Garnier nega que desfile de tanques tenha sido pressão para voto impresso
Oito réus que integram o "núcleo 1" serão ouvidos pela 1ª turma do STF.
Da Redação
terça-feira, 10 de junho de 2025
Atualizado às 12:15
O STF retomou nesta terça-feira, 10, os interrogatórios dos réus do núcleo principal da trama golpista que teria sido articulada durante o governo Jair Bolsonaro para impedir a posse do presidente eleito Lula.
O primeiro a depor foi ex-comandante da Marinha, almirante Almir Garnier. Garnier foi chefe da Marinha entre abril de 2021 e dezembro de 2022. Segundo a denúncia da PGR, ele teria aderido à proposta golpista e deixado sua tropa à disposição de Bolsonaro.
Pressão ao Congresso
Um dos questionamentos feitos pelo ministro Alexandre de Moraes foi sobre o episódio em que blindados da Marinha foram levados à Esplanada dos Ministérios no mesmo dia em que a Câmara votaria a proposta de emenda constitucional do voto impresso. O caso teve destaque na imprensa e foi entendido como uma pressão ao Congresso Nacional. "Os chineses dizem que coincidências não existem", afirmou Moraes.
Em resposta, o almirante Almir Garnier disse que coincidências existem "até certo ponto" e negou qualquer intenção de pressionar o Congresso. Segundo ele, a exibição dos blindados fazia parte de uma demonstração pública das capacidades da Marinha e já estava prevista. Afirmou que a coincidência de datas não foi proposital e que sua ida ao Planalto para entregar um convite ao presidente estava dentro de suas atribuições institucionais.
Assista:
Alexandre de Moraes questionou o almirante sobre reuniões realizadas à época. Garnier afirmou que eram encontros rotineiros, sem apresentação de documentos ou minutas.
Após cerca de 40 minutos de perguntas de Moraes, o ministro Luiz Fux fez seus questionamentos.
Fux quis saber se o almirante presenciou alguma reunião em que membros da cúpula das Forças Armadas ameaçaram prender o presidente da República. Garnier negou: "Ouvi na imprensa e, se me permite, achei surreal. Não faz parte das normas das Forças Armadas atitudes dessa natureza com esse contexto."
Sobre suposta declaração de que colocaria tropas à disposição, o almirante negou ter usado essa expressão. Disse que havia preocupação com possível perda de controle por parte dos órgãos de segurança durante manifestações, o que levaria as Forças Armadas a agir como "último bastião".
"As Forças Armadas sempre estão prontas para suas missões constitucionais. (...) O que eu disse não é para o contexto ao qual foi imputado por depoimentos anteriores, ou coisas assim."
8 de janeiro
Questionado sobre o deslocamento dos manifestantes à Praça dos Três Poderes, Garnier afirmou que deixou o comando da Marinha em 31 de dezembro de 2022. "Sendo muito franco, eu estava emocionalmente sobrecarregado e, ao passar o comando, me desliguei completamente." Segundo ele, até aquele momento, não havia sinais de orquestração como a que ocorreu no dia 8 de janeiro de 2023.
Disse ainda ter ficado chocado ao ver os atos pela TV: "Tive até consequências físicas, foi algo muito triste e a nação brasileira não precisava disso."
Tropas à disposição
O PGR Paulo Gonet também fez perguntas ao almirante Garnier. Ele mencionou o depoimento do general Freire Gomes, segundo o qual o almirante Garnier teria colocado suas tropas à disposição do então presidente Jair Bolsonaro, inclusive informando o número de fuzileiros navais disponíveis. O ministro destacou que seriam 14 mil militares.
Garnier contestou a informação, afirmando que, à época de seu comando, o Corpo de Fuzileiros Navais contava com 17 mil homens, número que hoje estaria em torno de 15.500. Segundo ele, o dado de 14 mil o intrigou, motivo pelo qual decidiu consultar o Google - onde encontrou justamente esse número.
"Tem grandes equívocos aí. (...) Eu nunca disponibilizei tropas para ações dessa natureza."
Diversos governos
Por questionamento de seu próprio advogado, dr. Demóstenes Torres, ele informou que talvez seja o oficial general que tenha mais tempo de serviço no ministério da Defesa, e que serviu Jobim, então ministro da Defesa; serviu, no governo Dilma, aos ministros Celso Amorin, Jacques Wagner, Aldo Rebelo e Raul Jungmann, e, por fim, foi secretário-Geral no governo Bolsonaro e comandante da Marinha. "Tenho longo período de serviços a diversos governos."
Como funciona o interrogatório
As oitivas tiveram início nesta segunda-feira, 9, quando foram ouvidos Mauro Cid e Alexandre Ramagem. A condução da oitiva é feita pelo relator do processo, ministro Alexandre de Moraes, com a participação do ministro Luiz Fux e do procurador-Geral da República, Paulo Gonet, responsável pela acusação. Após as perguntas do relator e do procurador-geral, os advogados dos demais réus também podem fazer perguntas.
Quem será ouvido
Além de Cid e Ramagem, o "núcleo 1" é composto por Almir Garnier, Anderson Torres, Augusto Heleno, Jair Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto. Eles serão ouvidos em audiências previstas para acontecer ao longo desta semana.
Segundo a PGR, esse núcleo teve papel central na tentativa de golpe. O esquema envolveu outros 26 réus, que foram divididos em outros três grupos distintos de acordo com seu papel na trama.
O grupo responde por tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. No caso de Alexandre Ramagem, a investigação sobre fatos ocorridos após sua posse como deputado federal, em janeiro de 2023, está suspensa até o fim do mandato.
- Processo: AP 2.668