No encerramento da sessão plenária do STF desta quinta-feira, 14, ministro Luiz Fux manifestou irresignação com a forma como foi proclamado o resultado do julgamento realizado na véspera, relativo à CIDE-Royalties. Por ter sido vencido em um ponto da tese, Fux perdeu a relatoria do caso para o ministro Flávio Dino.
A manifestação provocou um momento de desconforto na Corte.
Assista:
Fux afirmou que, no voto proferido na véspera, acompanhou a maioria dos ministros em quase todos os aspectos: declarou a lei constitucional, negou provimento ao recurso e concordou com a destinação dos valores, divergindo apenas quanto à aplicação da tese a determinados contratos.
"Nunca houve essa heterodoxia de se retirar do relator, vencido em parte mínima, a relatoria", disse, ressaltando que já manteve a função em outros casos mesmo quando foi amplamente vencido, como no julgamento sobre juiz de garantias.
"Eu não sou de pedir a relatoria, mas entendi, com a devida vênia, e com essa tranquilidade que eu falo ao plenário, que eu considerei essa manifestação, uma manifestação completamente dissonante do que ocorreu até então aqui no plenário. Eu gostaria de consignar essa minha irresignação, porque isto pode se repetir em relação a outros colegas", completou.
Barroso respondeu dizendo que respeitava a manifestação, mas não a considerava justa.
"Ali havia uma impugnação ao §2ºda lei. O §2º criava toda uma nova disciplina, porque ampliava substancialmente a base de cálculo de incidência da CIDE. Talvez a maior parte da base de incidência da CIDE. E Vossa Excelência entendeu de invalidar o §2º em maior extensão. E a maior parte do tribunal manteve o §2º. Na ocasião eu perguntei à Vossa Excelência se Vossa Excelência gostaria de reajustar para permanecer como relator. Vossa Excelência me disse que não reajustaria."
Fux, então, afirmou:
"Isso é o que eu queria dizer, Vossa Excelência. Eu não podia nem devia reajustar por uma questão de lisura com os demais colegas que haviam me acompanhado."
Barroso rebateu, dizendo que, pela praxe, quando o relator é vencido em ponto considerado essencial e não concorda em ajustar o voto à tese vencedora, a relatoria passa ao primeiro divergente. E insistiu:
"Ministro, a tese de julgamento era uma tese divergente da de Vossa Excelência em um capítulo essencial. Eu ofereci à Vossa Excelência permanecer como relator [...] apenas reajustando. Vossa Excelência disse: 'não, não quero reajustar'."
Fux, por sua vez, contestou:
"Reajustar...mas Vossa Excelência não me ofereceu como relator; passou direto..."
Barroso respondeu:
"Absolutamente, absolutamente. Pode resgatar a sessão. Eu disse, porque tenho a maior consideração por Vossa Excelência, e Vossa Excelência não está sendo fiel aos fatos."
Decano da paz
Diante do impasse, ministro Gilmar Mendes interveio propondo solução de colegialidade, lembrando que já houve casos em que votos foram ajustados para preservar relatorias.
Barroso afirmou não se opor à devolução da relatoria e relatou ter consultado Flávio Dino sobre a possibilidade, mas este considerou que, após a proclamação, não seria apropriado:
"Ministro, para mim, tanto se me dá quem será o redator do acórdão... Eu perguntei ao ministro Fux, e hoje perguntei ao ministro Flávio Dino, se ele se importava de devolver a relatoria ao ministro Fux, porque, para mim, tanto faz. E o ministro Flávio Dino disse: 'acho que depois da proclamação não é apropriado'."
Apesar das tentativas de acomodação, Fux manteve o registro de sua insatisfação. Barroso, então, encerrou a sessão.
Causa da irresignação
Na sessão de quarta-feira, 14, o STF declarou constitucional a cobrança da CIDE - Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico sobre remessas ao exterior, fixando que a arrecadação deve ser integralmente destinada à área de ciência e tecnologia.
Ministro Luiz Fux, relator do caso, votou pela constitucionalidade da CIDE sobre remessas ao exterior, mas defendeu interpretação restritiva: a contribuição deveria incidir apenas sobre contratos relacionados à exploração de tecnologia estrangeira, excluindo serviços e pagamentos sem vínculo tecnológico, como assistência administrativa, honorários advocatícios ou royalties de obras intelectuais.
Sua posição foi acompanhada por apenas três ministros: Cármen Lúcia, André Mendonça e Dias Toffoli. A maioria aderiu à divergência aberta por Flávio Dino, que reconheceu a validade da CIDE em base mais ampla, abrangendo todas as hipóteses previstas em lei.
Essa diferença foi decisiva para a perda da relatoria.
Pela praxe do STF, quando o relator é vencido em ponto considerado essencial da tese e não ajusta seu voto à posição vencedora, a função de redigir o acórdão passa ao primeiro ministro divergente, no caso, Dino.
Foi justamente esse procedimento que gerou a reação de Fux no plenário.