Nesta terça-feira, 21, ministro Luiz Fux apresentou voto pela absolvição de todos os réus do Núcleo 4 da chamada trama golpista - grupo apontado pela PGR como o "núcleo da desinformação".
O ministro propôs a declaração de incompetência da 1ª turma do STF para processar e julgar os acusados, e, de forma subsidiária, a absolvição de todos os réus por ausência de provas, atipicidade das condutas e inexistência de atos executórios concretos.
Ao afastar materialidade, nexo causal e dolo, Fux votou pela absolvição de Ângelo Denicoli, Reginaldo Vieira de Abreu, Carlos César Rocha, Guilherme Marques de Almeida, Giancarlo Rodrigues, Marcelo Bormevet e Ailton Moraes Barros das acusações de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Para o ministro, a responsabilidade penal exige prova além de dúvida razoável e não cabe ao juiz criminalizar a crítica, o debate ou a cogitação política.
Veja a conclusão do voto:
Mudança de entendimento
Logo na abertura, Fux retomou reflexão sobre o papel do julgador e a necessidade de rever entendimentos à luz do tempo e das garantias constitucionais.
O magistrado, disse, deve ter "coragem de corrigir equívocos" e jamais "pactuar com o próprio erro".
Afirmou que o tempo permite "dissipar as brumas da paixão", afirmou, advertindo que o juiz não deve confundir rigor com precipitação.
A reflexão do ministro foi um mea-culpa em relação a votos anteriores, proferidos no início dos julgamentos dos réus dos atos de 8 de janeiro, quando chegou a acompanhar a condenação de diversos acusados.
A mudança de entendimento foi observada quanto o ministro votou para absolver Jair Bolsonaro e outros réus do chamado Núcleo 1.
Preliminares
Fux reafirmou o entendimento de que o STF é incompetente para julgar réus sem foro por prerrogativa de função, conforme o art. 80 do CPP e o art. 5º, LV, da CF.
Defendeu que os autos deveriam ser remetidos à 1ª instância, garantindo o duplo grau de jurisdição previsto no Pacto de San José da Costa Rica.
Segundo o ministro, caso houvesse autoridade com foro, a competência seria do plenário, e não da turma, já que a emenda regimental 59/23, que ampliou a competência das turmas, é posterior aos fatos narrados.
Por essa razão, propôs a nulidade de todos os atos decisórios, inclusive o recebimento da denúncia, por violação ao princípio do juiz natural.
Mérito
No mérito, Fux reafirmou as premissas teóricas fixadas na AP 2.668, ao explicar que os crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L do CP) e de golpe de Estado (art. 359-M) exigem atos executórios imediatos, praticados com violência ou grave ameaça.
Para o ministro, discussões, críticas ou postagens em redes sociais não configuram atos executórios e não podem ser enquadradas como tentativa de golpe. "Cogitação, debate político e atos preparatórios não configuram tentativa. Criminalizar discursos e manifestações genéricas fragiliza o Estado Democrático de Direito", afirmou.
Segundo Fux, a denúncia não descreve qualquer ato concreto de abolição do Estado ou de tomada de poder, limitando-se a conversas privadas e manifestações sem potencial lesivo.
Ângelo Denicoli e Reginaldo Vieira de Abreu
Ao analisar o núcleo ligado à minuta sobre as urnas eletrônicas e ao relatório das Forças Armadas, Fux afirmou que a acusação extrapolou os limites da denúncia e utilizou documentos não acessíveis às defesas, o que violou o devido processo legal.
No caso de Ângelo Denicoli, o ministro observou que o réu apenas compartilhou informações públicas do site do TSE, sugerindo análise técnica por órgãos como o ITA e o IPEA - conduta que, segundo ele, revela busca pela verdade, não adesão a golpe.
"Criminalizar o direito de petição ou a fiscalização civil do sistema eleitoral é inibir a transparência democrática", advertiu.
Sobre o coronel Reginaldo Vieira de Abreu, Fux classificou a acusação de "tentativa da tentativa", ao atribuir-lhe suposta interferência em relatório que, hipoteticamente, poderia gerar apoio à ruptura institucional.
As provas, segundo o ministro, mostram apenas críticas pessoais e conversas privadas, sem qualquer relação com violência, ameaça ou ato executório.
Carlos César Rocha
Ao tratar do presidente do Instituto Voto Legal, Carlos César Moretzsohn Rocha, Fux afirmou que o relatório técnico elaborado pelo instituto não é ilícito e que o debate sobre a segurança das urnas é legítimo, não caracterizando tentativa de golpe.
"O questionamento ao sistema eletrônico de votação não pode ser considerado um meio para minar a legitimidade do resultado das urnas. O debate sobre segurança é indispensável e não denota desconfiança no processo eleitoral", declarou.
O ministro lembrou que, em 2014, o TSE já havia recebido auditoria semelhante com normalidade institucional.
Giancarlo Rodrigues e Marcelo Bormevet
Ao examinar o núcleo da chamada “ABIN paralela”, Fux afirmou que o MP não comprovou vínculo direto entre Giancarlo Gomes Rodrigues e Marcelo Araújo Bormevet com atos executórios de crimes contra o Estado Democrático de Direito.
Segundo o ministro, as supostas consultas a sistemas de inteligência ocorreram antes do período da denúncia e sem indícios de uso no contexto investigado, já que o FirstMile deixou de ser utilizado pela ABIN em maio de 2021.
Para Fux, não se provou estabilidade, permanência nem propósito criminoso comum, tampouco o uso de armas ou o conhecimento dos demais supostos integrantes, inviabilizando o enquadramento na lei de organização criminosa.
Ailton Moraes Barros
Por fim, ao analisar a acusação contra Ailton Moraes Barros, Fux ressaltou que testemunhos de Mauro Cid, Braga Netto, Freire Gomes e Batista Júnior negaram qualquer pressão, mensagem ou ameaça.
As postagens atribuídas ao réu, disse o ministro, contêm opiniões políticas, não incitação à violência.