Em decisão liminar, a 18ª vara Cível de Recife/PE determinou que operadora de plano de saúde arque integralmente com o tratamento multidisciplinar de criança diagnosticada com TEA - Transtorno do Espectro Autista e TDAH.
O juiz Jefferson Félix de Melo considerou abusiva a cobrança por coparticipação no plano de saúde, que ultrapassou R$ 2 mil e impediu a continuidade de tratamento essencial uma vez que a família não tinha condições de arcar com o valor. Assim, configurou violação ao direito fundamental à saúde.
Entenda o caso
Conforme os autos, a criança foi diagnosticada com TEA nível 2 associado ao TDAH, e necessita de tratamento terapêutico contínuo, individualizado e intensivo.
O plano terapêutico, prescrito por médico, envolve terapias como a psicoterapia de análise de comportamento aplicada (método ABA), fonoaudiologia, terapia ocupacional com integração sensorial, psicopedagogia e outras abordagens recomendadas para o desenvolvimento global da criança. As sessões são realizadas em clínica multidisciplinar credenciada, com evolução significativa já constatada.
Com a imposição do plano de coparticipações mensais, que chegaram a ultrapassar R$ 2 mil, a família alegou não ter condições financeiras de manter o tratamento, o que comprometia seriamente a evolução clínica da criança. Assim, pleiteou o reconhecimento do caráter abusivo das cobranças, o reembolso de valores já pagos indevidamente, e a condenação da operadora ao pagamento de danos morais.
A operadora, por sua vez, defendeu a legalidade da cláusula contratual de coparticipação e sustentou não haver negativa de cobertura, tampouco abusividade. Afirmou ainda que o tratamento poderia ser realizado na rede credenciada e que a carga horária proposta seria excessiva.
Direito à saúde
Ao apreciar o pedido, o juiz ressaltou que a cláusula de coparticipação, ainda que prevista contratualmente, não pode inviabilizar o acesso ao tratamento de saúde. Citou precedente do STJ segundo o qual a coparticipação que onera excessivamente o usuário de plano de saúde, especialmente em casos de TEA, configura restrição abusiva de acesso à saúde.
O magistrado destacou a aplicação da súmula 608 do STJ e que, nos termos do art. 47 do CDC, as cláusulas contratuais devem ser interpretadas da maneira mais favorável ao consumidor e que incide a proteção contra cláusulas que comprometam a função essencial do serviço.
Dessa maneira, concluiu que, por se tratar de situação excepcional que envolve risco à integridade física e mental da criança, justifica-se a determinação do custeio integral do tratamento, sem coparticipação, preservando o direito à saúde e à dignidade do menor.
"Diante da comprovada situação apresentada pelo demandante, diagnosticado com doença grave e que necessita de constante e dispendioso tratamento necessário à sua saúde, sob pena de graves danos em caso de interrupção, é de rigor reconhecer que restou configurada hipótese de exceção que autoriza, ao menos por ora, em sede de cognição sumária, que as terapias guerreadas sejam feitas sem a cobrança da coparticipação (...)."
Por fim, constatou a presença dos requisitos para concessão da tutela de urgência, conforme art. 300 do CPC. A probabilidade do direito, evidenciada pelo laudo médico e pelos comprovantes de cobrança e o perigo de dano, diante da interrupção do tratamento e seus impactos à saúde do menor.
"Vislumbra-se, no caso, o perigo da demora, por tratar-se de questão inerente à saúde do demandante, tendo em vista que o Transtorno do Espectro Autista que acomete o autor requer a realização imediata e contínua das terapias sub judice, com extensa quantidade de sessões a que será submetido, e, diante da possibilidade de grave prejuízo à saúde do menor, em caso de interrupção por não poder a sua família arcar com os custos da coparticipação."
Assim, deferiu a tutela de urgência para determinar a imediata cobertura integral do tratamento, sem qualquer cobrança de coparticipação, no prazo de cinco dias, sob pena de multa diária de R$ 2 mil.
O escritório Guedes & Ramos Advogados Associados atua no caso.
- Processo: 0010474-22.2025.8.17.2001
Confira a liminar.