A 4ª câmara de Direito Privado do TJ/MT reformou sentença para majorar, de cerca de R$ 46,7 mil para R$ 112,5 mil, o valor da indenização por instituição de servidão administrativa de passagem sobre imóvel rural.
O processo tramita desde 2010, e a sentença havia fixado a indenização sem realização de perícia técnica. Diante da ausência de prova pericial, o tribunal considerou válido o parâmetro estabelecido em agravo de instrumento julgado no início da demanda.
O novo montante deverá ser corrigido monetariamente pelo IPCA-E e acrescido de juros compensatórios de 6% ao ano, a contar da imissão na posse.
O que é servidão administrativa?
A servidão administrativa é um instituto jurídico que permite a utilização de parte de um imóvel particular pelo poder público ou por concessionárias de serviços públicos para a instalação de infraestrutura essencial, como linhas de transmissão de energia elétrica, tubulações de água ou vias de acesso. Diferente da desapropriação, onde há transferência de propriedade, na servidão administrativa o proprietário mantém a titularidade do imóvel, mas é obrigado a permitir o uso parcial do terreno para o fim específico determinado pelo ente público, mediante o pagamento de indenização justa pela limitação imposta ao uso da propriedade.
Entenda o caso
Trata-se de ação de constituição de servidão administrativa de passagem, ajuizada por uma concessionária de energia elétrica. O juízo de primeira instância declarou constituída a servidão sobre área de 77,8 hectares, localizada em Araputanga/MT, e fixou a indenização em R$ 46.789,98, acrescida de juros compensatórios e correção monetária.
Inconformados, os proprietários do imóvel alegaram que a sentença desconsiderou decisão anterior do TJ/MT no Agravo de Instrumento 87.430/2010, que havia estabelecido indenização provisória no valor de R$ 112.528,68, equivalente a 25% do valor do hectare da área afetada.
Sustentaram que a fixação sem realização de prova pericial violou o devido processo legal e resultou em indenização arbitrada sem critério técnico. Também defenderam a inaplicabilidade do CPC quanto à verba sucumbencial, requerendo a aplicação do art. 27, §1º, do decreto-lei 3.365/41, que prevê honorários entre 0,5% e 5% sobre a diferença entre o valor ofertado e o valor arbitrado.
A concessionária, por sua vez, argumentou que os próprios proprietários manifestaram desinteresse na realização da perícia durante o processo, o que teria gerado preclusão. Defendeu que a indenização foi baseada em laudo técnico suficiente e que não houve violação à ampla defesa. Requereu ainda a aplicação de multa por litigância de má-fé.
Parâmetro técnico
Em seu voto, o relator, desembargador Rubens de Oliveira Santos Filho, destacou que a ausência de perícia compromete a apuração justa do prejuízo imposto pela servidão administrativa, sendo a prova pericial, em regra, imprescindível nesse tipo de ação.
"A ausência de perícia técnica compromete a apuração do valor justo da indenização, especialmente em ações que impõem restrições ao direito de propriedade, sendo a prova pericial, em regra, imprescindível para avaliar o efetivo prejuízo."
Ainda assim, ponderou que a falta da prova técnica resultou em insegurança jurídica quanto ao valor da indenização, e que "o valor fixado na sentença mostra-se desproporcional, pois desconsidera parâmetro indenizatório previamente estabelecido em Agravo de Instrumento julgado pelo próprio Tribunal".
Diante desse cenário, o relator entendeu que o valor estabelecido no agravo, correspondente a 25% do valor do hectare da área afetada, embora provisório, revela-se proporcional e tecnicamente embasado, podendo servir como critério objetivo substitutivo. Ressaltou ainda que a concessionária efetivou o depósito no referido valor, o que corrobora sua adoção como base indenizatória.
Além disso, afirmou que "a ausência de prova pericial, quando imputável à parte, não configura cerceamento de defesa nem enseja nulidade da sentença", já que os réus, em diversas oportunidades, manifestaram desinteresse pela produção da perícia, o que gerou preclusão.
Por fim, o relator reforçou que, por se tratar de ação de intervenção estatal sobre propriedade privada, a indenização deve refletir o efetivo prejuízo causado pela restrição, nos termos do art. 5º, XXIV, da CF. Com isso, reformou a sentença somente quanto ao valor da indenização, fixando-o em R$ 112.528,68.
Quanto aos honorários sucumbenciais, o tribunal aplicou por analogia o art. 27, §1º, do decreto-lei 3.365/41, em conformidade com o Tema 184 do STJ, e fixou os honorários em 5% da diferença entre o valor ofertado na inicial e o valor judicialmente arbitrado.
O escritório Carapeba Elias & Advogados Associados atua pelos proprietários no imóvel rural.
- Processo: 0001256-32.2010.8.11.0038
Leia o acórdão.