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Transporte

STF julga validade de lei que permite a municípios barrarem mototáxis

Para Moraes, relator da ação, norma estadual invade competência da União e impõe barreira ao exercício de atividade econômica.

Da Redação

sexta-feira, 31 de outubro de 2025

Atualizado às 18:23

No plenário virtual, STF analisa a validade de lei do Estado de São Paulo que confere a municípios a competência para regulamentar e, eventualmente, proibir o serviço de mototáxis.

Até o momento, apenas o relator, ministro Alexandre de Moraes, votou no sentido de declarar a invalidade da lei.

O julgamento teve início nesta sexta-feira, 31, e está previsto para se encerrar no próximo dia 10, às 23h59.

Até o término do prazo, os ministros podem apresentar votos, alterar manifestações já registradas, ou ainda pedir vista ou destaque para levar o caso ao plenário físico.

Entenda

A CNS - Confederação Nacional de Serviços ajuizou a ação contra a  lei 18.156/25 do Estado de São Paulo, que exige autorização e regulamentação municipal para o uso de motocicletas no transporte individual privado remunerado de passageiros, como os serviços de mototáxi e aplicativos.

A norma estadual estabelece que os municípios podem regulamentar o serviço, impondo condições como:

  • habilitação específica para atividade remunerada;
  • limite de idade do veículo e requisitos técnicos;
  • apresentação de certidão negativa de antecedentes criminais;
  • contratação de seguro e inscrição no INSS;
  • previsão de multas e sanções pelo descumprimento.

A CNS pediu a suspensão da eficácia da lei e sua posterior declaração de inconstitucionalidade por invadir competência privativa da União (art. 22, IX e XI, da CF) e por violar os princípios da livre iniciativa, livre concorrência e defesa do consumidor (arts. 1º, IV, e 170, IV e V, da CF).

Sustentou que o transporte por aplicativos é uma atividade econômica privada, não um serviço público, e que a lei criava barreiras de entrada ao mercado.

A Assembleia Legislativa de São Paulo defendeu a validade da lei, argumentando tratar-se de matéria de interesse local e de proteção à saúde e ao consumidor, com fundamento no art. 24 da CF.

Apresentou dados do ministério da Saúde e do sistema Infosiga.SP, apontando aumento no número de acidentes e internações de motociclistas, para justificar a necessidade de regulação estadual.

O governador do Estado sustentou posição semelhante, afirmando que a lei complementava a legislação federal em matéria de consumo e saúde pública.

Por outro lado, tanto a AGU quanto a PGR emitiram avaliaram que a norma usurpa competência legislativa da União e contraria precedentes do STF.

Cautelar

Em setembro de 2025, ministro Alexandre de Moraes, relator, deferiu medida cautelar suspendendo a eficácia da lei até o julgamento definitivo da ação.

 (Imagem: Cris Faga/Dragonfly Press/Folhapress)

STF julga se referenda decisão de Moraes que suspendeu lei estadual envolvendo mototáxis.(Imagem: Cris Faga/Dragonfly Press/Folhapress)

Voto do relator

Ao votar, Moraes converteu o referendo da medida cautelar em julgamento definitivo de mérito, e declarou a inconstitucionalidade integral da lei paulista.

Para o ministro, a norma invadiu a competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transportes (art. 22, IX e XI, da CF).

O relator explicou que a Constituição é clara ao reservar ao legislador Federal a fixação das diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, já disciplinada pela lei 12.587/12, que confere aos municípios apenas o papel de regulamentar e fiscalizar o serviço dentro dos parâmetros Federais.

Moraes recordou que o STF possui jurisprudência consolidada no sentido de que Estados não podem editar normas próprias sobre transporte individual de passageiros, sob pena de fragmentar a regulação nacional.

Entre os precedentes citados estão as ADIns 2.606, 3.135, 3.136 e 4.961, que trataram de leis semelhantes em outros entes federativos.

O ministro também afirmou que a lei paulista cria "barreira de entrada" indevida, ao condicionar o exercício da atividade profissional à prévia autorização municipal.

Segundo Moraes, o transporte por aplicativos é uma atividade econômica, e não um serviço público, de modo que submetê-lo a regimes de autorização ou permissão esvaziaria sua utilidade econômica.

Com base em dados do IBGE, Moraes destacou que quase 1,7 milhão de brasileiros têm as plataformas digitais como principal meio de trabalho, e que mais da metade está concentrada na região Sudeste, especialmente em São Paulo, o que reforça a relevância social e econômica da atividade.

O relator ressaltou que a lei viola princípios constitucionais da livre iniciativa, da livre concorrência e da busca do pleno emprego, todos fundamentos da ordem econômica.

Para Moraes, a justificativa de proteção à saúde e à segurança do consumidor não legitima restrições desproporcionais.

"Não é defensável que o legislador ignore uma série de princípios e fundamentos constitucionais, a fim de impor restrições desarrazoadas, ao argumento de proteção consumerista e da saúde pública."

Segundo o ministro, a medida gera o efeito oposto ao pretendido, ao limitar alternativas de mobilidade e prejudicar especialmente consumidores de baixa renda, que são os principais usuários dos serviços de mototáxis.

O voto conclui que o papel do Estado não é proibir atividades econômicas lícitas, mas regulamentá-las de modo proporcional e razoável, garantindo segurança e livre concorrência.

Confira o voto.

Disputa em São Paulo

Desde o início de 2025, a prefeitura de São Paulo e as plataformas de transporte travam uma disputa judicial sobre o serviço de mototáxis.

As empresas alegam que a legislação Federal autoriza a atividade em todo o país, enquanto o município editou o decreto 62.144/23, proibindo o serviço sob o argumento de riscos à segurança dos usuários.

Em abril de 2025, a 4ª vara da Fazenda Pública rejeitou ação movida pela prefeitura e liberou a operação dos mototáxis.

No mês seguinte, uma nova liminar voltou a permitir o serviço, declarando inconstitucional o decreto municipal que o proibia.

Contudo, em junho, a 7ª câmara de Direito Público do TJ/SP reformou a decisão e restabeleceu a validade do decreto municipal, ao entender que o tema se insere no poder de polícia e na competência local.

Em julho, o Procon-SP multou as plataformas Uber e 99 por ofertarem o serviço de forma considerada irregular.

Já no início de setembro, o Órgão Especial do TJ/SP declarou inconstitucional a proibição do serviço de mototáxis na capital paulista, reabrindo a discussão que agora chegou ao STF.

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