PL Antifacção: Mais de mil promotores manifestam para manter Júri
Projeto prevê a retirada da competência do Tribunal do Júri para julgar determinados homicídios dolosos praticados em contexto de organizações criminosas.
Da Redação
terça-feira, 2 de dezembro de 2025
Atualizado às 19:04
Mais de mil promotores e promotoras de Justiça de todo o Brasil manifestaram oposição ao projeto de lei 5.582/25, conhecido no debate público como "PL Antifacção", por prever a retirada da competência do Tribunal do Júri para julgar determinados homicídios dolosos praticados em contexto de organizações criminosas, milícias e facções.
No documento, o grupo sustenta que a medida abriria precedente de "fatiamento" do Júri e propõe, como alternativa, o fortalecimento de instrumentos já existentes e a criação de mecanismos de proteção aos jurados.
Júri como garantia constitucional
No manifesto, os subscritores afirmaram que a instituição do Júri integra o rol de direitos e garantias fundamentais previsto no art. 5º, XXXVIII, da Constituição, sendo cláusula pétrea, o que impediria sua alteração por lei ordinária.
Ainda, conforme afirmaram, retirar do Júri parte dos crimes dolosos contra a vida, especialmente os ligados à criminalidade organizada, significaria deslocar para órgãos togados uma competência atribuída ao julgamento popular, com risco de esvaziamento progressivo da instituição.
"O Júri não é problema, é parte da solução"
Outro eixo do manifesto combate a tese de que o Júri "não funciona" em crimes envolvendo organizações criminosas. Para isso, cita levantamento estatístico do MP/SP, com base em decisões entre 2000 e 2025, que teria analisado 4.043 processos de homicídio doloso afetos ao Tribunal do Júri, apontando taxas de pronúncia e de condenação mais altas nos casos relacionados ao tráfico.
Os promotores e promotoras afirmaram que a efetividade estaria ligada ao "tripé funcional" do Júri: soberania dos veredictos e íntima convicção, sorteio e rotatividade dos jurados com sigilo das votações, e execução imediata da pena após veredicto condenatório, mencionando o Tema 1.068 do STF.
Crítica ao critério do PL e à analogia com latrocínio
Ao criticar o critério do PL para afastar o Tribunal do Júri com base em motivações típicas, como disputa de território, cobrança de dívida de droga e atuação de "tribunal do crime", o manifesto afirmou ser "incongruente" vincular a retirada da competência do júri ao motivo descrito na acusação.
Os promotores destacaram a incoerência do projeto, que retira do Júri apenas alguns homicídios dolosos ligados ao crime organizado, mas deixa sob o mesmo regime processual outros homicídios praticados pelos mesmos agentes, com idêntica ou maior carga de intimidação.
Segundo argumentaram, o temor dos jurados decorreria mais da capacidade de retaliação do acusado e do grupo criminoso do que do enquadramento do crime na denúncia.
Além disso, o texto refuta a comparação com o latrocínio, crime não submetido ao julgamento do Júri, sustentando que, nesse caso, a morte qualificaria um delito patrimonial, enquanto, nos homicídios ligados a facções e milícias, "o dolo de matar nasce na origem da conduta".
Na parte final, os subscritores defendem que, se a preocupação é segurança e enfrentamento ao crime organizado, a saída estaria em fortalecer, e não substituir, o Tribunal do Júri.
Entre as medidas sugeridas, o texto lista:
- reforço do desaforamento para transferir julgamentos para comarcas mais estruturadas;
- criação de lista específica e "sorteio qualificado" de jurados;
- sistema próprio de proteção com sigilos e restrições no plenário; e
- garantias mínimas para quem julgar facções e milícias.
Ao concluir, o manifesto resume a posição do grupo e conclama o Senado Federal a rejeitar dispositivos que retirem do Júri o julgamento de homicídios dolosos em contexto de criminalidade organizada.
"Não concordamos que, em nome de uma falsa sensação de segurança, se retire do povo o poder de julgar exatamente os homicídios mais graves e simbólicos - aqueles perpetrados por organizações criminosas, facções e milícias; e defenderemos o aperfeiçoamento do Júri, do desaforamento e dos mecanismos de proteção aos jurados como o verdadeiro caminho para enfrentar o crime organizado sem violar a Constituição."
Leia a íntegra do manifesto.






