STF analisa núcleo de militares acusados de tentativa de golpe; veja sustentações
Primeira sessão da 1ª turma foi destinada a ouvir as sustentações orais de acusação e defesas.
Da Redação
terça-feira, 20 de maio de 2025
Atualizado às 16:33
A 1ª turma do STF começou nesta terça-feira, 20, a analisar a denúncia apresentada pela PGR na Pet 12.100 contra o núcleo 3 de acusados de participar da tentativa de golpe de Estado.
A sessão da manhã foi dedicada a ouvir as 13 sustentações orais, da acusação e das defesas.
A análise de recebimento da denúncia será continuada às 14h30.
Acusados
O núcleo 3 é composto de militares da ativa e da reserva do Exército e por um policial Federal. São 12 acusados:
- Bernardo Romão Correa Netto (coronel)
- Cleverson Ney Magalhães (coronel da reserva)
- Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira (general da reserva)
- Fabrício Moreira de Bastos (coronel)
- Hélio Ferreira Lima (tenente-coronel)
- Márcio Nunes de Resende Júnior (coronel)
- Nilton Diniz Rodrigues (general)
- Rafael Martins de Oliveira (tenente-coronel)
- Rodrigo Bezerra de Azevedo (tenente-coronel)
- Ronald Ferreira de Araújo Júnior (tenente-coronel)
- Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros (tenente-coronel)
- Wladimir Matos Soares (agente da Polícia Federal).
Eles foram denunciados pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, envolvimento em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Nessa fase processual, a turma examina apenas se a denúncia atende aos requisitos legais mínimos exigidos pelo CPP para a abertura de uma ação penal.
A sessão é presidida pelo ministro Cristiano Zanin, e teve início com a leitura de um resumo do caso pelo relator, ministro Alexandre de Moraes.
"Não sobrou ministro"
Ao ler o relatório, Moraes pontuou que foram suscitados, pelas defesas, impedimento, suspeição e ausência de imparcialidade dele próprio, e dos ministros Cristiano Zanin, Flávio Dino, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli e do ministro Edson Fachin. "Quase não sobrou nenhum ministro para julgar o caso."
Sustentação oral da acusação
Falou pela PGR Cláudia Sampaio Marques, subprocuradora-Geral da República. Ela pontuou que a 1ª turma já recebeu as denúncias da PGR contra 22 pessoas acusadas de integrarem os núcleos 1, 2 e 4 da tentativa de golpe, e "com o julgamento de hoje, vai ser possível ter-se uma visão completa do conjunto de fatos atribuídos ao grupo criminoso".
Ela apresentou um resumo de quais seriam as funções de cada núcleo, segundo a acusação:
No núcleo 1, estão os agentes que ocupavam a cúpula da organização, que tomaram as decisões fundamentais, motivaram a constituição do grupo e procuraram desestabilizar as instituições democráticas, além de estabelecer um projeto de permanência no poder mediante notícias falsas sobre o sistema eleitoral, traçando planos de um golpe de Estado, inclusive com neutralização de autoridades.
O núcleo 2 seria responsável pelo gerenciamento das ações tomadas pelo núcleo 1. Eles coordenaram o emprego das forças policiais para permitir a vitória eleitoral de Bolsonaro, coordenaram ações de monitoramento de autoridades, realizaram interlocuções com lideranças populares e participaram da apresentação do projeto de decreto que concretizaria o golpe de Estado.
O núcleo 4 ficou responsável pelas estratégias de desinformação, seja propagando notícias falsas sobre fraudes eleitorais, seja promovendo ataques virtuais a autoridades e instituições.
O núcleo 3 é composto de 12 agentes, sendo 12 militares e 1 da PF. Coube a este núcleo a execução de ações coercitivas. Tratou-se de um núcleo operacional. Coube a ele as "ações de campo", que envolviam violência. Este grupo teria agido efetivamente para tornar possível o golpe de Estado.
Segundo a subprocuradora, todos os envolvidos sabiam que não houve fraude eleitoral, mas seguiam propagando informações falsas e, posteriormente, passaram a agir concretamente pela efetivação do golpe de Estado.
Para ela, todos os elementos estão presentes para o recebimento da denúncia.
Sustentações orais das defesas
Ruyter de Miranda Barcelos falou pelo denunciado coronel Bernardo Romão Correa Netto. O advogado afirma que, segundo a delação premiada, a reunião do dia 28 de novembro de 2022, marcada por seu cliente, e composta por aproximadamente 15 pessoas, não passou de uma "conversa de bar". "Convidar para uma confraternização é crime? É ato ilícito? Claro que não." Ele afirma que não há indícios de autoria e materialidade contra seu cliente. Para ele, houve uma "sucessão de erros" na investigação em relação ao cliente. O advogado afirma que Bernardo foi preso preventivamente nos EUA, e acusado de ter se evadido, mas, na verdade, ele estava em missão no exterior pelo Exército.
O advogado Luiz Mário Feliz de Moraes Guerra falou pelo denunciado Cleverson Ney Magalhães. O advogado também reduziu a relevância da reunião realizada pelo grupo em novembro de 2022, na residência de um dos coimputados. Segundo a defesa, se tratou de um "encontro entre amigos", e não de uma reunião para planejar o golpe.
Ele também diz que "não há uma manifestação de Cleverson Ney concordando com eventual golpe. Não há uma manifestação dizendo avante, vamos lá. Em tempos de WhatsApp, não há um emoji, um joinha assentindo com qualquer tipo de plano".
Segundo o advogado, não há justa causa contra seu cliente.
Diogo Rodrigues de Carvalho Musy realizou sustentação oral por Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira. Ele afirma que a denúncia da PGR contra seu cliente baseou-se unicamente em uma mensagem, enviada por Mauro Cid ao coronel Correa Netto, a qual teria conteúdo inverídico. O general também teria participado de uma reunião em 9 de dezembro, sobre a qual declarou para a autoridade policial todos os assuntos tratados. Segundo o advogado, não há prova para sustentar a acusação contra seu cliente.
Marcelo César Cordeiro sustentou oralmente pelo acusado Fabrício Moreira de Bastos. Ele criticou duramente o relatório final da PF, com 884 páginas, que chamou de "peça absurda". "Quando a gente lê, parece que reuniram várias pessoas diferentes, cada um escreveu um pedaço, juntaram e enviaram, tamanhas as contradições."
Ele pontua que, segundo a denúncia, os coronéis teriam se reunido para influenciar o alto comando do Exército. "Isso demonstra total desconhecimento da caserna. (...) Imagine um camarada que está lá embaixo... ele vai pressionar um general 4 estrelas a fazer o que não quer?"
"Não há absolutamente nenhuma conduta delituosa do coronel Fabrício Bastos às acusações que lhe são imputadas."
Luciano Pereira Alves de Souza falou pelo acusado Hélio Ferreira Lima. Ele iniciou a sustentação citando a Bíblia (Isaías, 59: 14 - 17), em trecho que trata de Justiça e "falta de verdade".
Ele citou quatro pontos que teriam inserido o coronel em investigação que chamou de "maquiavélica": i) ter compartilhado com Mauro Cid um documento que apontava possível fraude nas urnas; ii) suposta reunião na residência de Braga Netto; iii) alegado monitoramento de Alexandre de Moraes e de Lula; e iv) elaboração de uma planilha chamada "Op. Luneta".
O advogado rebateu todas as acusações. Disse que o encontro na casa de Braga Netto foi aleatório, que a viagem realizada a Brasília foi para encontrar familiares, que não havia monitoramento, e que a "op. Luneta" não era um plano de golpe, e não era um documento clandestino, mas sim um documento de cenário prospectivo de inteligência, que era parte de sua função.
Rafael Thomaz Favetti realizou sustentação pelo acusado Márcio Nunes de Resende Júnior. Ele afirmou que, ao chegar ao Supremo, há um busto de Rui Barbosa, que foi mantido pela ministra Rosa Weber da forma como ficou após o "dia da Infâmia", para que todos se lembrem o que ocorreu naquele dia. O advogado citou um livro de Rui Barbosa, segundo o qual o advogado tem o dever de defender, para que não sejam imputadas ao acusado outras questões, às vezes mais graves. "É exatamente como me sinto".
Ele afirmou que seu cliente não tem relação com o plano "Punhal Verde e Amarelo", no qual teria sido planejada a morte de Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes, ou com o 8 de janeiro. As acusações seriam sobre duas condutas: a feitura de uma carta para pressionar seus superiores, e ele seria o responsável por pressionar seu superior.
O advogado rebateu as acusações, e disse que o que há contra seu cliente são apenas citações em notas de rodapé.
"Espero ter sido claro o suficiente para tirar esse rapaz deste núcleo, e espero ter sido objetivo e laico o suficiente para dizer que, para esta defesa, este denunciado está nesta peça acusatória de maneira contrária à prova dos autos."
O advogado Cleber Lopes de Oliveira falou pelo acusado Nilton Diniz Rodrigues. Ele citou o jurista Piero Calamandrei, em obra que reflete a relação entre o advogado e o ideal de Justiça.
Veja:
Ele também citou Sobral Pinto, ao afirmar que "a advocacia não é para covardes", e disse que a tribuna é sagrada. Em sua sustentação, o advogado afirmou que a presença do general Nilton na reunião do dia 28 foi circunstancial e acidental, e que o delator foi claro sobre o encontro: "conversa de bar". Ele também disse que Nilton não participou de realização de carta, nem assinou, e não estava em qualquer grupo de WhatsApp.
"Somos escravos da prova. (...) Em relação a Nilton, a denúncia não traz em si o substrato fatico necessário para que se abra uma ação penal com essa importância, e com as repercussões todas que o processo tem na vida de um homem de bem."
Renato da Silva Martins falou pelo tenente-coronel do Exército Rafael Martins de Oliveira. Ele foi acusado de monitorar e "neutralizar" (que, em termos militares, significaria "incapacitar o opositor", conforme explicou o advogado) autoridades públicas, com destaque para Alexandre de Moraes.
A defesa ponderou sobre a alegada incompetência do STF para julgar Rafael, bem como o impedimento de Moraes no caso por ausência de imparcialidade, além de cerceamento de defesa. Ele afirmou que, embora seja uma aparente "guerra perdida", entende que a defesa deve ser combativa.
Ele pontuou que há a sistemática do foro por prerrogativa de função, e que não é o caso do denunciado. Além disso, citou que a condição de Alexandre de Moraes ser o "alvo" do mal injusto que seria praticado pelo denunciado, por si só, se diferencia dos demais casos, e serve como causa de suspeição.
"A participação dele [o acusado] seria justamente a de levar a cabo a incumbência de neutralizar o ministro. Entendo que põe em xeque a capacidade, pelo menos em dúvida, de que o ministro relator possa ter o mesmo sentimento de Justiça daquele que não tem nenhuma relação direta com os fatos."
Jeffrey Chiquini da Costa falou por Rodrigo Bezerra de Azevedo. Em sua fala, ele pontuou que foram apreendidos 1.200 aparelhos eletrônicos e que, em 158 mil mensagens do celular do delator, em nenhuma delas seu cliente foi citado.
Ele também disse que, ao contrário do que diz a PF, de que seu cliente estaria nos arredores da casa de Alexandre de Moraes para "atentar contra uma autoridade", seu cliente estava em casa, o que teria sido provado a partir de arquivos da nuvem do celular do acusado. "Agora a PF vai ter que dizer que a Apple mente."
Jeffrey citou que é de Curitiba, e relembrou a atuação de Cristiano Zanin enquanto advogado durante a operação Lava Jato, na qual disse a Moro que não se manifestaria enquanto não tivesse acesso à integralidade das provas. "Há seis meses Azevedo está preso, e até agora não tive acesso. O que querem esconder?"
O advogado João Carlos Dalmagro Júnior falou pelo acusado Ronald Ferreira De Araújo Júnior. Ele destacou que seu cliente não era "forças especiais", e que não estava na fatídica reunião de 28/11/22, visto que a reunião seria "restrita". O que se imputa a seu cliente é que, após o encontro, Ronald teria trocado mensagens dizendo que sabia para onde a carta, com as assinaturas, iria vazar - carta esta redigida para convencer o alto comando das forças armadas sobre o golpe. Para o advogado, a denúncia deve ser rejeitada contra seu cliente.
Igor Laboissière Vasconcelos Lima falou em defesa do acusado Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros. Ele citou uma história clássica da Odisseia, de Homero, em que Ulisses retorna de Troia após a vitória e é alertado de que enfrentará desafios - entre eles, o canto das sereias. Ulisses, então, pede para ser amarrado ao mastro para poder ouvir as sereias sem ser seduzido.
"A nós, advogados, procuradores, ministros, não nos é dado o direito de tampar os ouvidos para o canto das sereias - mas nos é dado o dever de amarrar nossa atuação ao mastro."
Ele dedicou sua sustentação a falar da competência para julgar seu cliente, que não seria do Supremo, por violação ao princípio do juiz natural. Disse, também, que o golpe de Estado não se concretizou, e que a suposta tentativa é inidônea. "Havia meio de ocorrer uma tentativa idônea? A resposta, segundo a lógica acusatória, é não." Ele afirma que, em nenhum momento, os comandantes das Forças Armadas aderiram ao intento.
Último a sustentar, Ramón Mas Gomez Junior falou pelo acusado Wladimir Matos Soares. Ele iniciou sua fala dizendo que Alexandre de Moraes fica incomodado com as defesas que levam à Tribuna a questão da incompetência do juízo, no que foi corrigido por Moraes: não fico nem um pouco incomodado". "Obrigado então", respondeu o causídico.
Ramón pediu que seja estendida a seu cliente uma decisão de Moraes em processo de Sérgio Rocha Cordeiro, em que o ministro teria declinado da competência por falta de foro por prerrogativa de função. Ele também pediu a revogação da prisão e apontou inépcia da denúncia.
- Processo: Pet 12.100