Durante sessão de julgamentos desta terça-feira, 24, a 1ª turma do STF debateu se suspenderia, ou não, a tramitação de uma reclamação constitucional que discutia o reconhecimento de vínculo empregatício entre um motoboy e uma empresa de entregas.
A discussão girou em torno dos efeitos da repercussão geral reconhecida no Tema 1.389, cuja relatoria está a cargo do ministro Gilmar Mendes e que trata justamente da caracterização do vínculo em relações de trabalho mediadas por plataformas digitais. Em razão da repercussão, o decano da Corte determinou, em abril, a suspensão nacional dos processos sobre o tema.
A controvérsia foi suscitada por questão de ordem do ministro Luiz Fux, que defendeu, inicialmente, o sobrestamento da reclamação, alegando que o julgamento da repercussão geral ainda está pendente no plenário e que o relator do Tema 1.389 ordenou a suspensão nacional dos processos correlatos.
No entanto, o relator da reclamação em análise, ministro Cristiano Zanin, manifestou-se contra a suspensão.
Segundo o ministro, a própria 1ª turma já havia decidido, por unanimidade, que a determinação de sobrestamento não se aplica aos feitos que já tramitam no STF, como é o caso da RCL 77.104.
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Zanin também destacou que a decisão de Gilmar Mendes contém ressalva expressa nesse sentido — interpretação que foi confirmada pelo ministro Alexandre de Moraes.
Moraes acrescentou que, no caso concreto, não se discute genericamente a terceirização ou o trabalho por aplicativo, mas sim uma situação específica em que há indícios claros de subordinação direta, com pagamento por entrega, jornada de trabalho e exclusividade — elementos que afastam a controvérsia central do Tema 1.389.
Veja o debate:
Ministro Flávio Dino externou preocupação com a integridade jurisprudencial, alertando para a existência de múltiplos regimes legais e o risco de decisões contraditórias.
Apesar de afirmar que tem evitado julgar casos semelhantes enquanto o tema de repercussão geral não é apreciado, defendeu que o STF deve enfrentá-lo o quanto antes, dado o número expressivo de processos atualmente suspensos.
Ministra Cármen Lúcia fez um alerta sobre o impacto da suspensão em casos que envolvem pessoas em situação de vulnerabilidade.
Demonstrando apreensão com a demora na análise, ressaltou que se trata de matéria trabalhista que já chegou à instância máxima por meio de reclamação, e que adiar a solução pode agravar a condição de quem já obteve o reconhecimento de um direito.
Ao final, prevaleceu o entendimento de que a suspensão nacional determinada no Tema 1.389 não alcança os processos em tramitação no Supremo, o que permitiu o prosseguimento do julgamento do mérito do agravo regimental.
No mérito
Superada a questão de ordem, a turma julgou o mérito e, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental da empresa.
O relator, ministro Cristiano Zanin, entendeu que não havia nos autos demonstração de que o trabalhador estivesse cadastrado como transportador autônomo de cargas, afastando a aplicação da lei 11.442/07 e da ADC 48.
Destacou, ainda, a condição de vulnerabilidade do motoboy, que recebia R$ 3 por entrega e trabalhava de forma contínua, subordinada e exclusiva para a empresa. Para Zanin, a decisão da Justiça do Trabalho que reconheceu o vínculo empregatício está em conformidade com o art. 3º da CLT e não afrontou precedentes do Supremo, sendo incabível o uso da reclamação como meio de reexame fático-probatório.
- Processo: Rcl 73.042