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Ministro Reynaldo concede prisão domiciliar a mãe de criança de 8 anos

Decisão considerou o direito previsto na lei de execução penal, destacou a proteção ao interesse da criança e reconheceu o princípio da fraternidade como base para a concessão da medida.

14/8/2025

Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, do STJ, concedeu habeas corpus de ofício para substituir a prisão em regime semiaberto por domiciliar de uma condenada pelo crime de uso de documento falso.

A decisão, fundamentada no art. 117, III, da LEP - lei de execução penal, que assegura o benefício à condenada com filho menor, destacou a proteção ao interesse da criança e aplicou o o princípio do constitucionalismo fraterno, reconhecendo o princípio da fraternidade como base jurídica para a concessão do benefício.

Ministro Reynaldo, do STJ, concedeu HC de ofício para substituir prisão em regime semiaberto por domiciliar a mãe de criança de 8 anos..(Imagem: Freepik)

Entenda o caso

A mulher foi condenada a cinco anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, além de 40 dias-multa, pelos crimes de uso de documento falso (arts. 304, 297 e 298 do CP, por três vezes, na forma do art. 69). Segundo os autos, ela utilizou certificados falsos de conclusão de cursos de mestrado e pós-graduação para obter progressão funcional e aumento salarial em prefeituras paulistas.

Na execução penal, a defesa requereu prisão domiciliar, alegando que a condenada é mãe solo de criança de 8 anos, sobre quem detém guarda unilateral, sem rede de apoio familiar. O juízo da unidade regional do Departamento Estadual de Execução Criminal da 5ª RAJ, de Presidente Prudente/SP, indeferiu o pedido.

A defesa recorreu ao TJ/SP, que manteve a negativa, afirmando não haver comprovação da imprescindibilidade da mãe nos cuidados com a menor, especialmente porque o pai, empregado formalmente, poderia prestar assistência, e a criança estava matriculada em escola em período integral. Diante da decisão, interpôs HC no STJ.

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Prevalência do interesse da criança

Ao analisar o habeas corpus, o ministro Reynaldo observou que, embora o pedido não tenha sido feito pela via processual adequada, era possível examinar o mérito diante de possível constrangimento ilegal.

O relator apontou que a decisão do TJ/SP não realizou a necessária ponderação sobre a conduta da paciente e a conveniência de atender ao melhor interesse da filha menor de 12 anos, como exige a CF. Ressaltou que, no caso, presume-se a necessidade dos cuidados maternos, já que o crime não envolveu violência ou grave ameaça.

Citando o art. 117, III, da LEP e o art. 318, V, do CPP, além de princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana e a fraternidade, ministro Reynaldo destacou que “a teleologia da inovação legislativa consiste em atender ao melhor interesse do menor. (...) Portanto, predomina o direito à prisão domiciliar, quando comprovado atendimento do disposto no inciso III ao art. 117 da LEP. Em outras palavras, prevalece o objetivo da norma, a proteção do interesse do menor, com o deferimento do benefício".

O ministro também citou o HC coletivo 143.641, do STF, que consolidou o entendimento de que mães de crianças menores de 12 anos podem cumprir prisão domiciliar, inclusive em regimes mais gravosos, desde que ausente situação excepcional que desaconselhe a medida.

Constitucionalismo fraterno

Segundo Reynaldo, a interpretação da norma deve atender ao constitucionalismo fraterno, conceito que reforça a proteção integral da criança e o dever de o Estado adotar soluções humanizadas no âmbito penal.

Conforme explicou o ministro:

"a) O princípio da fraternidade é uma categoria jurídica e não pertence apenas às religiões ou à moral. Sua redescoberta apresenta-se como um fator de fundamental importância, tendo em vista a complexidade dos problemas sociais, jurídicos e estruturais ainda hoje enfrentados pelas democracias. A fraternidade não exclui o direito e vice-versa, mesmo porque a fraternidade enquanto valor vem sendo proclamada por diversas Constituições modernas, ao lado de outros historicamente consagrados como a igualdade e a liberdade; 

b) O princípio da fraternidade é um macroprincípio dos Direitos Humanos e passa a ter uma nova leitura prática, diante do constitucionalismo fraternal prometido na CF/88 (preâmbulo e art. 3º); 

c) O princípio da fraternidade é possível de ser concretizado também no âmbito penal, através da chamada Justiça restaurativa, do respeito aos direitos humanos e da humanização da aplicação do próprio direito penal e do correspondente processo penal. A lei 13.257/16 decorre desse resgate constitucional."

Com base nesses fundamentos, determinou a substituição da prisão pelo regime domiciliar, com eventual monitoramento eletrônico, se possível.

Confira a decisão.

Veja a versão completa

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