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Por delação, condenado por Chacina de Unaí tem pena reduzida no STJ

Em 2004, auditores fiscais e motorista foram mortos ao fiscalizar fazendas em Unaí/MG por denúncia de trabalho escravo.

20/5/2025

A 5ª turma do STJ deu provimento ao agravo regimental em habeas corpus impetrado pela defesa de Hugo Alves Pimenta, condenado pela Chacina de Unaí, para garantir a redução da pena em dois terços, conforme previsto em seu acordo de colaboração premiada.

O relator, ministro Ribeiro Dantas, havia negado o pedido, alegando que o habeas corpus não era cabível devido à existência de recurso especial anterior sobre o mesmo tema, o que violaria o princípio da unirrecorribilidade. Segundo ele, os argumentos já haviam sido analisados em outras instâncias.

No entanto, a ministra Daniela Teixeira abriu divergência, seguida pelos ministros Joel Ilan Paciornik, Reynaldo Soares da Fonseca e Messod Azulay Neto. Para eles, o habeas corpus tratava especificamente do cumprimento do acordo de colaboração premiada, e não da nulidade abordada nos recursos anteriores. Assim, defenderam o respeito à justiça penal negociada, com a aplicação da pena nos termos acordados.

STJ aplica causa de diminuição da pena por colaboração premiada a condenado pela Chacina de Unaí.(Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Relembre o caso

Em 28 de janeiro de 2004, três auditores fiscais do trabalho, João Batista Soares Lage, Eratóstenes de Almeida Gonçalves e Nelson José da Silva, e o motorista Aílton Pereira de Oliveira, da então Delegacia Regional do Trabalho, foram mortos a tiros em uma emboscada enquanto apuravam denúncias de trabalho escravo em fazendas de Unaí/MG.

A execução ocorreu no trevo conhecido como Sete Placas, na rodovia MG-188. Segundo o inquérito, o crime foi motivado por represálias a autuações trabalhistas, especialmente as lavradas por Nelson José da Silva em propriedades ligadas à família de Antério Mânica, ex-prefeito de Unaí. Mânica foi condenado pela chacina e cumpre pena de 64 anos de prisão.

Histórico do processo

Hugo Alves Pimenta foi condenado a 48 anos de reclusão em regime fechado por quatro homicídios qualificados (art. 121, §2º, I, IV e V, CP). Em grau de apelação, o TRF da 1ª região excluiu a qualificadora da emboscada, reduzindo a pena para 31 anos e 6 meses.

Posteriormente, o STJ, no REsp 1.973.397, também afastou a qualificadora de promessa de recompensa, fixando a pena em 27 anos. Os réus iniciaram o cumprimento provisório da pena desde 2023. Por fim, a defesa realizou acordo de delação premiada com o MP.

No habeas corpus, a defesa pleiteou a redução da pena para 15 anos, com base no acordo de delação, na confissão espontânea e na aplicação da continuidade delitiva. Também apontou ofensa ao art. 580 do CPP, destacando que o corréu José Alberto recebeu pena menor.

A defesa ainda buscou suspender a execução provisória da pena e reformar a decisão monocrática que não conheceu do habeas corpus. Alegou que a impetração era válida mesmo com recurso especial já interposto, por se tratar de questão que afeta diretamente a liberdade do réu, conforme jurisprudência do próprio STJ.

O relator, ministro Ribeiro Dantas, rejeitou os argumentos e manteve o não conhecimento do habeas corpus. Para ele, a medida não seria cabível diante da existência de recurso especial sobre o mesmo ato, o que violaria o princípio da unirrecorribilidade, que impede o uso de meios recursais distintos contra a mesma decisão judicial.

Acordo de delação deve prevalecer

O ministro Joel Ilan Paciornik pediu vista e apresentou voto divergente, defendendo a prevalência do acordo de colaboração premiada. Para ele, devem ser respeitados os princípios da justiça penal negociada e a natureza vinculativa do pacto firmado com o MP.

Os ministros Reynaldo Soares da Fonseca e Messod Azulay Neto, que inicialmente tinham seguido o relator, retificaram seus votos e aderiram à divergência. Reynaldo enfatizou que o habeas corpus tratava de tema distinto, o cumprimento do acordo, e não da nulidade abordada no recurso especial.

Segundo o ministro Reynaldo, a credibilidade nas negociações penais precisa ser preservada como parte de um novo modelo de justiça criminal.

"Independentemente da repercussão ou não deste processo, que é realmente muito importante, é importante destacar que não está se discutindo, nem se desfazendo nada em relação àquilo que foi examinado nessa situação de Unaí/MG, que acabou sendo deslocada para Belo Horizonte/MG. Estamos apenas discutindo se o acordo do colaborador e o pedido do MP, em dois terços da diminuição da pena, deve valer, ou se o juiz pode reduzir esse percentual. Eu entendo que, nessa hipótese, a justiça penal negociada deve prevalecer. Eu penso que é um novo modelo de justiça e o princípio da confiança deve ser valorizado na justiça penal negociada."

Por maioria, a 5ª turma do STJ deu provimento ao agravo regimental e determinou a aplicação da pena nos termos ajustados no acordo de colaboração premiada.

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