Cátia Regina Raulino, que se passava por advogada e professora universitária, foi condenada a 10 anos de reclusão, em regime fechado, além do pagamento de 50 dias-multa e de indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil a cada vítima de plágio.
A sentença foi proferida pela juíza de Direito Virginia Silveira Wanderley dos Santos Vieira, da 2ª vara Criminal Especializada de Salvador/BA.
De acordo com a denúncia do MP/BA, durante quase uma década, Cátia construiu uma carreira acadêmica baseada em falsificações, utilizando supostos diplomas de graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado atribuídos a universidades Federais (UFMA, UFSC, UFBA e UFPE).
Amparada nesses documentos, chegou a assumir a coordenação do curso de Direito da UniRuy, a lecionar no mestrado da Unifacs e a integrar bancas examinadoras em diferentes instituições de ensino superior, consolidando prestígio e notoriedade acadêmica que agora se revelam fruto de fraude.
Fraudes acadêmicas
De acordo com os autos, a acusada construiu um currículo fictício, anunciando-se nas redes sociais e no Lattes como pós-doutora, organizando congressos e participando de eventos jurídicos ao lado de renomados juristas.
Ao mesmo tempo, plagiou trabalhos de conclusão de curso de alunos, que foram publicados em revistas e livros especializados como se fossem de sua autoria.
As investigações revelaram a apropriação de TCCs. O laudo pericial apontou índices elevados de similaridade entre os textos, chegando a mais de 70% em um dos casos.
As vítimas relataram impactos emocionais e acadêmicos, como a impossibilidade de reaproveitar os artigos plagiados, o bloqueio em seguir carreira na área pesquisada e a frustração pela perda de oportunidades.
Acusação e defesa
O MP/BA pediu a condenação pelos crimes de uso de documento falso (art. 304 do CP) e violação de direito autoral qualificada (art. 184, §1º do CP), além da fixação de indenização mínima às vítimas. Para o parquet, a conduta evidenciou abuso de confiança das instituições, obtenção de vantagens pessoais e prejuízos à comunidade acadêmica.
A defesa, por sua vez, alegou nulidades processuais, ausência de dolo no plágio, quebra da cadeia de custódia das provas digitais e cerceamento de defesa. Sustentou ainda que alguns trabalhos teriam sido produzidos em coautoria, com o consentimento dos alunos.
Na sentença, a magistrada afastou todas as preliminares, ressaltando que não houve demonstração concreta de adulteração ou comprometimento da fiabilidade das provas. Também destacou que a acusada jamais apresentou os diplomas originais que dizia possuir, mesmo quando intimada a fazê-lo.
Reconheceu duas condenações por uso de documentos falsos (referentes à contratação na UniRuy e na Unifacs) e três por violação de direito autoral.
No entanto, absolveu a ré da acusação de plágio do trabalho de uma quarta aluna, em razão de dúvida sobre a materialidade, e em relação ao crime de fraude processual, por ausência de dolo.
A pena definitiva foi fixada em 10 anos de reclusão, em regime inicial fechado, e 50 dias-multa. Além disso, a ré deverá indenizar cada uma das três vítimas de plágio em R$ 10 mil.
Apesar da gravidade dos fatos, Cátia poderá recorrer em liberdade, já que respondeu ao processo solta e não há, segundo a magistrada, fundamentos para a decretação da prisão preventiva.
Histórico do caso
O caso ganhou notoriedade em 2020. À época, o Migalhas noticiou suspeitas sobre a autenticidade do currículo da jurista que fazia sucesso nas redes sociais.
Cátia Raulino divulgava cursos de Direito Tributário em plataformas digitais, ostentava títulos acadêmicos em seu currículo Lattes e ocupava o cargo de coordenadora do curso de Direito em Salvador.
Naquele momento, universidades mencionadas por ela, UFBA, UFSC, UFMA e UFPE, negaram qualquer vínculo acadêmico com seu nome, e o MP/BA abriu investigação.
Ex-alunas começaram a denunciar casos de plágio, relatando que trabalhos foram publicados integralmente em revistas e livros jurídicos com o nome da professora.
Com a repercussão, perfis da acusada nas redes sociais foram desativados, e ela passou a evitar declarações públicas.
Em entrevista ao portal Metro1, limitou-se a dizer que preferia "não afirmar nada nesse sentido", alegando que ainda reunia documentação para se defender.
Nos anos seguintes, o caso avançou com a coleta de provas, oitivas de testemunhas e perícias que confirmaram a falsidade dos diplomas e os plágios praticados.
Em 2023, a instrução processual foi encerrada com depoimentos de professores, vítimas e universidades.
- Processo: 0511404-75.2020.8.05.0001
Veja a sentença.