Os vícios dos produtos - 6ª parte
quinta-feira, 31 de julho de 2025
Atualizado em 30 de julho de 2025 08:25
Continuo a análise dos vícios dos produtos tratados pelo CDC (Lei 8078/1990), ainda nas hipóteses dos incisos do §1º do art. 18 do CDC.
Lembremos a redação:
"§ 1º Não sendo o vício sanado no prazo máximo de 30 (trinta) dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III - o abatimento proporcional do preço".
Passemos ao exame do inciso II do § 1º do art. 18, que apresenta algumas questões intrigantes. A primeira parte da oração aponta o mais natural para um consumidor desgostoso com a não solução do seu problema. Está disposto que o consumidor pode exigir "a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada...". É uma boa alternativa: tomar de volta o dinheiro pago e com ele procurar outro produto de marca diferente.
A questão que se coloca é a relativa à segunda parte da oração: "sem prejuízo de eventuais perdas e danos". Quer dizer, então, que a opção pela alternativa II dá ao consumidor o direito de pleitear também indenização pelos danos sofridos em função da espera de 30 dias, sem o saneamento do vício?
A resposta é sim, mas comporta uma série de nuances.
Primeiramente, o sentido de "perdas e danos". A expressão há de ser entendida como danos materiais (emergentes e lucros cessantes) e morais. Ou seja, a norma garante ao consumidor o direito a pleitear indenização pelos danos sofridos, em função da passagem do prazo de 30 dias sem o efetivo conserto do produto.
A responsabilidade civil nesse caso é diversa daquela firmada no caput do art. 12, ainda que da mesma forma seja objetiva.
É responsabilidade objetiva porque, como já disse algumas vezes, a responsabilidade do fornecedor fixada no CDC é objetiva, com a única exceção do caso do profissional liberal na previsão do § 4º do art. 14.
Porém, não é responsabilidade que nasça do mesmo tipo de defeito apontado no caput do art. 12. Há defeito sim, mas ele é caracterizado pela não realização do serviço de conserto, e dentro do prazo oferecido. Ou, em outras palavras, a caracterização do defeito aqui nasce da conjunção de dois fatores:
a) serviço incompleto ou não realizado e que manteve o produto viciado;
b) extinção do prazo de 30 dias para o saneamento do vício.
A sistemática de pleito e apuração da indenização segue o seguinte esquema: o consumidor tem de demonstrar o dano, o nexo de causalidade entre este e a ausência ou incompletude do serviço que manteve o produto viciado, bem como a extinção do prazo de 30 dias, indicando o fornecedor responsável.
Dessa maneira, ao optar pela alternativa do inciso II do § 1º do art. 18, o consumidor pleiteará a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada (isto é, corrigida pelos índices oficiais de inflação), e, além disso, poderá pleitear indenização pelos danos materiais e morais sofridos.
Examinemos agora a regra que permite que o consumidor peça abatimento proporcional do preço. Isto é, que requeira devolução da parte do valor já pago ou que deixe de pagar parte ou toda a quantia ainda faltante (caso o pagamento do preço seja a prazo), na exata medida do vício existente e não solucionado no prazo de 30 dias. É a prevista no inciso III do § 1º do art. 18 da lei.
Essa terceira alternativa à escolha do consumidor dependerá de uma análise feita por ele no caso concreto, verificando se vale a pena o pedido de abatimento do preço.
Apesar de se poder negociar com o fornecedor o valor do abatimento, nem sempre será fácil chegar a um número. Pode-se tratar de mero vício estético e o consumidor conformar-se em ficar com o produto mediante a devolução de parte do preço pago ou pode ser vício que impeça o funcionamento, mas que o consumidor tenha como consertar com terceiro - nessa hipótese o abatimento será o valor cobrado pelo terceiro para o conserto. Não é, de qualquer forma, fácil chegar ao valor do abatimento. Numa ação judicial, por exemplo, as alternativas processuais não são muito favoráveis. O feito terá curso regular e dependerá de perícia.
Terminando esta parte, lembre-se e repita-se que é o consumidor quem escolhe qual fornecedor irá acionar. No caso de uma televisão que não sintonize os canais, ele pode requerer o conserto na assistência técnica, na fábrica ou na loja em que a adquiriu. Esse fornecedor será a parte passiva de todas as reivindicações. Como sempre, após resolver o problema do consumidor - a) consertando o produto; b) trocando-o por outro da mesma espécie, marca e modelo; c) devolvendo o valor do preço, de maneira atualizada monetariamente; d) oferecendo abatimento do preço; e) e junto com as hipóteses b, c, e d, pagando indenização pelos danos materiais e/ou morais sofridos pelo consumidor -, ele pode ressarcir-se com os demais partícipes do ciclo de produção, pela via de regresso e na medida em que os fornecedores são todos responsáveis solidários. Cada um arcará com sua participação, e na proporção das partições das responsabilidades.
A questão nesse ponto é de direito privado, o que permite que os fornecedores entre si elaborem contrato, prevendo a participação de cada um nas despesas para o caso de gastos com vício e/ou pagamento de indenizações ao consumidor. Podem ser estabelecidos rateios, partições, divisões em partes iguais, em percentuais diferenciados etc.