Entidades pedem R$ 414 milhões ao Itaú por morte de cliente negro em agência
Na ação civil pública, OAB/RJ e Educafro afirmam que a morte de Jonas em 2006 expõe o racismo estrutural e exige a adoção de medidas antirracistas obrigatórias em todas as agências do banco.
Da Redação
sexta-feira, 21 de novembro de 2025
Atualizado às 17:05
A OAB/RJ e a ONG Educafro Brasil ajuizaram, em 19 de novembro, ação civil pública na Justiça Federal do Rio de Janeiro para responsabilizar o Itaú Unibanco pela morte de Jonas Eduardo Santos de Souza, homem negro, cliente do banco, baleado por um vigilante dentro de uma agência no Centro do Rio, em 22 de dezembro de 2006.
As entidades pedem que a instituição seja condenada ao pagamento de R$ 414 milhões por dano moral coletivo - valor equivalente a 1% do lucro do banco em 2024.
A petição destaca que o ajuizamento ocorreu às vésperas do Dia da Consciência Negra e afirma que o episódio simboliza a vulnerabilidade enfrentada pela população negra em ambientes que deveriam ser seguros.
"A morte de Jonas não foi um acidente, um desvio, um ponto fora da curva. Foi, em verdade, a consequência previsível e a manifestação mais aguda de um fenômeno que permeia e organiza a sociedade brasileira: o racismo estrutural."
Racismo estrutural
Conforme relatado na ação, Jonas tentou entrar na agência quando a porta giratória travou. Após discussão com o vigilante, foi chamado o gerente, que questionou se ele era de fato cliente do banco. Mesmo após ter a entrada autorizada, o desentendimento prosseguiu, culminando no disparo que o atingiu e provocou sua morte.
A petição afirma que a conduta do vigilante não pode ser tratada como ato isolado, mas como resultado de falhas estruturais na política de segurança do banco, da ausência de treinamento adequado e de práticas institucionais que perpetuam discriminação racial.
"Jonas foi executado sumariamente, não por representar uma ameaça real, mas por ter ousado questionar a humilhação a que fora submetido. Ele foi morto por não se conformar ao lugar de subalternidade que o racismo estrutural lhe reservava."
Para as entidades, o caso comunica uma mensagem de "medo, humilhação e exclusão" à coletividade negra, caracterizando dano moral coletivo.
"Ao executar sumariamente um homem negro após uma abordagem discriminatória em uma de suas agências, o Banco Réu não violou apenas o direito à vida de Jonas. Ele emitiu uma mensagem poderosa e devastadora para milhões de brasileiros e brasileiras negras: a de que eles não estão seguros em espaços públicos de consumo; a de que sua presença é inerentemente suspeita; a de que sua vida pode ser ceifada diante da menor percepção de insubordinação."
Pedidos
As entidades pedem a condenação do banco ao pagamento dos R$ 414 milhões, sendo 80% destinados ao apoio a jovens pobres e afro-brasileiros com dificuldades de moradia e alimentação, garantindo sua permanência em instituições de ensino, e 20% para aquisição de computadores e oferta de cursos de formação voltados à população negra.
A ação requer ainda a concessão de tutela de urgência inibitória, com prazo de 90 dias para que o banco implemente, em âmbito nacional:
- programa contínuo e obrigatório de treinamento antirracista para todos os funcionários;
- revisão dos protocolos de segurança e abordagem para impedir perfilamento racial;
- criação de canal de denúncias externo e independente, com auditoria anual;
- campanhas permanentes de conscientização interna e externa sobre racismo.
O pedido inclui também a inversão do ônus da prova, a atuação do MPF como fiscal da ordem jurídica e a declaração incidental de que pretensões de reparação civil por racismo seriam imprescritíveis, com base no art. 5º, XLII, da CF.
Responsabilidade civil
A OAB/RJ e a Educafro sustentam que o Itaú responde objetivamente pelo ato do vigilante, nos termos dos arts. 932 e 927 do CC, e que o episódio decorre de falhas na vigilância, no treinamento e na supervisão de seus prepostos.
A ação menciona ainda casos anteriores de discriminação envolvendo o banco e afirma que a forma como Jonas foi tratado reforça o sentimento coletivo de medo e exclusão vivenciado pela população negra.
Para as entidades, o dano moral coletivo é inequívoco e decorre da mensagem "aterrorizante" transmitida quando um cliente negro é morto dentro de uma agência após abordagem discriminatória.
A petição destaca que, apenas em 2023, mais de 35 mil pessoas negras foram vítimas de homicídio no país, citando dados do Atlas da Violência, e afirma que a reparação buscada tem caráter estrutural, voltado a combater práticas e protocolos que reproduzem desigualdades raciais.
Confira a íntegra.





