Ministro Flávio Dino pediu destaque no julgamento em que o STF discute a validade de critérios para esterilização voluntária, como vasectomia e laqueadura. Com o pedido, a análise foi suspensa no plenário virtual e será reiniciada de forma presencial.
A ação foi proposta pelo PSB em 2018 e questiona trechos da lei 9.263/96, que regula o planejamento familiar no Brasil e impõe requisitos para a realização da esterilização. Atualmente (após lei de 2022), o texto estabelece que esses procedimentos só podem ser feitos por homens e mulheres com capacidade civil plena, desde que sejam maiores de 21 anos de idade ou que tenham ao menos dois filhos vivos.
Para a legenda, tais exigências violam direitos fundamentais, incluindo o planejamento reprodutivo, a autonomia individual e a igualdade de gênero, além de restringirem indevidamente a liberdade de escolha sobre o próprio corpo.
Durante a tramitação, diversas entidades foram admitidas como amici curiae no processo, entre elas o IBDFam - Instituto Brasileiro de Direito de Família, defensorias públicas, núcleos acadêmicos e organizações civis voltadas à defesa de direitos sexuais e reprodutivos. As instituições destacaram o impacto da norma sobre mulheres em situação de vulnerabilidade e defenderam a necessidade de rever os critérios estabelecidos pela lei.
O relator da ação é o ministro Nunes Marques, que havia proferido voto em meio virtual. Com o destaque solicitado por Flávio Dino, o placar fica zerado e a análise será reiniciada em sessão presencial do plenário físico, ainda sem data definida.
Votos anteriores
Oito votos já haviam sido proferidos em meio virtual. O relator da ação, ministro Nunes Marques, se manifestou em novembro de 2024. Ele defendeu que é válido restringir a esterilização para quem não tem capacidade civil plena (quem tem menos de 18 anos), independentemente da quantidade de filhos. Nunes votou para manter os demais critérios da lei: ter mais de 21 anos ou ao menos dois filhos. Em caso de esterilização antes dos 21 anos de idade, a exigência é de que a pessoa tenha capacidade civil plena e ao menos dois filhos.
Na sua avaliação, a lei não proíbe, impede, restringe ou limita o planejamento familiar: ela apenas regulamenta a utilização de um dos muitos métodos contraceptivos disponíveis e que exige tratamento mais cauteloso, em razão de seu caráter irreversível. Além disso, o ministro ponderou que permitir a esterilização como solução para a gravidez na adolescência pode vulnerabilizar ainda mais a população pobre do país.
O ministro Flávio Dino, em voto também apresentado em 2024, acompanhou o relator, mas ponderou que deve ser retirada a previsão de que uma equipe multidisciplinar realize aconselhamentos “a fim de desencorajar a esterilização precoce”. A seu ver, o Estado não tem esse papel, e cabe à equipe multidisciplinar apenas promover uma reflexão, sem interferir na vontade de quem busca o serviço. Dino avaliou que essa previsão viola a autonomia das pessoas e que o objetivo da norma é o planejamento familiar, que não compete à equipe multidisciplinar. O relator acolheu a sugestão.
Cristiano Zanin, Edson Fachin e Dias Toffoli também acompanharam o relator.
A divergência foi inaugurada pelo ministro André Mendonça, que votou para manter a lei como está atualmente, cujos critérios, a seu ver, são razoáveis e legítimos. Segundo ele, a esterilização voluntária é somente um dentre outros tantos métodos contraceptivos igualmente eficazes. Mas, em razão da irreversibilidade e de considerável risco à saúde, a fixação de critérios “não fere a liberdade de homens e mulheres e muito menos a dignidade da pessoa humana”.
Alexandre de Moraes também apresentou voto divergente, no que foi seguido pelo ministro Luiz Fux. Os dois divergiram de Mendonça só em relação à expressão “com vistas a desencorajar a esterilização precoce” que, para ambos, é inconstitucional.
Para os advogados Rafael Carneiro e Ana Letícia Bezerra Rodrigues, do escritório Carneiros Advogados, que representam o PSB no caso, "a decisão de levar a discussão do caso ao plenário físico demonstra a relevância do tema, que envolve saúde pública e liberdades individuais, direitos assegurados na Constituição. Confiamos que o direito de escolha, especialmente das mulheres, deve prevalecer, sem interferências estatais".
- Processo: ADin 5.911