COLUNAS

  1. Home >
  2. Colunas >
  3. Notas contemporâneas com Murillo de Aragão >
  4. A tragédia venezuelana e a omissão brasileira

A tragédia venezuelana e a omissão brasileira

segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

Atualizado às 07:19

A recente posse de Nicolás Maduro, fruto de um processo eleitoral amplamente contestado, consolida a Venezuela como o exemplo mais flagrante de uma democracia falsificada. Maduro perpetua um regime autoritário que devastou a economia, fragmentou a sociedade e alinha o país a um grupo de nações párias que desafiam abertamente os valores democráticos globais. Sob a máscara de um sistema eleitoral manipulado, o regime chavista emprega o cinismo político como estratégia de sobrevivência, sustentando sua legitimidade com repressão interna e alianças externas questionáveis.

A Venezuela, outrora a economia mais próspera da América Latina, transformou-se em um símbolo de colapso econômico. Durante o século XX, o país viveu uma era de prosperidade alicerçada nos altos preços do petróleo, sem esforços para diversificar sua economia. A ascensão de Hugo Chávez marcou uma nova fase de populismo autoritário, sustentado pela bonança dos anos 2000, mas também pavimentou o caminho para a crise. A combinação de estatizações, controle de preços e repressão institucional destruiu o tecido econômico, que desmoronou sob Nicolás Maduro com a queda dos preços do petróleo em 2014. Hoje, o PIB venezuelano é apenas uma fração do que era há uma década, enquanto milhões de cidadãos vivem em pobreza extrema ou buscam refúgio em outros países.

Desde 2015, mais de 7,7 milhões de venezuelanos fugiram do país, gerando uma crise migratória sem precedentes na região. Esse êxodo massivo, que representa cerca de 25% da população, sobrecarregou os sistemas públicos de nações vizinhas, como Colômbia, Brasil e Peru, agravando tensões sociais e econômicas. Apesar dessa tragédia humanitária, Maduro continua a instrumentalizar uma democracia falsificada para manter o controle, repetindo um padrão de manipulação eleitoral, exclusão de opositores, censura e uso dos recursos do Estado para coagir eleitores.

O regime chavista também se fortalece com alianças regionais e globais, formando o que pode ser descrito como um "eixo do cinismo" com regimes como Cuba e Nicarágua, além de apoio estratégico de potências como Rússia e China. Essas parcerias não apenas fornecem respaldo político e econômico, mas também reforçam estratégias de repressão que ameaçam a estabilidade democrática global. Ao mesmo tempo, a comunidade internacional permanece ambígua. Declarações de condenação e sanções pontuais têm sido insuficientes para enfraquecer o autoritarismo de Maduro, enquanto muitos países ainda mantêm relações econômicas com a Venezuela, corroendo a eficácia das pressões multilaterais.

O Brasil, maior economia da América Latina e ator estratégico na região, tem a responsabilidade de adotar uma postura clara e decisiva diante da farsa venezuelana. Ignorar ou minimizar a crise significa, na prática, legitimar um regime que viola princípios básicos de democracia e direitos humanos. O Brasil deve liderar iniciativas em fóruns multilaterais, como a OEA e o Mercosul, para exigir reformas concretas, a realização de eleições livres e justas e o respeito às liberdades civis na Venezuela. Além disso, a posição brasileira deve ser respaldada por ações humanitárias robustas, fortalecendo políticas de acolhimento aos refugiados venezuelanos, ao mesmo tempo em que trabalha para mitigar os impactos sociais dessa migração na região.

Por fim, a política externa brasileira deve equilibrar pragmatismo com firmeza de princípios. Manter canais diplomáticos abertos é importante, mas qualquer gesto de complacência ou neutralidade será interpretado como apoio ao autoritarismo chavista. Ao assumir um papel ativo na defesa da democracia e dos direitos humanos, o Brasil não apenas reafirma seu compromisso com os valores que orientam a estabilidade regional, mas também consolida sua posição como líder ético e estratégico na América Latina. A crise venezuelana não é apenas um problema de um país vizinho; é um teste para a capacidade do Brasil de liderar e influenciar positivamente em tempos de incerteza e ameaça democrática.