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Plano deve custear antidepressivo fora do rol da ANS, decide TJ/SP

Decisão reforça que o rol da ANS é exemplificativo e que a negativa de cobertura, sem alternativa terapêutica eficaz, configura prática abusiva.

30/9/2025

A 9ª câmara de Direito Privado do TJ/SP determinou que plano de saúde custeie o tratamento com o medicamento escetamina intranasal (Spravato) a beneficiário diagnosticado com transtorno depressivo recorrente.

O colegiado considerou abusiva a negativa de cobertura, que se baseou no fato de o fármaco não constar no rol da ANS, aplicando o entendimento de que esse rol tem caráter exemplificativo e não pode restringir tratamento prescrito quando não há alternativa terapêutica eficaz.

 

Plano deve custear antidepressivo não listado pela ANS, decide TJ/SP.(Imagem: Freepik)

Entenda o caso

O paciente, beneficiário do plano de saúde, foi diagnosticado com episódio grave de depressão resistente a diversos tratamentos convencionais. Diante da gravidade do quadro e do risco iminente de suicídio, o médico que o acompanha prescreveu o uso do medicamento Spravato, cuja administração deve ocorrer em ambiente clínico ou hospitalar, sob supervisão profissional, devido aos possíveis efeitos adversos.

A operadora recusou a cobertura alegando que o medicamento não consta no rol obrigatório da ANS e se enquadra como de uso domiciliar, hipótese excluída pela lei 9.656/98.

Sustentou também que a obrigação de fornecimento caberia ao Estado ou à família, que a negativa estava amparada na resolução normativa 465 da ANS, e que, por ser spray nasal disponível em farmácias, o produto não poderia ser considerado de uso hospitalar.

Em primeira instância, o juízo rejeitou os argumentos do plano de saúde e determinou o fornecimento do medicamento, além de condenar a empresa ao pagamento de indenização por danos morais e custas. A operadora recorreu ao TJ/SP, insistindo na legalidade da negativa e pedindo a redução dos honorários fixados.

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Função social do contrato

Relator do recurso, desembargador Alexandre Lazzarini ressaltou que o contrato de plano de saúde deve observar a boa-fé objetiva e a função social, sendo abusiva a recusa de custear tratamento prescrito quando não há substituto terapêutico eficaz.

"Considerando-se a ausência de qualquer outra opção apresentada pelo plano de saúde para tratamento do autor, portador de doença grave e resistente a diversos tratamentos, bem como havendo previsão contratual para a cobertura da doença, não se justifica a recusa da apelante para o fornecimento do medicamento necessário e prescrito por médico especialista que acompanha o recorrido."

O desembargador destacou que o medicamento possui registro na Anvisa e eficácia comprovada, além de citar a súmula 102 do TJ/SP, segundo a qual "é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS".

Assim, concluiu que a negativa da operadora cconfigurou abuso de direito por inviabilizar o acesso do paciente ao tratamento prescrito. "

"A interpretação das normas legais e cláusulas pactuadas deve ser realizada de forma mais favorável ao consumidor (art. 47, CDC). E, ainda, sob a ótica da própria função social do contrato e da razoabilidade, o tratamento não poderia ter sido negado ao apelado, sob pena de se inviabilizar o objeto do próprio ajuste contratual", afirmou.

Com base nesses fundamentos, o colegiado decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso do plano de saúde e manter a obrigação de custear o medicamento prescrito.

Para o advogado Leo Rosenbaum, sócio do escritório Rosenbaum Advogados, “a decisão reforça a proteção ao consumidor e a jurisprudência consolidada, que reconhece o rol da ANS como meramente exemplificativo. Cabe à operadora garantir o acesso a terapias eficazes, e não criar entraves burocráticos que comprometam a saúde do paciente, reforçando a primazia da indicação médica sobre limitações contratuais ou administrativas”.

Leia acórdão.

Veja a versão completa

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