Confira como foi o 2º dia de julgamento de Bolsonaro e aliados no STF
Sessão foi dedicada às sustentações orais de advogados.
Da Redação
quarta-feira, 3 de setembro de 2025
Atualizado às 15:47
Na manhã desta quarta-feira, 3, a 1ª turma do STF retomou o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, de generais da alta cúpula militar e de ex-ministros de Estado que compuseram o chamado "núcleo duro" do governo.
Todos são apontados pela PGR como integrantes da trama golpista para contestar o resultado das eleições de 2022.
Para a análise do caso, o colegiado reservou oito sessões. Nesta manhã foram ouvidos os advogados de quatro réus: Augusto Heleno, Jair Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto.
Na véspera, terça-feira, 2, o relator Alexandre de Moraes apresentou o relatório e, em seguida, o PGR, Paulo Gonet, realizou a sustentação oral da acusação. Ainda na tarde de ontem, foi a vez das defesas de Mauro Cid, Alexandre Ramagem, Almir Garnier e Anderson Torres apresentarem suas manifestações.
O julgamento será retomado no próximo dia 9, com sessão às 9h e às 14h.
Veja os destaques.
Sustentações orais
No segundo dia de julgamento, o advogado Matheus Mayer Milanez sustentou em defesa do general Augusto Heleno, ex-chefe do GSI e um dos oito denunciados pela PGR por tentativa de golpe de Estado.
Ele abriu sua fala citando Piero Calamandrei sobre o "veneno da injustiça" e criticou a condução do processo. Segundo Milanez, a defesa enfrentou dificuldades diante da disponibilização tardia de extensa documentação da operação Tempus Veritatis.
Também questionou a atuação do relator, Alexandre de Moraes, ao formular mais de 300 perguntas no interrogatório de Heleno, o que, em sua visão, comprometeria a imparcialidade do julgamento.
Ao pedir a absolvição, o advogado rebateu a acusação de que Heleno teria apoiado críticas às urnas em uma live de Bolsonaro, afirmando que o general apenas figurava no cenário sem se manifestar. Negou ainda que ele fosse "consultor" do ex-presidente, citando reportagem que apontava seu afastamento do núcleo decisório do governo.
- Veja os detalhes aqui.
Os advogados Celso Vilardi e Paulo Amador Thomaz Alves da Cunha Bueno apresentaram a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro perante a 1ª Turma do STF.
Vilardi classificou o caso como um julgamento histórico, mas sustentou que não há provas concretas que vinculem Bolsonaro a minutas golpistas, operações investigadas ou aos atos de 8 de janeiro. Segundo ele, o ex-presidente foi "dragado" para a acusação a partir da colaboração premiada do tenente-coronel Mauro Cid, que, em sua visão, é contraditória e pouco confiável. A defesa também alegou cerceamento, citando o volume excessivo de documentos sem tempo adequado de análise e a impossibilidade de formular perguntas a outros réus.
Cunha Bueno, por sua vez, argumentou que os crimes imputados exigem violência ou grave ameaça, elementos ausentes na denúncia. Para ele, a PGR tenta ampliar indevidamente o tipo penal em um "iter criminis estendido", punindo meros atos preparatórios. O advogado ainda comparou o processo ao caso Dreyfus, símbolo de erro judiciário na França, para reforçar a tese de fragilidade das provas.
- Veja a matéria completa.
A defesa do general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, conduzida pelo advogado Andrew Fernandes Farias, afirmou que o ex-ministro da Defesa tentou desencorajar Jair Bolsonaro de adotar medidas de exceção, e não aderir a qualquer trama golpista.
Farias rebateu os quatro pontos centrais da denúncia da PGR: negou que o general tenha endossado a narrativa de fraude eleitoral, disse que não houve atraso na entrega do relatório da Efasev, destacou que a principal testemunha de acusação confirmou a atuação de Paulo Sérgio para dissuadir o presidente, e refutou a versão de que comandantes militares tenham sido pressionados.
Em tom descontraído, o advogado ainda citou sua "querida sogra", episódio que gerou reações bem-humoradas no plenário.
- Saiba mais sobre esta sustentação.
O advogado José Luiz de Oliveira Lima, defensor do general Walter Braga Netto, apontou cerceamentos de defesa, como a dificuldade de acesso a mais de 70 terabytes de documentos e a negativa para gravação da acareação com Mauro Cid. Disse que o processo não oferece condições mínimas para o contraditório e que não há provas concretas contra seu cliente.
Segundo ele, a colaboração premiada de Mauro Cid foi firmada sem participação inicial do MP, carece de voluntariedade e se apoia em versões contraditórias.
A defesa também negou qualquer participação do general nos atos de 8 de janeiro. Para o advogado, a condenação sem provas representaria uma ferida aberta para sempre na democracia.
- Confira a matéria completa.
Qual a dinâmica do julgamento?
O rito do julgamento é previsto no regimento interno do STF e na lei 8.038/90.
Na terça-feira, 2, foram cumpridas as fases iniciais: leitura do relatório pelo relator, ministro Alexandre de Moraes; manifestação da PGR, com a sustentação oral do procurador-geral Paulo Gonet; e as defesas de quatro réus.
Hoje, estão previstas mais quatro sustentações orais, cada uma com prazo de até uma hora.
Encerradas todas as manifestações, o relator profere seu voto.
Moraes pode propor que as preliminares levantadas pelas defesas, como alegações de nulidade da colaboração premiada, cerceamento de defesa e incompetência da Corte, sejam analisadas de imediato ou em conjunto com o mérito.
Na sequência, votam os ministros Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e, por último, Cristiano Zanin. A decisão é tomada por maioria simples: bastam três votos entre os cinco ministros para condenar ou absolver os réus.
Confira a disposição das cadeiras no colegiado:
Calendário de sessões
Além da sessão da última terça-feira, e desta quarta-feira, estão previstas sessões para os dias 9 de setembro, às 9h e às 14h; 10 de setembro, às 9h; e 12 de setembro, novamente às 9h e às 14h.
Quem são os réus?
No banco dos réus da 1ª turma estão Jair Bolsonaro e figuras centrais de seu governo.
Ao lado do ex-presidente, respondem pelo plano de ruptura institucional:
- o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid;
- o deputado Alexandre Ramagem;
- o almirante Almir Garnier; e
- os generais Anderson Torres, Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto.
Crimes e penas
A acusação atribui aos réus, entre outros, os crimes de:
- Tentativa de golpe de Estado (art. 359-M, CP; 4-12 anos);
- Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L, CP; 4-8 anos);
- Organização criminosa armada (lei 12.850/13; 3-8 anos, com majorantes e aumento por liderança);
- Dano qualificado à União (art. 163, parágrafo único, III, CP; 6 meses-3 anos); e
- Deterioração de patrimônio tombado (art. 62, I, lei 9.605/98; 1-3 anos).
Em tese, a soma das penas pode ultrapassar os 40 anos, mas, pela legislação brasileira, o tempo máximo de cumprimento efetivo é de 40 anos.
Além disso, eventual condenação não implica prisão imediata para execução definitiva da pena. Em 2019, o STF consolidou o entendimento de que a pena só pode começar a ser cumprida após o trânsito em julgado da decisão.
Da investigação ao julgamento
A investigação que resultou na denúncia contra Jair Bolsonaro e aliados começou em 2022 e foi concluída em novembro de 2024, quando a PF encerrou o inquérito que apurava a atuação de uma organização criminosa voltada a manter o então presidente no poder à revelia do resultado eleitoral.
No relatório final, fruto das operações Tempus Veritatis e Contragolpe, a PF indiciou 37 pessoas, incluindo Bolsonaro, generais de alta patente e dirigentes partidários.
O documento apontou crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe e organização criminosa, detalhando seis núcleos de atuação: desinformação, incitação de militares, jurídico, operacional de apoio, inteligência paralela e medidas coercitivas.
Pouco depois, a operação Contragolpe levou à prisão de cinco investigados por um plano que incluía, além da ruptura institucional, homicídios do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes.
Com base nessas apurações, a Procuradoria-Geral da República apresentou, em fevereiro de 2025, denúncia formal (Pet 12.100) contra Bolsonaro e outros 32 acusados.
O grupo foi imputado por organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
A PGR atribuiu a Bolsonaro o papel de liderança da trama, sustentando que ele comandou ações para desacreditar o processo eleitoral, pressionar as Forças Armadas e preparar decretos que poderiam servir de base para uma ruptura institucional.
Em março de 2025, a 1ª turma do STF, por unanimidade, recebeu a denúncia e tornou réus Bolsonaro e outros sete integrantes do chamado "Núcleo 1" da acusação, rejeitando todas as preliminares levantadas pelas defesas, como alegações de suspeição dos ministros, incompetência da Corte e nulidades relacionadas à colaboração premiada de Mauro Cid.
Na etapa seguinte, em julho de 2025, a PGR apresentou alegações finais em peça de 517 páginas, pedindo a condenação de todos os réus pelos crimes narrados na denúncia. O órgão classificou Bolsonaro como líder da organização criminosa e principal articulador das ações golpistas.
Veja a linha do tempo:
Um ponto específico diz respeito ao deputado Alexandre Ramagem.
Em razão do foro parlamentar, a 1ª turma decidiu suspender o processo apenas quanto aos crimes patrimoniais a ele atribuídos, relacionados a fatos posteriores à sua diplomação.
Assim, ele segue respondendo por organização criminosa armada, tentativa de golpe de Estado e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
- Processo: AP 2.668
Preso em outro processo
Importante destacar que a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro não está ligada à ação penal julgada pela 1ª turma.
Ela foi determinada por Alexandre de Moraes no Inq. 4.995 e da Pet 14.129, após descumprimento de cautelares.
Segundo o ministro, o ex-presidente utilizou aliados e familiares para difundir mensagens que configurariam coação ao STF e obstrução da Justiça.
Diante disso, as restrições foram convertidas em prisão domiciliar integral, com medidas adicionais, como proibição de visitas e de uso de celulares.
A decisão foi confirmada pela maioria da 1ª turma em plenário virtual.