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STJ: Confissão reduz pena mesmo se não integrar convencimento do juiz

3ª seção fixou tese de que a confissão espontânea prevista no CP é apta a abrandar a pena, independentemente de ter sido utilizada na formação do convencimento do julgador.

10/9/2025

A 3ª seção do STJ, sob o rito dos recursos repetitivos, fixou a tese do Tema 1194, estabelecendo que a confissão espontânea do réu é apta a reduzir a pena, ainda que não tenha sido utilizada na fundamentação da condenação. Por unanimidade, os ministros acompanharam o voto do relator, ministro Og Fernandes, que modulou os efeitos da decisão para que eventuais prejuízos decorrentes da nova orientação só alcancem fatos posteriores à publicação do acórdão.

Tese fixada:

1. A atenuante genérica da confissão espontânea, prevista no art. 65, III, “d”, do CP, é apta a abrandar a pena, independentemente de ter sido utilizada na formação do convencimento do julgador, e mesmo que existam outros elementos suficientes de prova, desde que não tenha havido retratação, exceto, neste último caso, quando a confissão tiver servido à apuração dos fatos.

2. A atenuação deve ser aplicada em menor proporção e não poderá ser considerada preponderante no concurso com agravantes quando o fato confessado for tipificado com menor pena ou caracterizar circunstâncias excludentes da tipicidade, da ilicitude ou da culpabilidade.

 

STJ: Confissão do réu reduz pena mesmo sem ter sido utilizada na formação do convencimento do juiz.(Imagem: Freepik)

Caso paradigma

O processo que deu origem ao julgamento repetitivo é o REsp 2.001.973interposto pela Defensoria Pública da União em favor de réu condenado por descaminho (art. 334 do CP).

No caso, o TRF da 5ª região havia afastado a atenuante da confissão espontânea sob o argumento de que a confissão parcial prestada no inquérito não foi utilizada na fundamentação da condenação.

A Defensoria recorreu ao STJ sustentando que a negativa violou o art. 65, III, “d”, do CP, pois a lei não condiciona a aplicação da atenuante ao uso da confissão pelo julgador. Também pleiteou a redução do aumento de pena aplicado em razão dos maus antecedentes.

Em 2023, a 3ª seção afetou o recurso como representativo da controvérsia, delimitando a questão a ser decidida: se a confissão do réu, não utilizada para formar o convencimento do julgador, autoriza ou não o reconhecimento da atenuante.

Sustentação oral

Em nome do GAETS - grupo de atuação estratégica das defensorias públicas estaduais e distrital nos tribunais superiores, o defensor público Antônio Soares da Silva Junior defendeu que a confissão espontânea deve sempre gerar a atenuante do art. 65, III, “d”, do CP, ainda que não mencionada na sentença.

Segundo ele, a lei 7.209/84 suprimiu a exigência de utilidade da confissão, tornando suficiente o ato espontâneo de confessar. Condicionar o benefício à valoração pelo juiz, afirmou, recriaria requisito abolido há 40 anos e violaria a legalidade penal.

O defensor destacou que a súmula 231 do STJ já limita os efeitos da atenuante e que novas restrições a tornariam inócua. Lembrou ainda precedente da 3ª seção (AREsp 2.123.334), que reconheceu a natureza objetiva da confissão.

O GAETS pediu, assim, que o STJ reafirmasse que a atenuante incide sempre que houver confissão espontânea, ainda que parcial, qualificada, extrajudicial ou retratada, independentemente de sua utilização na condenação.

Atenuante vale mesmo sem ter sido utilizada no convencimento do juiz

O ministro Og Fernandes, relator, afirmou que a confissão espontânea é apta a abrandar a pena mesmo que não tenha sido empregada para formar o convencimento do julgador e ainda que existam outros elementos suficientes de prova. A exceção, explicou, ocorre em caso de retratação: nesse caso, a atenuante só incidirá se a confissão tiver contribuído para a apuração dos fatos.

Segundo o ministro, a atenuação deve ser aplicada em menor proporção quando o fato confessado se referir a delito de menor gravidade ou a circunstâncias excludentes da tipicidade, da ilicitude ou da culpabilidade. Já quanto aos maus antecedentes, ponderou que o aumento da pena deve observar a proporcionalidade, sendo admitida elevação mais acentuada apenas quando houver múltiplos registros criminais.

No caso concreto, o relator deu parcial provimento ao recurso para reconhecer a confissão, compensando-a com a agravante da reincidência e fixando a pena em 1 ano e 7 meses de reclusão.

A decisão foi unânime. O ministro Reynaldo Soares da Fonseca ressaltou que a tese consolida entendimento já firmado nas turmas criminais. Já o ministro Ribeiro Dantas frisou a necessidade de prestigiar a confissão, que contribui para a solução dos casos e para a efetividade da Justiça penal.

Em sua estreia na 3ª seção, a ministra Marluce Caldas acrescentou que a confissão deve ser reconhecida como contribuição do réu ao processo e aplicada de forma objetiva.

Revisão nas súmulas do STJ

Ao final, o relator destacou que a decisão exigirá a revisão das súmulas 545 e 630 do STJ, ambas relacionadas à confissão espontânea.

A súmula 545 estabelece que “quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no art. 65, III, d, do CP”.

Já a súmula 630 dispõe que “a incidência da atenuante da confissão espontânea no crime de tráfico ilícito de entorpecentes exige o reconhecimento da traficância pelo acusado, não bastando a mera admissão da posse ou propriedade para uso próprio”.

Com a tese fixada no Tema 1194, a Corte uniformizou o entendimento de que a confissão espontânea reduz a pena mesmo sem ter sido utilizada na fundamentação da condenação, o que deverá levar à adequação dos enunciados sumulares ao novo posicionamento.

Veja a versão completa

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