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Gilmar pausa análise de indenização a filhos de vítimas de hanseníase

O relator, ministro Toffoli, sugeriu que a imprescritibilidade das ações seja reconhecida, dada a longa duração das violações e o impacto duradouro nos afetados.

13/2/2025

O ministro Gilmar Mendes pediu vista e suspendeu o julgamento que analisa a declaração de inconstitucionalidade parcial do art. 1º do decreto 20.910/32, que visa excluir o prazo prescricional de cinco anos para ações de indenização movidas pelos filhos de pessoas afetadas pela hanseníase, separados de seus pais devido à política de isolamento compulsório. 

Até o momento, o relator, ministro Dias Toffoli, votou favoravelmente à declaração de inconstitucionalidade, enquanto o ministro Flávio Dino apresentou voto divergente.

O caso

Na ação, o Morhan - Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase e a Defensoria Pública sustentou que, devido aos danos causados pela política de separação forçada, a pretensão de indenização deveria ser considerada imprescritível.

O movimento ressaltou que houve graves violações de direitos humanos sofridas pelos filhos das vítimas, incluindo alienação parental e abusos diversos, que causaram danos físicos e psicológicos duradouros. Ademais, argumentam que o Estado brasileiro já reconheceu sua responsabilidade pela segregação de pessoas afetadas pela hanseníase, mas não incluiu os filhos dessas vítimas na reparação.

A presidência da República e a AGU se manifestaram em defesa da constitucionalidade do prazo prescricional, alegando que a questão deveria ser resolvida no âmbito legislativo, já que existe um projeto de lei tramitando no Congresso Nacional sobre o tema. A AGU também alertou sobre as possíveis implicações legais mais amplas que a revisão do prazo prescricional poderia gerar, afetando outras pretensões contra a Fazenda Pública.

Por outro lado, a PGR, embora tenha questionado a legitimidade ativa do Morhan, assumiu o polo ativo da ação e manifestou-se favorável ao acolhimento do pedido, argumentando que a indenização das crianças separadas de suas famílias durante a política de segregação compulsória deveria ser considerada imprescritível, dada a gravidade da violação dos direitos humanos cometida pelo Estado.

Gilmar pede vista e suspende julgamento sobre indenização a filhos de vítimas de hanseníase.(Imagem: AdobeStock)

Voto do relator

Em seu voto, o relator, ministro Dias Toffoli, reconheceu a gravidade dos danos causados pela separação forçada de filhos de pessoas atingidas pela hanseníase, argumentando que o prazo prescricional de cinco anos para ações de indenização não deveria ser aplicado nesse caso, dado o contexto de violação de direitos humanos e as consequências de longo prazo dessa política pública.

O relator destacou que, embora o Código Civil preveja um prazo para ações contra o Estado, a complexidade da situação exigia uma análise mais aprofundada, principalmente considerando os efeitos duradouros dessa violação. Além disso, afirmou que a impossibilidade de exigir indenização pelas violações sofridas durante a vigência da política pública, que perduram até hoje, violaria os direitos constitucionais garantidos pela atual Constituição Federal.

O relator concluiu que a configuração das violações e a impossibilidade de exigir reparação dentro do prazo de cinco anos, especialmente em casos envolvendo crianças e adolescentes na época dos fatos, impunham a imprescritibilidade das ações de indenização movidas pelos filhos das pessoas atingidas pela hanseníase, cujos direitos haviam sido desrespeitados pelo Estado.

“Pode-se concluir, portanto, que a absoluta impossibilidade do cumprimento em juízo do prazo prescricional quinquenal para a postulação indenizatória por aqueles que , à época dos fatos, eram crianças e adolescentes, somada à estatura constitucional dos valores efetivamente violados pelo próprio Estado Brasileiro, impõe o reconhecimento da imprescritibilidade da s pretensões de indenização propostas contra a União pelos filhos separados de pessoas atingidas pela hanseníase cujo fundamento seja o afastamento forçado de seus pais promovido pelo Estado.

O ministro afirmou que o direito de indenização deveria ser atemporal, considerando os efeitos duradouros da política pública adotada pelo Estado.

Divergência

Iniciando divergência, o ministro Flávio Dino, em seu voto, ressaltou a necessidade de respeitar a jurisprudência consolidada que estipula o prazo quinquenal. Ele defendeu que a flexibilidade do prazo prescricional poderia gerar insegurança jurídica, principalmente em um contexto que envolve a administração pública.

No entanto, o ministro também reconheceu o contexto diferenciado dos filhos das pessoas atingidas pela hanseníase, que, devido à separação forçada, se viam em situação de vulnerabilidade e não tinham meios adequados para buscar reparação naquele momento. Isso justificaria, segundo ele, um marco temporal distinto para o início do prazo prescricional para essas vítimas.

Por fim, o ministro propôs que as ações propostas pelos filhos dessas vítimas tivessem seu prazo prescricional contado a partir da publicação da ata do julgamento, garantindo tempo hábil para o exercício do direito sem comprometer a segurança jurídica.

O julgamento foi suspenso após pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.

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