins de exercício do juízo de admissibilidade, é sabido que o Superior Tribunal de Justiça, recentemente, por meio do Enunciado Administrativo n. 08, de 19/10/2022, orientou que "A indicação, no recurso especial, dos fundamentos de relevância da questão de direito federal infraconstitucional somente será exigida em recursos interpostos contra acórdãos publicados após a data de entrada em vigor da lei regulamentadora prevista no artigo 105, parágrafo 2º, da Constituição Federal", o que deve ser acatado, pois, em última instância, compete àquela Corte Superior o juízo de prelibação final do recurso especial." (TJGO - AC 5634221-14.2021.8.09.0000, RELATOR ZACARIAS NEVES COÊLHO, Data de Julgamento: 15 de novembro de 2022, VICE-PRESIDÊNCIA). Portanto, repisa-se que, em diálogo com a segurança jurídica, foi elogiável a postura do STJ ao prolatar o mencionado Enunciado n. 8, que demonstra a necessidade de se aguardar a vigência de lei regulamentadora da disciplina do filtro seletor da relevância aplicável aos recursos especiais. A lei certamente promoverá a alteração do Código de Processo Civil de 2015, e cuidará da forma e dos requisitos necessários para o manejo desse importante filtro seletor na dinâmica de trâmite e julgamento dos recursos especiais.
Voltamos ao estudo de mais um importante tema de Execuções Fiscais, eis que aproximadamente 35% dos feitos em tramitação em nosso país são Execuções Fiscais. As Execuções Fiscais correspondem, por exemplo, a 57% do acervo de processos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.1 Diferentemente do que ocorre nas outras Execuções de Títulos Extrajudiciais, nas Execuções Fiscais é obrigatória a integral garantia do débito para que se possa opor Embargos à Execução. E não é raro que o Exequente não aceite o oferecimento de bens à penhora e o Executado tenha de garantir a execução com fiança bancária e, principalmente, com seguro garantia. Tais formas de garantia têm sido normalmente aceitas pelos exequentes, entretanto, possuem um custo anual bastante alto, ainda mais quando se verifica que os processos de Execução Fiscal possuem uma tramitação mais lenta e podem durar facilmente mais de uma década. Desse modo, os Executados por não conseguirem garantir o juízo com formas menos onerosas de garantia (penhora de bens) se vêm obrigados a gastar vultosas quantias para a obtenção de fianças bancárias e seguros garantias. Assim, nos casos em que a cobrança se mostra indevida os executados entendem que poderiam cobrar o ressarcimento desse custo dos exequentes, eis que eles que deram causa ao ajuizamento indevido da cobrança, não aceitaram os bens oferecidos em garantia e fizeram com que a parte contrária fosse obrigada a dispender esses valores das garantias para que pudessem opor Embargos à Execução Fiscal. Em julgamentos esparsos temos os Tribunais Regionais Federais permitindo o ressarcimento dos custos com a garantia ofertada em Execuções Fiscais2: "PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. SÓCIO-GERENTE. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA.  ART. 135, III, DO CTN.  HIPÓTESE NÃO CONFIGURADA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE 13º SALÁRIO E REPOUSO SEMANAL REMUNERADO SOBRE HORAS EXTRAS.  LEI Nº 7.787/89 E LEI Nº 8.212/91. CABIMENTO. NÃO INCIDE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE CONTRATOS DE CESSÃO DE DIREITOS ARTÍSTICOS. RESSARCIMENTO DAS DESPESAS COM FIANÇA BANCÁRIA. CABIMENTO. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 20, § 4º, DO CPC. (...) 8. Cabe ao INSS ressarcir a embargante das despesas realizadas com a manutenção das fianças bancária relativas aos créditos tributários indevidamente exigidos, ou seja, aqueles correspondentes à CDA nº 31.680.093-7, equivalente a 98% (noventa e oito por cento) do valor dos créditos exeqüendos, já que a Autarquia Previdenciária deu causa à presente demanda, obrigando a executada-embargante a garantir o juízo, com a propositura da execução fiscal para cobrança dos aludidos créditos, incidindo, na espécie, o princípio da causalidade.(...)" (g.n.) (Apelação Cível nº 0041494-46.1995.4.02.5101, Rel. José Neiva, 3ª Turma do TRF2, j. 18/12/2007)                               Em recente julgado, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que o Executado não poderia se ressarcir do valor gasto com a contratação da garantia indispensável para a oposição de Embargos: "PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. FAZENDA PÚBLICA VENCIDA. VALORES PARA CONTRATAÇÃO DE SEGURO GARANTIA. RESSARCIMENTO PELA FAZENDA PÚBLICA INDEVIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NA EXECUÇÃO E NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO. FIXAÇÃO DEVIDA. I - No tocante ao ressarcimento do valor despendido com a apresentação de seguro garantia para viabilizar o ajuizamento dos embargos à execução, observa-se que o art. 82 do CPC/2015, dispõe que as partes devem prover as despesas dos atos que realizarem ou requererem no processo, sendo devido ao vencido pagar ao vencedor as despesas que antecipou. II - O art. 84 do CPC/2015, delimita a abrangência de despesas em custas dos atos do processo, indenização de viagem e remuneração do assistente técnico e a diária de testemunha. As custas dos atos processuais são as taxas judiciais para o impulsionamento do feito, já as despesas são aqueles valores pagos para viabilizar o cumprimento do ato judicial, sendo ato coercitivo e sem o qual o processo não se desenvolve, tais como as despesas com porte de remessa e retorno dos autos, com publicação de editais e diligências com oficiais de justiça. III - O art. 16 da Lei n. 6.830/1980 dispõe que para garantia da execução é necessário o depósito, a juntada de prova de fiança bancária ou seguro garantia ou, ainda, intimação da penhora. O devedor pode escolher qual garantia oferecer, o que retira seu enquadramento da natureza de despesa de ato processual, para fins de ressarcimento, não sendo impositivo o ressarcimento de tais valores pela Fazenda Pública. IV - No tocante à fixação em separado de honorários advocatícios na execução fiscal e nos embargos à execução, verifica-se ser possível ao juiz, quando do julgamento dos embargos à execução, arbitrar valor único para a verba de sucumbência relativa às condenações na ação executiva e na ação de embargos à execução. Os efeitos decorrentes da sentença de procedência dos embargos à execução atingem o próprio feito executivo, sendo possível assim que o julgador determine fixação única de honorários, a abranger os embargos à execução e à execução fiscal, desde que não ultrapasse o valor máximo permitido no art. 85 do CPC/2015. Precedentes: AgInt nos EDcl no REsp n. 1.946.955/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 20/6/2022, DJe de 1/7/2022; AgRg no REsp n. 1.165.291/RS, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 4/8/2015, DJe de 11/9/2015.) V - Recurso Especial improvido. (REsp n. 1.852.810/RS, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 13/9/2022, DJe de 19/9/2022.) Segundo o entendimento do julgado, o executado pode escolher a melhor forma de garantir o débito "o que retira seu enquadramento da natureza de despesa de ato processual, para fins de ressarcimento, não sendo impositivo o ressarcimento de tais valores pela Fazenda Pública". Entretanto, todos que advogam em face da Fazenda Pública sabem da recalcitrância dos Entes Públicos em aceitarem bens à penhora, sempre discordando da nomeação, muitas vezes sem nenhum motivo justo, preferindo sempre que a garantia recaia sobre dinheiro ou fiança bancária ou seguro garantia. Desse modo, a garantia por meio de fiança ou seguro não é propriamente uma escolha dos executados, mas uma imposição do exequente. Portanto, seria importante que fosse permitido o ressarcimento de tais despesas com a garantia, principalmente nos casos em que foram oferecidos bens injustamente não aceitos pelo exequente, já que seria uma tentativa de distribuir melhor os ônus nas Execuções Fiscais infundadas. Tal permissão também levaria os Exequentes a depurarem melhor os créditos antes de os executar e possibilitaria que formas mais baratas de garantia fossem aceitas nas Execuções Fiscais. ________________ 1 https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/09/justica-em-numeros-2022.pdf, p 171. 2 Em outros julgados tal pleito não restou aceito: 5005404-13.2019.4.03.6126 (4ª Turma TRF3); 0004474-02.2017.4.03.6110 (6ª Turma TRF3) e 5058075-42.2017.4.04.7100 (2ª turma TRF4)
Quando do Julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.3848.640/RS aos 7/5/14, a Corte Especial do STJ fixou o entendimento, por maioria de votos, de que "na fase de execução o depósito judicial do montante (integral ou parcial) da condenação extingue a obrigação do devedor, nos limites da quantia depositada". Referido julgamento, sob a ótica do então art. 543-C do CPC/73 (equivalente art. 1036 e seguintes, do CPC/15, restou fundamentado, em síntese: "A questão jurídica sujeita à presente afetação, responsabilidade do devedor pelo pagamento de juros de mora e correção monetária sobre os valores depositados em juízo na fase de execução, foi exaustivamente debatida por esta Corte Superior, tendo-se firmado entendimento no sentido da responsabilidade da instituição financeira depositária, não do devedor, pela remuneração do depósito judicial, conforme se verifica nos seguintes julgados: (...) Sobre o tema da remuneração dos depósitos judiciais, houve inclusive a edição de duas súmulas, embora restritas à questão da correção monetária. Confira-se: Súmula 179/STJ - O estabelecimento de credito que recebe dinheiro, em deposito judicial, responde pelo pagamento da correção monetária relativa aos valores recolhidos. Súmula 271/STJ - A correção monetária dos depósitos judiciais independe de ação específica contra o banco depositário. Não obstante a pacificação da jurisprudência desta Corte Superior, identificou-se no Núcleo de Recursos Repetitivos - NURER/STJ a subida de uma multiplicidade de recursos especiais referentes essa mesma controvérsia, principalmente nas demandas por complementação de ações de empresas de telefonia, uma das demandas de massa com maior número de recursos nesta Corte. Tornou-se necessário, portanto, afetar a matéria ao rito do art. 543-C do Código de Processo Civil, para impedir a subida em massa de recursos. A tese que se pretende consolidar segue, essencialmente, a linha do entendimento já firmado por esta Corte, nos precedentes supracitados, sugerindo-se a redação, conforme a proposta feita pelo eminente Ministro Ari Parglender, em seu voto, nos seguintes termos: Na fase de execução, o depósito judicial do montante (integral ou parcial) da condenação extingue a obrigação do devedor, nos limites da quantia depositada. Na redação ora proposta, optou-se por limitar a tese à fase de execução, pois, na fase de conhecimento, o devedor somente é liberado dos encargos da mora se o credor aceitar o depósito parcial. É o que se depreende do disposto no art. 314 do Código Civil, abaixo transcrito: Art. 314. Ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode o credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não se ajustou. (...)" (STJ, Corte Especial, Resp n. 1.348.640/RS, Corte Especial, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, v.u., j. 07.04.2014) Consoante assentado em 2014 pela Corte Especial, o deposito judicial,  realizado pelo devedor interrompe a incidência de juros moratórios e atualização monetária e o libera da obrigação de pagamento. Todavia, referida decisão sujeitou-se a proposta de revisão do entendimento supra citado por força da afetação do Recurso Especial n. 1.820.963/SP, para decisão sob o rito do Tema Repetitivo n. 677, o qual passou a abordar a seguinte questão submetida para julgamento: "Proposta de revisão da tese firmada pela Segunda Seção no REsp 1.348.640/RS, relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, para definição de: se, na execução, o depósito judicial do valor da obrigação, com a consequente incidência de juros e correção monetária a cargo da instituição financeira depositária, isenta o devedor do pagamento dos encargos decorrentes da mora, previstos no título executivo judicial ou extrajudicial, independentemente da liberação da quantia ao credor." (grifou-se) Em outras palavras, por força da afetação, sob o rito do art. 1036 e seguintes do CPC atual, o STJ reexaminou a mesma questão, desta feita sob o prisma dos recursos depositados em juízo terem o condão de (i) autorizar o imediato levantamento pelo credor (hipótese de nítido interesse do devedor em quitar o pagamento da dívida, à exemplo do parcelamento previsto no art. 916 do CPC ou do depósito em juízo destinado ao pagamento da dívida, art. 904, I, do CPC) ou (ii) por qualquer outra razão, há resistência do devedor em impedir aludido levantamento (por vezes quando o depósito espontâneo é utilizado como condição de obtenção do efeito suspensivo aos embargos do devedor - art. 919, § 1º ou quando referido depósito decorre do cumprimento de ordem de penhora online e que o devedor ainda será intimado para apresentação de eventual defesa contra referido ato de constrição patrimonial). E, no julgamento do tema 677 levado à efeito aos 19/10/22, por votação unânime, proclamou novo enunciado quanto a questão: "Na execução, o depósito efetuado a título de garantia do juízo ou decorrente da penhora de ativos financeiros não isenta o devedor do pagamento dos consectários de sua mora, conforme previstos no título executivo, devendo-se, quando da efetiva entrega do dinheiro ao credor, deduzir do montante final devido o saldo da conta judicial." O v. acórdão da Corte Especial ainda será disponibilizado. De toda sorte, as principais linhas do quanto decidido puderam ser obtidas no Informativo de Jurisprudência no 755, do STJ: "Trata-se de proposta de revisão de tese repetitiva acerca dos efeitos do depósito judicial em garantia do Juízo (Tema 677). No julgamento do REsp 1.348.640/RS foi firmada a tese repetitiva no sentido de que "na fase de execução, o depósito judicial do montante (integral ou parcial) da condenação extingue a obrigação do devedor, nos limites da quantia depositada". Em que pese tenha constado, na redação final do Tema, a referência expressa à extinção da obrigação do devedor por causa do depósito judicial, observa-se que, àquela ocasião, a Corte Especial não se debruçou, pontualmente, acerca do efeito do depósito sobre a mora do devedor, isto é, sobre a sua liberação quanto ao pagamento dos consectários decorrentes do retardamento no adimplemento da obrigação. Tanto o é que, em paralelo à tese firmada no recurso representativo da controvérsia, em 21/05/2014, consolidou-se na jurisprudência do STJ o entendimento de que o mero depósito para garantia do juízo, a fim de viabilizar a impugnação do cumprimento de sentença, não perfaz adimplemento voluntário da obrigação, porquanto a satisfação desta somente ocorre quando o valor respectivo ingressa no campo de disponibilidade do credor. Por isso, passou esta Corte a diferenciar o "pagamento" da "garantia do juízo", para o efeito de incidência da multa prevista no então art. 475-J do CPC/1973 (art. 523 do CPC/15). A obrigação da instituição financeira depositária pelo pagamento dos juros e correção monetária sobre o valor depositado convive com a obrigação do devedor de pagar os consectários próprios de sua mora, segundo previsto no título executivo, até que ocorra o efetivo pagamento da obrigação ao credor. No plano de direito material, considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento na forma e tempo devidos, hipótese em que deverá responder pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros e atualização dos valores monetários, além de honorários de advogado, nos termos dos arts. 394 e 395 do Código Civil. Outrossim, tem-se por caracterizada a mora do devedor até que este a purgue, mediante o efetivo oferecimento ao credor da prestação devida, acrescida dos respectivos consectários (art. 401, I, do CC/2002). A purga da mora na obrigação de pagar quantia certa, assim como ocorre no adimplemento pontual desse tipo de prestação, não se consuma com a simples perda da posse do valor pelo devedor; é necessário, deveras, que ocorra a efetiva entrega da soma de valor ao credor, ou, ao menos, a entrada da quantia na sua esfera de disponibilidade. Embora o Código Civil tenha sido lacunoso a respeito do tema, limitando-se a tratar das obrigações de dar coisa certa ou incerta - com o que não se confunde a obrigação de pagar -, o Código de Processo Civil, ao dispor sobre o cumprimento forçado da obrigação, deixa claro que a satisfação do crédito se dá pela entrega do dinheiro ao credor, ressalvada a possibilidade de adjudicação dos bens penhorados, nos exatos termos do art. 904 do CPC/2015. Na mesma linha, o art. 906 do CPC, expressamente vincula a declaração de quitação da quantia paga ao momento do recebimento do mandado de levantamento pela parte exequente, ou, alternativamente, pela transferência eletrônica dos valores. Assim, tem-se que somente o depósito judicial efetuado voluntariamente pelo devedor, com vistas à imediata satisfação do credor, sem qualquer sujeição do levantamento à discussão do débito, tem a aptidão de fazer cessar a mora do devedor e extinguir a obrigação, nos limites da quantia depositada. Se o depósito é feito a título de garantia do juízo ou se é coercitivo, decorrente da penhora de ativos financeiros, não se opera a cessação da mora do devedor, haja vista que, em hipóteses tais, não ocorre a imediata entrega do dinheiro ao credor, cujo ato enseja a quitação do débito. Consequentemente, se o depósito não tem a finalidade de pronto pagamento ao credor, devem continuar a correr contra o devedor os juros moratórios e a correção monetária previstos no título executivo, ou eventuais outros encargos contratados para a hipótese de mora, até que ocorra a efetiva liberação da quantia ao credor, mediante o recebimento do mandado de levantamento ou a transferência eletrônica dos valores. Evidentemente, no momento anterior à expedição do mandado ou à transferência eletrônica, o saldo da conta bancária judicial em que depositados os valores, já acrescidos da correção monetária e dos juros remuneratórios a cargo da instituição financeira depositária, há de ser deduzido do montante devido pelo devedor, como forma de evitar o enriquecimento sem causa do credor. Não caracteriza bis in idem o pagamento cumulativo dos juros remuneratórios, por parte do Banco depositário, e dos juros moratórios, a cargo do devedor, haja vista que são diversas a natureza e finalidade dessas duas espécies de juros. De fato, enquanto os juros remuneratórios têm por finalidade a simples remuneração ou rendimento pelo uso do capital alheio (são os frutos civis do capital), os juros moratórios têm natureza indenizatória e sancionadora, que deriva do retardamento culposo no cumprimento da obrigação. Há de se destacar que o depósito judicial na execução não se confunde com o depósito na ação de consignação em pagamento, que é ação com procedimento especial cabível nas estritas hipóteses do art. 335 do CC/02, em especial quando há recusa do credor em receber o pagamento ou dar-lhe quitação, sem justa causa (inc. I), ou, ainda, quando pende litígio sobre o objeto do pagamento (inc. V). Este apenas tem o condão de extinguir a obrigação do devedor quando para ele concorrer os mesmos requisitos de validade do pagamento, como tempo, modo, valor e lugar (arts. 336 e 337 do CC/2002), sendo que, de todo modo, a Lei Processual garante ao credor a imediata disponibilidade da quantia, como dispõe o art. 545, § 1º, do CPC/2015. Assim, não se pode atribuir o efeito liberatório do devedor por causa do depósito de valores para garantia do juízo, com vistas à discussão do crédito postulado pelo credor, nem ao depósito derivado da penhora de ativos financeiros, porque não se tratam de pagamento com animus solvendi. Entendimento em sentido diverso teria o nefasto condão de estimular a perpetuidade da execução, porquanto, uma vez ultrapassado o prazo para o pagamento da dívida - com isenção de multa e honorários advocatícios, no cumprimento de sentença judicial (art. 523 do CPC/15), ou com o pagamento dos honorários pela metade, na execução de título extrajudicial (art. 827 do CPC) - a menor ou maior duração do processo executivo em nada influenciaria o valor final do débito, se sua atualização (lato sensu) ocorresse apenas mediante o pagamento dos juros remuneratórios e da correção monetária, devidos por força do contrato de depósito mantido com a instituição financeira. Assim, na execução, o depósito efetuado a título de garantia do juízo ou decorrente da penhora de ativos financeiros não isenta o devedor do pagamento dos consectários de sua mora, conforme previstos no título executivo, devendo-se, quando da efetiva entrega do dinheiro ao credor, deduzir do montante final devido o saldo da conta judicial.  (STJ, Resp n. 1.820.963/SP, Corte Especial, Rel. Min. Nancy Andrighi, v.u., j. 19.10.2022, grifou-se)1 Pelo que se depreende do quanto decidido, (i) o depósito efetuado a título de garantia do juízo ou (ii) decorrente de penhora forçada de ativos financeiros não isenta o devedor do pagamento dos consectários de sua mora (a exemplo da incidência de juros e atualização monetária), os quais continuarão a ser exigíveis até a data de efetiva entrega do valor depositado ao credor. Na medida em que boa parte das dívidas é composta de juros e atualização monetária, o precedente supra citado terá impacto significativo no campo da execução de título extrajudicial (e igualmente na fase de cumprimento de sentença). Espera-se que o v. acórdão deixe claro (iii) qual o ato processual de efetiva entrega do valor depositado ao credor, para efeito de interrupção de acréscimo do quantum debeatur dos consectários da mora do devedor: seria (ii.i) a expedição de guia de levantamento ou efetiva transferência de quantia em favor do credor?; (ii.ii) em se tratando de depósito judicial manejado como garantia do juízo, o trânsito em julgado da r. decisão que julgar improcedente os embargos do devedor?; (ii.iii) em se tratando da penhora forçada de ativos financeiros, a preclusão da oportunidade conferida ao devedor para resistir ou impugnar o ato de penhora ou quando transitada em julgado eventual impugnação nesse sentido? e; (ii.iv) a forma de cálculo do quantum debeatur deve ser orientada pelo cálculo atualizado por seus consectários decorrentes da mora do devedor, abatendo-se os valores depositados ou referidos valores, para fins de abatimento, também devem ser atualizados? A resposta a tais questionamentos certamente imprimirá maior segurança jurídica, estabilidade e isonomia das decisões judiciais, mormente em se tratando de precedente obrigatório cuja tese terá aplicação sobre os órgãos fracionários e juízos de primeira instância (art. 927, III), a trazer impactos sobre a execução de título extrajudicial. Aguardemos, pois, pela vindoura disponibilização do v. acórdão referente ao julgamento do tema repetitivo 677, que oportunamente será objeto de comentários nesta coluna. ______________ 1 Informações obtidas junto ao Informativo de Jurisprudência n. 755 (7 de novembro de 2022), In. https://processo.stj.jus.br/jurisprudencia/externo/informativo/ 
quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Cumprimento de sentença e parcelamento da dívida

Como se sabe, o art. 916, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável à execução por quantia certa, permite que o executado, no prazo para apresentar embargos à execução, reconheça o crédito do exequente e realize o depósito de trinta por cento do valor em execução, acrescido de custas e honorários de advogado, para a finalidade de obter a permissão do juiz para "pagar o restante em até 6 (seis) parcela mensais, acrescidas de correção monetária e de juros de um por cento ao mês". Trata-se da possibilidade de o executado obter um parcelamento da dívida autorizado por lei e por isso alguns chamam essa hipótese de "moratória legal". Ocorre que o CPC atual, por meio do § 7º do art. 916, proíbe que este parcelamento da dívida previsto em lei seja aplicado ao procedimento do cumprimento de sentença ("o disposto neste artigo não se aplica ao cumprimento de sentença"). Em outras palavras, por disposição expressa de lei, a "moratória legal" é permitida na execução fundada em título extrajudicial, mas é proibida na execução fundada em título judicial (cumprimento de sentença). Tanto isso é verdade que, no cumprimento de sentença, se o executado fizer um depósito judicial em valor inferior ao montante total da execução, o § 2º do art. 523 do CPC expressamente determina que "efetuado o pagamento parcial no prazo previsto no caput, a multa e os honorários previstos no § 1º incidirão sobre o restante". Ou seja, se o executado depositar 30% (trinta por cento) do valor da execução, por exemplo, incidirá multa de 10% (dez por cento) e mais honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o saldo devedor em aberto. Por isso é que o executado, no cumprimento de sentença que reconhece a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, não pode sequer invocar o princípio da menor onerosidade da execução (CPC, art. 805) para pedir a aplicação do art. 916, do CPC, ao cumprimento de sentença "por analogia". Isso porque, além de o § 7º do art. 916 do mesmo diploma legal vedar expressamente esse expediente, também haveria o óbice do parágrafo único do art. 805 que impõe ao executado que alegar ser essa medida executiva a mais gravosa "indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados". Ora, o meio do art. 916, do CPC, para executar não pode ser considerado mais eficaz, dado que descarta a multa de 10% (dez por cento) e os honorários advocatícios de 10% (dez por cento), para o executado, se ele depositar um valor menor que o do débito em execução. Nesse sentido decidiu o Superior Tribunal de Justiça em julgado recente assim ementado: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO PROVISÓRIO DE SENTENÇA. PEDIDO DA PARTE EXECUTADA DE PARCELAMENTO DO DÉBITO. VEDAÇÃO EXPRESSA CONTIDA NO ART. 916, § 7º, DO CPC/2015. MITIGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. O propósito recursal consiste em definir se a vedação constante do art. 916, § 7º, do CPC/2015 - que obsta a aplicação da regra de parcelamento do crédito exequendo ao cumprimento de sentença - pode ser mitigada, à luz do princípio da menor onerosidade da execução para o devedor. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, formada à luz do diploma processual revogado, admitia a realização, no cumprimento de sentença, do parcelamento do valor da execução pelo devedor previsto apenas para a execução de título executivo extrajudicial (art. 745-A do CPC/1973), em virtude da incidência das regras desta espécie executiva subsidiariamente àquela, conforme dispunha o art. 475-R do CPC/1973. Precedentes. 3. Com a entrada em vigor do CPC/2015, todavia, fica superado esse entendimento, dada a inovação legislativa, vedando expressamente o parcelamento do débito na execução de título judicial (art. 916, § 7º), com a ressalva de que credor e devedor podem transacionar em sentido diverso da lei, tendo em vista se tratar de direito patrimonial disponível. 4. O princípio da menor onerosidade, a seu turno, constitui exceção à regra - de que o processo executivo visa, precipuamente, a satisfação do crédito, devendo ser promovido no interesse do credor - e a sua aplicação pressupõe a possibilidade de processamento da execução por vários meios igualmente eficazes (art. 805 do CPC/2015/2015), evitando-se, por conseguinte, conduta abusiva por parte do credor. 5. Saliente-se, nesse contexto, que a admissão do parcelamento do débito exequendo traria como consequências, por exemplo, a não incidência da multa e dos honorários decorrentes do não pagamento voluntário pelo executado no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do previsto no art. 523, § 1º, do CPC/2015, e a imposição ao credor de maior demora no recebimento do seu crédito, depois de já suportada toda a delonga decorrente da fase de conhecimento. É evidente, desse modo, a inexistência de meios igualmente eficazes, a impossibilitar a incidência do princípio da menor onerosidade. 6. Portanto, nos termos da vedação contida no art. 916, § 7º, do CPC/2015, inexiste direito subjetivo do executado ao parcelamento da obrigação de pagar quantia certa, em fase de cumprimento de sentença, não cabendo nem mesmo ao juiz a sua concessão unilateralmente, ainda que em caráter excepcional. 7. Recurso especial conhecido e desprovido. (REsp n. 1.891.577/MG, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 24/5/2022, DJe de 14/6/2022.) Em razão disso, está proibida a aplicação do art. 916, do CPC, no cumprimento de sentença. Somente se houver efetivo acordo de vontades entre exequente e executado no cumprimento de sentença que reconhece a exigibilidade de obrigação de pagar quantia é que poderá haver parcelamento da dívida. Nessa hipótese, não se trata de mitigação do disposto no § 7º do art. 916 ou de afastamento da incidência do § 2º do art. 523, ambos do CPC. Em verdade, o que acontece nessa última hipótese é um acordo de vontades entre o exequente (que abre mão de parte de seus direitos) e do executado (que propõe pagar parceladamente o valor da dívida e aceita o regime do art. 916 para a hipótese de não pagar alguma parcela do débito tempestivamente).
quinta-feira, 27 de outubro de 2022

O recente enunciado nº 8 do pleno do STJ

Em recente orientação, o STJ prolatou o Enunciado n. 8, o qual prevê que: "A indicação, no recurso especial, dos fundamentos de relevância da questão de direito federal infraconstitucional somente será exigida em recursos interpostos contra acórdãos publicados após a data de entrada em vigor da lei regulamentadora prevista no artigo 105, parágrafo 2º, da Constituição Federal". Como é sabido, no último mês de julho foi introduzida em nosso sistema a Emenda Constitucional n. 125/2022, a qual estabeleceu nova redação para o artigo 105 da Constituição Federal, e previu a adoção do filtro da relevância para a admissão dos recursos especiais perante o STJ. Veja-se:  "Art. 105. ...................................................................................................... § 1º ............................................................................................................... § 2º No recurso especial, o recorrente deve demonstrar a relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que a admissão do recurso seja examinada pelo Tribunal, o qual somente pode dele não conhecer com base nesse motivo pela manifestação de 2/3 (dois terços) dos membros do órgão competente para o julgamento. § 3º Haverá a relevância de que trata o § 2º deste artigo nos seguintes casos: I - ações penais; II - ações de improbidade administrativa; III - ações cujo valor da causa ultrapasse 500 (quinhentos) salários mínimos; IV - ações que possam gerar inelegibilidade; V - hipóteses em que o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça; VI - outras hipóteses previstas em lei."(NR) Art. 2º A relevância de que trata o § 2º do art. 105 da Constituição Federal será exigida nos recursos especiais interpostos após a entrada em vigor desta Emenda Constitucional, ocasião em que a parte poderá atualizar o valor da causa para os fins de que trata o inciso III do § 3º do referido artigo. Art. 3º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação". Com a nova redação do art. 105 da Magna Carta, naturalmente instalou-se a dúvida se o filtro seletor da relevância já seria desde logo - independentemente de normas regulamentadoras - exigido para fins de verificação da admissibilidade dos recursos especiais; especialmente diante da redação do art. 3º da Emenda Constitucional n. 125/2022. Não tardaram aparecer decisões de tribunais a quo negando seguimento a recursos especiais interpostos após a vigência da referida emenda constitucional, com a motivação de que o filtro seletor da relevância não teria sido abordado nos apelos endereçados ao STJ; e isso mesmo, diga-se, a despeito de a própria redação do art. 105 da Constituição Federal ser explícita quanto à competência do STJ para examinar a presença da relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso. Na decisão proferida no Recurso Especial n. 5738415-77.2019.8.09.0051, a Vice- Presidência do TJ-GO, em setembro de 2022, entendeu que: "uma vez que não consta da peça recursal em estudo a alegação de relevância infraconstitucional, e tampouco se enquadra o caso em alguma das hipóteses de presunção de relevância, a inadmissão deste recurso é medida que se impõe". Igualmente, em setembro de 2022, em decisão proferida no Recurso Especial n. 0801223-97.2019.8.12.0027/50000, a Vice-Presidência do TJ-MS entendeu que "as questões aqui discutidas não se enquadram nos casos de relevância presumida citados, sendo, portanto, ônus da parte recorrente demonstrar a existência desse requisito, do que in casu não se desincumbiu, daí que, a meu juízo, o presente recurso não merece prosperar". E na mesma linha foi a posição do gabinete da presidência do TJDF, em decisão proferida no Recurso Especial n. 0727063-86.2020.8.07.0001.  Neste cenário, em diálogo com a segurança jurídica, elogiável foi a postura do STJ ao prolatar o mencionado Enunciado n. 8, que demonstra a necessidade de se aguardar a vigência de lei regulamentadora da disciplina do filtro seletor da relevância aplicável aos recursos especiais. Cumpre relembrar que a relevância do Recurso Especial foi inspirada no instituto da repercussão geral do Recurso Extraordinário, o qual, apesar de ter se originado da EC nº 45, cuja publicação se deu em 2004, foi regulamentado em 2006 pela lei 11.418, que adicionou os artigos 543-A e 543-B ao CPC/73, e passou a ser exigido apenas em 2007, após a publicação da Emenda Regimental n° 21, que concluiu a disciplina do tema no Regimento Interno do STF. À época, o Supremo Tribunal Federal, a fim de solucionar as discussões sobre o termo inicial da aplicação do instituto da repercussão geral, firmou o entendimento de que "a demonstração formal e fundamentada da existência de repercussão geral de questões constitucionais (art. 543-A, § 2°, do CPC) só é exigível para os recursos extraordinários interpostos de acórdãos publicados após 3.5.2007 (data da publicação da Emenda Regimental n° 21)". Nesse mesmo sentido há diversos acórdãos da Corte. Assim, inexistindo ainda lei que regulamente o tema ou mesmo previsão regimental, por parte do STJ, órgão competente para conhecer e julgar o Recurso Especial, é certo que o filtro da relevância ainda não poderia ser exigido para fins de admissibilidade recursal. E foi essa a boa diretriz adotada no Enunciado n. 8 do Pleno do STJ.
Atualmente se busca dar uma maior efetividade ao processo de execução. Muitos processos de execução e cumprimentos de sentença não são satisfeitos pela não localização de bens do devedor. É o famoso ganhar, mas não levar e que muito impacta a imagem do Judiciário frente a população. Com a total implementação do Sistema Sisbajud surgiu uma nova funcionalidade, que ficou conhecida como "teimosinha", que nada mais é do que a reiteração automática de ordens de bloqueio on-line de contas judiciais pelo período de 30 dias. Como toda novidade, ela ainda vem sofrendo algumas resistências por parte de magistrados quanto a sua aplicação: "AGRAVO DE INSTRUMENTO - MANDATO - AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL - PEDIDO DE CONSULTA AO SISTEMA DE BUSCA DE ATIVOS DO PODER JUDICIÁRIO (SISBAJUD) POR MEIO DA FERRAMENTA "TEIMOSINHA" - DESCABIMENTO, NA HIPÓTESE - PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE - DECISÃO AGRAVADA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO. Sopesados os princípios da utilidade e eficácia do processo, assim como o princípio da razoabilidade, de rigor, por ora, o indeferimento do pedido de reiteração de diligência com o escopo de realizar pesquisa de ativo financeiro junto ao SISBAJUD, via ferramenta "teimosinha", eis que o pedido de pesquisa de bens ou ativos financeiros por meio dos sistemas eletrônicos em curtos períodos de tempo, como ocorre no caso, caracteriza abuso de tal direito." (TJSP;  Agravo de Instrumento 2225767-56.2022.8.26.0000; Relator (a): Paulo Ayrosa; Órgão Julgador: 31ª Câmara de Direito Privado; Foro de Barretos - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 14/10/2022; Data de Registro: 14/10/2022) Entretanto, é de se comemorar que a teimosinha vem sendo aceita na maioria dos julgados recém exarados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo: "EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL - Reiteração automática de ordem de bloqueio de valores por meio do sistema SISBAJUD - Pesquisas automáticas realizadas por até trinta dias mediante uma só ordem - Nova funcionalidade denominada "Teimosinha" - Possibilidade - Modalidade colocada à disposição do julgador que não é restrita a casos de fraude ou conduta ilícita - Princípio da efetividade da execução impõe a utilização de novas ferramentas legitimamente disponibilizadas e desenvolvidas pelo CNJ - Pleito do exequente que deve ser deferido - Decisão reformada - RECURSO PROVIDO."  (TJSP;  Agravo de Instrumento 2227465-97.2022.8.26.0000; Relator (a): Spencer Almeida Ferreira; Órgão Julgador: 38ª Câmara de Direito Privado; Foro de Diadema - 1ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 17/10/2022; Data de Registro: 17/10/2022) "Agravo de Instrumento. Cumprimento de sentença. Decisão que indeferiu a reiteração das pesquisas, deferindo o bloqueio SISBAJUD na forma singular. Inconformismo. Reiteração automática de ordens de bloqueio ("teimosinha"), pelo sistema Sisbajud. Ferramenta que permite a repetição de operação até a satisfação do débito ou até o decurso do prazo de reiteração de 30 dias. Mecanismo oficial que deve ser respeitado. Inteligência do art. 805 c.c. 797 ambos do CPC. Decisão reformada. Recurso provido."  (TJSP;  Agravo de Instrumento 2222548-35.2022.8.26.0000; Relator (a): Hélio Nogueira; Órgão Julgador: 23ª Câmara de Direito Privado; Foro de Paulínia - 1ª Vara; Data do Julgamento: 17/10/2022; Data de Registro: 17/10/2022) "IMISSÃO DE POSSE. Fase de cumprimento de sentença. Pedido de bloqueio permanente de ativos financeiros por meio do sistema SISBAJUD ("teimosinha"). Deferimento. Agravo do executado. Desacolhimento. Tentativas infrutíferas de penhora dos bens do agravado. Medida que perfaz legítima tentativa de satisfação do crédito. Execução que se processa no interesse do credor, nos termos do artigo 797 do NCPC. Decisão mantida. Recurso desprovido." (TJSP;  Agravo de Instrumento 2174704-89.2022.8.26.0000; Relator (a): Costa Netto; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santos - 7ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 17/10/2022; Data de Registro: 17/10/2022) Existem inclusive julgados do Tribunal de Justiça de São Paulo possibilitando a utilização da teimosinha sem a limitação dos 30 dias, até a satisfação do crédito: "AGRAVO DE INSTRUMENTO - Cumprimento de sentença - Pedido de reiteração de pesquisa pelo SISBAJUD, na modalidade denominada 'teimosinha' - Indeferimento - Inconformismo - Ausência de dispositivo legal com limitação quantitativa e temporal da realização de tal pesquisa - Possibilidade de deferimento da medida para garantia dos princípios da efetividade e celeridade da execução - Decisão reformada - Recurso provido." (g.n.) (TJSP;  Agravo de Instrumento 2191802-87.2022.8.26.0000; Relator (a): Heraldo de Oliveira; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional II - Santo Amaro - 8ª Vara Cível; Data do Julgamento: 16/10/2022; Data de Registro: 16/10/2022) "Agravo de instrumento. Cumprimento de sentença. Decisão que indeferiu o pedido de penhora bancária de forma reiterada, conhecida como teimosinha. Inadmissibilidade. Ferramenta que substituiu o BACENJUD ampliando sobremaneira a eficácia do processo de bloqueio de ativos financeiros da parte executada. Possibilidade de bloqueio permanente até satisfação integral do débito executado. Decisão reformada. Recurso provido." (TJSP;  Agravo de Instrumento 2202768-46.2021.8.26.0000; Relator (a): Ruy Coppola; Órgão Julgador: 32ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional VIII - Tatuapé - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 29/09/2021; Data de Registro: 29/09/2021) Outra ferramenta recente lançada pelo Conselho Nacional de Justiça é o Sniper. A análise da nova ferramenta já foi objeto de artigo do professor Elias Marques de Medeiros Neto nessa mesma coluna1. Em poucas palavras, é uma ferramenta digital para agilizar e centralizar a busca de ativos e patrimônios em diversas bases de dados. Apesar de lançada há mais de dois meses, ainda não pode ser utilizada na Justiça Estadual Paulista, eis que não implementada e regulamentada. Portanto, os pedidos de sua utilização vêm sendo afastados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo: "Agravo de instrumento. Pedido de pesquisa de bens pelo Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos (SNIPER). Ferramenta que, a despeito de anunciada pelo Colendo Conselho Nacional de Justiça ainda não foi regulamentada pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Indeferimento do pleito. Recurso não provido." (TJSP;  Agravo de Instrumento 2234418-77.2022.8.26.0000; Relator (a): Roberto Mac Cracken; Órgão Julgador: 22ª Câmara de Direito Privado; Foro de Vinhedo - 3ª Vara Judicial; Data do Julgamento: 11/10/2022; Data de Registro: 11/10/2022) "AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. Decisão que indeferiu pedido de pesquisa patrimonial junto ao Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos (SNIPER). Inconformismo do credor. PEDIDO DE PESQUISA JUNTO AO SNIPER. Providência, ineficaz, no momento, uma vez que não implementada e regulamentada no âmbito desta C. Corte, devendo o credor valer-se das ferramentas disponibilizadas pelo Judiciário suficientes a garantir a efetividade do processo de execução. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. Ademais, o pedido de pesquisa junto ao SNIPER requer a quebra de sigilo bancário mediante a análise objetiva e nas hipóteses do artigo 1º, §4º, da Lei Complementar n.º 105/2001. Hipótese não verificada no caso concreto. Decisão mantida. RECURSO NÃO PROVIDO." (TJSP;  Agravo de Instrumento 2237936-75.2022.8.26.0000; Relator (a): Rosangela Telles; Órgão Julgador: 31ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional II - Santo Amaro - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 14/10/2022; Data de Registro: 14/10/2022) Desse modo, faz-se urgente que o Maior Tribunal do Brasil e do Mundo implemente e regulamente tal nova ferramenta, que certamente auxiliará na localização de bens e na diminuição do congestionamento que as execuções e cumprimentos de sentenças frustrados causam em nosso ordenamento. __________ 1 Disponível aqui.
O caput do art. 700, combinado com seu inciso I, do Código de Processo Civil (CPC) estabelece que "a ação monitória pode ser proposta por aquele que afirmar, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, ter direito de exigir do devedor capaz" o "pagamento de quantia em dinheiro". Caso essa "prova escrita sem eficácia de título executivo" desperte no juiz dúvida quanto a sua idoneidade, deve ser aplicado o § 5º do art. 700 do CPC cujo teor é o seguinte: "Havendo dúvida quanto à idoneidade de prova documental apresentada pelo autor, o juiz intimá-lo-á para, querendo, emendar a petição inicial, adaptando-a ao procedimento comum". Em decorrência do estabelecido nos dispositivos acima mencionados (CPC, art. 700, caput, inciso I e § 5º), se o juiz determinar ao autor de uma ação monitória a juntada de documentos complementares àqueles que foram apresentados junto com a petição inicial, não resta dúvida de que o magistrado entendeu ser a prova escrita apresentada incapaz de autorizar o prosseguimento desse procedimento especial (ação monitória). Ou seja, se o juiz determinar ao autor a apresentação de mais documentos, fica claro que ele entende não ser viável o prosseguimento da ação monitória. Não é necessária a intimação expressa para emendar a inicial da ação monitória para convertê-la ao procedimento comum. Nesse sentido, decidiu a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça em julgado assim ementado: "PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. EMENDA À INICIAL. INTIMAÇÃO. EMBARGOS MONITÓRIOS. TEMPESTIVOS. CONVERSÃO. PROCEDIMENTO COMUM. 1. Recurso especial interposto em 11/08/2020 e concluso ao gabinete em 14/09/2021. 2. Cuida-se de ação monitória. 3. O propósito recursal consiste em definir se é necessária a intimação da parte para converter a ação monitória em procedimento comum. 4. A emenda à exordial e a oposição de embargos monitórios têm por consequência a conversão de procedimento monitório em procedimento ordinário. 5. O rito comum será dotado de cognição plena e exauriente, com ampla dilação probatória. Assim, a cognição da ação monitória, que em princípio é sumária, será dilatada mediante iniciativa do réu em opor embargos, permitindo que se forme um juízo completo e definitivo sobre a existência ou não do direito do autor. Precedentes. 6. O documento que serve de base para a propositura da ação monitória gera apenas a presunção de existência do débito, a partir de um juízo perfunctório próprio da primeira fase do processo monitório. Trazendo o réu-embargante elementos suficientes para contrapor a plausibilidade das alegações que levaram à expedição do mandado de pagamento, demonstrando a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito invocado na inicial, caberá ao autor-embargado superar os óbices criados, inclusive com a apresentação de documentação complementar, se for o caso. Precedentes. 7. Recurso especial conhecido e não provido. (REsp n. 1.955.835/PR, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 14/6/2022, DJe de 21/6/2022.)" No corpo do acórdão acima referido, ao se interpretar o art. 700, § 5º, do CPC, a Min. Nancy Andrighi afirmou o seguinte: "A literalidade do art. 700, § 5º não indica a exigência de intimação da parte para escolher sobre a conversão do processo ao rito comum, mas sim obriga o julgador a intimá-la a complementar suas alegações com todos os meios de prova admitidos em direito se houver dúvida quanto ao direito alegado, o que acarreta a conversão do procedimento em ordinário". Em outras palavras, o rito monitório deverá ser convertido em comum quando o autor fizer uso do comando do § 5º do art. 700 para juntar novas provas e emendar a inicial. Não há possibilidade de escolha para o autor se ele quiser continuar com o processo. Ou se adota o rito comum ou será o caso de indeferimento da petição inicial. Em outra oportunidade, o signatário do presente artigo já expressou a mesma opinião: "Caso o juiz determine a emenda da petição inicial para adaptá-la ao procedimento comum, suscitando dúvida sobre a idoneidade da prova para embasar a 'ação monitória', mas o autor não concorde em emendá-la, a petição inicial deverá ser indeferida com fundamento nos arts. 330 e 700, § 4º, do CPC" (SOUZA, André Pagani de. Comentários ao art. 700. In: SCARPINELLA BUENO, Cassio (coord.). Comentários ao código de processo civil. v. 3. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 353). Portanto, não há qualquer possibilidade de o autor escolher entre o procedimento monitório ou o comum. Se o juiz entender que a prova apresentada na inicial não é apta a desencadear o procedimento monitório, só há uma possibilidade de o processo continuar: a adoção do procedimento comum. Portanto, desnecessário intimar a parte para emendar a inicial, se o juiz já determinou a apresentação de novos documentos. Nesse sentido, a Min. Nancy Andrighi, no julgado acima mencionado, decidiu o seguinte: "Diante do exposto, conclui-se que o rito monitório irá se converter em comum quando o autor usufruir da faculdade de emendar a petição inicial com novas provas, bem como quando forem opostos embargos monitórios. Não sendo necessário, portanto, intimar a parte para que ela escolha se deseja a conversão do procedimento monitório em comum, haja vista que isto é uma consequência direta dos acontecimentos determinados em lei" (grifos nossos). Tudo isso acontece porque, com a juntada de novos documentos, amplia-se a cognição jurisdicional de tal maneira que só é possível realizá-la se for adotado procedimento comum. Portanto, é flagrante a desnecessidade de intimação do autor para converter ação monitória em procedimento comum quanto se determina a juntada de novos documentos.
Não é novidade as polêmicas que gravitam em torno da inteligência do art. 139, VI, do CPC, ao prever o poder do juiz para, "(...) determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto obrigação pecuniária". Algumas balizas haviam sido traçadas, como (i) tais medidas devem ser aplicadas subsidiariamente, condicionadas a existência de indícios de que exista patrimônio penhorável, (ii) além da necessidade de o magistrado aplicá-las com observância dos princípios da proporcionalidade, motivação e contraditório. Nos referimos ao julgamento do Recurso Especial n. 189.6421/SP. E, tal qual anotado pelo colega Elias Marques de Medeiros Neto, noutra oportunidade nesta coluna, quando do julgamento do AgInt no Resp. n. 179.9638/SP, a terceira turma do STJ fixou como requisitos para aplicação dat. 139, IV, (i) verificada a existência de indício de que devedor possui patrimônio expropriável, (ii) a decisão deve ser fundamentada cm base nas especificidades constatadas, (iii) a utilização subsidiária da medida atípica, esgotadas as diligências promovidas para a satisfação do crédito e (iv) há de se observar o contraditório e a proporcionalidade. Ainda, na proposta de afetação do Recurso Especial n. 1.955.539/SP (canalizada no Tema Repetitivo n. 1.137/STJ), com vistas a se formar precedente obrigatório, a Segunda Seção do STJ decidirá sobre a seguinte controvérsia: "Definir se, com esteio no art. 139, IV, do CPC/15, é possível, ou não, o magistrado, observando-se a devida fundamentação, o contraditório e a proporcionalidade da medida, adotar, de modo subsidiário, meios executivos atípicos." Por fim, a questão também será examinada pelo STJ no julgamento da ADI n. 5941, sob o prisma de exame da constitucionalidade do art. 139, IV, do CPC, em especial na proposta apresentada pela Procuradoria Geral da República,  para que sua aplicação seja subsidiária  e com o escopo de possibilitar medidas de natureza patrimonial, evitando=se a efetivação de medidas que possam gerar restrições de direito.1 A par das infindáveis discussões que gravitam em torno do tema, recentemente a terceira turma do STJ posicionou-se quanto eventual limitação temporal quando da aplicação da medida coercitiva: "CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. HABEAS CORPUS. DEVOLUÇÃO DE PASSAPORTE APREENDIDO HÁ DOIS ANOS COMO MEDIDA COERCITIVA ATÍPICA PARA COMPELIR DEVEDOR A ADIMPLIR OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA. DEFICIENTE INSTRUÇÃO DO HABEAS CORPUS, QUE NÃO RETRATA A REALIDADE DOS FATOS PROCESSUAIS. VIOLAÇÃO AOS DEVERES DE BOA-FÉ, ETICIDADE E COOPERAÇÃO. INDISPENSABILIDADE DA INSTRUÇÃO ADEQUADA DO WRIT. ÔNUS DO PACIENTE. AUSÊNCIA DE ESGOTAMENTO DAS MEDIDAS EXECUTIVAS TÍPICAS. INUTILIDADE, INEFICÁCIA, DESNECESSIDADE OU CARÁTER PENALIZADOR DA MEDIDA. ÔNUS PROBATÓRIO DO DEVEDOR. POSSIBILIDADE DE PENHORA DE COTAS SOCIAIS DAS PESSOAS JURÍDICAS DE QUE É SÓCIO O DEVEDOR. INEXISTÊNCIA DE PROVA DA EXPRESSÃO ECONÔMICA, DESEMBARAÇO E SUSCETIBILIDADE DE PENHORA. PENHORABILIDADE NÃO DEDUTÍVEL DOS ELEMENTOS EXISTENTES, SOBRETUDO DIANTE DA EXISTÊNCIA DE DIVERSAS OUTRAS EXECUÇÕES FISCAIS E TRABALHISTAS. ÔNUS DA PROVA DO DEVEDOR. OFERECIMENTO À PENHORA DE RENDIMENTOS DE APOSENTADORIA E PENSÃO. INSIGNIFICÂNCIA NO CONTEXTO DA DÍVIDA, QUE, DESSE MODO, SOMENTE SERIA ADIMPLIDA APÓS MAIS DE CINCO DÉCADAS. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DO PASSAPORTE SOB ESSE FUNDAMENTO. MEDIDAS COERCITIVAS ATÍPICAS. MANUTENÇÃO DA PATRIMONIALIDADE DA EXECUÇÃO. INCÔMODOS PESSOAIS AO DEVEDOR QUE O CONVENÇAM A ADIMPLIR E NÃO SOFRER ESSAS RESTRIÇÕES. POSSIBILIDADE. DURAÇÃO DA RESTRIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE PRÉ-FIXAÇÃO. MEDIDA QUE DEVE PERDURAR PELO TEMPO NECESSÁRIO PARA VERIFICAÇÃO DA EFETIVIDADE DA MEDIDA. 1- O propósito do presente habeas corpus é definir se é manifestamente ilegal ou teratológico o acórdão que indeferiu o pedido de devolução do passaporte do paciente, apreendido há dois anos como medida coercitiva  atípica destinada a vencer a sua renitência em adimplir obrigação de pagar quantia certa decorrente de condenação em honorários advocatícios sucumbenciais, cuja execução se iniciou há dezessete anos. 2- Conquanto não admita ampla dilação probatória, o habeas corpus deve ser suficientemente instruído pelo paciente, a quem cabe, em homenagem aos deveres de boa-fé, eticidade e cooperação, colacionar toda a prova documental necessária à compreensão da controvérsia e à adequada reconstrução dos fatos relevantes ao julgamento. 3- Ao paciente que pretende a retomada de seu passaporte apreendido como medida coercitiva atípica, impõe-se o ônus de provar a inexistência de esgotamento das medidas executivas típicas, de índole essencialmente patrimoniais e expropriatórias, bem como que a medida coercitiva atípica deferida seria inútil, ineficaz, desnecessária ou se revestiria de mera penalidade pelo inadimplemento da obrigação. 4- Descabe cogitar a possibilidade de penhora de cotas sociais das pessoas jurídicas de que o paciente é sócio, como razão suficiente para a devolução do passaporte do devedor, sem que existam evidências de que as referidas cotas possuem expressão econômica, estão livres e poderão ser objeto de penhora válida, ônus que igualmente cabe ao paciente. 5- O oferecimento à penhora de parte dos rendimentos advindos de aposentadoria e pensão por morte recebidos pelo devedor somente será relevante para o fim de viabilizar o desbloqueio de seu passaporte se os valores obtidos a partir dessa modalidade executiva forem suficientes para o adimplemento integral da obrigação em tempo razoável. 6- As medidas coercitivas atípicas não modificam a natureza patrimonial da execução, mas, ao revés, servem apenas para causar ao devedor determinados incômodos pessoais que o convençam ser mais vantajoso adimplir a obrigação do que sofrer as referidas restrições impostas pelo juiz, de modo que a retenção do passaporte do devedor deve perdurar pelo tempo necessário para que se verifique, na prática, a efetividade da medida e a sua capacidade de dobrar a renitência do devedor, sobretudo quando existente indícios de ocultação de patrimônio. 7- Na hipótese em exame, os elementos obtidos neste habeas corpus e nos demais processos e recursos que envolveram a paciente e os demais co-executados que foram submetidos ao exame desta Corte demonstram que: (i) trata-se de dívida de honorários advocatícios sucumbenciais inadimplida desde 2006, ou seja, há mais de dezessete anos; (ii) o esgotamento das medidas executivas típicas está suficientemente evidenciado; (iii) há indícios suficientes de ocultação patrimonial da paciente e dos demais co-executados, sua filha e seu genro; (iv) é absolutamente razoável inferir que as cotas sociais das pessoas jurídicas de que a paciente é sócia não possuem expressão econômica, não estão livres e não são suscetíveis de penhora, inclusive diante da existência de inúmeras outras  execuções fiscais e trabalhistas; (v) os rendimentos de aposentadoria e pensão oferecidos à penhora são insignificantes diante do valor da dívida, que, nesse contexto, somente seria quitada daqui a mais de cinquenta anos; (vi) o oferecimento de bem à penhora após dezesseis anos de execução infrutífera, ainda que claramente insignificante diante de seu contexto patrimonial e nitidamente insuficiente para adimplir a dívida, é evidência de que a retenção do passaporte do devedor está lhe causando o necessário incômodo pretendido por ocasião do deferimento da medida coercitiva atípica. 8- Ordem denegada." (STJ, HC n. 711.194/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, maioria de votos, j. 21.06.2022, grifou-se) Inicialmente ao enfrentar a questão, o relator designado, Ministro Marco Aurélio Belizze, concedeu a ordem de habeas corpus, em síntese: "(...) Tendo em vista a questão controvertida nos autos, importante relembrar que o entendimento sedimentado por esta Corte Superior é no sentido de ser admissível, ao menos em tese, a impetração de habeas corpus para impugnar decisão que determina suspensão ou apreensão de passaporte, pois é medida que limita o direito de ir e vir do devedor e pode, no caso concreto, significar constrangimento ilegal e arbitrário. (...) Em face disso, constata-se que, na espécie, a manutenção da medida coercitiva se mostra abusiva e desproporcional, pois o voto condutor do acórdão a quo manteve a medida constritiva ao argumento de não ser razoável que a devedora realize viagens ao exterior à custa da efetividade do processo e de não estar comprovada a necessidade da sua permanência nos Estado Unidos. Entretanto, como bem salientou o voto vencido do aresto estadual, a medida foi implementada há aproximadamente 2 (dois) anos e a paciente teria oferecido o percentual de 30% de sua aposentadoria para abatimento proporcional do débito, o qual, ainda que longevo, demonstra uma conduta inversa àquelas conhecidas dos devedores recalcitrantes. Assim, não ficou devidamente comprovado que, com o esgotamento dos meios tradicionais de satisfação do crédito, a executada deixou de indicar bens à penhora ou que há indícios de ocultação de patrimônio. Corroborando essa tese, a exequente Mirian Elisa Tenório compareceu espontaneamente aos autos (e-STJ, fls. 137-173) informando que a paciente é empresária, sócia da Galetti e Bocci Promoção de Venda Ltda., bem como possui participação societária em outras 4 (quatro) sociedades empresárias. Desse modo, afirma que "as alegações apresentadas no presente remédio de habeas corpus, sob o manto da legalidade, na verdade têm o nítido propósito de impedira justa aplicação do Direito e da Justiça, portanto afrontam o dever ético e de boa-fé. A Paciente se mantém em plena atividade, explora negócios comerciais lucrativos, ou seja, não possui somente os benefícios previdenciários apontados pelos Impetrantes, tampouco necessita da ajuda de "terceiros" para sobreviver" (e-STJ, fl. 138). Desse modo, a própria exequente confirma que não houve o exaurimento prévio dos meios típicos de satisfação do crédito exequendo, haja vista a possibilidade de, ao menos em tese, serem expropriadas as referidas cotas sociais, conforme procedimento estabelecido no art. 861 do CPC/2015. Por conseguinte, manter o bloqueio do passaporte no caso vertente se mostra ilegal, já que as medidas executivas atípicas devem ser adotadas com certa  cautela, observando-se, além daquelas diretrizes delineadas por esta Corte e acima citadas, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, para não configurar uma medida extremamente gravosa e que não consiga alcançar o fim que se pretende. Assim, não é possível que os meios executivos atípicos sejam impostos por tempo indeterminado sem a demonstração de uma justificativa plausível, e que se revele apenas como uma penitência imposta ao devedor sem a potencialidade de coagi-lo ao adimplemento. Esclareça-se, ainda, que nada impede que o Juízo da execução determine a implementação de novas medidas constritivas (típicas e atípicas), caso vislumbre a presença de novos elementos capazes de justificar a sua adoção, tomando-se como base as diretivas traçadas acima. Por fim, importante deixar claro que não se descura da afetação do Tema 1.137/STJ à Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça para fixação de precedente vinculante, no qual se delimitou a seguinte questão para julgamento, nestes termos:  Definir se, com esteio no art. 139, IV, do CPC/15, é possível, ou não, o magistrado, observando-se a devida fundamentação, o contraditório e a proporcionalidade da medida, adotar, de modo subsidiário, meios executivos atípicos. Destaca-se que, a despeito de ter sido determinada a suspensão do processamento de todos os feitos e recursos pendentes que versem sobre idêntica matéria e que tramitem no território nacional, essa indicação não impede a análise de questões urgentes e flagrantemente ilegais, como é o caso dos autos. Diante dessas considerações, concedo, de ofício, a ordem de habeas corpus, nos termos da fundamentação supra. Fica prejudicado o pedido de reconsideração. É como voto." (STJ, HC n. 711.194/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, maioria de votos, j. 21.06.2022, grifou-se) Todavia, prevaleceu a divergência instaurada pela Ministra Nancy Andrighi, cujo voto foi acompanhado pelos demais integrantes da turma julgadora: "(...) 06) Também se colhe dos autos do RHC 128.327/SP que a decisão interlocutória que determinou o bloqueio dos passaportes de todos os executados (da paciente, de ANDREA e de HERMANN) ocorreu no ano de 2019 (isto é, mais de 14 anos após o início do cumprimento de sentença) e, ainda que sucintamente, está lastreada na ausência de oferecimento de bens passíveis de penhora pelos executados. (...) 14) De todo modo, não se pode olvidar que, de fato, a paciente VANDA e a filha ANDREA constam como empresárias do ramo de petróleo e combustível, como atestam os documentos que somente foram juntados pela exequente (fls. 137/175, e-STJ). E também é correto dizer que, de fato, há inúmeras execuções fiscais contra elas ajuizadas (fls. 54/63, e-STJ). 15) De outro lado, examinando-se o teor do HC 637.802/SP e a petição inicial do habeas corpus em julgamento, impetrado quase um ano depois daquele primeiro, percebe-se não existir o apontamento de nenhuma circunstância fática que justificasse uma nova impetração, nem mesmo o lapso temporal transcorrido desde a apreensão. 16) A esse respeito, como orienta a jurisprudência desta Corte, "a mera repetição de fundamentos de fato e de direito já ventilados em idêntico habeas corpus (...) implica em manifesta inexistência de interesse processual, nas modalidades utilidade e adequação" (HC 412.492/SC, 3ª Turma, DJe 18/12/2017). 17) É igualmente útil ao desfecho da controvérsia destacar que a matéria em questão foi devolvida a esta Corte também no AREsp 1.854.464/SP, que não foi conhecido por incidência da Súmula 182/STJ em decisão unipessoal da Presidência e transitou em julgado em 23/05/2021. 18) É que, contra a decisão interlocutória que determinou a apreensão dos passaportes da paciente, proferida em setembro/2019, houve também a interposição de agravo de instrumento pela paciente, que veio a ser desprovido pelo TJ/SP, por unanimidade, sob os seguintes fundamentos: A agravante explica que foi coautora de pedido de "Alienação Judicial de coisa comum" julgado improcedente (fls. 2). Acerca desta execução de honorários de sucumbência, limita-se a afirmar que: "O Exequente direcionou de várias formas a sua execução para penhora de valores e bens dos Executados" (sic) (fls. 2). Poderia ter esclarecido que o cumprimento de sentença teve início em abril/2006 (fls. 133/135). A r. decisão agravada impôs a medida porque não houve o pagamento da dívida nem oferecimento de bens à penhora (fls. 627). A agravante nada diz sobre esses fundamentos. Convenientemente, nada informa sobre sua profissão (fls. 1) nem sobre seu patrimônio. Noto que ela havia se qualificado como "comerciante" na inicial da ação de conhecimento (fls. 20). Seu endereço residencial em Jundiaí permanece o mesmo (fls. 1 e 20). Nesse contexto, o bloqueio do passaporte com base no art. 139, IV, do CPC se mostra eficaz para a concretização da tutela jurisdicional. A agravante tem plena liberdade de locomoção no Brasil. Viagem ao exterior à custa da efetividade deste processo não é razoável. (fls. 742/746, e-STJ, do AREsp 1.854.464/SP). 19) Como se observa do histórico acima mencionado, o requisito do prévio esgotamento das medidas executivas típicas, essencialmente patrimoniais e expropriatórias, está amplamente demonstrado na hipótese em exame, conforme reiteradamente certificado pelas instâncias ordinárias e também por esta Corte em julgamento anterior (AgInt no RHC 128.327/SP). 20) Nesse contexto, rogando as mais respeitosas venias ao e. Relator, não é razoável supor, tampouco se pode inferir das frágeis provas documentais que instruem o presente writ, que não tenha havido o exaurimento dos meios executivos típicos nos dezesseis anos de tramitação do cumprimento de sentença. 21) É importante registrar, no ponto, que caberia à paciente produzir a prova, neste habeas corpus, de que não teria havido o exaurimento das medidas executivas típicas e de que a apreensão do passaporte, nesse contexto, seria ineficaz, inútil ou se revestiria de mera penalidade pelo inadimplemento da obrigação, mas, como reiteradamente destacado, o presente writ não está suficientemente aparelhado, seja por desídia, seja por algum propósito escuso. 22) Especificamente sobre a penhora das cotas sociais das pessoas jurídicas mencionadas pela exequente em sua petição de fls. 137/175 (e-STJ), hipótese aventada como admissível pelo e. Relator, destaque-se, em primeiro lugar, que não há nenhuma evidência de que as referidas cotas possuem alguma expressão econômica, especialmente porque, relembre-se, cogita-se a existência de provas na origem acerca da participação da paciente em atos de adulteração de combustíveis e de sonegação fiscal, questão cujo conhecimento, repise-se, foi subtraído desta Corte pela própria paciente. 23) Em segundo lugar, anote-se que não há absolutamente nenhuma evidência de que tais cotas estariam livres e seriam suscetíveis de penhora, seja porque se tratam de pessoas jurídicas constituídas há muitos anos (1999, 2000, 2001, 2003 e 2018), seja porque se constata ainda a existência de dezenas de execuções fiscais e trabalhistas em face da paciente, consoante certidões de fls. 54/63, e-STJ. 24) Com o perdão da insistência, mas era dever da paciente comprovar a teratologia ou manifesta ilegalidade da manutenção da apreensão de seu passaporte a partir de uma reconstrução verdadeira dos fatos processuais e desse ônus, com a devida venia, ela não se desincumbiu minimamente. 25) De outro lado, no que se refere especificamente ao oferecimento, pela paciente, de 30% de seus rendimentos como aposentada e pensionista para a quitação da dívida, que fora reputada pelo e. Relator como  suficiente para o desbloqueio do passaporte com base no princípio da boa-fé, são necessários alguns esclarecimentos e reflexões. 26) O valor originário da dívida executada, repise-se, inadimplida desde 2006, era de aproximadamente R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais). O valor atualizado da dívida para esta data, com juros e correção monetária, é superior a R$ 920.000,00 (novecentos e vinte mil reais). 27) O valor líquido dos benefícios auferidos pela paciente totaliza R$ 5.097,70 (fls. 68/73, e-STJ), de modo que a penhora de 30% desse valor resultaria em um benefício mensal à credora da ordem de R$ 1.529,31. 28) Se, por hipótese, o valor da dívida executada não fosse mais atualizado ou corrigido a partir desta data, conclui-se que, ainda assim, seriam necessários 601 (seiscentos e um) meses para o adimplemento da dívida, ou seja, mais de 50 (cinquenta) anos. 29) Dado que a paciente atualmente possui 71 anos e a expectativa média de vida dos brasileiros é, segundo a mais recente pesquisa do IBGE, de 76,8 anos, é bastante razoável inferir que nem mesmo metade da dívida será adimplida a partir do método sugerido pela paciente, de modo que está evidenciada a absoluta inocuidade da medida. 30) A propósito, registre-se que o oferecimento dessa insignificante quantia mensal após mais de dezesseis anos de execução, sem que nenhuma outra forma fosse viabilizada ao longo de todo esse período, não é apenas inócua, mas, ao revés, é até mesmo desrespeitosa e ofensiva ao credor e à dignidade do Poder Judiciário, na medida em que são oferecidas migalhas em troca de um passaporte para o mundo e, quiçá, para a inadimplência definitiva. (...) 32) Aliás, os contornos que se deve dar à iniciativa da paciente são, com a máxima venia, substancialmente diferentes. O oferecimento de algum valor, por mais insignificante que seja, pelo devedor contumaz e claramente despido de boa-fé, após dois anos de bloqueio de seu passaporte, é, a meu juízo, a prova cabal de eficácia da medida coercitiva atípica, pois é representativo de que a restrição pessoal está lhe causando o necessário incômodo que havia sido pretendido por ocasião de seu deferimento. 33) Nesse particular, é importante salientar que as medidas executivas atípicas, sobretudo as coercitivas, não são penalidades judiciais impostas ao devedor, pois, se assim fossem, implicariam obrigatoriamente em quitação da dívida após o cumprimento da referida pena, o que não ocorre. 34) Por esse motivo, é correto dizer que essas medidas também não representam uma superação do dogma da patrimonialidade da execução, uma vez que são os bens - e apenas os bens - do devedor que respondem pelas suas dívidas. Não se deve confundir, todavia, patrimonialidade da execução com a possibilidade de imposição de restrições pessoais como método para dobrar a recalcitrância do devedor. 35) De fato, essas medidas devem ser deferidas e mantidas enquanto conseguirem operar, sobre o devedor, restrições pessoais capazes de incomodar e suficientes para tirá-lo da zona de conforto, especialmente no que se refere aos seus deleites, aos seus banquetes, aos seus prazeres e aos seus luxos, todos bancados pelos credores. 36) A limitação temporal das medidas coercitivas atípicas, a propósito, é questão inédita nesta Corte, pois os precedentes até aqui examinados se circunscreveram aos pressupostos para deferimento de medidas dessa natureza, mas não às hipóteses de manutenção e de verificação de efetividade após o transcurso de determinado período. 37) E, nesse particular, é correto afirmar que não há uma formula mágica e nem deve haver um tempo pré-estabelecido fixamente para a duração de uma medida coercitiva, que deve perdurar, pois, pelo tempo suficiente para dobrar a renitência do devedor, de modo a efetivamente convencê-lo de que é mais vantajoso adimplir a obrigação do que, por exemplo, não poder realizar viagens internacionais. 38) No que tange ao bloqueio de passaporte, é particularmente interessante observar o peculiar e injustificado interesse que os devedores que afirmam estar em situação de miserabilidade, de insolvência ou de qualquer modo impossibilitados de adimplir as suas dívidas, possuem especificamente na posse desse documento. 39) Isso porque ou bem o devedor realmente se encontra em situação de penúria financeira e não reúne condições de satisfazer a dívida (e, nessa hipótese, a suspensão do passaporte será duplamente inócua, como técnica coercitiva e porque o documento apenas ficará sob a posse do devedor no Brasil, diante da impossibilidade de custear viagens internacionais) ou o devedor está realmente ocultando patrimônio e terá revogada a suspensão tão logo quite as suas dívidas. 40) Sublinhe-se que, na hipótese, não há nenhuma circunstância fática justificadora do desbloqueio de passaporte da paciente e que autorize, antes da quitação da dívida, a retomada de suas viagens internacionais que, ao que tudo indica, eram bastante corriqueiras. 41) Com efeito, somente foi colacionado ao presente habeas corpus um e-mail, que teria sido enviado em 09/12/2020 pela filha da paciente, ANDREA, que, relembre-se, também é executada no mesmo processo de origem, por meio do qual ela noticia já ter havido a alegada cirurgia, que teria sido exitosa e com boa recuperação, na qual informa ter saudades da mãe, que gostaria de revê-la e que, a despeito das supostas dificuldades financeiras, supostamente custearia as passagens porque seria "um esforço para que possamos nos ver e passar alguns dias juntas, não vai matar ninguém" (fl. 66, e-STJ). 42) Com todo o respeito, é absolutamente intolerável esse tipo de postura do devedor, que maximiza os seus próprios problemas e necessidades e minimiza, sem nenhum conhecimento ou autorização, os problemas e necessidades do credor, pretendendo, às expensas desse, manter íntegros os seus padrões de vida e os seus hábitos. 43) Em suma, a partir do contexto acima mencionado e por qualquer ângulo que se examine a questão, não há que se falar em teratologia ou em manifesta ilegalidade da decisão de fls. 75/77 (e-STJ) e no acórdão de fls. 79/85 (e-STJ), que, de maneira fundamentada e aderente à realidade da execução que se iniciou, repise-se uma vez mais, em abril/2006, rejeitaram o pedido de desbloqueio do passaporte da paciente. 44) Forte nessas razões, rogando as mais respeitosas venias ao e. Relator, DENEGO A ORDEM pretendida pela paciente." (STJ, HC n. 711.194/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, v.u., j. 21.06.2022, grifou-se) Ao que se extrai do voto vencedor acima, as medidas coercitivas previstas no art. 139, IV, do CPC, (i) devem perdurar pelo tempo necessário para verificação de sua efetividade, (ii) a ausência de elementos fáticos novos não reclama a alteração da medida coercitiva determinada (ao revés, o incômodo do devedor em preocupar-se com a revogação da medida, sem contudo contribuir para a satisfação da tutela executiva, revela sua efetividade), (iii) é ônus do devedor demonstrar o esgotamento de cumprimento das medidas executivas típicas, de índole essencialmente patrimonial e expropriatória, bem como (iv) que a medida coercitiva atípica deferida seria inútil, ineficaz, desnecessária ou se revestiria de mera penalidade pelo inadimplemento da obrigação e, por fim, (v) tais medidas coercitivas tem por desiderato causar ao devedor determinados incômodos pessoais que o convençam a ser mais vantajoso adimplir a obrigação do que sofrer referidas restrições impostas pelo magistrado. Tem-se, pois, mais um capítulo da série "art. 139, IV, do CPC", cuja temática quiçá se estenderá de série para diversas temporadas, porquanto o fenômeno jurídico vem sendo examinado pelo STJ de modo fragmentado. O que se espera, independentemente do posicionamento adotado, em especial quando do vindouro julgamento do Tema Repetitivo n. 1.137/STJ, é que as premissas objetivas a serem adotadas sejam aplicadas sem distinção, a assegurar a tão esperada segurança jurídica, isonomia e previsibilidade que se espera das decisões do Poder Judiciário, mantendo-se um sistema íntegro e coerente, tal qual inclusive necessito o legislador assim o prever no art. 926 do CPC2. __________ 1 Disponível aqui. 2 "Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, integra e coerente."
A prática de atos de comunicação por meio eletrônico é a regra do Código de Processo Civil ("CPC"). Nesse sentido, tanto o artigo 246, quanto o artigo 270, do CPC, estabelecem as regras para que a citação ocorra de forma eletrônica. Com isso, tanto as empresas públicas, como privadas, devem manter cadastro na Plataforma de Comunicações Processuais do Conselho Nacional de Justiça ("CNJ"), para garantir o recebimento de citações e intimações (art. 246, §1º, do CPC). A citação eletrônica ocorrerá da seguinte maneira: (i) o juiz determinará a citação por meio eletrônico no prazo de 2 (dois) dias úteis, a contar da decisão; (ii) a pessoa jurídica, ao receber a citação com as devidas orientações, terá até 3 (três) dias úteis para confirmar seu recebimento; e (iii) o prazo do réu para apresentação de defesa começará no quinto dia útil após a confirmação de recebimento da citação realizada por e-mail. Caso não ocorra a confirmação do recebimento da citação eletrônica no prazo estipulado, a citação ocorrerá por carta com aviso de recebimento, ou oficial de justiça, de modo que o Réu, na primeira oportunidade em que se manifestar no processo, deverá apresentar justificativa para a ausência de confirmação do recebimento da citação eletrônica. Além disso, destaca-se que o artigo 1.051 do CPC já previa o prazo de 30 (trinta) dias para que as empresas públicas e privadas realizassem o cadastro na Plataforma de Comunicações Processuais do CNJ, a contar da data de inscrição do ato constitutivo da pessoa jurídica, perante o juízo onde tenham sede ou filial. Em respeito ao quanto disposto no CPC, o artigo 196 desse código delegou ao CNJ o poder para regulamentar a prática e a comunicação oficial dos atos processuais por meio eletrônico, zelando-se pela compatibilidade dos sistemas; motivo pelo qual foi editada a resolução CNJ n. 234/2016, seguida pela Resolução CNJ n. 455/2022, que revogou a Resolução anterior. Através das citadas Resoluções, foi criada a Plataforma de Comunicações Processuais do Poder Judiciário, que preceitua o modo de cadastramento das pessoas indicadas nos §§ 1º e 2º do art. 246 do CPC. Para além disso, o CNJ, recentemente, criou o "Portal de Serviços do Poder Judiciário", ferramenta desenvolvida pelo "Programa Justiça 4.0", objetivando a uniformização do acesso aos processos judiciais de tribunais de todo o país em um ambiente virtual único, sem a necessidade de acessar-se diferentes sistemas de processo eletrônico. A integração dos tribunais à Plataforma Digital do Poder Judiciário segue avançando, de modo que em agosto/2022, 68 (sessenta e oito) tribunais já haviam concluído a integração. Neste sentido, os cadastros de pessoas físicas e jurídicas e de seus representantes serão possibilitados a partir de 30 de setembro de 2022, data provável de disponibilização do sistema, de acordo com o noticiado pelo CNJ. As empresas seguirão um cronograma de cadastramento em fases a partir do dia 30 de setembro de 2022 e terão um prazo de 90 (noventa) dias para concluir o processo, conforme informações que serão oportunamente disponibilizadas no Portal do CNJ. O cadastro é facultado às pessoas físicas, microempresas e empresas de pequeno porte. No entanto, o CNJ recomenda que todos se cadastrem. Frisa-se que a pessoa jurídica que não realizar o devido cadastro no sistema instituído pelo CNJ poderá vir a ser condenada ao pagamento de multa de 5% (cinco por cento) do valor da causa, por ato atentatório à dignidade da justiça, nos termos os artigos 77, inciso V e 246, §1º-C, do CPC. Desta forma, a medida instituída pelo CPC e ora regulamentada pelo CNJ, objetiva viabilizar a tendência contemporânea de prática de atos processuais pelo formato eletrônico.
O Estudo das Execuções Fiscais mostra-se importante, eis que aproximadamente 35% dos feitos em tramitação em nosso país são Execuções Fiscais. As Execuções Fiscais correspondem, por exemplo, a 57% do acervo de processos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.1 E como é notório, em grande parte das Execuções Fiscais o valor cobrado é bastante baixo, muitas vezes sendo inferior ao próprio custo de tramitação do processo2.   Desse modo, continua relevante a previsão contida no artigo 34 da Lei de Execuções Fiscais: "Art. 34 - Das sentenças de primeira instância proferidas em execuções de valor igual ou inferior a 50 (cinqüenta) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTN, só se admitirão embargos infringentes e de declaração."3   Referida previsão sempre foi questionada por parte da doutrina4, entretanto, teve sua constitucionalidade reafirmada pelo Supremo Tribunal Federal, em 2011, ao julgar o Tema 408 de Repercussão Geral5.   Apesar da previsão legal prever a restrição de recursos em face da sentença, desde muito a doutrina vem entendendo que tal restrição também seria aplicável ao Agravo de Instrumento:  "(...) é evidente que, eliminando o duplo grau no principal, não o manteve no secundário. Assim, não cabe, nas execuções de alçada, o recurso de agravo(...); em contrapartida, não precluem as decisões. O ideal da irrecorribilidade das interlocutórias se implantou indiretamente, devolvendo-se ao conhecimento do órgão julgador, nas execuções de alçada, através da interposição dos embargos infringentes, todas as questões porventura antes decididas e nele impugnadas." (Araken de Assis, Manual da execução. 11ª ed., São Paulo: RT, 2007. p. 1.059 e 1.061.)  "Voltou-se, assim, ao sistema de causas de alc¸ada, para as quais na~o vigora o duplo grau de jurisdic¸a~o por provocac¸a~o das partes. Duas indagac¸o~es, pelo menos, suscita a inovac¸a~o em seus aspectos pra'ticos: a) caberia agravo de instrumento das deciso~es interlocuto'rias nas causas de alc¸ada? b) caberia o duplo grau de jurisdic¸a~o necessa'rio (antigo recurso ex officio)? Parece-nos que ambos os expedientes esta~o implicitamente inadmitidos pela atual sistema'tica das causas de alc¸ada para as execuc¸o~es fiscais." (Humberto Theodoro Júnior, Lei de Execução Fiscal, 13ª ed., São Paulo: Saraiva, 2016, edição eletrônica, p. 356/357) Esse também era o entendimento da Súmula 259 do extinto Tribunal Federal da Recursos:  "Não cabe agravo de instrumento em causa sujeita à alçada de que trata a Lei 6.825/80, salvo se versar sobre o valor da causa ou admissibilidade de recurso." Tal entendimento continua sendo prestigiado pelas duas Turmas de Direito Público do Superior Tribunal de Justiça:  "PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. VALOR DA CAUSA INFERIOR A 50 ORTNS. ALÇADA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. APLICAÇÃO. 1. A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias é regida pela Lei n. 6.830/1980 e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil, conforme dispõe o art. 1º da referida Lei de Execução Fiscal. 2. O art. 34 da LEF estabelece o valor de alçada para eventual acesso ao segundo grau de jurisdição no montante de 50 (cinquenta) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTNs. 3. Em interpretação sistemática do regramento legal, conclui-se pelo não cabimento do agravo de instrumento contra decisões interlocutórias na hipótese de a execução fiscal não alcançar o valor de alçada do art. 34 da Lei n. 6.830/1980, conforme antigo entendimento jurisprudencial sedimentado na Súmula 259 do ex-TFR. 4. Agravo interno não provido." (AgInt no AREsp n. 1.831.509/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 27/9/2021, DJe de 7/10/2021.) "PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. VALOR DA CAUSA INFERIOR A 50 ORTNS. ALÇADA. RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. NÃO CABIMENTO. I - Na origem, trata-se de agravo de instrumento contra decisão que, em processo de execução fiscal, determinou a intimação da municipalidade para o recolhimento das despesas de citação postal, sob pena de extinção da ação executiva. No Tribunal a quo, não se conheceu do recurso. II - Não havendo, no acórdão recorrido, omissão, obscuridade, contradição ou erro material, não fica caracterizada ofensa aos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015. III - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica ao afirmar que não há recurso para a segunda instância quando o valor executado for inferior ao valor de alçada, de modo que, estando o valor da execução abaixo do estipulado, haverá exceção ao duplo grau de jurisdição, seja para a Fazenda Pública, seja para o executado. Confiram-se: AgInt nos EDcl no AREsp 1.700.964/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 24/8/2020, DJe 27/8/2020 e AgInt no AREsp 1.831.509/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 27/9/2021, DJe 7/10/2021. IV - Recurso especial improvido." (AREsp n. 1.751.847/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 22/8/2022.) No IAC no RMS 54712 / SP, a Primeira Seção, do Superior Tribunal de Justiça também decidiu que "Não é cabível mandado de segurança contra decisão proferida em execução fiscal no contexto do art. 34 da lei 6.830/80". Desse modo, a limitação recursal imposta pela lei somente em face da sentença vem sendo estendida para também abranger o Agravo de Instrumento e mesmo o Mandado de Segurança cabendo ao jurisdicional ficar atento a tão extensão. __________ 1 Disponível aqui, p 171. 2 "De todo modo, com base nos dados fornecidos, é possível fazer constatações relevantes em relação a um dos problemas identificados: grande parte das execuções fiscais ajuizadas exige valores inferiores ao custo de tramitação do próprio processo de execução. A análise preliminar dos dados leva à conclusão de que é necessário alterar o sistema de cobrança de débitos, evitando-se ajuizamento de execuções fiscais que custarão mais do que o valor que se pretende cobrar." (Disponível aqui, p. 127) 3 "Valor de alçada: 50 OTNs. Para a atualização do valor de alçada, utiliza-se a sequência de indexadores OTN/BTN/INPC/UFIR, aplicando ainda o IPCA-E a contar de janeiro de 2000, data da última UFIR divulgada. Note-se que a UFIR foi extinta pela MP n. 1973-67, em 26 de outubro de 2000, mas vinha sendo fixada anualmente, sendo que seu último valor foi de R$ 1.0641, em 1o de janeiro de 2000. De rigor a utilização do IPCA-E a partir de janeiro de 2001 consoante a decisão do STJ no REsp 1.168.625, sujeito ao regime do art. 543-C do CPC, pois servia de parâmetro para a fixação da UFIR (vide adiante a ementa e os comentários sobre o critério adotado e os valores indicados em tal julgado). Não há como aplicar a SELIC porque esta abrange tanto correção como juros. A aplicação da TR, por sua vez, não recompõe sequer o processo inflacionário, além do que não encontra sustentação legal, na medida em que a atualização do valor da causa não corresponde à hipótese do art. 1o-F da Lei n. 9.494/97, com a redação da Lei 11.960/2009, que determina a utilização dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança para a atualização das condenações impostas à Fazenda Pública. Valor de alçada, atualizado pelo IPCA-E: jan/2018: R$ 1.020,16; jan/2017: R$ 990,26; jan/2016: R$ 934,74; jan/2015: R$ 844,09; jan/2014: R$ 785,87; jan/2013: R$ 742,45; jan/2012: R$ 701,91; jan/2011: R$ 658,73; jan/2010: R$ 622,66; jan/2009: R$ 597,64; jan/2008: R$ 563,27; jan/2007: R$ 539,72; jan/2006: 524,22; jan/2005: R$ 495,11; jan/2004: R$ 460,42; jan/2003: R$ 419,09; jan/2002: R$ 374,23; e jan/2001: R$ 348,08." (Leis de processo tributário comentadas: processo administrativo fiscal, protesto extrajudicial de títulos e execução fiscal / Leandro Paulsen, René Bergmann Ávila e Ingrid Schroder Sliwka - 9. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018, edição eletrônica, p. 760)".   4 "(...) se afirma sem susto a impropriedade do dispositivo. Não há de se conceber, ao menos na vigência da nossa Constituição, a possibilidade de se suprimir o direito de acesso ao Judiciário, seja em primeira ou segunda instância. A ampla defesa e o pleno direito de ação, se tomados como garantias efetivas, como demanda a moderna processualística, fulminam a legitimidade da limitação fundada no valor de alçada." (MARINS, James. Direito Processual Tributário Brasileiro - Administrativo e Judicial. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2010. p. 678.). 5 "É compatível com a Constituição o art. 34 da lei 6.830/1980, que afirma incabível apelação em casos de execução fiscal cujo valor seja inferior a 50 ORTN."
Os honorários advocatícios já tiverem seu reconhecimento como caráter alimentar e, portanto, devem alocar-se na ordem de recebimento de crédito por equiparação ao crédito trabalhista na falência. Dúvidas emergiram, a  se tais créditos, equiparados a trabalhistas, dizem respeito somente a honorários sucumbenciais ou contratuais, b) se tal equiparação se observa somente na falência ou também na recuperação judicial e c) a interpretação quanto a aplicação do art. 83, I, da lei 11.101/2005, ao trazer a limitação de 150 (cento e cinquenta) salários mínios por credor na ordem de classificação dos créditos trabalhistas. Recentemente a Primeira Turma do STJ examinou a questão sob tais prismas: "DIREITO EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. RECURSO ESPECIAL. HABILITAÇÃO DE CRÉDITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NATUREZA ALIMENTAR. CRÉDITO TRABALHISTA POR EQUIPARAÇÃO. LIMITAÇÃO DO TRATAMENTO PREFERENCIAL (LEI 11.101/2005, ART. 83, I). POSSIBILIDADE. PREVISÃO NO PLANO. QUESTÃO FÁTICA. NECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO DO TRIBUNAL A QUO. OMISSÃO RELEVANTE CONFIGURADA. RECURSOS ESPECIAIS PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. "1.1) Os créditos resultantes de honorários advocatícios têm natureza alimentar e equiparam-se aos trabalhistas para efeito de habilitação em falência, seja pela regência do Decreto-Lei n. 7.661/1945, seja pela forma prevista na Lei n. 11.101/2005, observado, neste último caso, o limite de valor previsto no artigo 83, inciso I, do referido Diploma legal" (REsp 1.152.218/RS, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Corte Especial, DJe de 9/10/2014). 2. "Em se tratando de crédito trabalhista por equiparação (honorários advocatícios de alta monta), as Turmas de Direito Privado firmaram o entendimento de que é possível, por deliberação da AGC, a aplicação do limite previsto no art. 83, I, da Lei 11.101/2005 às empresas em recuperação judicial, desde que devida e expressamente previsto pelo plano de recuperação judicial, instrumento adequado para dispor sobre forma de pagamento das dívidas da empresa em soerguimento (princípio da preservação da empresa)" (REsp 1.812.143/MT, Relator Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, DJe de 17/11/2021). 3. Na hipótese, o eg. Tribunal a quo não se manifestou sobre fato essencial ao julgamento da questão de direito, relativamente à existência, ou não, de previsão no plano de recuperação judicial - instrumento adequado para dispor sobre a forma de pagamento das dívidas da sociedade em soerguimento - da limitação pleiteada, o que impede que se aplique, de pronto, o entendimento adotado por ambas as Turmas de direito privado no que diz respeito à aplicabilidade do art. 83, I, da Lei 11.101/2005 à hipótese dos autos, mormente diante das vedações impostas pelas Súmulas 5 e 7 deste Pretório. 4. Ademais, alega-se peculiaridade relevante, quanto à inexistência de crédito trabalhista à época da aprovação do Plano de Recuperação, o que justificaria a eventual inexistência de previsão no Plano, ensejando, assim, debate acerca da possibilidade de haver ou não a limitação do elevado valor do crédito relativo aos honorários, apesar da inexistência de deliberação em tal sentido, dado que a natureza alimentar do crédito é reconhecida. 5. Por tais razões, deve ser acolhida a apontada violação ao art. 1.022 do CPC/2015, tão somente com relação ao pleito de limitação do valor dos créditos a 150 salários-mínimos, nos termos do art. 83, I, da Lei 11.101/2005, anulando-se o v. acórdão proferido em sede de embargos declaratórios para que outro seja proferido e, assim, sanada a omissão verificada, inclusive quanto às peculiaridades do caso, notadamente à inexistência de crédito trabalhista à época da aprovação do Plano de Recuperação, deliberando-se quanto ao cabimento ou não da limitação do valor do crédito. 6. Recursos especiais parcialmente providos. (STJ, REsp n. 1.785.467/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Raul Araújo, v.u., j. 02.08.2022, grifou-se) Ao enfrentar a questão, o voto condutor bem examinou: "(...) Cinge-se a controvérsia em definir a classificação dos créditos discutidos nos autos, oriundos de honorários advocatícios de sucumbência, para fins de habilitação na recuperação judicial das agravantes REDE ENERGIA PARTICIPAÇÕES S/A - EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL e OUTRAS, bem como analisar a possibilidade de limitação do tratamento preferencial para os referidos créditos, nos termos do art. 83, I, da Lei de Falências e Recuperação Judicial (Lei 11.101/2005).  (...) Contudo, em juízo de retratação (art. 543-C, § 7º, II, do CPC/73, atual art. 1.040, II, do CPC/2015) em razão do julgamento do REsp 1.152.218/RS (Tema 637 dos recursos repetitivos), o Tribunal a quo alterou seu entendimento para concluir pela equiparação do crédito perseguido pelas recorridas aos créditos trabalhistas, nos seguintes termos: "No que se refere, entretanto, ao item I.3 acima (classificação do crédito), sobrevindo decisão em recurso repetitivo do E. Superior Tribunal de Justiça acerca da matéria, este Relator a ela se submete: Os créditos resultantes de honorários advocatícios têm natureza alimentar e equiparam-se aos trabalhistas para efeito de habilitação em falência, seja pela regência do Decreto-Lei n. 7.661/1945, seja pela forma prevista na Lei n. 11.101/2005, observado, neste último caso, o limite de valor previsto no artigo 83, inciso I, do referido Diploma legal (REsp nº 1.152/218/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, dj 07.05.14). III. DISPOSITIVO: Pelos fundamentos expostos, mantém a rejeição da preliminar de não conhecimento e, submetendo-se à decisão em recurso repetitivo, dá-se parcial provimento ao recurso para atribuir a classificação de privilegiado trabalhista ao crédito ostentado pela Sociedade de Advogados." (fls. 558/559, g.n.) Todavia, irresignadas, as recorrentes alegam a inaplicabilidade da tese formada no julgamento do repetitivo ao caso, sustentando a ausência de similitude fática em razão de se tratar de hipótese de habilitação de crédito pertencente a sociedade de advogados em recuperação judicial, enquanto o precedente obrigatório trata de caso de habilitação de crédito de advogado autônomo em falência. Ocorre que, por ocasião do julgamento do mencionado recurso repetitivo, esta Corte Superior firmou o entendimento de que os créditos resultantes de honorários advocatícios ostentam os mesmos privilégios legais dados aos créditos trabalhistas, especificamente aqueles previstos na Lei 11.101/2005, inclusive em caso de recuperação judicial. Confira-se a ementa do mencionado precedente:  "DIREITO PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FALÊNCIA. HABILITAÇÃO. CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTAR. ART. 24 DA LEI N. 8.906/1994. EQUIPARAÇÃO A CRÉDITO TRABALHISTA. 1. Para efeito do art. 543-C do Código de Processo Civil: 1.1) Os créditos resultantes de honorários advocatícios têm natureza alimentar e equiparam-se aos trabalhistas para efeito de habilitação em falência, seja pela regência do Decreto-Lei n. 7.661/1945, seja pela forma prevista na Lei n. 11.101/2005, observado, neste último caso, o limite de valor previsto no artigo 83, inciso I, do referido Diploma legal. 1.2) São créditos extraconcursais os honorários de advogado resultantes de trabalhos prestados à massa falida, depois do decreto de falência, nos termos dos arts. 84 e 149 da Lei n. 11.101/2005. 2. Recurso especial provido." (REsp 1.152.218/RS, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe de 9/10/2014, g.n.) Assim, a qualificação dos créditos em classes de credores, conforme a ordem de preferência legal, possui tratamento único, seja na falência ou na recuperação judicial, não assistindo razão às recorrentes no que tange à apontada diferenciação entre falência e recuperação judicial. Tal entendimento foi melhor elucidado quando do julgamento do REsp 1.649.774/SP, de relatoria do il. Ministro Marco Aurélio Bellizze (Terceira Turma, DJe de 15/2/2019), in verbis: "Especificamente em razão da natureza dos créditos resultantes de honorários advocatícios, que ostenta o caráter alimentar, admite-se a equiparação destes com o créditos trabalhistas, a ensejar aos seus titulares os correspondentes privilégios fixados em lei em face de concurso de credores em geral, tal como se dá na falência, na recuperação judicial, na liquidação extrajudicial e na insolvência civil. Sem olvidar a distinção existente entre o salário - concebido como a remuneração decorrente da prestação de serviços, no âmbito da relação de emprego, definida nos arts. 2º e 3º da CLT - e os honorários advocatícios - compreendidos como a remuneração à prestação do serviço do profissional da advocacia, com registro na Ordem dos Advogados do Brasil, convencionados, fixados por arbitramento ou advindos da sucumbência -, sobressai inequívoca a identidade da natureza alimentar de tais verbas, destinando-se, cada qual, à subsistência de seu titular e de sua família. Não se pode, assim, conferir tratamento díspar a realidades tão assemelhadas. Com essa compreensão, encontra-se pacificado no âmbito da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça o posicionamento de que os créditos resultantes de honorários advocatícios ostentam os mesmos privilégios legais dados aos créditos trabalhistas, especificamente aqueles previstos na Lei n. 11.105/2005, tese, ressalta-se, firmada em recurso especial representativo da controvérsia pela Corte Especial, por ocasião do julgamento do REsp 1.152.218/ES, nos termos da seguinte ementa:(...)" (...) De igual modo, o STJ, também no julgamento do referido REsp 1.649.774/SP, já se manifestou no sentido de que o fato de os créditos serem titularizados por sociedade de advogados não afasta sua natureza alimentar, uma vez que a remuneração pelo trabalho desenvolvido pelos advogados organizados em sociedade também se destina à subsistência de cada um dos causídicos integrantes da banca e de suas famílias. (...) Ainda, diferentemente do alegado pelas recorrentes, consoante entendimento desta Corte, os honorários advocatícios, sejam contratuais ou sucumbenciais, possuem natureza alimentar para fins de habilitação em falência e recuperação judicial, conforme previsto no art. 85, § 14, do CPC/2015. Nesse sentido: "AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. COBRANÇA DE HONORÁRIOS CONTRATUAIS. CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTAR. EQUIPARAÇÃO AO CRÉDITO DE NATUREZA TRABALHISTA. ART. 85, § 14, DO CPC/2015. RECURSO DESPROVIDO. 1. Consoante decidiu a Corte Especial do STJ no julgamento do REsp n. 1.152.218/RS, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, DJe de 9/10/2014 - sob o rito dos recursos repetitivos -, "os créditos resultantes de honorários advocatícios têm natureza alimentar e equiparam-se aos trabalhistas para efeito de habilitação em falência, seja pela regência do Decreto-Lei n. 7.661/1945, seja pela forma prevista na Lei n. 11.101/2005, observado, neste último caso, o limite de valor previsto no artigo 83, inciso I, do referido Diploma legal". 2. Sob essa perspectiva, não há que se fazer distinção entre honorários sucumbenciais e contratuais, à mingua, inclusive, do devido amparo legal, tendo em vista que o art. 85, § 14, do CPC/2015 expressamente dispõe que "os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho". 3. Agravo interno desprovido." (AgInt no REsp 1.582.186/RS, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 3/8/2020, g.n.) Nesse cenário, não assiste razão às recorrentes ao afirmar que o crédito em discussão não pode ser classificado com o privilégio de trabalhista por se tratar de honorários de sucumbência e por não guardar similitude fática com a hipótese tratada no REsp  .152.218/RS, razão pela qual deve ser mantido o acórdão estadual, no ponto. Assiste razão às recorrentes, contudo, no que diz respeito à omissão do Tribunal a quo em analisar a alegação de necessidade de limitação dos créditos equiparados a trabalhistas a 150 salários-mínimos, nos termos do art. 83, I, da Lei 11.101/2005. (...) Consoante entendimento firmado pela eg. Terceira Turma no julgamento do mesmo REsp 1.649.774/SP, a limitação prevista no art. 83, I, da Lei 11.101/2005 não tem aplicação automática na recuperação judicial, cabendo às recuperandas e aos credores da respectiva classe, segundo critérios e quorum definidos em lei, deliberarem sobre o estabelecimento de um patamar máximo para o tratamento preferencial dos créditos trabalhistas, isto é, somente incidirá a limitação do art. 83, I, da Lei de Falências e Recuperação Judicial caso haja previsão expressa no respectivo plano de recuperação. (...) A eg. Quarta Turma adotou o mesmo posicionamento no julgamento do REsp 1.812.143/MT, de relatoria do Ministro Marco Buzzi (DJe de 17/11/2021), firmando o entendimento de que, nos casos em que se busca a habilitação em recuperação judicial de honorários advocatícios de elevado valor - crédito trabalhista por equiparação -, é possível a aplicação do limite previsto no art. 83, I, da Lei 11.101/2005 desde que deliberado pela assembleia-geral de credores e expressamente previsto no plano recuperacional. O julgado foi assim ementado: "RECURSO ESPECIAL - AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM - RECUPERAÇÃO JUDICIAL - HONORÁRIOS DE ADVOGADO " - CRÉDITO TRABALHISTA POR EQUIPARAÇÃO - POSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO DE PAGAMENTO, DESDE QUE CONSENSUALMENTE ESTABELECIDO PELA ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES - PRECEDENTES DE AMBAS AS TURMAS DE DIREITO PRIVADO DO STJ. 1. O Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência firmada no sentido de que não há aplicação automática do limite previsto no art. 83, I, da Lei nº 11.101/2005 às empresas em recuperação judicial, pois a forma de pagamento dos créditos é estabelecida consensualmente pelos credores e pela recuperanda no plano de recuperação judicial 1.1. É permitido, portanto, à Assembleia Geral de Credores - AGC, em determinados créditos e situações específicas, a liberdade de negociar prazos de pagamentos, diretriz, inclusive, que serve de referência à elaboração do plano de recuperação judicial da empresa. 2. Em se tratando de crédito trabalhista por equiparação (honorários advocatícios de alta monta), as Turmas de Direito Privado firmaram o entendimento de que é possível, por deliberação da AGC, a aplicação do limite previsto no art. 83, I, da Lei 11.101/2005 às empresas em recuperação judicial, desde que devida e expressamente previsto pelo plano de recuperação judicial, instrumento adequado para dispor sobre forma de pagamento das dívidas da empresa em soerguimento (princípio da preservação da empresa). Precedentes. 3. Recurso especial provido para cassar o acórdão estadual e, por conseguinte, restabelecer, em relação ao referido crédito concursal, o plano de recuperação judicial homologado pelo juízo universal. (REsp 1.812.143/MT, Relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe de 17/11/2021, g.n.) Ocorre que a eg. Corte de origem, apesar de provocada com a oposição de embargos de declaração, não analisou o pleito de limitação do tratamento preferencial para os créditos discutidos nestes autos, nos termos do art. 83, I, da Lei 11.101/2005, deixando de examinar questões relevantes para o deslinde da controvérsia e que, na via estreita do recurso especial, não poderia ser analisada de plano. (...) Por essa razão, deve ser acolhida a alegada violação ao art. 1.022 do CPC/2015, tão somente com relação ao pleito de limitação da habilitação dos créditos trabalhistas a 150 salários para efeito de falência, nos termos do art. 83, I, da Lei 11.101/2005, anulando-se o v. acórdão proferido em sede de embargos declaratórios e determinando-se, por conseguinte, que outro seja proferido e, assim, seja sanada a omissão aqui verificada, inclusive quanto às peculiaridades do caso, quanto à  inexistência de crédito trabalhista à época da aprovação do Plano de Recuperação, quando poderá haver ou não a limitação do valor do crédito em face de tais peculiaridades." (STJ, REsp n. 1.785.467/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Raul Araújo, v.u., j. 02.08.2022, grifou-se) O recente entendimento do STJ joga luzes as discussões que circundam o tema, para assim, também amparado da leitura do julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.151.218/RS (Tema n. 637) firmar o entendimento de que a) os créditos resultantes de honorários advocatícios têm natureza alimentar e equiparam-se aos trabalhistas para efeito de habilitação em falência e também na recuperação judicial, b) a circunstância de créditos serem titularizados por sociedade de advogados ou por determinado causídico não afasta sua natureza alimentar, c) tal caráter alimentar aplica-se tanto para honorários sucumbenciais quanto contratuais, ex vi ao quanto disposto no art. 85, § 14º, do CPC e d) a limitação prevista no art. 83, I, da lei 11.101/2005 não se aplica automaticamente no âmbito da recuperação judicial, cabendo às recuperandas e credores da respectiva classe deliberarem sobre o estabelecimento de um patamar máximo para o tratamento preferencial dos créditos trabalhistas, de sorte que tal norma somente incidirá caso haja previsão expressa no respectivo plano de recuperação e deliberado o tema em assembleia geral de credores.
De acordo com o art. 50, do Código Civil (CC), que versa sobre a desconsideração da personalidade jurídica: "Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso". Ou seja, preenchidos os requisitos (confusão patrimonial ou desvio de finalidade) os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações da pessoa jurídica poderão ser estendidos aos bens particulares dos administradores e dos seus sócios. O art. 133, § 2º, do Código de Processo Civil (CPC), por sua vez, admite a desconsideração inversa da personalidade jurídica. Isso significa afirmar que, uma vez preenchidos os requisitos do art. 50, do CC, os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações dos sócios e dos administradores poderão ser estendidos aos bens da pessoa jurídica. Essa é a desconsideração em sentido inverso. Questão importante é saber se o sócio teria interesse em recorrer de uma decisão que decreta a desconsideração inversa da personalidade jurídica. Isso porque, para o sócio, à primeira vista, seria interessante ter mais alguém responsável pelo pagamento da sua dívida. Nessa linha de raciocínio, se tem mais alguém para pagar, isso seria melhor para o devedor originário, faltando-lhe interesse para recorrer de uma decisão que lhe seria até benéfica. Porém, em julgado recente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o sócio tem interesse recursal nesses casos. Confira-se, a propósito, a ementa da decisão: "RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUE DEFERIU O PEDIDO DE DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE DO SÓCIO EXECUTADO. LEGITIMIDADE E INTERESSE RECURSAL DO SÓCIO PARA RECORRER DA DECISÃO. EXISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O propósito recursal consiste em definir, além da ocorrência de negativa de prestação jurisdicional, a legitimidade e o interesse recursal do sócio executado para impugnar a decisão que deferiu o pedido de desconsideração inversa da personalidade jurídica dos entes empresariais dos quais é sócio. (...) 3. A jurisprudência desta Corte Superior assenta-se no sentido de que, sendo deferido o pedido de desconsideração, o interesse recursal da empresa devedora originária é excepcional, evidenciado no propósito de defesa do seu patrimônio moral, da honra objetiva, do bom nome, ou seja, da proteção da sua personalidade, abrangendo, inclusive, a sua autonomia e a regularidade da administração, inexistindo, por outro lado, interesse na defesa da esfera de direitos dos sócios/administradores. 4. Na desconsideração inversa da personalidade jurídica, por sua vez, verifica-se que o resultado do respectivo incidente pode interferir não apenas na esfera jurídica do devedor (decorrente do surgimento de eventual direito de regresso da sociedade em seu desfavor ou do reconhecimento do seu estado de insolvência), mas também na relação jurídica de material estabelecida entre ele e os demais sócios do ente empresarial, como porventura a ingerência na affectio societatis. 5. Desse modo, sobressaem hialinos o interesse e a legitimidade do sócio devedor, tanto para figurar no polo passivo do incidente de desconsideração inversa da personalidade jurídica, quanto para recorrer da decisão que lhe ponha fim, seja na condição de parte vencida, seja na condição de terceiro em relação ao incidente, em interpretação sistemática dos arts. 135 e 996 do Código de Processo Civil de 2015, notadamente para questionar sobre a presença ou não, no caso concreto, dos requisitos ensejadores ao deferimento do pedido. 6. Recurso especial conhecido e parcialmente provido". (REsp n. 1.980.607/DF, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 9/8/2022, DJe de 12/8/2022, grifos nossos.) Com o devido respeito, não é possível concordar com a afirmação de que haveria uma ação de regresso daquele que teve o seu patrimônio atingido pela desconsideração da personalidade jurídica (a sociedade) contra o sócio a justificar o seu interesse recursal. É bem verdade que o julgado acima mencionado se escora em respeitável doutrina para sustentar tal afirmação. Veja-se: "Em viés semelhante, asseveram Fernando da Fonseca Gajardoni e outros ser evidente o interesse jurídico do devedor originário, pois, havendo o acolhimento do pleito de desconsideração e a satisfação da obrigação através do patrimônio do terceiro atingido pela desconsideração, surge para este o direito de regresso em face do devedor. (Comentários ao Código de Processo Civil. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 205)". Entretanto, é forçoso reconhecer que quando a teoria da desconsideração da personalidade jurídica é aplicada, o integrante da pessoa jurídica responde por dívida própria. Essa responsabilidade do integrante da pessoa jurídica decorre do fato de ele ter se beneficiado de uma atividade abusiva e lesiva realizada por meio da pessoa jurídica (SALOMÃO FILHO, Calixto. "O novo direito societário". 2ª ed., São Paulo: Malheiros, 2002. p. 202).   Como o signatário já teve oportunidade de asseverar "É possível perceber, portanto, que a responsabilidade decorrente da aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica não pode ser confundida com a responsabilidade civil decorrente da 'teoria dualista da obrigação', pois com ela se admite que o responsável exerça seu direito de regresso em face do devedor, caso o primeiro pague a dívida do segundo. (...) Porém, como já asseverado, a teoria dualista da obrigação não é de grande utilidade para se entender a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica. Isso porque não se pode considerar que quando a teoria da desconsideração é aplicada a pessoa jurídica passa a ser considerada a devedora e o seu integrante para a ser considerado o responsável pela dívida. Se assim fosse, haveria uma verdadeira contradição na aplicação da disregard doctrine: ao mesmo tempo que se afirma desconsiderar a personalidade jurídica, ela seria considerada para se entender que uma pessoa seria responsável e outra pessoa seria a devedora. Na verdade, decorre da aplicação da disregard doctrine que a pessoa jurídica e seu integrante, sociedade e sócio, são na realidade uma só pessoa, ambos devedores e responsáveis pelo adimplemento da mesma dívida" (SOUZA, André Pagani de. Desconsideração da personalidade jurídica: aspectos processuais. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 89-90). O mesmo raciocínio acima exposto vale para a desconsideração inversa da personalidade jurídica. Não há ação de regresso cabível pois a responsabilidade é primária e não secundária. A pessoa jurídica participou do ato abusivo e fraudulento e portanto responde por ato próprio. Dívida e responsabilidade estão concentradas na mesma pessoa. Em razão do exposto, não se pode concordar com este argumento utilizado pelo STJ no acórdão acima mencionado de que haveria uma ação de regresso cabível para justificar o interesse recursal do sócio na desconsideração da personalidade jurídica inversa. Quanto aos demais argumentos, em razão do espaço, vamos deixar a sua análise para outra oportunidade aqui na Coluna "CPC na prática". Mas com esse argumento, da existência de possível e eventual ação de regresso a justificar o interesse recursal, não se pode concordar, respeitadas as opiniões em contrário.
Como já tivemos a oportunidade de ilustrar, a execução, no Brasil, é um fator de forte preocupação para se alcançar o almejado patamar de efetividade processual idealizado pelo legislador no artigo 4 do CPC/15. Nos índices apresentados pelo Justiça em Números do CNJ, existem mais de "79 milhões de demandas em tramitação, das quais nada menos do que 42,81 milhões são de natureza executiva fiscal, civil e cumprimento de sentenças, equivalente a 54,2% de todo o acervo do Poder Judiciário (...) Os dados do CNJ ainda indicam que apenas 14,9% desses processos de execução atingem a satisfação do crédito perseguido, enquanto a taxa de congestionamento é de 85,1%, ou seja, de cada 100 processos de execução que tramitavam em 2018, somente 14,9 obtiveram baixa definitiva nos mapas estatísticos."1 No levantamento mais recente, reconheceu-se que uma grande causa dos alarmantes números de execuções pendentes é a falta de localização de bens do devedor: "Há de se destacar, no entanto, que há casos em que o Judiciário esgotou os meios previstos em lei e ainda assim não houve localização de patrimônio capaz de satisfazer o crédito, permanecendo o processo pendente. Ademais, as dívidas chegam ao judiciário após esgotados os meios de cobrança administrativos - daí a difícil recuperação."2 Neste cenário, conforme já escrevemos3, um procedimento eficiente de busca de bens do devedor seria um forte aliado nessa cruzada contra a falta de efetividade e eficiência na implementação dos atos executivos. O tema também traça interessante comunicação com as previsões do CPC/15 que estipulam medidas de reforço à efetividade e à cooperação processual, tais como a prevista no artigo 772, III, do CPC/15. Vale realçar que o artigo 772 do CPC/15 reforça o dever do juiz de determinar que sujeitos indicados pelo exequente forneçam informações em geral relacionadas ao objeto da execução, tais como documentos e dados que tenham em seu poder, assinando-lhes prazo razoável4. Reforça-se que a ideia da cooperação do magistrado na localização de bens do devedor, na ação de execução, também foi vista como essencial pelo professor Flávio Luiz Yarshell,5 para quem "deixar o interessado entregue à própria sorte na busca de dados que, por circunstâncias jurídicas (como a preservação do sigilo e da intimidade) ou práticas, não pode razoavelmente atingir é ignorar que o cumprimento das decisões judiciais (ou mesmo dos direitos que o ordenamento indica como reconhecidos em títulos extrajudiciais) interessa antes de tudo ao Estado (...)".  Em linha com o artigo 6º. do CPC/15, efetivar as providências do artigo 772 do CPC/15, em uma postura mais cooperativa do Poder Judiciário na busca e localização de bens do devedor, seria um fator de contribuição para a melhor eficiência do processo de execução no Brasil. Como acertadamente lembra Miguel Teixeira de Sousa6, "o êxito da execução depende exclusivamente dos bens que nela possam ser penhorados". E Flávio Luiz Yarshell7 já bem observou que "... não é difícil compreender que quanto mais amplo o acervo sujeito à regra da responsabilidade patrimonial, tanto mais fácil (ou menos difícil) se torna a tarefa de satisfazer o credor". É claro que, no caso de ausência de bens, o devedor não terá como pagar o débito, sendo a execução infrutífera; não importando quantas medidas atípicas o magistrado defira em favor do credor. Ao saber quais são e onde estão os bens penhoráveis do devedor, o credor e o magistrado já poderão se posicionar, de forma mais eficiente, para as providências de expropriação do patrimônio daquele que deve.   Daí a crucial e relevante importância da recente ferramenta do CNJ denominada "Sniper", que muito pode auxiliar os sujeitos processuais na localização de bens do devedor. Conforme noticiado8: "O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançou, nesta terça-feira (16/8), ferramenta digital para agilizar e centralizar a busca de ativos e patrimônios em diversas bases de dados. O Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos (Sniper), desenvolvido no Programa Justiça 4.0, identifica em segundos os vínculos patrimoniais, societários e financeiros entre pessoas físicas e jurídicas. Com isso, a expectativa é que a busca de ativos - que hoje chega a levar meses e mobiliza uma equipe especializada em investigação patrimonial a partir da análise de documentos - possa ser feita rapidamente. Os resultados são representados em grafos (conjunto de informações e das relações existentes entre eles) de fácil compreensão pela magistratura, indicando as ligações entre os atores de forma simples, o que contribui para reduzir o tempo de conclusão dos processos na fase de execução e cumprimento de sentença - maior gargalo atual dos processos judiciais (...).Com uma interface amigável e navegação intuitiva em plataforma web, o Sniper já disponibiliza uma consulta rápida a bases de dados abertas e fechadas, com a possibilidade de incluir novas bases de informações. O acesso ao sistema só é ser feito por pessoas autorizadas, a partir da decisão de quebra de sigilo, para garantir a segurança das informações. Por meio do sistema, usuários e usuárias podem buscar dados de pessoas físicas e jurídicas pelo nome, CPF, razão social, nome fantasia ou CNPJ. É possível visualizar as informações, a relação de bens e ativos (incluindo aeronaves e embarcações) e as relações com outras pessoas físicas e jurídicas. As informações podem ser exportadas em um relatório no formato .pdf e anexadas a um processo judicial. Atualmente, já estão integrados ao Sniper os dados de CPF e CNPJ, as bases de candidatos e bens declarados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), informações sobre sanções administrativas, empresas punidas e acordos de leniência (CGU), dados do Registro Aeronáutico Brasileiro (Anac), embarcações listadas no Registro Especial Brasileiro (Tribunal Marítimo) e informações sobre processos judiciais, como partes, classe, assunto dos processos e valores (cabeçalho processual, do CNJ). No módulo de dados sigilosos, poderão ser adicionadas informações fiscais e bancárias, com acesso restrito a usuários autorizados, a partir da integração com o Infojud e Sisbajud". É certo que quanto mais eficaz for o uso da ferramenta do CNJ, em conformidade com o espírito da efetividade, eficiência e cooperação, melhor será a contribuição para almejarmos com uma execução cada vez mais próxima dos ditames do artigo 4 e 8 do CPC/15. __________ 1 Disponível aqui. 2 Disponível aqui. 3 Disponível aqui. 4 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: RT, 2015. p. 842. No mesmo sentido: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins. RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. TORRES de MELLO, Rogério Licastro. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 2ª. Edição. São Paulo: RT, 2015. p. 1228. 5 YARSHELL, Flávio Luiz. Antecipação da Prova sem o Requisito da Urgência e Direito Autônomo à Prova. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 183. 6 SOUSA, Miguel Teixeira de. A reforma da acção executiva. Lisboa: Lex, 2004. p. 25. 7 YARSHELL, Flávio Luiz. A Ampliação da responsabilidade patrimonial: caminho para solução da falta de efetividade da execução civil brasileira? In: ALVIM, Arruda; ARRUDA ALVIM, Eduardo; BRUSCHI, Gilberto Gomes; CHECHI, Mara Larsen; COUTO, Mônica Bonetti. Execução Civil e temas afins. São Paulo: RT, 2014. p. 392.  8 CNJ lança ferramenta que permite identificar ativos e agilizar execução.
Uma das maiores e mais comemoradas inovações trazidas pelo Código de Processo Civil de 2.015 foi a criação do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica, que possibilita o prévio contraditório sobre as alegações do Requerente, no prazo de 15 dias, e com ampla possibilidade probatória, nos termos dos artigos 133 a 137 do Código de Processo Civil. No caso clássico de desconsideração, a empresa figura como devedora e seus sócios são tidos como responsáveis secundários no caso de ocorrência das previsões constantes do artigo 50 do Código Civil e 28 do Código do Consumidor. Temos também a desconsideração inversa, na qual o sócio é o devedor e a sociedade empresarial é a responsável patrimonial secundária, quando constatado que o sócio transferiu seu patrimônio pessoal para a sociedade empresarial com o objetivo de frustrar a satisfação de seus credores. Mesmo não sendo positivada em nosso ordenamento, a desconsideração inversa é amplamente aceita pela Doutrina e pela Jurisprudência1, sendo que o artigo 133, § 2º, do Código acabou também prevendo a aplicação do incidente para esses casos.  Dúvida que surgiu é se deferida a desconsideração a empresa, no caso da desconsideração tradicional e o sócio, no caso da desconsideração inversa, teriam legitimidade para recorrer de tal decisão. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, após decisões conflitantes entre Turmas, já havia decidido quanto a possibilidade da empresa recorrer no caso de desconsideração tradicional da Personalidade Jurídica:  "PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. PESSOA JURÍDICA. DESCONSIDERAÇÃO. PEDIDO DEFERIDO. IMPUGNAÇÃO. LEGITIMIDADE RECURSAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NÃO PROVIDOS. 1. Trata-se de embargos de divergência interpostos contra acórdão que decide legitimidade da pessoa jurídica para interpor recurso de pronunciamento judicial que desconsidera a personalidade jurídica. 2. No caso, entendeu-se que, diante do rol de legitimados à interposição de recursos (arts. 499 do Código de Processo Civil de 1973 e 996 do Código de Processo Civil de 2015), do qual emerge a noção de sucumbência fundada no binômio necessidade/utilidade, a pessoa jurídica detém a mencionada legitimidade quando tiver potencial bastante para atingir o patrimônio moral da sociedade. Fundamenta-se tal entendimento no fato de que à pessoa jurídica interessa a preservação de sua boa fama, assim como a punição de condutas ilícitas que venham a deslustrá-la. 3. Os fundamentos trazidos no acórdão recorrido estão mais condizentes com a própria noção de distinção de personalidades no ordenamento jurídico pátrio. A pessoa jurídica, como ente com personalidade distinta dos sócios que a compõem, também possui direitos a serem preservados, dentre eles o patrimônio moral, a honra objetiva, o bom nome. De fato, o argumento da falta de interesse na reforma da decisão, tendo em vista o fato de que apenas os sócios seriam prejudicados com a resolução (já que é sobre os seus bens particulares que recairia a responsabilidade pelas obrigações societárias), mostra-se frágil. 4. "O interesse na desconsideração ou, como na espécie, na manutenção do véu protetor, pode partir da própria pessoa jurídica, desde que, à luz dos requisitos autorizadores da medida excepcional, esta seja capaz de demonstrar a pertinência de seu intuito, o qual deve sempre estar relacionado à afirmação de sua autonomia, vale dizer, à proteção de sua personalidade. Assim, é possível, pelo menos em tese, que a pessoa jurídica se valha dos meios próprios de impugnação existentes para defender sua autonomia e regular administração, desde que o faça sem se imiscuir indevidamente na esfera de direitos dos sócios/administradores incluídos no polo passivo por força da desconsideração" (REsp 1.421.464/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 24/4/2014, DJe 12/5/2014) 5. Embargos de divergência conhecidos, aos quais se nega provimento." (EREsp n. 1.208.852/SP, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 4/5/2016, DJe de 20/5/2016.) Em recentíssimo julgado, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que em caso de desconsideração inversa, o sócio também seria legitimado a recorrer de tal decisão:  "RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUE DEFERIU O PEDIDO DE DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE DO SÓCIO EXECUTADO. LEGITIMIDADE E INTERESSE RECURSAL DO SÓCIO PARA RECORRER DA DECISÃO. EXISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O propósito recursal consiste em definir, além da ocorrência de negativa de prestação jurisdicional, a legitimidade e o interesse recursal do sócio executado para impugnar a decisão que deferiu o pedido de desconsideração inversa da personalidade jurídica dos entes empresariais dos quais é sócio. 2. Verifica-se que o Tribunal de origem analisou todas as questões relevantes para a solução da lide, de forma fundamentada, não havendo falar em negativa de prestação jurisdicional. 3. A jurisprudência desta Corte Superior assenta-se no sentido de que, sendo deferido o pedido de desconsideração, o interesse recursal da empresa devedora originária é excepcional, evidenciado no propósito de defesa do seu patrimônio moral, da honra objetiva, do bom nome, ou seja, da proteção da sua personalidade, abrangendo, inclusive, a sua autonomia e a regularidade da administração, inexistindo, por outro lado, interesse na defesa da esfera de direitos dos sócios/administradores. 4. Na desconsideração inversa da personalidade jurídica, por sua vez, verifica-se que o resultado do respectivo incidente pode interferir não apenas na esfera jurídica do devedor (decorrente do surgimento de eventual direito de regresso da sociedade em seu desfavor ou do reconhecimento do seu estado de insolvência), mas também na relação jurídica de material estabelecida entre ele e os demais sócios do ente empresarial, como porventura a ingerência na affectio societatis. 5. Desse modo, sobressaem hialinos o interesse e a legitimidade do sócio devedor, tanto para figurar no polo passivo do incidente de desconsideração inversa da personalidade jurídica, quanto para recorrer da decisão que lhe ponha fim, seja na condição de parte vencida, seja na condição de terceiro em relação ao incidente, em interpretação sistemática dos arts. 135 e 996 do Código de Processo Civil de 2015, notadamente para questionar sobre a presença ou não, no caso concreto, dos requisitos ensejadores ao deferimento do pedido. 6. Recurso especial conhecido e parcialmente provido." (g.n.) (REsp n. 1.980.607/DF, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 9/8/2022, DJe de 12/8/2022.) Desse modo a jurisprudência acompanha o entendimento da doutrina majoritária, que defende a existência de legitimidade recursal em face de quem tem a desconsideração decretada. Por todos cita-se o entendimento do Professor Cássio Scarpinella Bueno: "Quando se tratar de desconsideração da pessoa jurídica, para a responsabilização do sócio, contudo, tem a própria pessoa jurídica legitimidade recursal? E se tratar da chamada "desconsideração inversa", o próprio sócio tem legitimidade recursal? As respostas positivas a estas duas questões pressupõem que a pessoa jurídica e a pessoa natural consigam demonstrar interesse jurídico próprio no caso concreto para que, ainda que na qualidade de terceiros em relação ao incidente, atestem a sua legitimidade recursal. Ao caso, merece ser aplicada, portanto, a mesma diretriz que o parágrafo único do art. 966 reserva para o recurso de terceiro".2   Portanto, em caso de desconsideração da personalidade jurídica o devedor principal terá legitimidade para recorrer nos casos em que provar que tem interesse jurídico próprio na interposição do recurso. ______________ 1 Segundo o professor José Roberto dos Santos Bedaque: "Admite-se expressamente a denominada desconsideração inversa (art. 133, § 2º), aceita pela doutrina e pela jurisprudência no regime processual anterior. Trata-se de fenômeno segundo o qual a pessoa física, mediante atos simulados ou fraudulentos, procura furta-se ao cumprimento de obrigações, transferindo bens a pessoa jurídica da qual é sócio." (Comentários ao Código de Processo Civil: da intervenção de terceiros até da defensoria pública: vol. III: art. 119 a 187, coordenação José Roberto Ferreira Gouvêa, Luis Guilherme Aidar Bondioli, João Francisco Naves da Fonseca, São Paulo: Saraiva, 2019, p. 130). 2 Comentários ao Código de processo civil, vol. 1, São Paulo: Saraiva, 2017, p. 582/583.
No tocante ao procedimento ligado a medida cautelar, o CPC/73 previa em seu art. 806 o prazo de 30 (trinta) dias para formulação do pedido principal, contados da data da efetivação da medida cautelar, quando esta for concedida em procedimento preparatório1. O CPC/2015, ao disciplinar dentre as tutelas provisórias de urgência, a chamada tutela cautelar requerida em caráter antecedente (arts. 305 a 310), disciplinou, em seu art. 308, o prazo de 30 (trinta) dias para formulação do pedido principal, prazo esse contado da efetivação da tutela cautelar. A inovação procedimental ligado ao instituto ficou por conta da formulação de referido pedido principal (i) nos mesmos autos em que tramita a tutela cautelar e, (ii) dispensado o adiantamento de novas custas processuais. Ainda, a tutela cautelar restou aprimorada com vistas a permitir que autor, querendo, (iii) veicule o pedido principal diretamente com o pedido de tutela cautelar (art. 308, § 1º). Por sua vez, o CPC em vigor disciplina que os prazos correm em dias úteis, regra que ocupa o art. 219, frisando o legislador que a observância de tal regra é restrita aos prazos processuais2. Dúvida há de surgir, portanto, se o prazo previsto no art. 308 do CPC em vigor há de ser contado em dias úteis ou corridos (tal qual o regime do CPC/73). Em verdade o exame de tal questão reside em saber a natureza jurídica do prazo previsto para a formulação do pedido principal ligado a tutela cautelar antecedente. Recentemente a Primeira Turma do STJ examinou a questão: "PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE. PRAZO PARA A FORMULAÇÃO DO PEDIDO PRINCIPAL. NATUREZA JURÍDICA. DECADENCIAL. CONTAGEM EM DIAS CORRIDOS. 1. Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC (Enunciado n. 3 do Plenário do STJ). 2. À luz dos arts. 806 e 808 do CPC/1973, este Tribunal Superior sedimentou entendimento jurisprudencial segundo o qual "a falta de ajuizamento da ação principal no prazo do art. 806 do CPC acarreta a perda da eficácia da liminar deferida e a extinção do processo cautelar" (Súmula 482 do STJ). À época, a orientação jurisprudencial deste Tribunal era pela natureza decadencial do prazo de 30 dias para o ajuizamento da ação principal. Precedentes. 3. Na vigência do CPC/2015, mantem-se a orientação pela natureza decadencial do prazo de 30 dias para a formulação do pedido principal (art. 308 do CPC/2015), razão pela qual deve ser contado em dias corridos, e não em dias úteis, regra aplicável somente para prazos processuais (art. 219, parágrafo único). 4. No caso dos autos, o recurso não pode ser conhecido porque o acórdão recorrido está em conformidade com a orientação jurisprudencial deste Tribunal. Observância da Súmula 83 do STJ. 5. Agravo interno não provido." (STJ, AgInt no REsp n. 198.2986/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, v.u., j. 21.06.2022, grifou-se) Ao enfrentar a questão, o voto condutor bem examinou: "(...) Pois bem. Como se observa, para o órgão julgador, o prazo para a formulação do pedido principal deve ser contado em dias corridos porque seria teria natureza decadencial, e não processual, hipótese em que o prazo seria contado em dias úteis. Deve ser mantido, à luz da jurisprudência deste Tribunal Superior. Com efeito, ainda na vigência do CPC/1973, à luz dos arts. 806 e 808, este Tribunal Superior sedimentou entendimento jurisprudencial segundo o qual "a falta de ajuizamento da ação principal no prazo do art. 806 do CPC acarreta a perda da eficácia da liminar deferida e a extinção do processo cautelar" (Súmula 482 do STJ). Ao se consultar os precedentes mencionados na proposta da referida súmula, percebe-se que, à época, havia orientação jurisprudencial deste Tribunal pela natureza decadencial do prazo de 30 dias para o ajuizamento da ação principal, daí porque a não observância resultava na extinção do processo cautelar. Nesse sentido, dentre outros: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CAUTELAR. CONTAGEM DE PRAZO PARA AJUIZAMENTO DA AÇÃO PRINCIPAL. PRAZO DECADENCIAL. TERMO INICIAL. EFETIVAÇÃO DA LIMINAR. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. 1. Interpretando o artigo 806 do CPC o prazo de trinta dias para o ajuizamento da ação principal é contado a partir da data da efetivação da medida liminar e não da sua ciência ao requerente da cautelar. 2. Em caso de descumprimento do prazo, ocorre a extinção da Ação Cautelar, sem julgamento de mérito. Precedentes. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no Ag 1319930/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/12/2010, DJe 03/02/2011) Direito Processual civil. Cautelar. Indisponibilidade dos bens. Ação Principal. Propositura. Prazo de decadência. Termo inicial. Efetivação da liminar. - Enquanto não efetivada a medida liminar, ou seja, tornados efetivamente indisponíveis os bens dos requeridos, não começa a fluir o prazo de decadência do direito de promover a ação principal. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 687.208/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/10/2006, DJ 16/10/2006, p. 365) PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. MEDIDA CAUTELAR. PRAZO DECADENCIAL. DIES A QUO DO TRINTÍDIO LEGAL. ARESTO EMBARGADO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DA CORTE. 1. Trata-se de agravo regimental interposto por ALBERTO KATZ em face de decisão que negou seguimento a embargos de divergência ao entendimento de encontrar-se superada a dissonância interpretativa entre os julgados indicados. Sustenta o agravante que deve ser reformada a decisão objurgada, pois não pretende que a contagem do prazo decadencial seja feita a partir da ciência do requerente acerca da cautelar deferida pelo juízo de primeira instância. Ao contrário, em absoluta conformidade com o entendimento consolidado desta Corte, sempre partiu da premissa que a contagem do prazo decadencial se inicia com a efetivação da medida liminar, recaindo a discussão, contudo, sobre o momento em que se pode reputar verificada tal efetivação. 2. Há de ser confirmada a decisão agravada no sentido da impossibilidade de se emprestar seguimento a recurso de embargos de divergência que traz à colação aresto cuja tese encontra-se superada nesta Casa. 3. A decisão ora agravada apreciou cuidadosamente a dissidência invocada, tendo lançado fundamentação suficiente para embasar a conclusão adotada, não merecendo sofrer nenhuma alteração. Pretende o embargante, na verdade, suscitar a definição acerca do momento em que a efetivação da medida cautelar pode ser reputada verificada. Mas, conforme consignado no próprio acórdão que examinou os embargos de declaração, a constatação de tal situação implicaria em reexame de matéria fático-probatória, o que é vedado pela Súmula 07/STJ. Não haveria a possibilidade, nesta seara especial, de se certificar se, desde a intimação, o embargante realmente começou a sofrer constrições em seu patrimônio, passando a estar impedido de dispor livremente de seus bens ou não. 4. Agravo regimental não-provido. (AgRg nos EREsp 583.345/RJ, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, CORTE ESPECIAL, julgado em 07/06/2006, DJ 01/08/2006, p. 332). Ainda pela natureza decadencial do prazo, confiram-se: AgInt no AREsp 1351646/CE, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 08/03/2021, DJe 15/03/2021; AgInt nos EDcl no REsp 1801977/MS, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 27/10/2020, DJe 20/11/2020; AgInt no AREsp 898.521/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 13/12/2016, DJe 01/02/2017. Na vigência do CPC/2015, mantem-se a orientação pela natureza decadencial do prazo de 30 dias para a formulação do pedido principal (art. 308 do CPC/2015), razão pela qual deve ser contado em dias corridos, e não em dias úteis, regra aplicável somente para prazos processuais (art. 219, parágrafo único). De fato, quanto aos prazos processuais, a Lei n. 13.105/2015 - CPC/2015 estabelece, que, na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis (art. 209); e que, "decorrido o prazo, extingue-se o direito de praticar ou de emendar o ato processual, independentemente de declaração judicial, ficando assegurado, porém, à parte provar que não o realizou por justa causa" (art. 223). E, no que se refere ao processo cautelar, o CPC/2015 dispõe, ainda, que, efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de 30 dias, sob pena de cessar a eficácia da cautelar, hipótese em que será vedado a renovação do pedido, salvo sob novo fundamento (arts. 308 e 309). No contexto, portanto, deve-se reconhecer que o acórdão recorrido está em conformidade com a orientação jurisprudencial deste Tribunal Superior, razão pela qual não deve ser conhecido o recurso, seja pela alínea 'a' do permissivo, seja pela 'c'. (...)" O recente entendimento do STJ soa acertado, porquanto não nos parece razoável pensar que a circunstância de novel legislação passar a prever a contagem dos prazos em dias úteis retira ou modifica o entendimento de que determinado prazo tem natureza jurídica de decadencial, ocasião cujo cômputo dar-se-á em dias corridos. __________ 1 CPC/73: Art. 806. Cabe à parte propor a ação, no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data da efetivação da medida cautelar, quando esta for concedida em procedimento preparatório. 2 Art. 219. Na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis. Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se somente aos prazos processuais.
É possível a conversão de pedido de reintegração de posse em "ação de execução" quanto o veículo automotor objeto de contrato de arrendamento mercantil ("leasing") não é localizado. Foi o que decidiu a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por votação unânime, nos autos do Recurso Especial n. 1.785.544/RJ, em julgamento realizado em 21.06.2022. Como se sabe, duas modalidades bastante utilizadas para possibilitar a aquisição de bens consistentes em veículos automotores de maneira financiada são o contrato de alienação fiduciária e o contrato de arrendamento mercantil, também conhecido como "leasing". Na hipótese da alienação fiduciária, caso ocorra o inadimplemento do devedor no que diz respeito ao pagamento das parcelas pactuadas para obtenção do financiamento, o credor pode recuperar fisicamente o bem mediante o ajuizamento de "ação de busca e apreensão", nos termos do art. 3º, do decreto-lei 911/1969, com a redação conferida pela lei 13.043/2014, que dispõe o seguinte: "Art. 3o O proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2o do art. 2o, ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, podendo ser apreciada em plantão judiciário". Caso o bem não seja encontrado no curso da "ação de busca e apreensão", o art. 4º, do decreto-lei 911/1969, estabelece expressamente que o credor pode pedir a conversão da "ação de busca e apreensão" em "ação de execução". Confira-se: "Art. 4o Se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou não se achar na posse do devedor, fica facultado ao credor requerer, nos mesmos autos, a conversão do pedido de busca e apreensão em ação executiva, na forma prevista no Capítulo II do Livro II da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil. (Redação dada pela lei 13.043, de 2014)". Já no caso do arrendamento mercantil ("leasing"), na hipótese de inadimplemento do devedor, cabe ao credor propor "ação de reintegração de posse" para recuperar fisicamente o bem objeto do contrato disciplinado lei 6.099/1974. Sem dúvida, existia um tratamento diferenciado conferido pela lei no que diz respeito ao procedimento para o credor retomar o bem objeto do financiamento dependendo da espécie contratual adotada para viabilizar o negócio: alienação fiduciária ou arrendamento mercantil. Em 2014, a lei 13.043, do mesmo ano, inseriu o § 15 no art. 3º do decreto-lei 911/1969, que versa exatamente sobre a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente em garantia na hipótese de inadimplemento do devedor, com o seguinte teor: "§ 15.  As disposições deste artigo aplicam-se no caso de reintegração de posse de veículos referente às operações de arrendamento mercantil previstas na lei 6.099, de 12 de setembro de 1974." Em outras palavras, o dispositivo legal acima transcrito autorizou expressamente a aplicação das normas procedimentais previstas para a alienação fiduciária em garantia de veículos automotores aos casos de reintegração de posse referentes às operações de arrendamento mercantil desses bens. Portanto, em decisão irretocável, o STJ entendeu que é válida a extensão das normas previstas no decreto-lei 911/1969, que trata da alienação fiduciária, às hipóteses de reintegração de posse de veículos que foram objeto de contrato de arrendamento mercantil, também conhecido como "leasing". Veja-se, a propósito, a ementa do julgado: "RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ARRENDAMENTO MERCANTIL. INADIMPLEMENTO. LIMINAR DEFERIDA. VEÍCULO NÃO LOCALIZADO. CONVERSÃO EM AÇÃO DE EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. ART. 4º DO DECRETO-LEI Nº 911/1969. APLICABILIDADE. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Cuida-se, na origem de ação de reintegração de posse que objetiva a retomada de veículo em virtude do inadimplemento de contrato de arrendamento mercantil. O pedido de conversão da ação em processo executivo em virtude da não localização do bem foi indeferido, tendo sido extinto o processo sem resolução de mérito. 3. Cinge-se a controvérsia a definir se, diante da não localização do bem objeto do contrato de arrendamento mercantil, é possível a conversão do pedido de reintegração de posse em ação de execução, por aplicação analógica do decreto-lei 911/1969 que estabelece normas de processo acerca de alienação fiduciária. 4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça traçou orientação no sentido de que, em ação de busca e apreensão processada sob o rito do decreto-lei 911/1969, o credor tem a faculdade de requerer a conversão do pedido de busca e apreensão em ação executiva se o bem não for encontrado ou não se achar na posse do devedor (art. 4º). 5. A lei 13.043/2014, que trouxe modificações no Decreto-Lei nº 911/1969, autoriza a aplicação das normas procedimentais previstas para a alienação fiduciária aos casos de reintegração de posse de veículos referentes às operações de arrendamento mercantil (Lei nº 6.099/1974). 6. Recurso especial provido. (REsp n. 1.785.544/RJ, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 24/6/2022)". Assim, diante da não localização do veículo automotor objeto do contrato de arrendamento mercantil, é possível a conversão do pedido de reintegração de posse em ação de execução, por aplicação analógica do Decreto-Lei nº 911/1969 que estabelece normas de processo acerca de alienação fiduciária. Trata-se da uma decisão acertada da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, que equipara o procedimento a ser adotado para situações muito parecidas, em harmonia com a jurisprudência recente da Corte.
Inspirado na obra de João de Castro Mendes1, o processualista português José Lebre de Freitas2 pontua que "a prova tem por objeto os fatos pertinentes para o objeto do processo". João Batista Lopes3 define provas como: "À demonstração dos fatos (ou melhor, das alegações dos fatos) é que se dá o nome de prova... o vocábulo prova provém do latim probatio, com o significado de verificação, exame, inspeção. De acordo com os dicionaristas, quer dizer 'aquilo que mostra a verdade de uma proposição ou realidade de um fato'. Na linguagem jurídica, o termo é empregado como sinônimo de demonstração (dos fatos alegados no processo). É a chamada prova judiciária". Para o mesmo mestre, as provas podem ser: direta (se refere ao próprio fato objeto da prova) ou indireta (se refere a fato diverso do que efetivamente se pretende demonstrar, mas que com ele se relaciona), pessoal (feita por meio de testemunho ou de depoimento) ou real (feita por meio de objetos e demonstrações), oral (ex: testemunhal) ou escrita (ex: documento)4. E a prova também pode ser emprestada. O novo CPC, no capítulo referente às provas, prevê, em seu art. 372, que: "o juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório". Trata-se da possibilidade de o magistrado validar a utilização da prova emprestada, sendo certo que esta orientação está em consonância com a posição que predomina na doutrina e na jurisprudência pátria. A prova emprestada deve ser entendida como aquela que foi produzida em outro processo e cujos efeitos a parte pretende que sejam apreciados e considerados válidos por magistrado que preside um processo diverso. Para Nelson Nery Jr.5 prova emprestada é "aquela que, embora produzida em outro processo, se pretende produza efeitos no processo em questão. Sua validade como documento e meio de prova, desde que reconhecida sua existência por sentença transitada em julgado, é admitida pelo sistema brasileiro". Para João Batista Lopes, a admissibilidade da prova emprestada depende dos seguintes requisitos: (i) a prova emprestada tem que ter sido produzida em processo com as mesmas partes litigantes; (ii) no processo anterior, o princípio do contraditório deve ter sido observado; e (iii) é fundamental que não seja possível a reprodução da prova6. Para Nelson Nery Jr7., a questão mais importante para a admissão da prova emprestada é a observância do contraditório em relação aos litigantes. Na mesma direção segue Luiz Guilherme Marinoni8, para quem a observância do contraditório na produção da prova é fundamental para que esta possa emprestar os seus efeitos a outros autos. Lição semelhante está na obra de Eduardo J. Couture9: "As provas produzidas em outro juízo podem ser válidas, se nele a parte teve a oportunidade de empregar contra elas todos os meios de controle e de impugnação que a lei lhe conferia no juízo em que foram produzidas (...). Da mesma maneira, as provas do juízo penal podem ser válidas no juízo cível, se no processo criminal a parte teve a oportunidade de exercer contra elas todas as formas de impugnação facultadas pelo processo penal". No Fórum Permanente de Processualistas Civis do IBDP - Instituto Brasileiro de Direito Processual, no encontro de Salvador, foi votado, em 2013, enunciado sugerido pelo Centro de Estudos Avançados de Processo (Ceapro), sendo aprovado por unanimidade que, para fins de admissão da prova emprestada, o princípio do contraditório deve ser observado tanto no processo de origem, no qual se formou a prova, como no processo de destino, no qual se pretende utilizar a prova produzida no processo anterior. A necessidade de observância do princípio do contraditório nas duas esferas, tanto no processo de origem como no processo de destino, é fundamental para que a prova emprestada possa ser validamente admitida no direito processual civil pátrio; tudo de modo a se respeitar o direito constitucionalmente protegido de zelar-se pelo devido processo legal. Em recente julgado, o STJ se posicionou no sentido de que: "10. Não se pode ignorar o fato de que a prova emprestada tem como fundamento os princípios da economia processual, da eficiência e da celeridade, tendo em vista que se evita a repetição desnecessária da produção de prova de idêntico conteúdo, a qual tende a ser demasiado lenta e dispendiosa, notadamente em se tratando de provas periciais na realidade do Poder Judiciário brasileiro. Ademais, a medida garante a obtenção do mesmo resultado útil, em menor período de tempo, em consonância com a garantia constitucional da duração razoável do processo.11. Nos EREsp n. 617.428, julgado pela Corte Especial, firmou-se o entendimento de que a prova emprestada não pode se restringir a processos em que figurem partes idênticas, sob pena de se reduzir excessivamente sua aplicabilidade, sem justificativa razoável para tanto (EREsp n. 617.428/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe de 17/6/14)" (AgInt no AREsp 1.827.101 / RJ, 2ª. turma, ministro Og Fernandes, j. 29/11/21). Em outro recente julgado, o STJ, com enfoque para a importância do contraditório, prescreveu que: "1. É assente o entendimento desta Corte Superior sobre a admissibilidade de prova emprestada, uma vez observado o devido contraditório, ainda que as partes não tenham participado do feito para o qual a prova será trasladada (EREsp 617.428-SP, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe de 17/6/14). 2. No caso, além de haver identidade substancial de partes e o objeto da prova ser o mesmo, a exigência do contraditório foi observada, uma vez que os réus foram intimados e ofereceram suas respectivas contestações, por meio das quais puderam se pronunciar sobre a prova emprestada, insurgindo-se, inclusive, contra os seus efeitos. Desse modo, é de se ressaltar a desnecessidade da produção de prova testemunhal e de depoimento pessoal dos ora recorrentes, na medida em que a discussão sobre o crime praticado não necessitaria ser repetida nos presentes autos." (AgInt no AREsp 1.333.528 / SP, 3ª. turma, ministro Marco Aurelio Bellizze, j. 19/8/19). Não há dúvida que o regular uso da prova emprestada pode contribuir para a fluência e o dinamismo do processo civil; sendo importante, contudo, que se respeite o princípio do contraditório tanto no processo em que a prova foi produzida, como no processo em que ela será utilizada como emprestada, tudo de modo a se respeitar sempre o devido processo legal e o princípio da proibição da prova ilícita. _____ 1 MENDES, João de Castro. Do conceito de prova em processo civil. Lisboa: Ática, 1961. 2 FREITAS, José Lebre de. A ação declarativa comum. Coimbra: Coimbra Editora, 2013. p. 201. 3 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. São Paulo: RT, 3ª. Edição. 2006. p.25. 4 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. São Paulo: RT, 3ª. Edição. 2006. p. 35 e 36. 5 NERY Jr., Nelson. Princípios do processo civil na constituição federal. São Paulo: RT, 8ª. edição. p. 190. 6 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. São Paulo: RT, 3ª. Edição. 2006. p. 65 e 66. 7 NERY Jr., Nelson. Princípios do processo civil na constituição federal. São Paulo: RT, 8ª. edição. p. 191. 8 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do processo de conhecimento. São Paulo: RT, 3ª. Edição, 2006. p. 323. 9 COUTURE, Eduardo J. Fundamentos do direito processual civil. Tradução: Henrique de Carvalho. Florianópolis: Conceito Editorial. 2008. p. 125.
A comunidade jurídica ficou em polvorosa com a publicação, em 15/7/22, da EC 125, que prevê "a relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso" como requisito de admissibilidade dos REsp. Segundo o presidente do STJ: "A PEC corrige uma distorção do sistema, ao permitir que o STJ se concentre em sua missão constitucional de uniformizar a interpretação da legislação federal. O STJ, uma vez implementada a emenda constitucional, exercerá de maneira mais efetiva seu papel constitucional, deixando de atuar como terceira instância revisora de processos que não ultrapassam o interesse subjetivo das partes".1 É notório que o STJ recebe uma carga muito grande de processos, aproximadamente 10 mil novos processos por ministro a cada ano. Como o Tribunal permanece em recesso nos meses de janeiro e julho, temos uma média de 1.000 processos a serem julgados todo mês pelos ministros. Obviamente por mais que cada ministro possua muitos assessores, é um número que acaba inviabilizando grandes discussões nos casos julgados e que levou à criação do nefasto expediente da jurisprudência defensiva para a eliminação sumária de recursos. Em artigo publicado anteriormente nessa coluna já tivemos oportunidade de defender "que se os Tribunais possuem muitos recursos a serem julgados, que se criem filtros objetivos para selecionar os recursos que devem ser julgados e os que não. O que não se pode admitir é a criação de armadilhas não previstas em lei ou exacerbando a previsão legal e que surpreendem diuturnamente a advocacia e o jurisdicionado."2 Portanto, se tivéssemos a substituição de um limitador recursal subjetivo e não previsto em lei por outro objetivo e com previsão legal teríamos realmente muito a comemorar. Entretanto, não se pode ser ingênuo e, pelo menos num primeiro momento, devemos ter esses dois limitadores trabalhando concomitantemente e barrando o julgamento da imensa maioria dos recursos. É de se esperar que com o tempo a relevância venha a cumprir o seu papel e a jurisprudência defensiva deixe de ser necessária para limitar o número de recursos a serem julgados no STJ. Desde muito a doutrina entendia que seria necessária a instituição de um filtro também para o STJ3. Entretanto, sempre se discutiu quanto aos problemas que podem advir de tal limitação, já que ainda não temos a cultura de respeito aos precedentes arraigada em nosso ordenamento, a jurisprudência de nossos tribunais superiores ainda se altera com certa facilidade e o número de recursos especiais providos não se mostra desprezível4. A grande discussão que se passou a travar é quanto ao termo inicial da necessidade da demonstração da relevância. De fato, no §2 introduzido pela EC 125 consta a expressão "nos termos da lei". Não obstante, estranhamente, o art. 2º da EC prevê que suas novas disposições se aplicam aos recursos especiais interpostos após início da sua vigência, que se deu com sua publicação em 15/7/22. Parece clara a necessidade da edição de lei regulamentando a relevância nos recursos especiais, assim como aconteceu quando da instituição da repercussão geral. Portanto, tal requisito não poderia ser exigido de imediato5. Entretanto, cabe aos operadores serem cautelosos e fazerem desde já em seus recursos especiais um capítulo similar ao utilizado nos RE, para tratar da relevância das questões de direito federal infraconstitucional. _____ 1 Disponível aqui. 2 Publicação em 21/03/2019. Disponível aqui. 3 Nesse sentido é o entendimento de Carlos Frederico Bastos Pereira: "A introdução de um filtro recursal de admissibilidade nos recursos especiais mostra-se a saída para que o STJ se pronuncie apenas sobre questões federais infraconstitucionais dotadas de relevância e transcendência. Essa alteração poderá promover ganhos não só quantitativos, mas também qualitativos, na medida em que a Corte poderá dedicar seu tempo para julgamento de casos importantes ao desenvolvimento da ordem jurídica brasileira. (Revista Eletrônica de Direito Processual - REDP, Ano 13. Volume 20. Número 2. Maio a Agosto de 2019, p. 42). 4 Nesse sentido Marco Aurélio Serau Jr. E Denis Donoso mostravam essa preocupação desde o início da tramitação da PEC da Relevância: "Com efeito, o percentual de reforma de acórdãos está na média de 15%, o que já é um número elevado, em nosso sentir. Tais percentuais - pasme-se - conhece picos de 30 a 50% de reforma em relação a determinados Tribunais e matérias. Tal dado estatístico é mais do que suficiente para a manutenção do papel do recurso especial como mecanismo de controle dos Tribunais inferiores. Não pode haver dúvidas, em outras palavras, de que esse quadro exigiria maior cuidado em relação á tomada de posição quanto aos temas que seriam excluídos de apreciação pelo STJ, diante do reconhecimento da ausência de relevância das questões federais. Por fim, não é exagero agregar que as "engenharias jurídicas" cujo escopo é a redução do número de processos que sobrecarregam o Judiciário representam um remédio amargo e que nem sempre cura o paciente." (Relevância da Questão Federal como filtro de admissibilidade do Recurso Especial: Análise das Propostas de EC 209/12 e n. 17/13, in Revista de Processo, 224, outubro de 2013, p. 250).   5 Nesse sentido é o entendimento do professor Elpídio Donizetti: "Calma.   A exigência do requisito da "relevância das questões de direito federal infraconstitucional" ainda vai demorar um pouco para ser implementada. Fica na dependência da edição da lei. Como já dito, certamente haverá alteração do CPC". Disponível aqui.
Em pretérita edição desta coluna registramos a preocupação quanto a não aplicação, em determinados julgados, do art. 85, § 2º, do CPC/2015, cujo novel dispositivo apontou critérios objetivos quando do arbitramento da verba honorária advocatícia sucumbencial, fixada entre o mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. Em contrapartida, as hipóteses de arbitramento de honorários por equidade ficaram limitadas a situações pontuais reservadas no § 8º, do art. 85: "nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quanto o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º." (grifou-se). A despeito das regras previstas nos parágrafos acima tratarem de situações claras, objetivas e distintas quanto a aplicação do § 8º ou do § 2º, sem prejuízo de igual entendimento de abalizada doutrina, referenciamos precedentes destinados a aplicar o arbitramento por equidade ainda que presente as hipóteses taxativas capituladas no § 2º, retro citado1. Também noutras oportunidades trouxemos razões acerca da necessária aplicação pelo legislador do comando previsto no art. 85, § 2º, de sorte que a equidade somente é permitida aplicação em hipóteses previstas em lei, tal qual impõe o art. 140, do CPC/2015234. Os fundamentos de referida intepretação (seja extensiva, seja contra legem), em síntese, (i) partem do pressuposto de que tal qual quando o valor da causa é muito baixo, aplica-se a equidade, idêntico regime há de ser observado quando o julgador vislumbrar que valor da condenação, do proveito econômico ou o valor da causa é excessivo ou, ainda (ii) a verba honorária arbitrada com base no art. 85, § 2º, por vezes pode constituir quantia exorbitante conferida ao patrono vencedor na demanda, devendo se evitar suposto enriquecimento sem causa. Por fim, o colega Rogério Mollica referenciou o resultado do julgamento do tema n. 1046, levado à efeito pela Corte Especial do STJ aos 16.03.2022, para assim fixar a tese de que a aplicação equitativa não é permitida quando os valores da condenação ou da causa, ou do proveito econômico da demanda, forem considerados elevados, sendo obrigatória a observância da regra objetiva do art. 85. §§s 2º e 3º do CPC5, tendo a tese presente em referido precedente obrigatório também sido aplicada pelo STF6 Finalmente restou publicado o acórdão oriundo do aludido tema n. 1046, valendo transcrever tanto a proposta de afetação quanto a ementa do quanto restou decidido, no sentido de afastar a aplicação da fixação de honorários advocatícios por equidade além da hipótese legal prevista no art. 85, § 8º, do CPC:  "PROCESSUAL CIVIL. PROPOSTA DE AFETAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. ART. 256-I C/C ART. 256-E DO RISTJ, NA REDAÇÃO DA EMENDA REGIMENTAL 24, DE 28/09/2016. ART. 85, § 8º, DO CPC. DEFINIÇÃO DO ALCANCE DO DISPOSITIVO NAS DEMANDAS EM QUE ELEVADOS O VALOR DA CAUSA OU O PROVEITO ECONÔMICO. MULTIPLICIDADE DE PROCESSOS. PARTICIPAÇÃO DE AMICI CURIAE. ART. 138 DO CPC. DESNECESSIDADE DE DETERMINAÇÃO DA SUSPENSÃO DOS PROCESSOS QUE VERSEM SOBRE A QUESTÃO. ART. 1.037, INC. II, DO CPC. PROPOSTA DE AFETAÇÃO ACOLHIDA. 1. Delimitação da controvérsia: "Definição do alcance da norma inserta no § 8º do artigo 85 do Código de Processo Civil nas causas em que o valor da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados.". 2. Recurso especial afetado ao rito do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 (art. 256-I c/c art. 256-E do RISTJ, na redação da Emenda Regimental 24, de 28/09/2016). 3. Convite à Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, à União, ao Colégio Nacional de Procuradorias-Gerais dos Estados e do Distrito Federal - CONPEG, ao Instituto Brasileiro de Direito Processual - IBDP, e à Associação Norte e Nordeste de Professores de Processo - ANNEP, para atuação como amici curiae. 4. Afastada a determinação de suspensão nacional dos processos que versem sobre a matéria. 5. Acolhida a proposta de afetação do recurso especial como representativo da controvérsia, para que seja julgado na Corte Especial (afetação conjunta dos Recursos Especiais 1.850.512/SP e 1.877.883/SP). "PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. ART. 85, §§ 2º, 3°, 4°, 5°, 6º E 8º, DO CPC. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. VALORES DA CONDENAÇÃO, DA CAUSA OU PROVEITO ECONÔMICO DA DEMANDA ELEVADOS. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO POR APRECIAÇÃO EQUITATIVA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. RECURSO JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DO ART. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015, C/C O ART. 256-N E SEGUINTES DO REGIMENTO INTERNO DO STJ. 1. O objeto da presente demanda é definir o alcance da norma inserta no § 8º do artigo 85 do CPC, a fim de compreender as suas hipóteses de incidência, bem como se é permitida a fixação dos honorários por apreciação equitativa quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. 2. O CPC/2015 pretendeu trazer mais objetividade às hipóteses de fixação dos honorários advocatícios e somente autoriza a aplicação do § 8º do artigo 85 - isto é, de acordo com a apreciação equitativa do juiz - em situações excepcionais em que, havendo ou não condenação, estejam presentes os seguintes requisitos: 1) proveito econômico irrisório ou inestimável, ou 2) valor da causa muito baixo. Precedentes. 3. A propósito, quando o § 8º do artigo 85 menciona proveito econômico "inestimável", claramente se refere àquelas causas em que não é possível atribuir um valor patrimonial à lide (como pode ocorrer nas demandas ambientais ou nas ações de família, por exemplo). Não se deve confundir "valor inestimável" com "valor elevado". 4. Trata-se, pois, de efetiva observância do Código de Processo Civil, norma editada regularmente pelo Congresso Nacional, no estrito uso da competência constitucional a ele atribuída, não cabendo ao Poder Judiciário, ainda que sob o manto da proporcionalidade e razoabilidade, reduzir a aplicabilidade do dispositivo legal em comento, decorrente de escolha legislativa explicitada com bastante clareza. 5. Percebe-se que o legislador tencionou, no novo diploma processual, superar jurisprudência firmada pelo STJ no que tange à fixação de honorários por equidade quando a Fazenda Pública fosse vencida, o que se fazia com base no art. 20, § 4º, do CPC revogado. O fato de a nova legislação ter surgido como uma reação capitaneada pelas associações de advogados à postura dos tribunais de fixar honorários em valores irrisórios, quando a demanda tinha a Fazenda Pública como parte, não torna a norma inconstitucional nem autoriza o seu descarte. 6. A atuação de categorias profissionais em defesa de seus membros no Congresso Nacional faz parte do jogo democrático e deve ser aceita como funcionamento normal das instituições. Foi marcante, na elaboração do próprio CPC/2015, a participação de associações para a promoção dos interesses por elas defendidos. Exemplo disso foi a promulgação da Lei n. 13.256/2016, com notória gestão do STF e do STJ pela sua aprovação. Apenas a título ilustrativo, modificou-se o regime dos recursos extraordinário e especial, com o retorno do juízo de admissibilidade na segunda instância (o que se fez por meio da alteração da redação do art. 1.030 do CPC). 7. Além disso, há que se ter em mente que o entendimento do STJ fora firmado sob a égide do CPC revogado. Entende-se como perfeitamente legítimo ao Poder Legislativo editar nova regulamentação legal em sentido diverso do que vinham decidindo os tribunais. Cabe aos tribunais interpretar e observar a lei, não podendo, entretanto, descartar o texto legal por preferir a redação dos dispositivos decaídos. A atuação do legislador que acarreta a alteração de entendimento firmado na jurisprudência não é fenômeno característico do Brasil, sendo conhecido nos sistemas de Common Law como overriding. 8. Sobre a matéria discutida, o Enunciado n. 6 da I Jornada de Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal - CJF afirma que: "A fixação dos honorários de sucumbência por apreciação equitativa só é cabível nas hipóteses previstas no § 8º, do art. 85 do CPC." 9. Não se pode alegar que o art. 8º do CPC permite que o juiz afaste o art. 85, §§ 2º e 3º, com base na razoabilidade e proporcionalidade, quando os honorários resultantes da aplicação dos referidos dispositivos forem elevados. 10. O CPC de 2015, preservando o interesse público, estabeleceu disciplina específica para a Fazenda Pública, traduzida na diretriz de que quanto maior a base de cálculo de incidência dos honorários, menor o percentual aplicável. O julgador não tem a alternativa de escolher entre aplicar o § 8º ou o § 3º do artigo 85, mesmo porque só pode decidir por equidade nos casos previstos em lei, conforme determina o art. 140, parágrafo único, do CPC. 11. O argumento de que a simplicidade da demanda ou o pouco trabalho exigido do causídico vencedor levariam ao seu enriquecimento sem causa - como defendido pelo amicus curiae COLÉGIO NACIONAL DE / CONPEG - deve ser utilizado não para respaldar apreciação por equidade, mas sim para balancear a fixação do percentual dentro dos limites do art. 85, § 2º, ou dentro de cada uma das faixas dos incisos contidos no § 3º do referido dispositivo. 12. Na maioria das vezes, a preocupação com a fixação de honorários elevados ocorre quando a Fazenda Pública é derrotada, diante da louvável consideração com o dinheiro público, conforme se verifica nas divergências entre os membros da Primeira Seção. É por isso que a matéria já se encontra pacificada há bastante tempo na Segunda Seção (nos moldes do REsp n. 1.746.072/PR, relator para acórdão Ministro Raul Araújo, DJe de 29/3/2019), no sentido de que os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser fixados no patamar de 10% a 20%, conforme previsto no art. 85, § 2º, inexistindo espaço para apreciação equitativa nos casos de valor da causa ou proveito econômico elevados. 13. O próprio legislador anteviu a situação e cuidou de resguardar o erário, criando uma regra diferenciada para os casos em que a Fazenda Pública for parte. Foi nesse sentido que o art. 85, § 3º, previu a fixação escalonada de honorários, com percentuais variando entre 1% e 20% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico, sendo os percentuais reduzidos à medida que se elevar o proveito econômico. Impede-se, assim, que haja enriquecimento sem causa do advogado da parte adversa e a fixação de honorários excessivamente elevados contra o ente público. Não se afigura adequado ignorar a redação do referido dispositivo legal a fim de criar o próprio juízo de razoabilidade, especialmente em hipótese não prevista em lei. 14. A suposta baixa complexidade do caso sob julgamento não pode ser considerada como elemento para afastar os percentuais previstos na lei. No ponto, assiste razão ao amicus curiae Instituto Brasileiro de Direito Processual - IBDP, quando afirma que "esse dado já foi levado em consideração pelo legislador, que previu 'a natureza e a importância da causa' como um dos critérios para a determinação do valor dos honorários (art. 85, § 2º, III, do CPC), limitando, porém, a discricionariedade judicial a limites percentuais. Assim, se tal elemento já é considerado pelo suporte fático abstrato da norma, não é possível utilizá-lo como se fosse uma condição extraordinária, a fim de afastar a incidência da regra". Idêntico raciocínio se aplica à hipótese de trabalho reduzido do advogado vencedor, uma vez que tal fator é considerado no suporte fático abstrato do art. 85, § 2º, IV, do CPC ("o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço"). 15. Cabe ao autor - quer se trate do Estado, das empresas, ou dos cidadãos - ponderar bem a probabilidade de ganhos e prejuízos antes de ajuizar uma demanda, sabendo que terá que arcar com os honorários de acordo com o proveito econômico ou valor da causa, caso vencido. O valor dos honorários sucumbenciais, portanto, é um dos fatores que deve ser levado em consideração no momento da propositura da ação. 16. É muito comum ver no STJ a alegação de honorários excessivos em execuções fiscais de altíssimo valor posteriormente extintas. Ocorre que tais execuções muitas vezes são propostas sem maior escrutínio, dando-se a extinção por motivos previsíveis, como a flagrante ilegitimidade passiva, o cancelamento da certidão de dívida ativa, ou por estar o crédito prescrito. Ou seja, o ente público aduz em seu favor a simplicidade da causa e a pouca atuação do causídico da parte contrária, mas olvida o fato de que foi a sua falta de diligência no momento do ajuizamento de um processo natimorto que gerou a condenação em honorários. Com a devida vênia, o Poder Judiciário não pode premiar tal postura. 17. A fixação de honorários por equidade nessas situações - muitas vezes aquilatando-os de forma irrisória - apenas contribui para que demandas frívolas e sem possibilidade de êxito continuem a ser propostas diante do baixo custo em caso de derrota. 18. Tal situação não passou despercebida pelos estudiosos da Análise Econômica do Direito, os quais afirmam com segurança que os honorários sucumbenciais desempenham também um papel sancionador e entram no cálculo realizado pelas partes para chegar à decisão - sob o ponto de vista econômico - em torno da racionalidade de iniciar um litígio. 19. Os advogados devem lançar, em primeira mão, um olhar crítico sobre a viabilidade e probabilidade de êxito da demanda antes de iniciá-la. Em seguida, devem informar seus clientes com o máximo de transparência, para que juntos possam tomar a decisão mais racional considerando os custos de uma possível sucumbência. Promove-se, dessa forma, uma litigância mais responsável, em benefício dos princípios da razoável duração do processo e da eficiência da prestação jurisdicional. 20. O art. 20 da "Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro" (Decreto-Lei n. 4.657/1942), incluído pela Lei n. 13.655/2018, prescreve que, "nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão". Como visto, a consequência prática do descarte do texto legal do art. 85, §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 8º, do CPC, sob a justificativa de dar guarida a valores abstratos como a razoabilidade e a proporcionalidade, será um poderoso estímulo comportamental e econômico à propositura de demandas frívolas e de caráter predatório. 21. Acrescente-se que a postura de afastar, a pretexto de interpretar, sem a devida declaração de inconstitucionalidade, a aplicação do § 8º do artigo 85 do CPC/2015, pode ensejar questionamentos acerca de eventual inobservância do art. 97 da CF/1988 e, ainda, de afronta ao verbete vinculante n. 10 da Súmula do STF. 22. Embora não tenha sido suscitado pelas partes ou amigos da Corte, não há que se falar em modulação dos efeitos do julgado, uma vez que não se encontra presente o requisito do art. 927, § 3º, do CPC. Isso porque, no caso sob exame, não houve alteração de jurisprudência dominante do STJ, a qual ainda se encontra em vias de consolidação. 23. Assim, não se configura a necessidade de modulação dos efeitos do julgado, tendo em vista que tal instituto visa a assegurar a efetivação do princípio da segurança jurídica, impedindo que o jurisdicionado de boa-fé seja prejudicado por seguir entendimento dominante que terminou sendo superado em momento posterior, o que, como se vê claramente, não ocorreu no caso concreto. 24. Teses jurídicas firmadas: i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. ii) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo. 25. Recurso especial conhecido e provido, devolvendo-se o processo ao Tribunal de origem, a fim de que arbitre os honorários observando os limites contidos no art. 85, §§ 3°, 4°, 5° e 6º, do CPC, nos termos da fundamentação. 26. Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e art. 256-N e seguintes do Regimento Interno do STJ. (STJ, REsp 1.850.512/SP, Rel. Min. Og Fernandes, Corte Especial, j. 16/03/2022, DJe 31/05/2022, maioria de votos, grifou-se) Respeitados os entendimentos em sentido contrário ao quanto decidido por maioria de votos pela Corte Especial do STJ, não se pode fechar os olhos de que a intepretação de aplicação da equidade na fixação de honorários advocatícios além da hipótese prevista no art. 85, § 8º do CPC, não obstante na contramão da inteligência do art. 85, § 2º, é limitada ao deixar ao desprezar que; (i)  a condenação da verba sucumbencial constitui ônus financeiro do processo, a desestimular a litigância frívola informada por pedidos dotados de valores exorbitantes, sabedor o autor da demanda (ou o réu, que resiste indevidamente a pretensão autoral), que eventual sucumbência há de incidir em percentual sobre a soma financeira de tais pedidos ou valor da causa, a se materializar, em respeito à boa-fé e cooperação, a formulação de pedidos responsáveis e alinhados com a medida daquilo que o autor efetivamente acredita que tem razão;7 (ii) demandas cujos valores envolvidos soam exorbitantes podem por vezes ser resolvidas mediante meios alternativos de autocomposição, porquanto os litigantes, cientes de que eventual verba sucumbencial proporcional aos valores em disputa será alta, por meio de composições mútuas, podem chegar a um denominador comum em acordo que evitará o litígio judicial e risco de incidência de elevada verba honorária advocatícia sucumbencial; (iii) de igual sorte, a verba honorária sucumbencial fixada em parâmetros elevados (em verdade, cumprindo-se a regra do art. 85, § 2º, do CPC/2015), também desestimula a recorribilidade protelatória, porquanto sobre referida verba arbitrada, na eventualidade de manutenção da decisão impugnada, há de ser majorados os honorários sucumbenciais (art. 85, § 11º, do CPC/2015); (iv) sob tal prisma, atinge-se um dos desideratos do CPC/2015, voltado a desestimular o ajuizamento de ações e a interposição desenfreada de recursos (ou cultura de se recorrer sempre). De outra banda, tal objetivo torna-se letra morta acaso prevaleça entendimento de que, casuisticamente caberá ao julgador decidir se aplica o art. 85, § 2º ou, relativiza sua aplicação mediante interpretação extensiva da equidade, prevista no art. 85, § 8º; (v) Até porque, o subjetivismo do julgador, nitidamente cambiante para se subsumir que a verba honorária advocatícia seria excessiva (que varia no tempo, espaço e cultura do magistrado), também impactará no estímulo a recorribilidade, a se tornar mais um tema que desnecessariamente congestionará a pauta dos tribunais e tribunais superiores, dado que o que para determinado tribunal figura como honorários excessivos, para outro ministro pode se subsumir que não; (vi) No mais, o subjetivismo interpretativo daquilo que seria considerado honorários excessivos, trazem como efeito pernicioso a coexistência de decisões díspares, senão contraditórias e divorciadas de uniformização - determinado órgão jurisdicional pode entender que "x", a título de honorários, é excessivo, ao passo em que o mesmo valor pode ser interpretado por outro órgão jurisdicional como algo condizente a se aplicar o art. 85, § 2º - a se macular a própria imagem da jurisdição (que se espera aplicar o direito de forma uma), porquanto presente a insegurança jurídica, ausência de previsibilidade e quebra da isonomia ao se aplicar o dispositivo para dado caso concreto e negar sua vigência em outro; (vii) Também não se pode perder de vista que é comum na advocacia por vezes o causídico aceitar patrocinar determinada causa sem nada receber para remunerar seu trabalho, a labutar na incerteza se vencerá ou não em favor de seu cliente, porém contratados honorários ad exitum ou tão-somente dado o interesse do causídico na elevada verba sucumbencial uma vez aplicado o comando do art. 85, § 2º, do CPC/2015 e; (viii) Tal prática em que, indiretamente proporciona o acesso à justiça àqueles que não têm condições de, de plano, honrar o pagamento de honorários contratuais, restará mitigada acaso a fixação da verba honorária sucumbencial tangencie a regra prevista no art. 85, § 2º, do CPC/2015. Espera-se que o quanto decidido pela Corte Especial do STJ ao fixar tese firmada no tema n. 1046, por meio da técnica de julgamento de recursos repetitivos seja respeitado pelos órgãos fracionários (com o aval inclusive do STF, conforme mencionado acima), em especial os recursos especiais sobrestados que tratam desta matéria, a viabilizar a aplicação do precedente obrigatório na forma prevista nos arts. 1.039 e 1.040, II, do CPC ________________ 1 Disponível aqui. 2 Disponível aqui. 3 Disponível aqui. 4 Disponível aqui. 5 Disponível aqui. 6 Disponível aqui. 7 Ou, valendo-se do clássico ensinamento de Chiovenda: "Il processo deve dare per quanto è possibile praticamente a chi ha um diritto tutto quello e proprio quello ch'egli ha diritto di conseguire". In. CHIOVENDA, Giuseppe. Instituzioni di diritto processuale civile, v. 1. 2. Ed. Napoli: Jovene, 1935, p. 42. "O processo deve dar, na medida do possível, a quem tem um direito, tudo aquilo e exatamente aquilo que tem direito de conseguir", tradução livre.
Em decisão proferida há 5 (cinco) anos, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) decidiu que não caberia a condenação ao pagamento de honorários advocatícios no incidente de desconsideração da personalidade jurídica disciplinado pelos artigos 133 a 137 do Código de Processo Civil (CPC), quando, ao final, se entender que não teriam restadas comprovadas as hipóteses autorizadoras da medida prevista do art. 50 do Código Civil (CC).* No caso concreto, julgado em 07.02.2017, pela 37ª Câmara de Direito Privado do TJSP, nos autos do Agravo de Instrumento n. 2230826-35.2016.8.26.0000, da Comarca de Santos, durante a fase de cumprimento de sentença, foi instaurado e acolhido o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, em primeiro grau de jurisdição. Entretanto, os sócios atingidos pela decisão de desconsideração da personalidade jurídica interpuseram recurso de agravo de instrumento, conforme autorizado expressamente pelo art. 1.015, inciso IV, do CPC. No referido recurso, os sócios argumentaram que não restaram comprovadas nenhuma das hipóteses autorizadoras de desconsideração da personalidade jurídica discriminadas pelo artigo 50 do CC (confusão patrimonial ou desvio de finalidade), enfatizando que a mera inexistência de bens em nome da sociedade para pagar o valor objeto da execução movida em face da pessoa jurídica não autorizaria a adoção desta medida extrema. Assim, em sede recursal, pediram a reforma da decisão do incidente de desconsideração da personalidade jurídica que havia acolhido o pedido dos credores com base no art. 50 do CC, para afastar o decreto de desconsideração da personalidade jurídica, com a exclusão dos sócios do polo passivo da demanda e desbloqueio de valores eventualmente bloqueados, bem como condenar a parte que pediu a instauração do incidente a arcar com os ônus da sucumbência. Ocorre que o TJSP, reconhecendo que não houve demonstração de abuso da personalidade jurídica, acolheu o primeiro pedido acima mencionado, mas não acolheu o segundo pedido de condenação ao pagamento dos ônus de sucumbência por parte daqueles que requereram a instauração do incidente e terminaram vencidos. O julgado foi assim ementado: "Agravo de instrumento. Cumprimento de sentença. Incidente de desconsideração da personalidade jurídica acolhido. Insurgência dos sócios incluídos no polo passivo, ora Agravantes, sob o argumento de que não restaram comprovadas quaisquer das hipóteses autorizadoras da medida, previstas no artigo 50 do Código Civil. Medida que é excepcional, a ser deferida apenas em caso de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial. Mera inexistência de bens em nome da pessoa jurídica para cobrir a execução não constitui motivo suficiente para a desconsideração da personalidade jurídica. Precedentes jurisprudenciais. Honorários advocatícios que não são cabíveis no caso. Ausência de previsão a esse respeito no CPC/15, que é taxativo quanto às hipóteses em que se mostram passíveis de fixação. Mero incidente no curso do processo que não autoriza a fixação de honorários. Atuação dos patronos que será avaliada como um todo no final do processo. Recurso parcialmente provido. (Relator: João Pazine Neto; Comarca: Santos; Órgão julgador: 37ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 07/02/2017; Data de registro: 08/02/2017, sem os destaques)". Como se pode perceber da simples leitura da ementa do julgado acima transcrita, o argumento utilizado pelo TJSP para negar o pedido de condenação ao pagamento de honorários advocatícios aos vencedores no incidente de desconsideração da personalidade jurídica é a ausência de previsão a esse respeito no CPC, que seria taxativo quanto às hipóteses de arbitramento de honorários desta natureza. Da leitura mais atenta do v. acórdão, percebe-se que há ainda outro argumento utilizado para se negar a condenação ao pagamento da verba sucumbencial pelo vencido ao vencedor. Confira-se, a propósito, o trecho do v. acórdão que trata do assunto: "(...) Por fim, não merece acolhida o pleito para fixação de honorários advocatícios em razão do acolhimento do incidente, pois não são cabíveis no caso. Insta ressaltar a ausência de previsão a esse respeito no CPC/15 que, diga-se de passagem, é extensamente enumerativo quanto às hipóteses em que possível tal fixação (art. 85, § 1º). Mero incidente no curso do processo, o que é o caso dos autos, não autoriza a fixação de honorários. Ademais, a atuação dos patronos será avaliada como um todo no final do processo, para fixação da verba honorária sucumbencial (...). Em outras palavras, os argumentos utilizados para se negar a condenação ao pagamento de honorários advocatícios no incidente de desconsideração da personalidade jurídica são os seguintes: (a) ausência de previsão legal no CPC, que teria um rol taxativo de hipótese de pagamentos de honorários no art. 85, § 1º; (b) descabimento de fixação de honorários em mero incidente no curso do processo, uma vez que a atuação dos advogados "será avaliada como um todo no final do processo". Depois desse julgamento ocorrido no TJSP, outros julgamentos no mesmo sentido começaram a surgir no Superior Tribunal de Justiça (STJ) sustentando haver "ausência de previsão legal"1 para condenação do vencido no incidente de desconsideração da personalidade jurídica ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência. Com o devido respeito, não se pode concordar com os entendimentos acima mencionados no que diz respeito à suposta impossibilidade de condenação ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais por parte daquele que sai vencido no incidente de desconsideração da personalidade jurídica pelas razões abaixo articuladas. Não se desconhece o fato de que o art. 85, § 1º, do CPC, estabelece hipóteses em que é cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios e não menciona o incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Com efeito, o referido dispositivo legal, após fixar que "a sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor" (CPC, art. 85, caput), menciona que "são devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente" (CPC, art. 85, § 1º). No entanto, isso não é o suficiente para afirmar que esse rol do § 1º do art. 85 do CPC seria taxativo, pois a própria lei processual estabelece em outras passagens a possibilidade de se condenar alguém ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais. Veja-se, por exemplo, a hipótese do parágrafo único do art. 129 do CPC, que trata da denunciação da lide: "se o denunciante for vencedor, a ação de denunciação não terá o seu pedido examinado, sem prejuízo da condenação do denunciante ao pagamento das verbas de sucumbência em favor do denunciado". A propósito, na situação descrita pelo parágrafo único do art. 129 do CPC, fica claro que o sistema processual permite, em hipóteses nas quais ocorra o encerramento do processo por meio de decisões que decidam parcialmente o mérito, a condenação ao vencido de pagamento de honorários advocatícios ao advogado do vencedor. Nesse sentido, Thiago Asfor Rocha Lima e Marcus Claudius Saboia Rattacaso observam que "ao que parece, o legislador nunca pretendeu tornar a fixação dos honorários parciais a regra do sistema, pois, se assim o fosse, poderia ter feito, quando menos, nas alterações processuais de 2005, ou dez anos depois, quando da promulgação do Novo CPC. Isso, todavia, não impede o magistrado, em situações específicas e justificadas, de estabelecer os honorários de sucumbências parciais e nas decisões parciais de mérito. Isso é possível de ocorrer não apenas nos casos de extinção do processo em relação a uma das partes, por ilegitimidade, exempli gratia - visto que nesse caso a parte excluída não participará da decisão final - mas também quando houver desistência, renúncia ou reconhecimento parcial do pedido (art. 90, caput e § 1º) e ainda nos casos de parcela do pedido se mostrar incontroverso ou em imediatas condições de julgamento (art. 356, inciso II), seja por desnecessidade de produção de provas novas, seja por se operarem os efeitos de revelia"2. Assim, nas hipóteses em que o pedido de desconsideração da personalidade jurídica é julgado improcedente, após a regular tramitação do incidente sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, fica claro que o sócio, que era considerado parte no processo por ter sido citado (CPC, art. 135), inclusive com comunicação do ocorrido ao distribuidor (CPC, art. 134, § 1º), será excluído do processo, que será extinto em relação a ele, pelo menos3. Trata-se, evidentemente, de uma decisão interlocutória de mérito aquela de decide o incidente de desconsideração da personalidade jurídica acolhendo ou rejeitando o pedido, conforme já se manifestou Eduardo Talamini: "A decisão pode não chegar a julgar o mérito da demanda de desconsideração, nas hipóteses do art. 485 do CPC/2015 (por exemplo, constata-se que já houve sentença entre as mesmas partes rejeitando a possibilidade da desconsideração pretendida, havendo coisa julgada que proíbe nova decisão da questão, art. 485, V). Mas tendo julgado o mérito do pedido de desconsideração, seja para acolhê-lo, seja para rejeitá-lo, a decisão do incidente fará coisa julgada material, assim que transitar em julgado (i.e., uma vez não interposto recurso ou exaurido todos os cabíveis). Trata-se de uma decisão interlocutória de mérito, apta a fazer coisa julgada material (arts. 356, § 3.º, e 502, do CPC/2015)"4. Nesse particular, vale a pena observar que a ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, compartilhava desse mesmo entendimento quando ao cabimento de fixação de honorários de sucumbência em incidentes processuais como o de desconsideração da personalidade jurídica, quando proferiu o voto vencido no julgamento cuja ementa está abaixo transcrita: RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DESCABIMENTO. ART. 85, § 1º, DO CPC/2015. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Não é cabível a condenação em honorários advocatícios em incidente processual, ressalvados os casos excepcionais. Precedentes. 2. Tratando-se de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, o descabimento da condenação nos ônus sucumbenciais decorre da ausência de previsão legal excepcional, sendo irrelevante se apurar quem deu causa ou foi sucumbente no julgamento final do incidente. 3. Recurso especial provido. (REsp 1845536/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/05/2020, DJe 09/06/2020) Tanto isso é verdade, que a Min. Nancy Andrighi, em aditamento ao seu voto vencido, fez questão de esclarecer o seguinte: "No que importa à fixação de honorários e à correta interpretação do alcance do art. 85, caput e seu parágrafo § 1º, do CPC/15, é relevante notar que o CPC/15 inovou o sistema do CPC/73 no tocante aos novos critérios por meio dos quais são classificados os atos do juiz. Quanto ao tema, na redação original do CPC/73, as sentenças eram caracterizadas pelos atos do juiz que envolvessem decisões de mérito do processo, as quais, por sua vez, somente eram tomadas no julgamento final da lide na fase de conhecimento, por meio do pronunciamento único e uno, que marcava o final da tramitação da ação no primeiro grau de jurisdição. Vigia, portanto, no código revogado, a teoria da unidade estrutural da sentença, de modo que todas as demais decisões que não pusessem fim ao processo ostentariam a natureza de decisões interlocutórias. Paulatinamente, todavia, em busca de maior celeridade e efetividade na prestação jurisdicional, passaram a ser previstas hipóteses em que tutelas demérito satisfativas poderiam ser concedidas independentemente de regular instrução e até mesmo antes do final do processo, o que ocorreu, sobretudo, em virtude das alterações veiculadas pela Lei 11.232/2005 no CPC/73. A despeito das citadas alterações da Lei 11.232/2005, prevaleceu na jurisprudência, no entanto, que o CPC/73 não teria abandonado a classificação das sentenças a partir o critério da extinção do processo ou da fase processual. De fato, segundo o entendimento desta Terceira Turma, "permaneceu, dessa forma, no Código de Processo Civil de 1973 a teoria da unidade estrutural da sentença, a obstar a ocorrência de pluralidade de sentenças em uma mesma fase processual" (REsp 1281978/RS, Terceira Turma, DJe 20/05/2015). O CPC/15 inovou radicalmente, entretanto, o tratamento da matéria, ao passar a prever expressamente, em seus arts. 354, parágrafo único, e 356, a possibilidade do fracionamento do julgamento de mérito. Sob a nova disciplina do CPC/15, consoante ressalta a doutrina, "é expressamente permitido o fracionamento do julgamento do mérito, com a prolação de decisão parcial e, posteriormente, no mesmo processo, de sentença para julgamento do(s) pedido(s) restante(s)", de forma que "o CPC/2015, pelo seu art. 356 e pelo parágrafo único de seu art. 354, deu traços adequados à questão e colocou fim ao dogma da unicidade da sentença" (CAMARGO, Luiz Henrique Volpe. Honorários advocatícios em decisões parciais de mérito e em decisões parciais sem mérito. Revista de Processo: RePro, São Paulo, v. 43, n. 283, p. 133-151, set. 2018, sem destaque no original). Dessa forma, no atual CPC, por não mais viger o princípio da unicidade da sentença e, tampouco, a teoria da unidade estrutural, o exame de uma determinada questão ou capítulo do pedido pode encerrar uma parcela da demanda com resolução parcial do mérito ou mesmo acarretar a extinção parcial do processo sem resolução de mérito. Essa decisão terá natureza de decisão parcial de mérito, mesmo que possua natureza interlocutória e seja impugnável por agravo de instrumento, conforme prevê o art. 354, parágrafo único, do CPC/15, persistindo, assim, parcelas remanescentes do processo a serem examinadas somente ao fim da fase processual do primeiro grau de jurisdição. Trata-se, de fato, da fragmentação da coisa julgada, a partir da qual "existe a possibilidade de serem proferidas, no curso do processo, várias decisões com capacidade para se tornarem indiscutíveis pela coisa julgada, razão pela qual um mesmo processo poderá produzir tantas coisas julgadas quantas tenham sido as decisões proferidas que tenham essa aptidão" (CASTELO, Fernando Alcântara. A coisa julgada parcial e o problema do termoinicial para a propositura da ação rescisória no CPC de 2015. Revista de Processo: RePro, São Paulo, v. 43, n. 277, p. 283-304, mar. 2018., sem destaque no original). Portanto, mesmo que não exista menção expressa no art. 85, caput e § 1º, do CPC/15, não há razão para se interpretar restritivamente as hipóteses de decisões que decidam o mérito das distintas controvérsias e, por consequência, as de cabimento de honorários de sucumbência"5. Assim, na vigência do CPC de 2015, as decisões interlocutórias de mérito têm o condão de gerar coisa julgada material e são equivalentes a uma sentença, não fazendo sentido o argumento, à luz da lei atual, de alegar que o caput do art. 85 do CPC faz referência apenas às sentenças e que, por isso, não haveria previsão legal para condenação do vencido no incidente de desconsideração da personalidade jurídica ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência. Ora, em razão do não acolhimento do pedido de desconsideração da personalidade jurídica, o sócio ou administrador da pessoa jurídica que contratou advogados para se defender no prazo de 15 (quinze) dias e requereu a produção de provas (CPC, art. 135), inclusive periciais e testemunhais, será excluído da demanda originária, sem poder participar do processo principal até decisão final, após terminada a suspensão a que se refere o § 3º do art. 134. O que se busca demonstrar é que não é justo que alguém (sócio ou administrador de pessoa jurídica, nos termos do art. 50 do CC), a quem foi imputado um fato grave de desvio de finalidade ou confusão patrimonial com intuito fraudulento, que teve que contratar advogados para se defender de um pedido de tutela jurisdicional formulado por um credor leviano que queria lhe estender os efeitos de uma obrigação de uma pessoa jurídica para lhe tomar o patrimônio particular, não tenha o direito de - pelo menos - receber honorários de sucumbência e ser reembolsado pelas despesas processuais que antecipou (CPC, art. 82, § 2º). Não há nada de absurdo no que se defende aqui. O integrante da pessoa jurídica que foi atingido por uma decisão de desconsideração da personalidade jurídica teve que se defender de um pedido de tutela jurisdicional contra si e se esse pedido foi considerado infundado, leviano ou, enfim, improcedente, aquele que deu causa à movimentação de toda a máquina judiciária estatal para atingir o patrimônio do sócio ou do administrador da pessoa jurídica, deve arcar com as consequências, dentre elas pagar honorários de sucumbência ao advogado do vencedor (CPC, art. 85) e reembolsar as despesas antecipadas (CPC, art. 82, § 2º). Aliás, o próprio § 1º do art. 322 do CPC, ao tratar do pedido de tutela jurisdicional, que é exatamente o que faz aquele que pede a instauração do incidente a que se referem os artigos 134 e seguintes do CPC ao imputar a alguém o fato de ter realizado uma das hipóteses autorizadoras da desconsideração da personalidade jurídica, alcançando-se o seu patrimônio particular, estabelece que compreendem-se no pedido principal os juros legais, a correção monetária e as verbas de sucumbência, inclusive os honorários advocatícios. Note-se que o próprio Superior Tribunal de Justiça já decidiu por impor o pagamento de honorários advocatícios de sucumbência a quem pleiteou, a título de desconsideração da personalidade jurídica, a inclusão de sócios no pólo passivo de uma execução originariamente movida contra a sociedade da qual faziam parte sem a necessária instauração do incidente: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. INSTAURAÇÃO DO INCIDENTE. NECESSIDADE. NULIDADE RECONHECIDA. SUCUMBÊNCIA. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Segundo o princípio da causalidade, os encargos sucumbenciais devem ser suportados pela parte que deu causa ao ajuizamento da ação. 2. No caso concreto, foi a parte recorrente que pleiteou a inclusão dos sócios no polo passivo da execução, sem instauração do devido incidente de desconsideração da personalidade jurídica da pessoa jurídica executada, e foi este pedido que deu causa ao ajuizamento dos presentes embargos à execução, razão pela qual a recorrente deve arcar com a verba honorária. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1710393/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 22/03/2021, DJe 13/04/2021) Em outras palavras, se o credor pede a desconsideração da personalidade jurídica para alcançar os bens dos integrantes da pessoa jurídica que até então não eram partes do processo, ele deve estar preparado para todas as consequências de ter um pedido de tutela jurisdicional negado pelo Estado-juiz, sobretudo no sentido de indenizar pelos prejuízos que eventualmente causou aos inocentes que tiveram que vir a juízo se defender, inclusive pagando-lhes honorários advocatícios e reembolsando as despesas incorridas. O argumento de que o Superior Tribunal de Justiça já teria "precedente" da Corte Especial no sentido de não caber arbitramento de honorários advocatícios em sede de incidente processual não sobrevive a uma análise mais detalhada. Isso porque todos os julgamentos que mencionam a existência desse "precedente"6 acerca do não cabimento de tais verbas em incidentes processuais remontam ao ERESsp 1.366.014/SP, que se refere ao Código de Processo Civil de 1973 e não ao de 2015. Confira-se: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. INCIDENTE PROCESSUAL. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. ART. 20, § 1o. DO CPC/1973. IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS. 1. A divergência traçada nestes autos trata apenas da condenação em honorários de sucumbência em sede de incidente processual. 2. A jurisprudência desta Corte entende que a melhor exegese do § 1o. do art. 20 do CPC/1973 não permite, por ausência de previsão nele contida, a incidência de honorários advocatícios em incidente processual ou recurso. 3. Embargos de Divergência providos para reformar o acórdão embargado, e negar provimento ao Recurso Especial de POMPÉIA S.A. EXPORTAÇÃO E COMÉRCIO. (EREsp 1366014/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 29/03/2017, DJe 05/04/2017) Cumpre registrar que o julgado acima, com todo o respeito, não se aplica ao Código de Processo Civil atual no tocante ao incidente a que se referem os artigos 133 a 137 do CPC/2015 por, pelo menos, dois motivos: não havia incidente de desconsideração da personalidade jurídica no CPC/1973 e não havia dispositivo semelhante ao art. 356 do CPC/2015, que permite expressamente a decisão parcial de mérito. Portanto, invocar o julgado acima (refiro-me ao EREsp 1.366.014/SP) para justificar o não cabimento de condenação em honorários em incidente de desconsideração da personalidade jurídica parece ser uma interpretação descabida e incompatível com a boa-fé. Em outras palavras, naquela ocasião, a Corte Especial do STJ referia-se a outros incidentes e não tinha em mente a possibilidade de decisões parciais de mérito. Ademais, conforme já tivemos oportunidade de sustentar em outra ocasião, "(...) caso se descubra depois que não era hipótese de se desconsiderar a personalidade jurídica, nascerá para o prejudicado um direito de pleitear indenização, e somente quem pediu e se beneficiou com essa medida excepcional é que estará legitimado a indenizar (...)"7. A indenização pelos prejuízos causados com um pedido de desconsideração julgado improcedente - certamente devida - pode até ter lugar em um outro processo, mas a fixação de honorários advocatícios em favor do vencedor no incidente ao qual se refere o art. 134 e seguintes do CPC deve ser fixado no momento em que o juiz proferir a decisão interlocutória do art. 136, caput, do CPC ("Concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória"). Nesse sentido é a tese de Christian Garcia Vieira, apresentada para obtenção do título de Doutor na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo: "Afinal, uma vez citado o réu, ele irá constituir advogado, ingressar no feito e, exemplificativamente, apresentar defesa para demonstrar a inexistência de atos de confusão patrimonial que justificariam a inaplicabilidade do instituto no caso concreto. Há uma decorrência lógica de que o autor, que propôs a demanda, caso derrotado, remunere as custas e os honorários advocatícios ao réu (e vice-versa)"8. Também não é outro o entendimento de Eduardo Talamini, que observa o seguinte: "A decisão final do incidente condenará o vencido nas verbas de sucumbência (custas e honorários de advogado). Se a desconsideração for provida, o sócio ou sociedade responde por tais verbas. Se for rejeitada, a parte que a requereu é a responsável"9. Portanto, como a atuação do advogado que defendeu o sócio ou o administrador da pessoa jurídica no incidente de desconsideração da personalidade desta última não acompanhará o processo até o final porque o seu cliente foi excluído do seu polo passivo, a fixação das verbas de sucumbência não pode ser depois, ao final da demanda originária. Ela deve ser feita ao final do incidente, quando ele for acolhido ou rejeitado. Diante do exposto, conforme amplamente demonstrado, o art. 85, § 1º, do CPC, não apresenta um rol taxativo das hipóteses de cabimento de condenação do vencido ao pagamento de honorários advocatícios ao advogado do vencedor. Trata-se de um rol meramente exemplificativo, considerando-se que em outras passagens do CPC também se estabelece a condenação dos honorários advocatícios sucumbenciais, tais como o parágrafo único do art. 127. Vale reproduzir, uma vez mais, as palavras da Min. Nancy Andrighi, antes de se render à maioria circunstancial da Terceira Turma do STJ, acima mencionada: "(...) somente não há fixação de honorários nas resoluções dos incidentes processuais se a decisão do incidente se enquadrar como uma pura, genuína ou típica interlocutória, em que não ocorre o julgamento de mérito de algum capítulo do pedido ou a extinção do processo em relação a determinado litigante (...)"10. No caso do incidente de desconsideração, o sócio e o administrador podem ser citados para apresentar defesa no prazo de 15 (quinze) dias, pleiteando a produção de provas que entender necessárias. Trata-se, portanto, de trabalho significativo realizado pelo advogado daquele que é citado para se defender em um incidente de desconsideração da personalidade jurídica, semelhante ao trabalho de qualquer outro colega que atue em processo autônomo para defender os interesses de seu cliente. Portanto, o advogado deve fazer jus aos honorários referidos no art. 85 do CPC, sob pena de seu trabalho ficar sem a devida remuneração, ainda que tenha ocorrido a extinção do processo com relação ao seu cliente. A atuação desse advogado que atua no incidente de desconsideração da personalidade jurídica para defender o sócio ou administrador não poderá ser avaliada ao final do processo para se verificar se ele agiu de acordo com os parâmetros do ar. 85, § 2º, incisos I a IV, do CPC, devido ao fato de que ele não atuará mais no processo em que foi decidido sobre a desconsideração da personalidade jurídica em caráter definitivo, julgando-se improcedente o pedido. Uma vez proferida decisão que indefere a desconsideração, cessa-se a suspensão que havia sido determinada em atenção ao art. 136 do CPC e o processo volta a correr exclusivamente entre as suas partes originárias. Ou seja, não há o que mais avaliar no tocante à conduta do advogado do sócio ou do administrador que saiu vencedor do incidente de desconsideração da personalidade jurídica porque ele simplesmente não atuará mais no processo que não diz respeito aos seus clientes, todos excluídos da demanda. Portanto, não há qualquer pretexto para se adiar os pagamentos do advogado do vencedor do incidente ao qual se referem os artigos 134 a 137 do CPC, nos termos do art. 85 do mesmo diploma legal. Por idênticas razões, as despesas processuais também devem ser arcadas pelos vencidos, nos termos do § 2º do art. 82 do CPC. Logo, é cabível a condenação de pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais ao advogado do vencedor no incidente de desconsideração da personalidade jurídica. __________ *As ideias aqui colocadas foram originariamente sustentadas pelo autor em artigo publicado na Coluna "CPC na Prática", no "site" Migalhas, em 30.03.2017. Posteriormente, tais argumentos foram reproduzidos em outro local sob o título "Condenação de pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais ao advogado do vencedor no incidente de desconsideração da personalidade jurídica" (In: Ana Cândida Menezes Marcato; Elias Marques de Medeiros Neto; Luiz Dellore; Rodrigo Barioni; Rogério Mollica; Sidnei Amendoeira; William Santos Ferreira. Org. Reflexões sobre o Código de Processo Civil de 2015. São Paulo: Verbatim, 2018, v. 1, p. 23-29). Apesar do tempo decorrido e de alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça em sentido contrário, o subscritor não mudou o seu entendimento, conforme se verá adiante, reproduzindo aqui os mesmos argumentos e acrescentando outros para rebater a tese de que não caberia a condenação ao pagamento de honorários em incidente de desconsideração da personalidade jurídica por ausência de previsão legal. 1 "No incidente de desconsideração da personalidade jurídica não cabe a condenação nos ônus sucumbenciais diante da ausência de previsão legal". (REsp 1943831/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/12/2021, DJe 17/12/2021). No mesmo sentido: AgInt no AREsp 1745989/PR, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 22/11/2021, DJe 26/11/2021; AgInt no AREsp 1707782/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2021, DJe 25/03/2021; AgInt no AREsp 1691479/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 01/03/2021, DJe 22/03/2021; AgInt no REsp 1852515/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/08/2020, DJe 27/08/2020; AgInt no REsp 1834210/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 12/11/2019, DJe 06/12/2019; AgInt no REsp 1933606/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/02/2022, DJe 24/02/2022; 2 LIMA, Tiago Asfor Rocha; RATTACASO, Marcus Claudius Saboia. Honorários advocatícios parciais: muito além da interpretação literal do art. 85 do Novo CPC. In: COÊLHO, Marcus Vinicius Furtado; CAMARGO, Luiz Henrique Volpe. Honorários advocatícios. 2ª edição. Salvador: Juspodivm, 2016. p. 347. Os destaques são da transcrição. 3 Já tivemos a oportunidade de demonstrar que aquele que é atingido por uma decisão de desconsideração da personalidade jurídica deve ser considerado parte no processo e não terceiro. (SOUZA, André Pagani de. Desconsideração da personalidade jurídica: aspectos processuais. 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 118-148. 4 Disponível aqui (acesso em 27.03.2017). 5 REsp 1845536/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/05/2020, DJe 09/06/2020, p. 20-22 do acórdão. 6 Confira-se, por exemplo, o AgInt no REsp 1838933/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/05/2020, DJe 15/05/2020;e o AgInt no REsp 1838236/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/04/2020, DJe 27/04/2020. Ambos fazem referência ao RESP 1.366.014/SP. 7 SOUZA, André Pagani de. Desconsideração da personalidade jurídica: aspectos processuais. 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 188. 8 VIEIRA, Christian Garcia. Desconsideração da personalidade jurídica no Novo CPC: natureza, procedimentos e temas polêmicos. Salvador: Juspodivm, 2017. p. 183. 9 Disponível aqui (Acesso em 27.03.2017). 10 REsp 1845536/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/05/2020, DJe 09/06/2020, p. 24 do acórdão.
Em breve o Superior Tribunal de Justiça ("STJ") revisitará o tema da interpretação do artigo 406 do Código Civil, e definirá, através do julgamento do REsp nº 1795982 / SP pela Corte Especial, se a Selic é o único índice a ser utilizado para fins de correção monetária e incidência de juros de mora, nas hipóteses previstas naquele artigo do diploma civil. O julgamento tem notória importância, até porque, como se sabe, o STJ, no julgamento do EREsp 727.842, fixou a tese de que a taxa dos juros moratórios a que se refere artigo 406 do Código Civil é a Selic. Essa posição, já consolidada no STJ, é reflexo de orientação da 2ª Turma, que prontamente adotou, em seus julgados, a aplicação da Taxa Selic ao artigo 406 do Código Civil, entendendo que esta incluía tanto os juros legais quanto a correção monetária: "2. Com o advento do novo Código Civil, quando não convencionados os juros moratórios, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional; por enquanto, a taxa SELIC (a partir da citação), com a advertência de que não pode ser ela cumulada com qualquer outro índice de correção monetária, porque já embutida no indexador."1 "2. Os juros de mora devem incidir na correção do saldo das contas vinculadas do FGTS no percentual de 0,5% ao mês até a data de entrada em vigor do Novo Código Civil. A partir de então, deverá incidir a Selic (Lei n. 9.250/95), taxa que está em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional (art. 406 do Código Civil de 2002)."2 A 1ª Seção deliberou sobre o tema no mesmo sentido: "PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. JUROS DE MORA. TAXA SELIC. APLICABILIDADE. ART. 406 DO NOVO CÓDIGO CIVIL. 1. Os juros moratórios, nas ações em que se discute a inclusão de expurgos inflacionários nas contas vinculadas ao FGTS, são devidos a partir da citação - que nos termos do arts. 219 do Código de Processo Civil e 406 do Código Civil vigentes, constitui o devedor em mora -, à base de 0,5% (meio ponto percentual) ao mês até a entrada em vigor do Novo Código Civil (Lei n.º 10.406/2001) e, a partir de então, segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional (art. 406). Taxa esta que, como de sabença, é a SELIC, nos expressos termos da Lei n.º 9.250/95 (Precedentes: REsp n.º 666.676/PR, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU de 06/06/2005; e REsp n.º 803.628/RN, Primeira Turma, deste Relator, DJU de 18/05/2006)."3 E, em embargos de divergência, a matéria chegou a ser decidida pela Corte Especial, que votou pela aplicação da Taxa Selic: "CIVIL. JUROS MORATÓRIOS. TAXA LEGAL.  CÓDIGO CIVIL, ART. 406. APLICAÇÃO DA TAXA SELIC. 1. Segundo dispõe o art. 406 do Código Civil, "Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional". 2. Assim, atualmente, a taxa dos juros moratórios a que se refere o referido dispositivo é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95, 84 da Lei 8.981/95, 39, § 4º, da Lei 9.250/95, 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da Lei 10.522/02). 3. Embargos de divergência a que se dá provimento."4 A partir desse julgado, o STJ adotou firme posicionamento pela aplicação da Selic como taxa de juros legais5. Apenas para elucidar quão pacífico se tornou o tema no STJ, apontamos os seguintes julgados: "3. A Corte Especial deste Tribunal pacificou o entendimento de que atualmente a taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406 do Código Civil é a Selic."6 "4.  Os juros de mora, devidos in casu a partir do evento danoso (Súmula 54/STJ), devem ser calculados à base de 0,5% ao mês, nos termos do artigo 1.062 do Código Civil de 1916 até a entrada em vigor do Novo Código Civil (Lei nº 10.406/2001), devendo observar, a partir de então, a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional (artigo 406). Taxa esta que, como de sabença, é a SELIC, nos expressos termos da Lei nº 9.250/95 (Precedente da Corte Especial: EREsp 727.842/SP, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe de 20/11/2008) 5. A incidência da taxa SELIC a título de juros moratórios, a partir da entrada em vigor do atual Código Civil, em janeiro de 2003, exclui a incidência cumulativa de correção monetária, sob pena de bis in idem (Precedente: EDcl no REsp 1077077/SP, Rel. Min. SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, DJe de 05/06/2009)"7 "5. Nas obrigações ainda não adimplidas, anteriores à vigência do CC/02, a jurisprudência tem se orientado no sentido de reputar aplicável, quanto aos juros, o art. 1.062 do CC/16 até a data de 10/1/2003, e o art. 406 do CC/02 após essa data. Precedentes. 6. O índice que deve ser aplicado de conformidade com o art. 406 do CC/02 é, consoante precedente da Corte Especial, a Taxa SELIC, não obstante a existência de julgados recentes aplicando, à espécie, o art. 161, §1º, do CTN. 7. A taxa SELIC abrange juros e correção monetária, não pode ser cumulada a nenhum outro índice que exprima tais consectários."8 "1. "Os juros (de mora) legais devem ser fixados à taxa de 0,5% ao mês (artigo 1.062 do CC/1916) no período anterior ao início da vigência do novo Código Civil (10.1.2003) e, em relação ao período posterior, nos termos do disposto no artigo 406 do Código Civil de 2002, o qual corresponde à Taxa SELIC". (AgRg no Ag 1370108/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/04/2011, DJe 27/04/2011)"9 "3. A taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406 do Código Civil de 2002, segundo precedente da Corte Especial (EREsp 727842/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 08/09/2008), é a SELIC, não sendo possível cumulá-la com correção monetária, porquanto já embutida em sua formação."10 "7. Os juros de mora incidem desde o evento danoso, à taxa de 0,5% ao mês até a entrada em vigor do CC/2002, e pela Taxa Selic após essa data (EREsp n. 727.842/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, DJe de 20/11/2008)."11 "6. Sobre os valores apurados em liquidação de sentença devem recair, até o efetivo pagamento, juros moratórios de 6% ao ano a partir da citação, nos termos dos arts. 1.062 e 1.063 do CC/1916, até 11.1.2003, quando passou a se aplicar a Taxa Selic (art. 406 do CC atual)."12 "2. Os valores a serem restituídos pelo banco serão acrescidos de juros remuneratórios de 1% ao mês, corrigidos monetariamente pelo INPC, mais juros de mora de 0,5% ao mês desde a citação e, após a vigência do novo Código Civil, da taxa Selic, índice comum de juros moratórios e correção monetária, na forma do art. 406 do CC."13 Ainda, conforme o posicionamento apontado: "2. Os juros de mora incidem desde o evento danoso, à taxa de 0,5% ao mêsatéa entrada em vigor do CC/2002, e pela Taxa Selic após essa data(EREsp727.842/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Corte Especial, DJe de 20/11/2008)."14 "1.EstaCortefirmouentendimento no sentido de que a fixação da taxadosjurosmoratórios, a partir da entrada em vigor do artigo 406doCódigoCivilde2002,deveser com base na taxa Selic, podendo essa tese ser aplicada inclusive nos casos em que se discute a execução de honorários. Precedentes."15 "1.OSuperior Tribunal de Justiça, em julgamento submetido ao rito dosprocessosrepresentativosdacontrovérsia(art.543-Cdo CPC/1973eart.1.036 do CPC/2015) firmou o entendimento de que a taxados juros moratórios a que se refere o art. 406 do CC/2002 é a taxareferencialdoSistemaEspecialde Liquidação e Custódia - SELIC 2. Agravo interno não provido."16 "3.OTribunaldeorigem, ao discorrer sobre os juros moratórios, entendeu que seu termo inicial será a partir da citação e na base de 6%aoanoaté a entrada em vigor do Código Civil, aplicada a taxa Selic,a partir de então, consoante interpretação feita do art. 406 do Código Civil, que se coaduna com jurisprudência desta Corte."17 "3. Os juros moratórios são devidos a partir do evento danoso no percentual de 0,5% a.m até a entrada em vigor do Código Civil atual (11.1.2003), quando deverão ser calculados na forma do seu art. 406, isto é, de acordo com a SELIC."18 E, como se pode imaginar, o STJ, para fins do artigo 406 do CC, manteve sua posição sobre a aplicação da taxa SELIC nos últimos dois anos, como se depreende dos seguintes julgados, apenas a título exemplificativo: "AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. JUROS DE MORA. TAXA SELIC. INCIDÊNCIA. PRECEDENTES. NÃO PROVIMENTO. 1. "A Corte Especial no julgamento de recurso especial repetitivo entendeu que por força do art. 406 do CC/02, a atualização dos débitos judiciais deve ser efetuada pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, a qual deve ser utilizada sem a cumulação com correção monetária por já contemplar essa rubrica em sua formação" (AgInt no REsp 1794823/RN, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, DJe 28/5/2020). 2. Agravo interno a que se nega provimento."19 "3. Nos termos dos Temas 99 e 112/STJ, a taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406 do Código Civil é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, vedada a acumulação com correção monetária."20 A orientação apenas segue, como mencionado previamente, os julgados da Corte Especial. Além do EREsp 727842 / SP, importante apontar que, em sede de recurso especial repetitivo, a Corte Especial firmou a seguinte tese na sessão de 02 de junho de 2010: "Tema 176: Tendo sido a sentença exequenda prolatada anteriormente à entrada em vigor do Novo Código Civil, fixado juros de 6% ao ano, correto o entendimento do Tribunal de origem ao determinar a incidência de juros de 6% ao ano até 11 de janeiro de 2003 e, a partir de então, da taxa a que alude o art. 406 do Novo CC, conclusão que não caracteriza qualquer violação à coisa julgada." Constata-se, a partir da orientação do STJ, que a taxa oficial de juros legais - prevista pelo artigo 406 do CC - é a Taxa Selic. Por isso, nesse contexto, fundamental é o julgamento do REsp nº 1795982 / SP pela Corte Especial do STJ, que revisitará importante tema, com impacto nacional nas mais diversas lides cíveis que tramitam no país.  __________ 1 STJ, REsp 781594/PE, 2ª Turma, Minª. Relª. Eliana Calmon, j. 16.05.2006. 2 STJ, REsp 916567/PE, 2ª Turma, Min. Rel. João Otávio de Noronha, 27.03.2007. 3 STJ, REsp 875919/PE, 1ª Seção, Min. Rel. Luiz Fux, j. 13.06.2007. 4 STJ, EREsp 727842 / SP, Corte Especial, Min. Rel. Teori Albino Zavascki, j. 08.09.2008. 5 Nessa toada: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. PRECATÓRIO COMPLEMENTAR. JUROS MORATÓRIOS. MOMENTO DA INCIDÊNCIA. CRITÉRIOS. VIGÊNCIA NOVO CÓDIGO CIVIL. I - Trata-se de discussão acerca da incidência de juros moratórios em precatório complementar, em autos de execução de título judicial, onde o Tribunal a quo determinou que tais juros incidam à razão de 0,5% ao mês durante a vigência do Código Civil/1916 e, a partir do Novo Código, em 1% ao mês. II - Sob o argumento de que a indenização que gerou a referida execução se deu na vigência do Código Civil/1916, pretende o recorrente que durante todo o período os juros moratórios sejam fixados em 0,5% ao mês. III - Esta eg. Corte de Justiça já tem firme posicionamento no sentido de que os juros de mora são devidos à taxa de 0,5% ao mês, até a vigência do Código Civil de 2002, a partir de quando deve ser considerada a taxa que estiver em vigor para a mora no pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional (artigo 406), ou seja, a SELIC. Precedentes: AgRg no REsp nº 972.590/PR, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJe de 23.06.2008; REsp nº 858.011/SP, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJe de 26/05/2008; REsp nº 926.140/DF, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe de 12.05.2008. IV - Assim, a pretensão estadual é descabida e, por outro lado, considerando-se a peculiaridade da espécie, deve ser mantido o entendimento firmado pelo juízo a quo sobre o percentual dos juros moratórios, nada podendo se deliberar nestes autos sobre a incidência da SELIC, em observância ao princípio da non reformatio in pejus. V - Recurso improvido." - STJ, REsp 926285 / PR, 1ª Turma, Min. Rel. Francisco Falcão, j. 14.10.2008. 6 STJ, REsp 945601 / SC, 2ª Turma, Minª. Relª. Eliana Calmon, j. 16.06.2009. 7 STJ, EDcl no REsp 961512 / SP, 3ª Turma, Min. Rel. Vasco Della Giustina, j. 14.12.2010. 8 STJ, EDcl no REsp 953460 / MG, 3ª Turma, Minª. Relª. Nancy Andrighi, j. 09.08.2011. 9 STJ, AgRg no REsp 886970 / DF, 4ª Turma, Min. Rel. Luis Felipe Salomão, j. 16.08.2011. 10 STJ, EDcl no REsp 1025298 / RS, 2ª Seção, Min. Rel. Luis Felipe Salomão, j. 28.11.2012. 11 STJ, REsp 645729 / RJ, 4ª Turma, Min. Rel. Antonio Carlos Ferreira, j. 11.12.2012. 12 STJ, AgRg no AREsp 311954 / PR, 2ª Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, j. 28.05.2013. 13 STJ, EDcl no AgRg no Ag 1316058 / GO, 3ª Turma, Min. Rel. João Otávio de Noro-nha, j. 10.09.2013. 14 STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1740851 / MA, 3ª Turma, Min. Rel. Moura Ribeiro, j. 24.06.2019. 15 STJ, AgInt no AREsp 1180613 / MS, 4ª Turma, Min. Rel. Marco Buzzi, j. 21.10.2019. 16 STJ, AgInt no REsp 1628809 / SP, 3ª Turma, Min. Rel. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 18.05.2017. 17 STJ, AgInt no AREsp 870448 / SP, 2ª Turma, Min. Rel. Humberto Martins, j. 18.08.2016. 18 STJ, AgRg no REsp 831173 / RJ, 4ª Turma, Min. Rel. Raul Araujo, j. 16.12.2014. 19 STJ, AgInt no REsp 1723791 / MS, 4ª Turma, Minª. Relª. Maria Isabel Gallotti, j. 08.02.2021. 20 STJ, REsp 1846819 / PR, 3ª Turma, Min. Rel. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 13.10.2020.
A comprovação do Feriado Local é uma das muitas armadilhas que vêm atormentando os advogados. A grande conquista da advocacia com a contagem dos prazos processuais em dias úteis pode virar um pesadelo. Dada a importância do tema, ele já foi objeto de três artigos de minha autoria nessa coluna1. Apesar da primazia do julgamento de mérito ser um dos pilares do Código de Processo Civil de 2.015, do entendimento de nossa melhor doutrina quanto a possibilidade de comprovação posterior do feriado local2 e do Enunciado nº 663 do Conselho da Justiça Federal, tal entendimento restou vencido no Superior Tribunal de Justiça. Sendo necessária a comprovação quando da interposição do recurso, dúvida passou a surgir sobre a melhor forma de atestar a existência do feriado local. A mais comum e mais simples seria a juntada do calendário do Tribunal Local atestando os dias em que teríamos feriados.    Tal forma de comprovação restou em xeque após o recentíssimo julgado da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça: "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE QUE NÃO CONHECEU DO RECLAMO EM RAZÃO DA INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE REQUERIDA. 1. É intempestivo o recurso especial interposto após o prazo de 15 (quinze) dias úteis previsto nos artigos 219 e 1.003, § 5º, do CPC/15. 2. De acordo com a jurisprudência do STJ, o dia de Corpus Christi é feriado local, porquanto não previsto em lei federal, razão pela qual a ausência de expediente forense em tal data deve ser comprovada pela parte recorrente, no momento da interposição do recurso, por meio de documento idôneo, o que não ocorreu no presente caso. 3. A juntada de calendário extraído de página da Corte de origem mantida em rede mundial de computadores não se revela como documento idôneo a ensejar a comprovação da existência do aludido feriado, na medida em que, para tanto, é necessária a juntada de cópia de lei ou de ato administrativo que ateste, de modo inequívoco, a ausência de expediente forense na data em questão. Precedentes. 4. Agravo interno desprovido." (g.n.) (AgInt no AREsp n. 1.779.552/GO, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 26/4/2022, DJe de 6/5/2022.) Desse modo, a simples comprovação pela juntada do calendário do tribunal de origem não seria suficiente, sendo necessária a juntada de "lei ou ato administrativo que ateste, de modo inequívoco, a ausência de expediente forense na data em questão." Esse mesmo entendimento vinha sendo manifestado pela Terceira Turma da Corte: "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. INTEMPESTIVIDADE. COMPROVAÇÃO POSTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. DOCUMENTO IDÔNEO. NECESSIDADE. CALENDÁRIO. TRIBUNAL. INVIABILIDADE. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. É intempestivo o recurso especial protocolizado após o prazo de 15 (quinze) dias, de acordo com o artigo 1.003, § 5º, c/c artigo 219, caput, do CPC/2015. 3. O Superior Tribunal de Justiça entende que a existência de feriado local, paralisação ou interrupção de expediente forense deve ser demonstrada por documento oficial ou certidão expedida pelo tribunal de origem que comprove o período em que ocorreu eventual suspensão de prazos, não servindo cópia do calendário do Poder Judiciário extraído da internet. Precedentes. 4. Agravo interno não provido" (g.n.) (AgInt no AREsp n. 1.499.001/GO, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 28/3/2022, DJe de 31/3/2022.) Entretanto, em julgado mais recente, a Terceira Turma, por unanimidade, reviu seu posicionamento e passou a aceitar a comprovação pela juntada do calendário do Tribunal de origem: "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TEMPESTIVIDADE RECURSAL. CALENDÁRIO DO PODER JUDICIÁRIO OBTIDO NA PÁGINA ELETRÔNICA DO TRIBUNAL DE ORIGEM. DOCUMENTO IDÔNEO PARA A COMPROVAÇÃO DE FERIADO LOCAL, NA FORMA DO § 6º DO ART. 1.003 DO CPC/2015. PRECEDENTE DO COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. EXISTÊNCIA DE VÍCIO NA DECISÃO EMBARGADA. EMBARGOS ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. 1. Consoante dispõe o art. 1.022 do CPC/2015, destinam-se os embargos de declaração a expungir do julgado eventual omissão, obscuridade, contradição ou erro material, não se caracterizando via própria ao rejulgamento da causa. 2. Existência de vício no acórdão embargado, que, ao ratificar decisão da Presidência do STJ, ignorou a adequada comprovação da tempestividade recursal. 3. Apresentação, no ato de interposição do recurso especial, de cópia do calendário oficial obtido na página eletrônica do tribunal de origem, em que detalhados todos os feriados locais observados pelo Poder Judiciário estadual, documento que se revela perfeitamente apto à comprovação exigida pelo § 6º do art. 1.003 do CPC/2015, tal como decidido pelo colendo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RMS n. 36.114/AM. 4 . Embargos de declaração acolhidos com efeitos infringentes." (g.n.) (EDcl no AgInt no AREsp n. 1.526.182/SE, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 17/5/2022, DJe de 26/5/2022.) No Recurso Ordinário em Mandado de Segurança citado (RMS 36.114/AM) a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu que "O calendário judicial do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas - o qual instruiu o recurso -, aprovado por meio da Portaria nº 1.930/2015-PTJ, mostrou-se idôneo à elucidação pretendida, reforçada pelo crivo positivo de admissibilidade do Colegiado de origem." Portanto, denota-se que a questão ainda está longe de ser pacificada por nossas Cortes Superiores, cabendo aos operadores serem cautelosos e comprovarem sempre a existência do feriado local por meio da juntada da lei ou ato administrativo que ateste, de modo inequívoco, a ausência de expediente forense na data em questão.  __________ 1 Colunas de 6/7/2017, 25/10/2018 e 6/2/2020. 2 Neste sentido: Luis Guilherme Aidar Bondioli (Comentários ao Código de Processo Civil - arts. 994 a 1.044, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017, p. 68); Daniel Amorim Assumpção Neves (Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo, Salvador: Juspodivm, 2016, p. 1.654); Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero (Novo Código de Processo Civil Comentado, 2ª ed., São Paulo, RT, 2016, p. 1063); Eduardo Talamini e Felipe Scripes Wladeck (Comentários ao Código de Processo Civil, coord. Cássio Scarpinella Bueno, v. 4, São Paulo: saraiva, 2017, p. 377). 3 Enunciado nº 66: "Admite-se a correção da falta de comprovação do feriado local ou da suspensão do expediente forense, posteriormente à interposição do recurso, com fundamento no art. 932, parágrafo único, do CPC."
O tema honorários advocatícios desperta cativante interesse e tem sido objeto das mais variadas discussões enfrentadas pelo STJ. Já tivemos a oportunidade de expor nesta coluna inúmeros entendimentos referentes a mais variadas questões que gravitam em torno da dinâmica da majoração de honorários em grau recursal, regra prevista no art. 85, § 11º, do CPC1-2-3-4-5-6. No tocante ao arbitramento da verba honorária advocatícia, em havendo litisconsortes, dispõe o art. 87 do CPC que os vencidos respondem proporcionalmente pelas despesas e honorários. Referido dispositivo não aponta regras objetivas quanto a aludida distribuição proporcional, tampouco se referida distribuição proporcional da verba honorária advocatícia deve ou não observar as limitações percentuais delineadas pelo art. 85, § 2º, do CPC. Coube a Terceira Turma do STJ perfilhar o entendimento de que, em havendo litisconsortes, em relação ao litisconsorte excluído da lide, há de se relativizar a regra objetiva de fixação dos honorários advocatícios nos percentuais de 10% a 20% sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, regra essa que se ocupa a redação do art. 85 § 2º, do CPC: "CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. COBRANÇA DE VALORES PREVISTOS EM CONTRATO. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE CONTRATANTE. ALEGAÇÃO DE OFENSA A BOA-FÉ OBJETIVA E INVOCAÇÃO DA TEORIA DA APARÊNCIA. TEMAS NÃO PREQUESTIONADOS. SÚMULA Nº 211 DO STF. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE CONTRATADA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO CONFIGURADA. EXCLUSÃO DE LITISCONSORTE PASSIVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. FIXAÇÃO DE FORMA PROPORCIONAL A MATERIA DECIDIDA NO JULGAMENTO PARCIAL DA LIDE. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 85, § 2º, DO CPC NÃO CARATERIZADA. 1. As disposições do NCPC, no que se refere aos requisitos de admissibilidade dos recursos, são aplicáveis ao caso concreto ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016. 2. Recurso especial de SUSANA. A invocação aos princípios da boa-fé objetiva e da teoria da aparência não foram examinadas pelo Tribunal estadual a despeito dos embargos de declaração ali opostos. O tema carece, portanto, do devido prequestionamento, merecendo aplicação a Súmula nº 211 do STJ. 3. Recurso especial de POLLYMER. Negativa de prestação jurisdicional não configurada, pois houve exame adequado de todas as questões submetidas à apreciação judicial na medida necessária para o deslinde da controvérsia, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte. 4. A teor do Enunciado nº 5 da I Jornada de Direito Processual Civil, ao proferir decisão parcial de mérito ou decisão parcial fundada no art. 485 do CPC, condenar-se-á proporcionalmente o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor, nos termos do art. 85 do CPC. 5. Isso significa que o juiz, ao reconhecer a ilegitimidade ad causam de um dos litisconsorte passivos e excluí-lo da lide, não está obrigado a fixar, em seu benefício, honorários advocatícios sucumbenciais mínimos de 10% sobre o valor da causa. 6. O art. 85, § 2º, do NCPC, ao estabelecer honorários advocatícios mínimos de 10% sobre o valor da causa, teve em vista decisões judiciais que apreciassem a causa por completo, ou seja, decisões que, com ou sem julgamento de mérito, abrangessem a totalidade das questões submetidas a juízo. Tratando-se de julgamento parcial da lide, os honorários devem ser arbitrados de forma proporcional a parcela do pedido efetivamente apreciada. 7. A prevalecer o entendimento propugnado nas razões do apelo nobre, no sentido de que o litisconsorte excluído antecipadamente faz jus a honorários de no mínimo 10% sobre o valor da causa, seria forçoso concluir que, numa outra hipótese, na qual presentes vários réus excluídos em momentos diferentes do processo, a verba honorária total poderia ultrapassar o limite legal de 20% sobre o valor da causa. 8. Recurso especial de SUSANA não conhecido. Recurso especial de POLLYMER não provido." (STJ, REsp 1760538/RS, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, j. 24/05/2022, DJe 26/05/2022, grifou-se)   (...) O voto condutor, da lavra da Ministro Moura Ribeiro, bem asseverou, em síntese: "(...) No caso dos autos apresenta-se mais uma questão relativa a honorários advocatícios sucumbenciais. Discute-se, neste processo, como devem ser fixados os honorários sucumbenciais nas hipóteses de exclusão de litisconsortes, tendo em vista os limites mínimo e máximo fixados no art. 85, § 2º, do NCPC que assim dispõe: Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. § 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; Como se percebe, o legislador quis conferir maior objetividade à quantificação dos honorários advocatícios sucumbenciais, determinando que eles devem ser arbitrados entre 10% e 20% sobre o valor da condenação ou, subsidiariamente, sobre o proveito econômico obtido ou, se imensurável, sobre o valor atualizado da causa. A pergunta que se coloca é se, nas hipóteses de exclusão de litisconsortes passivos, serão devidos sempre e em qualquer caso, honorários mínimos de 10% ou se, ao contrário, referida verba pode, excepcionalmente, ser fixada em menor percentual. No caso dos autos, a ação monitória foi proposta contra ANDRÉ e POLLYMER e, tendo sido reconhecida a ilegitimidade passiva desta sociedade, foi fixado, em benefício do seu patrono, verba honorária equivalente a 5% sobre o valor da causa. Não parece que daí resulte algum tipo de ilegalidade, porque observado o valor mínimo dos honorários advocatícios sucumbenciais que caberia ao advogado de POLLYMER. Afinal, se era lícita a fixação de honorários no percentual mínimo de 10% sobre o valor da causa na hipótese de rejeição dos embargos monitórios, é porque cada um dos réus receberia, em princípio, apenas 5% do valor da causa, correspondente a fração ideal do montante integral da verba de sucumbência. Dessa forma, sobrevindo decisão que julga parcialmente a causa, excluindo antecipadamente da lide um dos litisconsortes passivos, não parece coerente afirmar que houve ofensa ao art. 85, § 2º, do NCPC se, justamente, foi fixado, em seu benefício, honorários advocatícios sucumbenciais correspondentes ao quinhão que lhe tocaria na hipótese de uma decisão que apreciasse integralmente a lide. Perceba-se que o momento em que se dá o reconhecimento da ilegitimidade da parte ré (no curso ou ao fim do processo) não pode ser tomado como fundamento para majorar o valor dos honorários advocatícios devidos em favor da parte. Admitindo que o reconhecimento da ilegitimidade passiva ao final do processo pode resultar em honorários advocatícios de apenas 5% do valor da causa, parece necessário admitir que o reconhecimento antecipado dessa mesma circunstância pode, igualmente, resultar em honorários de apenas 5% sobre o valor da causa. A prevalecer o entendimento propugnado nas razões do apelo nobre, no sentido de que o litisconsorte excluído faz jus a honorários de no mínimo 10% sobre o valor da causa, imperioso seria concluir que, numa outra hipótese, em que presentes vários réus excluídos em momentos diferentes do processo, a verba honorária total poderia ultrapassar o limite legal de 20% sobre o valor da causa. Imagine-se, por exemplo, uma demanda proposta contra três réus. Dois deles sustentam, em contestação, ilegitimidade passiva para a causa. O magistrado de primeiro grau, no saneador, reconhece a ilegitimidade em favor de apenas um dos réus, e o Tribunal de Justiça dá provimento ao agravo de instrumento manejado em seguida para reconhecer a ilegitimidade passiva também em relação ao segundo réu. Ao final, sobrevém sentença julgando improcedente o pedido em relação ao terceiro réu que permaneceu no feito. Nessa situação, a cada decisão de extinção parcial sem julgamento de mérito, os honorários deveriam ser fixados no mínimo em 10% sobre o valor da causa. Logo, ao final do processo, a verba honorária total seria equivalente a no mínimo 30% sobre o valor da causa, o que claramente violaria o art. 85, § 2º, do NCPC. Ainda com base nessa mesma situação hipotética poder-se-ia cogitar que, se o pedido fosse julgado procedente em relação aos três réus, o autor da demanda teria assegurado, em proveito do seu patrono, apenas 10% sobre o valor da causa.  Não parece isonômico, portanto, admitir que alguém, desejando iniciar uma demanda, possa ser obrigado a pagar 30% de honorários advocatícios em caso de insucesso (com exclusões sucessivas de dois réus e posterior julgamento de improcedência do pedido), mas receber apenas 10% na hipótese de êxito. Bem por isso, o Enunciado nº 5 da I Jornada de Direito Processual Civil, realizada pelo CJF entre 24 e 25 de agosto de 2017, estabeleceu: Ao proferir decisão parcial de mérito ou decisão parcial fundada no art. 485 do CPC. condenar-se-á proporcionalmente o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor, nos termos do art. 85 do CPC. Nesta Corte Superior também é possível localizar julgados asseverando que os honorários advocatícios sucumbenciais, nos casos de decisões parciais de mérito, devem observar a parcela da pretensão decidida antecipadamente. (...) Examinando o inteiro teor de tais julgados, é possível observar que eles não tratam de situação idêntica a dos autos. Não versam sobre a fixação de honorários em caso de exclusão de litisconsorte passivo por ilegitimidade ad causam. Apesar disso, empregaram o advérbio proporcionalmente contido no Enunciado nº 5 da Jornada de Direito Processual Civil para adequar o valor dos honorários à parcela do pedido efetivamente apreciado nas decisões parciais de mérito examinadas Assim, admitindo-se que a legitimidade das pessoas indicadas no polo passivo da demanda constitui (parte da) matéria a ser examinada pelo julgador, tem-se que admitir também, por coerência, que os honorários a serem fixados na decisão parcial que aprecia a legitimidade deve ser proporcional ao tema efetivamente decidido. Em suma, o art. 85, § 2º, do NCPC, ao fixar honorários advocatícios mínimos de 10% sobre o valor da causa, teve em vista as decisões judiciais que apreciassem a causa por completo. Decisões que, com ou sem julgamento de mérito, abrangessem a totalidade das questões submetidas a juízo. Nas hipóteses de julgamento parcial, como ocorre na decisão que exclui um dos litisconsortes passivos sem pôr fim a demanda, os honorários devem observar proporcionalmente a matéria efetivamente apreciada. (...) (STJ, REsp 1760538/RS, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, j. 24/05/2022, DJe 26/05/2022, grifou-se) Consoante se depreende do entendimento supra citado, o limitador de 10% a 20%, sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido, ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor da causa (hipótese que sói ocorre quando há exclusão de litisconsorte no curso da demanda, antes de qualquer condenação), previsto no art. 85, § 2º, do CPC, há de ser compreendido em vista as decisões judiciais que apreciassem a causa por completo, a abranger a totalidade das questões submetidas a juízo, de sorte que, em havendo exclusão de um dos litisconsortes passivos da lide, sem pôr fim a demanda, os honorários devem observar proporcionalmente a matéria efetivamente apreciada. As razões que se assentaram o voto condutor partem da premissa de que, em havendo litisconsórcio passivo, sendo um dos litisconsortes excluído da lide e arbitrada a verba honorária em 10%, a sobrevier ulterior sentença de procedência da demanda, seria injusto com o Autor aplicar mais 10% de verba honorária advocatícia devida a cada um dos litisconsortes passivos que sagrarem-se vendedores na demanda, a fatalmente transcender a limitação de 20% prevista no art. 85, § 2º, do CPC. Malgrado o entendimento acima, ao trazer balizas de que o máximo da condenação que o Autor, sucumbente, venha experimentar quando litiga contra diversos réus, não pode exceder o percentual de 20% (observada as balizas do art. 85, § 2º, do CPC), espera-se que igual premissa seja adotada na situação inversa. Em outras palavras, sendo o Autor vencedor em demanda contra diversos Réus, a verba honorária advocatícia arbitrada em desfavor do Réus não poderá transcender a soma do percentual de 20%, observadas as hipóteses referenciadas no art. 85, § 2º. __________ 1 O cabimento da majoração (i) há de ser observado em recursos interpostos na vigência do CPC de 2015, (ii) pressupõe pretérita sucumbência arbitrada, (iii) os honorários são majorados na hipótese de improvimento ou não conhecimento do recurso por culpa do recorrente, e (vi) o aumento da verba honorária não incide se já majorada no mesma instância recursal. 2 Afastamento dos honorários advocatícios recursais em recursos tirados de mandado de segurança. 3 Nos recursos de apelação tirados de sentenças ilíquidas, caberá ao juízo a quo a fixação da verba honorária cuja majoração restou determinada pelo tribunal ao improver ou não conhecer do recurso.  4 Cabimento de honorários advocatícios recursais em embargos de declaração, caso o tribunal deixe de aplicar o art. 85, § 11º quando do julgamento da apelação.  5 Decisões divergentes, no bojo do STJ, quanto ao cabimento ou não de honorários advocatícios recursais quando o objeto do recurso interposto versa exclusivamente sobre a majoração de verba honorária advocatícia arbitrada pelo juízo a quo.  6 E, recentemente, tecemos considerações acerca da majoração de honorários advocatícios recursais quando a decisão atacada restar mantida em relação aos demais litisconsortes.
O art. 833, do CPC, indica os bens que são considerados impenhoráveis no processo de execução, ou seja, que não podem ser apreendidos por ordem judicial para serem empregados direta ou indiretamente na satisfação da obrigação que está sendo objeto de execução forçada (contra a vontade do devedor). O inciso IV do art. 833 estabelece, por sua vez, que os salários são impenhoráveis, "ressalvado o § 2º". E a ressalva do § 2º é a seguinte: "(...) o disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem (...)". Em outras palavras, se a penhora for realizada para assegurar o "pagamento de prestação alimentícia", independentemente de sua origem, ela pode, sim, recair sobre salário. Ao menos, essa é a interpretação literal. A questão que se coloca, portanto, é a seguinte: as verbas de sucumbência têm natureza de prestação alimentícia ou não? Como se sabe, as verbas de sucumbência são aquelas mencionadas pelo art. 85, do CPC: "A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor". Assim, a indagação é: os honorários advocatícios aos quais o vencido é condenado a pagar ao advogado do vencedor em um processo judicial têm natureza alimentar? Para além de respostas lamentavelmente frequentes como "se fulano é advogado, vai dizer que sim pois está defendendo a classe" ou "se fulano é juiz, vai dizer que não, pois não gosta de ver advogado ganhando muito", vamos tentar responder tal pergunta com amparo na lei e não em percepções distorcidas da realidade, que não contribuem para uma melhor distribuição da justiça. Pois bem, o § 14 do art. 85 do CPC dispõe que "Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial" (grifos nossos). À luz da lei, portanto, os honorários advocatícios de sucumbência tem natureza alimentar. E esse seria o fim da história se o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não resolvesse "interpretar" o § 14 do art. 85 do CPC. E é isso que ele vai fazer em breve. A questão acima delineada foi submetida a julgamento e cadastrada no sistema de recursos repetitivos do STJ como Tema 1.153, com a seguinte redação: "Definir se os honorários advocatícios de sucumbência, em virtude da sua natureza alimentar, inserem-se ou não na exceção prevista no parágrafo 2º do artigo 833 do Código de Processo Civil de 2015 - pagamento de prestação alimentícia". Há dois recursos selecionados como representativos da controvérsia (REsp 1.905.573 e REsp 1.947.011) cuja relatoria coube ao ministro Villas Bôas Cueva. Cumpre observar que a Corte Especial do STJ, em recurso julgado em 2020 (REsp 1.815.055), já decidiu que as exceções destinadas à execução de prestação alimentícia não se estendem aos honorários advocatícios. Mas mesmo com este entendimento pacificado no STJ, ainda há tribunais que decidem de maneira diferente. Por tal razão é que o tema vem à tona novamente, para que o STJ decida pela sistemática dos recursos repetitivos, que honorários advocatícios de sucumbência não tem caráter alimentar. O Tema 1.153 ainda não foi julgado, mas não precisa ser um expert para conseguir adivinhar qual será o resultado. O § 14 do art. 85 do CPC sofrerá um golpe de uma força nunca antes vista que será difícil lembrar que um dia ele existiu (apesar de ter sido votado no Congresso Nacional e passado por todo o processo legislativo regular para se tornar uma Lei Federal). E quem perderá, mais uma vez será o jurisdicionado, que precisa de um advogado, que exerce função indispensável à administração da Justiça (quem diz isso é o art. 133, da Constituição Federal). Isso porque o advogado precisa sobreviver e receber pelo seu trabalho e, se os honorários sucumbenciais estão cada vez mais difíceis de receber com obstáculos artificiais de "interpretação", este profissional tem que garantir o sustento de sua família pelos honorários contratuais apenas. Se houvesse um pouco de previsibilidade e certeza no recebimento das verbas de sucumbência, será que os honorários contratuais precisariam ser altos? Antes de responder, lembre-se de um princípio geral do direito: a boa-fé é que se presume e a má-fé deve ser provada, sempre.
Em recente acórdão proferido relativo à proposta de afetação do Recurso Especial n. 1.955.539 - SP, restou estabelecido que, sob o rito dos recursos repetitivos, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça ("STJ") definirá os limites e requisitos para a aplicação do artigo 139, IV, do CPC/15, verificando se "é possível, ou não, o magistrado, observando-se a devida fundamentação, o contraditório e a proporcionalidade da medida, adotar, de modo subsidiário, meios executivos atípicos". O tema não é novo no STJ, sendo certo que a terceira turma já vinha delineando que as medidas atípicas devem ser subsidiariamente aplicadas, sendo condicionadas à presença de indícios de que exista patrimônio penhorável, além da necessidade de o magistrado aplicá-las com a observância dos princípios da proporcionalidade, motivação e contraditório. Foi exatamente essa a linha adotada no julgamento proferido no Recurso Especial n. 1896421/SP, conforme já noticiado nessa coluna: "6. A adoção de meios executivos atípicos é cabível desde que, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade". A 3ª. turma do STJ também enfrentou o tema no julgamento do AgInt no REsp 1799638 / SP, sendo que restou enfatizado que são requisitos para a aplicação do artigo 139, IV, do CPC/15: "i) existência de indícios de que o devedor possua patrimônio apto a cumprir com a obrigação a ele imposta; ii) decisão devidamente fundamentada com base nas especificidades constatadas; iii) a medida atípica deve ser utilizada de forma subsidiária, dada a menção de que foram promovidas diligências à exaustão para a satisfação do crédito; e iv) observância do contraditório e o postulado da proporcionalidade". A grande novidade do julgamento da proposta de afetação relativa ao Recurso Especial n. 1.955.539 - SP é o desafio do STJ de, sob o regime dos recursos repetitivos, fixar a tese quanto aos limites e requisitos para a aplicação do artigo 139, IV, do CPC/15, tese esta que restará consagrada para fins de precedente previsto no artigo 927, III, do CPC/15. A fixação da tese será de grande importância para o meio jurídico, em especial em tema onde, desde o início da vigência do CPC/15, existem relevantes reflexões doutrinárias. Vale lembrar que Teresa Arruda Alvim1 enfatiza a necessidade de o inciso IV do artigo 139 do novo CPC/15 ser interpretado "com grande cuidado, sob pena de, se entender que em todos os tipos de obrigações, inclusive na de pagar quantia em dinheiro, pode o juiz lançar mão de medidas típicas das ações executivas lato sensu, ocorrendo completa desconfiguração do sistema engendrado pelo próprio legislador para as ações de natureza condenatória". E Flávio Luiz Yarshell2, por sua vez, doutrina que, quanto ao artigo 139, IV, "será preciso cuidado na interpretação desta norma, porque tais medidas precisam ser proporcionais e razoáveis, lembrando-se que pelas obrigações pecuniárias responde o patrimônio do devedor, não sua pessoa. A prisão civil só cabe no caso de divida alimentar e mesmo eventual outra forma indireta de coerção precisa ser vista com cautela, descartando-se aquelas que possam afetar a liberdade e ir e vir e outros direitos que não estejam diretamente relacionados com o patrimônio do demandado". Não se olvide, por fim, que o tema ainda precisa ser enfrentado pelo Supremo Tribunal Federal ("STF"), no julgamento da ADI n. 5941, na qual se debate o desafio da constitucionalidade das medidas executivas atípicas, tendo a PGR já ali se posicionado no sentido de que o artigo 139, IV, do CPC/15, deveria ser aplicado de forma subsidiária e sempre com o escopo de possibilitar medidas de natureza patrimonial, evitando-se a efetivação de medidas que possam gerar restrições de direitos. Tanto o STF como o STJ, quanto ao tema, terão fundamental importância para o estabelecimento dos requisitos para a aplicação do artigo 139, IV, do CPC/15, almejando-se a sempre construir uma técnica de conformidade entre este dispositivo e os princípios presentes nos artigos 4, 6, 8 e 9 do CPC/15.   __________ 1 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins. RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. TORRES de MELLO, Rogério Licastro. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 1ª. Edição. São Paulo: RT, 2015. p. 264. 2 COELHO, Marcus Vinicius Furtado. MEDEIROS NETO, Elias Marques de. YARSHELL, Flávio Luiz. PUOLI, José Carlos Baptista. O Novo Código de Processo Civil: Breves Anotações para a Advocacia. Brasília: OAB, Conselho Federal, 2016. p. 28.
Em meu último artigo escrito em nossa coluna tive a oportunidade de citar o Julgamento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça sobre a fixação dos honorários por equidade1.                         Restou fixada a tese que de acordo com o § 8º, do artigo 85 do CPC, a equidade na fixação dos honorários advocatícios só pode se dar para aumentar honorários que seriam irrisórios2.  Basicamente se respeitou a previsão legal, que concorde-se ou não, foi a opção do legislador e deve ser prestigiada.  Dúvida que surgiu é se efetivamente o Tema nº 1.076 dos Recursos Repetitivos seria aplicado por nossos Tribunais. E o bom exemplo vem da nossa mais alta Corte. Em recentíssimo julgado, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu:  AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SENTENÇA RESTABELECIDA. INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. LIDE COM VALOR CERTO E DETERMINADO. VERBA HONORÁRIA RAZOÁVEL E PROPORCIONAL AO VALOR DA CAUSA. 1. A lide em que se postulou a anulação do Auto de Infração e da imposição da multa tem valor certo e determinado. Assim, não há razão para que verba honorária seja fixada por apreciação equitativa. 2. O CPC/2015 tornou mais objetivo o processo de determinação da verba sucumbencial, restringindo a subjetividade do julgador e remetendo-o aos critérios previstos no art. 85 do diploma processual, aos quais deve se submeter o caso concreto, na ordem de preferência estabelecida nos parágrafos desse artigo. 3. Com o provimento do RE, restauraram-se os honorários advocatícios, fixados na sentença em total conformidade com o CPC. Desse modo, não cabe qualquer alteração da verba honorária, a qual também se revela razoável e proporcional à complexidade da causa. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (ARE 1367266 ED-AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 22/04/2022, publ.28-04-2022) Cumpre frisar que o respeito à decisão do Superior Tribunal de Justiça, a quem cabe a última palavra quanto às questões infraconstitucionais, é expresso no voto do Ministro Relator:  "Registre-se que o Superior Tribunal de Justiça, a quem cabe a interpretação do direito infraconstitucional, compreende que o CPC/2015 tornou mais objetivo o processo de determinação da verba sucumbencial, restringindo a subjetividade do julgador e remetendo-o aos critérios previstos no art. 85 daquele diploma processual, aos quais deve se submeter o caso concreto na ordem de preferência estabelecida nos parágrafos daquele artigo." O referido julgamento proferido após a consolidação do entendimento do STJ sobre a matéria se mostra importante, eis que em fevereiro do corrente ano o Plenário do STF, de forma unânime, determinou a redução dos honorários pela aplicação da equidade:  "Direito Processual Civil. Embargos de declaração em ação cível originária. Honorários advocatícios. 1. Embargos de declaração opostos contra acórdão que julgou parcialmente procedente o pedido com fixação de honorários em percentual sobre o valor da causa. 2. Fixação dos honorários que gera à parte sucumbente condenação desproporcional e injusta. Processo que tratou de questão exclusivamente de direito. 3. Revisão do valor dos honorários para arbitrá-los por equidade, conforme art. 85, § 8º, do CPC. Precedentes. 4. Embargos de declaração parcialmente providos para fixar os honorários advocatícios por apreciação equitativa." (g.n.) (ACO 2988 ED, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 21/02/2022, Publ. 11-03-2022) Essa aparente mudança de entendimento de nossa mais alta Corte em respeito ao entendimento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça é salutar e sem dúvida tem um efeito educativo, multiplicador e exemplar para os Tribunais Locais. Desse modo, espera-se que realmente o Tema nº 1.076 do STJ seja de observância obrigatória pelas nossas Cortes, com a eliminação de subjetivismos quanto a fixação dos honorários e reduzindo em muito os recursos em que só se discute a fixação de honorários advocatícios. __________ 1 Disponível aqui. 2 Nesse sentido o professor Cássio Scarpinella Bueno defende que "Sua aplicação, todavia, deve ficar restrita às hipóteses referidas no próprio § 8º do artigo 85, isto é, quando o proveito econômico perseguido for inestimável ou irrisório ou quando o proveito econômico perseguido for inestimável ou irrisório ou quando se tratar de valor da causa tão baixo que a fixação percentual referida nos §§ 3º e 4º do mesmo art. 85 não teria o condão de remunerar condignamente o trabalho do advogado. Entendimento contrário seria fazer prevalecer regra similar à do § 4º do art. 20 do CPC de 1973 que foi, como já destaquei acima, abolida do sistema processual pelo CPC de 2015." ("Honorários Advocatícios e o art. 85 do CPC de 2015: reflexões em homenagem ao professor José Rogério Cruz e Tucci", Estudos de Direito processual Civil em homenagem ao Professor José Rogério Cruz e Tucci, Salvador: Jus Podivm, 2018, p.134.