Tempos bicudos e heroicos
quinta-feira, 8 de maio de 2025
Atualizado em 7 de maio de 2025 13:56
Foram tempos escuros e obscuros. Sentia-se os efeitos de um autoritarismo recém implantado, que já mostrava as suas garras e nos dava um prognóstico desfavorável às franquias democráticas e à liberdade. Os anos eram 1966/67 o ambiente era o universitário, especificamente a Faculdade Paulista de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Em frente ao prédio da PUC, situado no velho convento da Monte Alegre, estava instalado o Centro Acadêmico 22 de Agosto. Locais muito queridos que nos legaram recordações de fatos e de sentimentos que nos deixaram marcas irremovíveis. Acaloradas discussões acadêmicas e políticas; festas memoráveis; trotes; brigas verbais e físicas; chopadas que se estendiam para o meio das ruas. Na verdade, começavam no campo de futebol existente na parte baixa do prédio da Faculdade. Inúmeras, portanto, eram as atividades na Faculdade e no Centro.
Eu, no entanto, participei de uma, involuntariamente, que tinha um caráter, revolucionário, diria até terrorista. Certa manhã, abri um carrinho do refrigerante Fanta que estava parado na entrada do Centro. Dentro não encontrei a bebida, mas sim o chamado coquetel "MOLOTOV". Garrafas cheias de gasolina com um pano no gargalo, que aceso e arremessado substituía um eficiente explosivo. Claro que preferi manter a sede.
Ao lado das agitações políticas, manifestações constantes contra o regime militar, que aumentava progressivamente o grau de repressão, houve a tomada das Faculdades. Os alunos da Católica e da São Francisco montaram um esquema para a tomada dos respectivos prédios e da manutenção da ocupação. Não me recordo do tempo em que os estudantes permaneceram "amotinados" sem permitir a entrada de estranhos. Entenda-se como estranhos a polícia. Essa não promoveu invasão, como ocorreu em 1977 no prédio da PUC. Aguardou que os alunos desocupassem os edifícios. Eu não sei qual a razão dessa passividade
Um fato pitoresco eu assisti quando, embora aluno da PUC, estive na São Francisco. No belíssimo Salão Nobre, os bustos das grandes figuras que passaram pela escola estavam voltados para a parede.
Divergem as interpretações desse ato simbólico. O que representava? Qual o seu simbolismo?
Para os favoráveis ao golpe militar e contrários à tomada da Faculdade, postos olhando para a parede as celebridades estavam alheias ao que se passava dentro do Largo de São Francisco, portanto contrários aos protestos.
Já para os que se rebelavam contra a ditadura, estava-se poupando antigos alunos e professores de assistirem aos eventuais atos de repressão caso a polícia entrasse na Faculdade.
A época era de diversidade, de medo e de coragem.