Migalhas Quentes

STJ reconhece prescrição em ações de agricultores contra setor citrícola

Maioria entendeu que prazo prescricional começou a correr na assinatura do contrato, não na divulgação da investigação.

18/2/2025

Por maioria, a 3ª turma do STJ reconheceu prescrição em duas ações envolvendo produtores de laranjas que buscavam reparação por danos contra empresas do setor citrícola, alegando suposta formação de cartel.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, acompanhada pelo ministro Humberto Martins e pelo desembargador convocado, Carlos Cini Marchionatti, reconheceu a prescrição.

Inicialmente, Nancy considerou a divulgação da investigação na mídia como marco inicial da prescrição. Contudo, reajustou seu voto para seguir o entendimento do ministro Moura Ribeiro, que fixou o termo inicial na data da assinatura do contrato entre os produtores e as empresas.

Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva ficou vencido.

Operação Fanta

Em 2006, a Operação Fanta foi deflagrada para apurar supostas práticas anticoncorrenciais no setor citrícola. 

Uma das ações (REsp 2.133.992) foi proposta por um agricultor em 2019, alegando prejuízos financeiros decorrentes dessas práticas.

Em 1ª instância, o juízo da vara de Tanabi/SP reconheceu a prescrição, entendendo que o prazo de três anos previsto no art. 206, §3º, V, do CC, deveria ser contado a partir da ampla divulgação da investigação na mídia, em 2006.

O produtor recorreu ao TJ/SP, sustentando que a prescrição deveria ser contada a partir da decisão final do Cade, em 2018, que homologou o Termo de Compromisso de Cessação (TCC). Por maioria, o tribunal estadual reformou a decisão, fixando o termo inicial na decisão administrativa.

A fabricante de suco, então, recorreu ao STJ.

No segundo caso (REsp 2.166.984), o produtor rural ajuizou a ação alegando que, entre os anos de 2000 e 2006, vendeu sua produção de laranjas para uma empresa, mas que os preços foram artificialmente reduzidos devido a um suposto cartel. O produtor requereu indenização pelos danos materiais sofridos.

Em 1ª instância foi reconhecida a prescrição trienal prevista, extinguindo o processo com resolução de mérito. Em 2ª instância, a 34ª câmara de Direito Privado do TJ/SP manteve a sentença.

O produtor rural, então, recorreu ao STJ.

Voto da relatora

Em outubro de 2024, a ministra Nancy Andrighi explicou que as ações reparatórias por danos concorrenciais podem ser classificadas como follow on ou stand-alone, conforme a atuação do Cade.

417607

Nas ações follow on, a ilicitude já foi reconhecida pelo órgão administrativo, e o prazo prescricional inicia-se com a decisão condenatória. Já nas stand-alone, a violação não foi previamente analisada pelo Cade, e o prazo prescricional deve ser contado do momento em que a vítima tomou ciência do dano.

Inicialmente, a ministra votou pelo reconhecimento da prescrição com base na divulgação da Operação Fanta, em 2006. Entretanto, ao reajustar seu voto, nesta terça-feira, 18, seguiu o entendimento de Moura Ribeiro, fixando a data da assinatura dos contratos como termo inicial.

Ministro Humberto Martins acompanhou a relatora. Nancy também foi acompanhada pelo desembargador convocado, Carlos Cini Marchionatti, que votou apenas no 2º caso.

Divergência

Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva havia pedido vista da ação.

Ao votar, nesta terça-feira, 18, divergiu da relatora, alertando que fixar a data dos contratos como termo inicial poderia gerar insegurança jurídica, uma vez que as transações envolvem aditamentos e repactuações sucessivas.

Para o ministro, sendo o cartel uma infração permanente, o prazo prescricional somente deveria começar a contar a partir da cessação da prática.

Cueva também afastou a ideia de que a divulgação da investigação na mídia fosse o marco inicial da prescrição, por entender que isso presumiria o conhecimento simultâneo de todos os afetados. "Uma investigação recém-publicada, justamente pelo sigilo que a envolve, não parece ser capaz de fornecer os elementos necessários a amparar uma ação de responsabilidade por dano concorrencial", afirmou.

Veja parte do voto:

Fundamentou o posicionamento na legislação vigente, destacando que o TCC, ainda que não implique confissão de culpa, pretende fazer cessar uma infração à ordem econômica dentro do prazo determinado pelo Cade.

Além disso, enfatizou que o compromisso deve conter o reconhecimento da participação do compromissário na conduta investigada. "É razoável entender que o titular do direito violado somente passará a ter inequívoco conhecimento da lesão a partir desse marco, o qual deverá dar início ao prazo prescricional", explicou.

Com esse entendimento, votou pelo afastamento da prescrição.

Contagem do prazo

Ao votar, ministro Moura Ribeiro sustentou que a assinatura do TCC não implica reconhecimento de culpa ou condenação por cartel. Também afastou a possibilidade de considerar a divulgação da Operação Fanta na mídia como termo inicial da prescrição, pois não garantiria um critério objetivo.

Seguindo precedente da 4ª turma do STJ no REsp 1.971.316, Moura Ribeiro votou por fixar o termo inicial da prescrição na data da assinatura do contrato.

Veja trecho do voto:

"O termo acorde à prescrição seguirá a regra geral aplicada para as ações que reclamam indenização por danos extracontratuais: conhecimento do ato ilícito causador do dano, que, no caso dos autos, ocorre na data em que foi fixado o preço para pagamento das laranjas", explicou.

"A venda foi feita sabidamente por preço inferior ao mercado e agora o agricultor quer pedir indenização, parece-me que ele fez reserva mental", pontuou.

Veja a versão completa

Leia mais

Migalhas Quentes

Procuradoria do Cade busca influenciar STJ em caso do setor cítrico

17/2/2025
Migalhas Quentes

STJ julga prescrição em caso envolvendo cartel do mercado de laranjas

15/10/2024
Migalhas Quentes

STJ mantém prescrição de pedido de produtor rural por "cartel do suco"

25/10/2022