MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. Migalhas de peso >
  4. Considerações acerca do empréstimo consignado CLT

Considerações acerca do empréstimo consignado CLT

Artigo trata das inovações trazidas pela MP 1.292, de 12/3/25, que ampliou para os trabalhadores celetistas a possibilidade de contratação de empréstimo consignado.

terça-feira, 8 de abril de 2025

Atualizado às 13:28

No dia 12 de março de 2025, entrou em vigor a MP 1.292, alterando a lei 10.820/03, dando direito aos empregados, com Contrato de Trabalho ativo, de aderirem ao empréstimo consignado bancário.

Esta nova modalidade tem sido chamada de "empréstimo consignado CLT" ou "Crédito do Trabalhador", exigindo atenção de trabalhadores, empregadores e das instituições bancárias concedentes.

A alteração foi feita com o §9º do art. 1º da lei 10.820/03, incluído pela Medida Provisória acima indicada, que assim dispõe: "A consignação voluntária mencionada no caput será aplicável a todos os vínculos empregatícios ativos no momento da contratação do crédito que se fizerem necessários ao adimplemento das obrigações assumidas, e será autorizado, em caso de rescisão ou de suspensão do contrato de trabalho, o seu redirecionamento para...".

A inclusão dos trabalhadores abrange empregados urbanos, rurais e domésticos, além de diretores não empregados com direito ao FGTS, conforme novo §11º do Art. 1º da lei 10.820/03, também inserido pela MP.

A legislação estabelece o percentual de comprometimento da remuneração do trabalhador para o pagamento das mensalidades do empréstimo, devendo ser observado o limite de "...40% (quarenta por cento), sendo 35% (trinta e cinco por cento) destinados exclusivamente a empréstimos, financiamentos e arrendamentos mercantis e 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente à amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito consignado ou à utilização com a finalidade de saque por meio de cartão de crédito consignado.", conforme Art. 1º, §1º da lei 10.820/03, com redação alterada pela lei 14.431, de 2022.

O desconto mensal na remuneração do trabalhador, para pagamento dos empréstimos, pode ser de, até, 35%, podendo também ser deduzido de suas verbas rescisórias, no caso de extinção do contrato de trabalho, caso autorizado pelo empregado.

No momento da contratação do crédito, o empregado poderá dar como garantia, de maneira irrevogável e irretratável, até 10% do saldo de sua conta vinculada do FGTS e até 100% do valor da multa paga pelo empregador, em caso de dispensa sem justa causa ou extinção por culpa recíproca ou força maior.

O FGTS do trabalhador, utilizado como lastro do empréstimo, somente poderá ser acionado nos casos de "...despedida sem justa causa, inclusive a indireta, ou de despedida por culpa recíproca ou força maior..." do empregado, criando-se uma exceção à regra de impenhorabilidade prevista no §2º do art. 2º da lei 8.036/90.

Em caso de rescisão ou suspensão do contrato de trabalho, o empregado poderá redirecionar os descontos para outros vínculos de emprego ativos no momento da contratação do crédito, mas inicialmente não alcançados pela consignação, ou outros vínculos empregatícios que surjam posteriormente à contratação da operação de crédito.

Destacamos, ainda, que a Medida Provisória implementou a possibilidade do trabalhador optar pela portabilidade da operação de crédito, transferindo seu contrato para outras instituições bancárias. Além disto, a lei já previa a possibilidade do trabalhador solicitar o bloqueio de novos descontos em seu salário.

Cabe salientar a responsabilidade do empregador, quando da contratação do consignado por seu empregado, de "efetuar todos os procedimentos necessários para a operacionalização dos descontos dos valores das prestações contratadas em operações de crédito, inclusive nas verbas rescisórias".

Caso o valor descontado do salário e das verbas rescisórias do trabalhador não seja repassado para a instituição concedente do empréstimo, o empregador fica sujeito a responder por perdas e danos que houver causado à instituição consignatária e ao empregado e, no caso de apropriação dos recursos, estará sujeito às penalidades administrativas, civis e penais aplicáveis, conforme §5º do Art. 3º da lei 10.820/03.

Na hipótese em que os valores retidos do salário e das verbas rescisórias do obreiro não forem repassados para as instituições bancárias, o empregador responderá como devedor principal e solidário perante a instituição consignatária.

Entendemos como peculiar a utilização do saldo do FGTS como garantia do empréstimo, pois o empregado somente pode sacar o valor do fundo nas hipóteses previstas no Art. 20 da lei 8.036/1990.

Assim, mesmo sem poder utilizar o valor depositado mensalmente por seu empregador, o trabalhador poderá indicar o crédito como garantia de empréstimo contraído junto às instituições bancárias. Neste caso o empregado pagará juros sobre seu saldo de FGTS, utilizado como lastro para o empréstimo.

Além disto, o oferecimento, como garantia do consignado, de "até 100% (cem por cento) do valor da multa paga pelo empregador, em caso de despedida sem justa causa ou de despedida por culpa recíproca ou força maior" antecipa situação hipotética que pode não ocorrer, ou seja, caso o contrato de trabalho seja extinto por iniciativa obreira, nenhum valor será devido a título de indenização do FGTS. Nesta situação, inexistirá o valor concedido como garantia.

Não obstante a intenção do legislador, expressamente indicada na exposição de motivos da Medida Provisória, de garantir ao trabalhador celetista o acesso a empréstimos com melhores condições de crédito, entendemos que a utilização do FGTS como lastro do consignado vulnerabiliza importante direito constitucional trabalhista.

Cabe salientar que as alterações acima tratadas foram implementadas por meio de Medida Provisória, com período máximo de vigência de 60 (sessenta) dias, podendo ser prorrogada uma vez, por igual prazo, sendo fundamental monitorar se os seus termos serão convertidos em Lei, sob pena de perderem eficácia ainda no ano de 2025.

Por lealdade ao leitor, destaca-se que a movimentação do FGTS já foi autorizada por Medida Provisória em outras oportunidades como, por exemplo, ocorrido na época da pandemia do COVID (MP 1.105/22).

Em se tratando de temática nova, com implicações para toda a sociedade, incluindo os trabalhadores, os empregadores e as instituições bancárias, o presente artigo visa apresentar as inovações trazidas pela Medida Provisória, sendo certo que a matéria merece atenção e debate pelos operadores do direito.

Otávio Vieira Tostes

Otávio Vieira Tostes

Advogado sócio do escritório Tostes e de Paula Advocacia Empresarial, mestre em Direito Empresarial, especialista em Direito do Trabalho, professor de graduação e pós-graduação.

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca