Os defeitos dos produtos e dos serviços - 1ª parte
quinta-feira, 16 de outubro de 2025
Atualizado em 15 de outubro de 2025 13:11
Hoje começo a análise dos defeitos que geram acidentes de consumo ou como diz o CDC (lei 8078/1990), o fato do produto e do serviço.
Acidente de consumo e fato do produto: os defeitos
Costuma-se falar em "acidente de consumo", mas a lei abre a seção II do capítulo IV do título I falando em "Fato do Produto e do Serviço".
A expressão "acidente de consumo", muito embora largamente utilizada, pode confundir, porque haverá casos de defeito, em que a palavra "acidente" não fica muito adequada. Assim, por exemplo, ser lançado por equívoco no cadastro de devedores do Serviço de Proteção ou Crédito é defeito do serviço, gerando responsabilidade pelo pagamento de indenização por danos materiais, morais e à imagem. Porém, não se assemelha em nada a um "acidente"; comer algum alimento e depois sofrer intoxicação por bactéria que lá estava gera, da mesma maneira, dano, mas ainda assim não se assemelha propriamente a acidente.
De outro lado, a lei fala em "fato" do produto. A palavra fato permite uma conexão com a ideia de acontecimento, o que implica, portanto, qualquer acontecimento.
Diga-se, de qualquer maneira, que se tem usado tanto "fato" do produto e do serviço, quanto "acidente de consumo", para definir o defeito. Porém, o mais adequado é guardar a expressão "acidente de consumo" para as hipóteses em que tenha ocorrido mesmo um acidente: queda de avião, batida do veículo por falha do freio, quebra da roda-gigante no parque de diversões etc., e deixar fato ou defeito para as demais ocorrências danosas. Em qualquer hipótese, aplica-se a lei.
O fato do produto
A responsabilidade pelo fato do produto está regulada nos arts. 12 e 13 do CDC. Examinemos, primeiramente as hipóteses previstas no art. 12:
"Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
§ 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I - sua apresentação;
II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III - a época em que foi colocado em circulação.
§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado.
§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:
I - que não colocou o produto no mercado;
II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;
III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro."
Quem é o responsável
A primeira observação diz respeito aos sujeitos da oração do caput. A norma diz "o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador", abrindo mão de utilizar o termo geral: "fornecedor".
Explico. Fornecedor é o gênero daqueles que desenvolvem atividades no mercado de consumo, conforme definido no art. 3º. Assim, toda vez que o CDC se refere a "fornecedor" está envolvendo todos os participantes que desenvolvem atividades, sem qualquer distinção. É o que ocorre, por exemplo, na responsabilidade pelo vício (que já examinamos). No art. 18 o CDC põe como sujeito "os fornecedores", sem distinção. Como vimos, quando isso ocorre, cabe ao consumidor a escolha daquele que deverá resolver seu problema (v. g., o consumidor vai ao comerciante-lojista pedir a troca do produto).
Já na responsabilidade por defeito, a regra é a da especificação do agente. Com isso, a sujeição passiva se altera, limitando a escolha do consumidor. Na hipótese de dano por acidente de consumo com produto, a ação do consumidor tem de se dirigir ao responsável pelo defeito: fabricante, produtor ou construtor e, em caso de produto importado, o importador.
Veja-se o exemplo dos dois consumidores que vão à concessionária receber seu automóvel zero-quilômetro no mesmo momento. Ambos recebem seu carro com o mesmo problema de fabricação: o sistema de freios não funcionará quando acionado.
O primeiro consumidor conduz o veículo, e quando aciona o breque não consegue pará-lo. Mas, aos poucos, reduzindo as marchas, consegue encostar o carro na guia e, assim, estacioná-lo.
O outro, ao atingir a esquina em certa velocidade, depara com o sinal vermelho. Pisa no breque e este não funciona. Acaba numa colisão, com danos no seu e em outro veículo.
No primeiro caso, diz a lei (art. 18) que a escolha do responsável por consertar o veículo (vício) é do consumidor. Como a norma estipula o gênero - fornecedor -, o consumidor pode tanto acionar a concessionária quanto a montadora.
Na segunda hipótese, não. Como se trata de acidente de consumo e defeito (art. 12), o consumidor lesado é obrigado a pleitear o ressarcimento dos danos junto à montadora, na qualidade de fabricante.
O defeito
Leia-se o substantivo "defeito" no caput do art. 12 e tudo aquilo de que ele decorre: projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação, acondicionamento, além do oferecimento de informações insuficientes ou inadequadas sobre o risco e a utilização do produto.
Como norma protetora do consumidor deve-se entender que o elenco das hipóteses aventadas é meramente exemplificativo. Qualquer outra possi-bilidade ligada ao produto, quer antes, durante ou após o processo de fabrica-ção, pode implicar a qualificação do defeito - que sempre gera dano. Assim, por exemplo, pode-se falar no transporte do produto, na sua guarda, na con-fecção, enfim, não há alternativa capaz de excluir o produto da incidência legal. Nesse sentido entram no rol, também, a oferta e a publicidade relativa ao produto e que possam causar dano (cf. arts. 30, 31, 36 e 37 do CDC).
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Continua na próxima semana.

