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XIII Fórum de Lisboa

"No Brasil, Internet não é terra sem lei", diz Moraes a big techs

Durante o XIII Fórum de Lisboa, ministro debateu os desafios da regulação das big techs no último dia do evento.

Da Redação

sexta-feira, 4 de julho de 2025

Atualizado às 15:46

Nesta sexta-feira, 4, durante o último dia do XIII Fórum de Lisboa, ministro Alexandre de Moraes palestrou no painel "Dilemas da Soberania Digital: Big Techs e Governos".

S. Exa. criticou a atuação das big techs, afirmando que as redes sociais se transformaram em ambientes de disseminação de discurso de ódio, racismo, misoginia e ataques à democracia, sob o pretexto de liberdade de expressão.

Para Moraes, as plataformas digitais deixaram de ser neutras e passaram a direcionar conteúdos de forma opaca, visando lucro e influência política, inclusive ao se instrumentalizarem dolosamente para impulsionar os atos golpistas de 8 de janeiro.

Moraes defendeu a regulação global das redes, comparando sua atuação à de um poder econômico e político sem precedentes, concentrado nas mãos de poucos, que ignora legislações nacionais e despreza até a vida de crianças e adolescentes. 

Ao final, afirmou que a decisão do STF, que regula as redes, foi um recado às big techas de que o Brasil não é "terra sem lei".

Que redes queremos?

No início da fala, Moraes questionou o modelo atual de funcionamento das plataformas digitais. Para S. Exa., o ponto de partida de qualquer debate regulatório deve ser o tipo de ambiente digital que se deseja construir.

O ministro criticou a ideia de que redes sociais devam operar como "terras sem lei", imunes à legislação dos Estados soberanos.

"Se nós quisermos que haja um ente sobrenatural, um ente mítico, que possa ignorar países, legislações, constituições, direitos fundamentais, a dignidade das pessoas - tudo em nome do poder econômico e político -, então podemos delegar às big techs a organização internacional", afirmou.

Moraes também rechaçou a concepção de que qualquer conteúdo nas redes possa ser legitimado sob o pretexto de "liberdade de expressão". Para S. Exa., essa noção desvirtuada enfraquece a democracia e favorece interesses que se sobrepõem ao bem comum.

Ofensas no ambiente digital

Na sequência, o ministro, apresentando diversos exemplos de postagens ofensivas, afirmou que é inaceitável que redes sociais sejam utilizadas para disseminar preconceitos, discriminações e ofensas que, fora do ambiente digital, seriam inadmissíveis.

"Nós queremos uma rede social que direcione, impulsione e divulgue mensagens contra direitos arduamente conquistados por minorias?", questionou. 

O ministro comparou a atuação nas redes com o comportamento em ambientes públicos.

"Alguém pode falar isso num bar, num restaurante, no emprego, pessoalmente, sem ser responsabilizado? Não pode. Por que pode postar, impulsionar e ter milhões de seguidores?"

Para Moraes, a proteção da liberdade de expressão não pode servir de escudo para práticas criminosas, como o racismo, vedado expressamente pela CF.

Ao mencionar a intolerância religiosa, o antissemitismo e a misoginia, ele apontou falhas gravíssimas na atuação das big techs. 

O ministro ainda comparou o atual cenário de permissividade das plataformas a antigos paraísos fiscais que só foram combatidos após tragédias, como os atentados de 11 de setembro nos Estados Unidos.

8 de janeiro

Moraes afirmou que as plataformas digitais se deixaram "instrumentalizar dolosamente" para organizar a tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023.

Segundo o ministro, as redes permitiram e impulsionaram conteúdos com "mapas, pontos de encontro, mensagens incentivando a quebra do Estado de Direito e da democracia".

S. Exa. contestou a tentativa de reescrever os acontecimentos do dia 8 de janeiro de 2023. Para o ministro, essas narrativas ocultam a realidade da tentativa de golpe, organizada e difundida com o auxílio direto das redes sociais.

Segundo Moraes, enquanto golpistas invadiam os prédios dos Três Poderes, filmavam os próprios crimes e conclamavam novos apoiadores a aderirem ao movimento.

"O objetivo era a decretação de uma GLO e, com a chegada das Forças Armadas, pedir a adesão ao golpe de Estado", explicou.

Ao questionar a omissão das plataformas digitais diante da escalada golpista, o ministro foi enfático:

"Onde estava a autorregulação das big techs? A inteligência artificial não percebeu que isso era convocação para golpe?".

Para S. Exa., os algoritmos, longe de neutralidade, continuaram a direcionar conteúdos para bolhas que defendiam intervenção militar.

"Pode parecer risível, se não fosse trágico, mas mais de 400 pessoas foram condenadas porque elas mesmas postaram o que estavam fazendo e convocaram outros para o golpe."

Moraes também denunciou o caráter orquestrado e financeiro do processo.

Os conteúdos golpistas foram impulsionados, monetizados e, segundo Moraes, tolerados pelas plataformas por interesses econômicos.

A contenção da tentativa de "efeito dominó" - almejado pelos organizadores para estimular levantes em vários Estados - só foi possível graças à atuação conjunta de governadores e das polícias militares, afirmou.

Veja o trecho:

Desprezo à vida

O ministro apontou ainda outro sintoma da "falência da autorregulação": o aumento de mortes de crianças e adolescentes em razão de desafios estimulados nas redes sociais.

"Crianças morrendo porque são incentivadas, induzidas, até auxiliadas a desafios de autolesão, sufocamento, spray de desodorante", lamentou.

Alertou que, se as plataformas desprezam a democracia, a igualdade de gênero e o combate ao racismo, agora também desprezam a vida.

"Discursos de ódio, imagens que chocam, geram muito mais monetização. Utiliza-se a liberdade de expressão como escudo protetivo para ganhar dinheiro e induzir politicamente as pessoas."

Regulação e atividade econômicas

Moraes reforçou a necessidade de regulação das plataformas digitais com base em princípios de boa-fé, razoabilidade e preservação da democracia. "Pessoas de bom senso e boa fé não podem permitir que isso continue. É impossível que as redes sociais sigam como estão", afirmou.

Segundo o ministro, é falacioso o argumento de que não se pode regulamentar as redes.

"Nenhuma atividade econômica na história que repercuta sobre milhões ou bilhões de pessoas deixou de ser regulamentada. Por que esta seria a primeira?", questionou, ao apontar que as plataformas acumulam o maior poder de comunicação já existente.

Ao citar a obra Homo Videns, do cientista político Giovanni Sartori, Moraes fez um paralelo entre o impacto da televisão e o das redes sociais sobre a democracia.

O ministro argumentou que a liberdade de expressão, historicamente garantida mesmo em meios regulados como rádio e TV, não é ameaçada pela existência de limites legais. "Alguém pode, ao vivo, esquartejar uma pessoa ou induzir uma criança a se automutilar na televisão? Não. Então por que seria permitido nas redes sociais?", indagou.

Lavagem cerebral

Moraes denunciou a "lavagem cerebral" promovida pelas plataformas, que confundem liberdade de expressão com liberdade de agressão, insulto, discurso de ódio, racismo e misoginia. "As redes sociais devem ser reguladas como qualquer outro setor da sociedade. Jamais se concentrou tanto poder econômico e político nas mãos de tão poucos", alertou.

Mudança de paradigma

O ministro fez um histórico do uso inicial positivo das redes, como na Primavera Árabe, quando serviram como ferramenta para comunicação livre em regimes autoritários.

No entanto, observou que segmentos econômicos rapidamente perceberam o potencial de controle a partir do direcionamento de algoritmos. "Hoje, ninguém tem um banco de dados comparável ao das redes sociais. Elas sabem o que todos nós comemos, vestimos, compramos", explicou.

A transparência dos algoritmos, segundo Moraes, tornou-se um dos maiores desafios globais. Afirmou que os sistemas não são neutros e direcionam conteúdo com base em interesses econômicos e políticos.

"Se você é crítico, ao buscar seu nome, só aparece notícia ruim. Se é aliado, só aparecem elogios. Isso é manipulação."

O ministro também lembrou decisões do STJ e do TSE que coibiram o uso abusivo do impulsionamento digital, inclusive em campanhas eleitorais.

Relator do acórdão que tratou do chamado "estelionato eleitoral", Moraes exemplificou como os algoritmos foram usados para manipular o voto: "Você consultava um candidato, e imediatamente recebia conteúdo contra ele, induzindo a conhecer o outro".

Citando episódio recente envolvendo o Projeto de Lei das Fake News, relatado pelo deputado Orlando Silva, Moraes relatou como as big techs atuaram para inviabilizar sua tramitação.

"Jogaram a população contra os deputados, enviando mensagens direcionadas aos eleitores com base geográfica. Isso intimidou o Congresso Nacional, e a votação foi retirada de pauta."

Por fim, destacou que o STF tem enfrentado o tema com seriedade, a partir do julgamento de casos concretos que abordam justamente os limites da atuação das redes e a proteção da ordem democrática.

Veja o momento:

Decisão do STF

No encerramento da falam Moraes destacou a recente tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de repercussão geral, que obriga as plataformas digitais, independentemente de sua origem, a manter sede e representação legal no Brasil para atuarem no território nacional.

Segundo o ministro, a decisão se baseia em aprendizados obtidos nas últimas eleições, quando o país enfrentou tentativas organizadas de desinformação, direcionamento algorítmico e supressão da liberdade de escolha dos eleitores. "O Brasil, nesse ponto, é um exemplo para os demais países", afirmou.

A nova diretriz do STF busca justamente evitar a impunidade das empresas digitais.

"É muito fácil querer influenciar milhões de pessoas e ser absolutamente irresponsável perante a legislação brasileira."

Ao reafirmar o binômio constitucional "liberdade com responsabilidade", o ministro explicou que a liberdade de manifestação permanece assegurada, mas acompanhada do dever de responder pelos atos.

A decisão do Supremo, segundo Moraes, foi "minimalista", mas firme, ao prever a obrigação de retirada imediata de conteúdos que envolvam ilicitudes pré-existentes, como pornografia infantil, pedofilia, racismo, nazismo e atentados contra a democracia. "Não se trata de atentar contra a liberdade de expressão, mas de fazer valer a Constituição também no ambiente digital", destacou.

Ao final, o ministro sintetizou a posição do Supremo diante do cenário digital global:

"O STF mostrou ao mundo que, pelo menos no Brasil, a internet não é uma terra sem lei."

Assista:

O evento

O XIII Fórum de Lisboa acontece de 2 a 4 de julho e tem como tema "O mundo em transformação - Direito, Democracia e Sustentabilidade na Era Inteligente". O evento reúne autoridades e acadêmicos de diversas áreas para discutir como a chegada da Era Inteligente tem moldado as relações entre Estados, instituições, empresas e sociedade.

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