"Quero uma branca": Mulher indenizará venezuelana por injúria
Ao recusar atendimento, mulher teria afirmado não querer ser atendida por "estrangeira negra". Juiz reconheceu a gravidade da conduta e fixou indenização em R$ 20 mil.
Da Redação
segunda-feira, 14 de julho de 2025
Atualizado em 15 de julho de 2025 16:38
Uma médica foi condenada a pagar R$ 20 mil de indenização por danos morais após proferir ofensas racistas contra uma atendente venezuelana em estabelecimento de trabalho. Decisão é do juízo da 2ª vara do JEC de Araucária/PR.
A agressora teria se recusado a ser atendida pela profissional, alegando que "não queria ser atendida por uma estrangeira negra, mas sim por uma pessoa branca".
A decisão foi inicialmente proferida pelo juiz leigo Gustavo Mateus Santos Zonta e, posteriormente, homologada com majoração de indenização pelo juiz de Direito Raphael de Morais Dantas. Montante foi fixado em R$ 20 mil, considerando-se a gravidade do comportamento "racista, supremacista e xenófobo" da agressora.
O magistrado também considerou que a agressora é médica, devendo a punição ser compatível com o patrimônio da autora.
O caso ocorreu em 15 de novembro de 2023. De acordo com depoimentos, a agressora chegou exaltada ao local, afirmando que não queria ser atendida por uma "estrangeira negra". Segundo os relatos, declarou ainda: "Não é só por ela ser venezuelana, ela também é negra e eu não quero ser atendida por uma negra, eu quero uma pessoa branca". Provas documentais e vídeos, além de depoimentos de testemunhas, corroboraram a versão narrada.
A defesa alegou ausência de intenção ofensiva, sustentando que a agressora apenas buscava atendimento com alguém que falasse a mesma língua, devido a dificuldades de comunicação.
Injúria racial e xenofobia
Ao analisar o caso, o juiz leigo Gustavo Zonta destacou que o conjunto probatório demonstrou uma conduta de teor hostil, humilhante e discriminatório.
Conforme explicou na decisão, as provas indicam que a intenção da agressora era claramente desmerecer a atendente por sua origem, e comentários feitos em tom elevado e depreciativo, como "esse povo não entende nada do que estamos falando", revelaram desprezo pela nacionalidade da vítima, extrapolando qualquer alegação de dificuldade linguística.
Nesse sentido, observou que a agressora poderia ter manifestado sua dificuldade de forma respeitosa, mas optou por se expressar de maneira hostil.
"Não haveria a necessidade de pronunciar em alto e bom tom a necessidade de atendimento por brasileiro, ou dizer que 'este povo não entende o que eu falo', indicando desprezo pelo que não é nacional."
Assim, o magistrado reconheceu a ocorrência de dano moral passível de indenização. "É evidente, portanto, a ofensa à honra da parte autora, quando maculada em razão da sua origem."
"A cor da pele ou a origem das pessoas não deve medir a honra"
Ao homologar a sentença, o juiz de Direito Raphael de Morais Dantas majorou a indenização de R$ 10 mil para R$ 20 mil, fundamentando a decisão da seguinte forma:
"Ponderando a elevadíssima reprovação ético-jurídica que recai sobre o comportamento - racista, supremacista e xenofóbico - da ré. A cor da pele ou a origem das pessoas não deve medir a honra nem orientar o mérito alheio. Constitui objetivo fundamental deste país promover o bem de todos, sem preconceitos de origem (art. 3º, inciso IV, CF). A autora é médica concursada, prestando atendimento em unidade básica de saúde (UBS) e auferindo cerca de R$ 20 mil mensais. A ofendida, mesmo passados meses do fato ofensivo, ainda carrega n'alma os males das ofensas perpetradas. Logo, a punição deve ser compatível - especialmente - com o patrimônio/renda da autora."
Errata
Na versão original desta matéria, informamos incorretamente que a pessoa ofendida era médica. Na verdade, a médica foi quem proferiu as ofensas. A matéria foi corrigida em 15/7, às 16h32.
- Processo: 0009157-14.2024.8.16.0170