AMB questiona quórum para impeachment de ministros do STF
Associação pede que Supremo reconheça necessidade de dois terços dos votos no Senado para instauração de processo e afastamento de ministros.
Da Redação
quarta-feira, 17 de setembro de 2025
Atualizado às 15:39
A AMB - Associação dos Magistrados Brasileiros ajuizou a ADPF 1.260 no STF, que foi distribuída por prevenção para o ministro Gilmar Mendes, para discutir a validade dos artigos da lei de crime de responsabilidade (1.079/50) que tratam do "impeachment" de ministros da Corte. O ponto central é o quórum necessário para instaurar o processo e afastar preventivamente um ministro.
A entidade sustenta que a regra da lei 1.079/50, que permite a instauração do processo e a suspensão do ministro por maioria simples do Senado, não foi recepcionada pela Constituição de 1988.
Para a AMB, a aplicação desse quórum fragiliza a independência judicial e expõe os ministros ao arbítrio de maiorias momentâneas no Legislativo.
A ação pede que o STF reconheça a exigência de maioria qualificada de dois terços dos senadores tanto para o recebimento da denúncia quanto para a pronúncia, evitando afastamentos automáticos com base em decisões circunstanciais.
"Do ponto de vista procedimental, é preciso estabelecer, com base em interpretação sistemática da Constituição, que o quórum para instauração de processos de impeachment de seus ministros deve ser qualificado - aprovação por dois terços do Senado Federal, em vez de maioria simples."
No documento, assinado pelos advogados Pedro Gordilho e Alberto Pavie Ribeiro, a AMB afirma que permitir o afastamento de ministros com apenas 41 votos - número mínimo de senadores para a deliberação - cria um risco concreto de desestabilização institucional e de uso político do instituto. Por isso, pede que o Supremo declare a não recepção dos artigos 47 e 54 da lei 1.079/50 na parte em que preveem o quórum reduzido.
"Resta evidente, d.v., que a violação ao princípio da independência do Poder Judiciário, no caso, está intimamente ligada à violação das garantias dos magistrados (vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos) que se verifica diante da existência, nos dispositivos questionados da Lei n. 1.079/50, de um quórum de maioria simples dos membros do Senado Federal, para deliberação sobre o recebimento da denúncia com as consequências do afastamento do cargo e até redução da remuneração dos Ministros do Supremo Tribunal Federal. Os dispositivos da lei impugnada estão conferindo aos membros do STF um tratamento até mesmo desigual em cotejo com os demais membros da magistratura brasileira."
Leia a íntegra do pedido.
Precedentes
O pedido inclui ainda interpretação conforme ao art. 319 do CPP, para impedir que o dispositivo que prevê afastamento cautelar de função pública seja aplicado a ministros do Supremo. A AMB argumenta que esse tipo de medida é "sujeita à reserva de Constituição" e só pode ser decidido dentro do regime especial da magistratura.
A AMB cita precedentes em que o próprio STF, nos casos de impeachment dos presidentes Fernando Collor (1992) e Dilma Rousseff (2016), firmou entendimento de que o quórum de dois terços é requisito constitucional para a instauração de processos dessa natureza.
A diferença, ressalta a entidade, é que no caso dos ministros do STF não existe a fase prévia de autorização da Câmara dos Deputados, o que torna ainda mais sensível a necessidade de quórum elevado no Senado.
Fundamentação jurídica
Para fundamentar o pedido, a AMB consultou dois jurisconsultos, os professores de Direito Constitucional Daniel Sarmento e Ademar Borges, os quais destacam que a independência judicial é cláusula pétrea (art. 60, § 4º, III, CF) e deve ser resguardada contra pressões políticas.
Na petição, a AMB requer que o STF:
- Declare a nulidade (pela CF/46) ou a não recepção (pela CF/88) das normas que preveem maioria simples;
- Estabeleça que o afastamento cautelar não seja automático, devendo ser deliberado expressamente;
- Afaste qualquer possibilidade de redução de remuneração durante o afastamento;
- Reforce o direito à ampla defesa e ao contraditório.
Ritos do processo
O rito do impeachment de ministros do STF está disciplinado nos arts. 41 a 73 da lei 1.079/50.
A denúncia pode ser apresentada por qualquer cidadão ao Senado Federal (art. 41), desde que acompanhada de documentos ou indicação de provas (art. 43). Após leitura em plenário, é criada uma comissão especial para emitir parecer preliminar (arts. 44 e 45). Esse parecer é submetido ao plenário e pode ser aprovado por maioria simples (art. 47), hipótese em que o denunciado é intimado a apresentar defesa em dez dias (art. 49).
Se a acusação for considerada procedente, o ministro denunciado é automaticamente afastado de suas funções e passa a perder um terço da remuneração até o julgamento final (art. 57).
O processo segue, então, para a fase de libelo acusatório, contrariedade e instrução probatória (arts. 58 a 66), culminando no julgamento pelo Senado, presidido pelo presidente do STF, no qual todos os senadores atuam como juízes (art. 61). Para a condenação e consequente perda do cargo é necessário o voto favorável de dois terços dos senadores (art. 68), podendo ainda ser fixado prazo de até cinco anos de inabilitação para funções públicas.
Importante ressaltar que, embora o procedimento esteja previsto em lei, nunca houve um caso de impeachment de ministro do STF no Brasil.
Quantitativo
De acordo com dados oficiais do Senado, entre 2021 e 2025 foram protocolados 57 pedidos de impeachment contra ministros do STF.
O ano de 2021 concentrou o maior número de petições, com 23 registros. Em seguida, aparecem os anos de 2022 e 2025, com 11 pedidos cada. Em 2023, foram 10, e em 2024 apenas 2 solicitações.
Na análise individual, ministro Alexandre de Moraes lidera com 27 pedidos. Em seguida, está o ministro Luís Roberto Barroso, com 22.
Outros alvos de petições foram Gilmar Mendes (5), Cármen Lúcia e Flávio Dino (3 cada), Dias Toffoli (2), além de Luiz Fux e Edson Fachin (1 cada).
Até o momento, os ministros André Mendonça, Nunes Marques e Cristiano Zanin não foram alvos de nenhum pedido.
Apesar de o gráfico apontar 64 menções a ministros, o número real de petições é 57. A aparente diferença ocorre porque alguns pedidos citam mais de um ministro, contabilizados individualmente para cada autoridade mencionada.
Vale destacar que duas petições específicas - Pet 2/21 e Pet 12/21 - foram excluídas da representação gráfica, pois abrangem vários ministros, incluindo alguns já aposentados, dificultando a atribuição individual. A exclusão visa garantir a consistência metodológica dos dados apresentados.
Outro dado relevante é a origem das petições. A maior parte (74%) foi protocolada por cidadãos comuns: 42 das 57.
O restante distribui-se entre deputados Federais (8), senadores (6) e deputados estaduais (2), sendo um do Maranhão e outro do Espírito Santo.






