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"Catfishing na Escola" e extorsão no Instagram: Entenda casos virais

Especialista em Direito Digital explica como a lei brasileira enquadra esses crimes.

21/9/2025

Crimes digitais, antes vistos como episódios excepcionais, tornaram-se parte da rotina do Judiciário e da vida social.

Entre eles, destacam-se o catfishing - criação de perfis falsos ou manipulação de identidades para enganar ou prejudicar terceiros - e a extorsão digital, práticas que desafiam a aplicação das normas tradicionais do Direito Penal às novas formas de interação em rede.

Dois episódios recentes que "viralizaram" ilustram a gravidade do problema.

Nos Estados Unidos, um documentário da Netflix revelou um caso intrigante de mensagens de ódio e ameaças anônimas a adolescentes.  Em território brasileiros, na cidade de Conceição de Alagoas/MG, uma jovem de 21 anos foi presa por difamar moradores em perfil anônimo e exigir dinheiro para apagar as postagens. 

Para compreender como o ordenamento jurídico brasileiro lida com esses fenômenos, Migalhas ouviu o advogado Luiz Augusto D’Urso, especialista em Direito Digital e Crimes Cibernéticos.

Veja a entrevista:

Catfishing 

O documentário "Número Desconhecido: Catfishing na Escola" acompanha a história de uma adolescente de 13 anos que, junto ao namorado, passou a receber mensagens anônimas com ofensas e ameaças. Após meses de investigação, foi descoberto quem estava por trás dos ataques - revelação que tornou o caso ainda mais perturbador.

Segundo o advogado Luiz Augusto D’Urso, se a conduta tivesse ocorrido no Brasil, poderia ser enquadrada no art. 232 do ECA, que pune quem submete criança ou adolescente a situação vexatória, com pena de até dois anos.

Também caberia o crime de perseguição (stalking), previsto no art. 147-A do CP, igualmente sujeito a pena máxima de dois anos.

Além disso, explica o especialista, as condutas poderiam caracterizar crimes contra a honra (calúnia, difamação e injúria – arts. 138 a 140 do CP), bem como bullying e cyberbullying.

Extorsão

No Brasil, em Conceição de Alagoas/MG, o caso ultrapassou a difamação online.

Uma jovem de 21 anos mantinha perfil anônimo em que difundia boatos e acusações contra moradores e instituições locais - envolvendo traições, gravidez e agressões físicas.

Quando confrontada pelas vítimas, exigia pagamentos entre R$ 200 e R$ 500 para remover as postagens.

Segundo D’Urso, nesse caso há também o uso do meio digital, mas a conduta ultrapassa a esfera dos crimes contra a honra e configura extorsão:

"Nesse absurdo caso que ocorreu em Minas Gerais, nós tínhamos uma situação mais gravosa, que era após a publicação, quando as pessoas reclamavam pela remoção, a autora exigiu um pagamento para que a publicação fosse retirada, vale dizer cometendo um crime mais gravoso, que a pena pode chegar até 10 anos de prisão, que é o crime de extorsão."

Arcabouço jurídico

Apesar das inovações tecnológicas, o especialista considera que o Brasil já dispõe de um sistema jurídico apto a lidar com esses crimes.

"Não há dúvida que hoje nós temos leis suficientes para enfrentar essas situações, extorsão já está previsto no Código Penal, crime de perseguição, crime de ameaças, crimes contra a honra, tudo isso já tem previsão legal e já são condutas ilícitas no Brasil."

Responsabilidade civil 

As consequências não se limitam à esfera penal. D’Urso ressalta que as vítimas podem buscar reparação por danos morais:

"Hoje nós temos diversos os processos que tramitam por danos morais, indenização por dano moral, em razão desse desgaste público [...] e diante disso o judiciário tem enfrentado essa situação, analisando inclusive esse alcance maior desse desgaste à honra nas redes sociais e aplicando indenizações de multas severas. Nós temos casos aí que a multa ficou entre R$100 mil e R$200 mil de indenização", afirma.

Plataformas digitais

Outro aspecto central é a responsabilidade das empresas de tecnologia.

O advogado recorda que o STF, ao julgar a constitucionalidade do art. 19 do marco civil da internet (lei 12.965/14), alterou o regime jurídico das plataformas.

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Antes, a responsabilização só ocorria se a empresa descumprisse ordem judicial para remoção do conteúdo, exceto em casos de nudez e pornografia, regulados pelo art. 21.

Após a decisão, qualquer ato ilícito, salvo crimes contra a honra, pode gerar responsabilidade civil se a plataforma for notificada e não retirar o material.

"O Supremo mudou isso e colocou como regra no artigo 19 que qualquer ato ilícito que tenha a notificação, entregue a plataforma dizendo que o conteúdo está no ar, ela poderia ser corresponsabilizada", observa D’Urso.

Veja a versão completa

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