STF: Toffoli suspende análise de inscrição de advogado público na OAB
Até o pedido de vista, cinco ministros votaram com o relator, ministro Cristiano Zanin, contra a obrigatoriedade da inscrição.
Da Redação
quinta-feira, 8 de maio de 2025
Atualizado às 21:04
Nesta quinta-feira, 8, em sessão plenária, pedido de vista do ministro Dias Toffoli suspendeu julgamento no qual a Corte analisa se advogados públicos são obrigados a se inscrever nos quadros da OAB para exercer suas funções.
Até o momento, prevalece o voto do ministro Cristiano Zanin. Para S. Exa., é inválida a exigência de inscrição na OAB como requisito para o exercício da advocacia pública.
No entanto, o ministro reconheceu a possibilidade de inscrição voluntária, desde que como manifestação expressa de vontade do representante do órgão ou ente federativo.
O entendimento do relator foi acompanhado pelos ministros Flávio Dino, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes.
Divergiram os ministros André Mendonça e Edson Fachin, que consideram obrigatória a inscrição na OAB para o exercício da função.
Ministro Luiz Fux apresentou posição intermediária, defendendo a obrigatoriedade de inscrição na OAB apenas nos casos em que o exercício da advocacia privada é permitido ou quando o concurso público exige a inscrição como requisito prévio, mas afastando a necessidade de manter a inscrição ativa quando houver impedimento legal para advogar.
Veja o placar:
Entenda
No caso, a OAB/RO recorreu ao STF contra acórdão da turma recursal do Juizado Especial da Seção Judiciária do Estado que reconheceu o direito de advogado público atuar judicialmente em nome da União, independentemente de inscrição na OAB.
AGU
Em sustentação oral, o advogado da União Lyvan Bispo dos Santos defendeu a obrigatoriedade de inscrição na OAB para o exercício da advocacia pública.
Segundo ele, a CF atribui à advocacia pública o papel de função essencial à Justiça, equiparando-a ao Ministério Público, à Defensoria Pública e à advocacia privada.
Citando jurisprudência do STF, especialmente voto do ministro Luiz Fux no RE 663.696, Lyvan argumentou que essas instituições têm a missão comum de resguardar valores constitucionais e direitos fundamentais.
Destacou que, embora existam diferenças quanto ao regime funcional e ao beneficiário final da atuação, as atividades desempenhadas por advogados públicos e privados são, em essência, idênticas, o que justifica a aplicação de um mesmo regime jurídico.
Lembrou ainda que, no julgamento da ADIn 2.652, o Supremo rejeitou a criação de tratamentos jurídicos diferenciados entre essas categorias.
O advogado afirmou que a exigência de inscrição na OAB é um mecanismo para garantir a autonomia técnica e as prerrogativas dos advogados públicos, frequentemente vulneráveis em entes subnacionais.
Embora a LC 73/93, que dispõe sobre a AGU, não preveja expressamente essa exigência, ele sustentou que o Estatuto da OAB complementa o regime jurídico dos advogados públicos, assegurando direitos, deveres e normas éticas da profissão. Lyvan admitiu, no entanto, a possibilidade de exceções em casos de regimes públicos mais específicos, como o da corregedoria própria da AGU.
Ao final, reforçou que o caso julgado não se confunde com o RE 1.240.299, de relatoria do ministro Alexandre de Moraes, que afastou a exigência de inscrição na OAB para defensores públicos, por se tratar de carreiras distintas.
Conselho Federal da OAB
Também em sustentação oral, o advogado Vicente Martins Prata Braga, representante do Conselho Federal da OAB, procurador do Estado do Ceará e presidente da Associação Nacional dos Procuradores de Estado, defendeu que todos os advogados públicos devem manter inscrição obrigatória na OAB.
Segundo ele, a diferença entre a advocacia pública e privada reside apenas no cliente representado, já que ambas compartilham a mesma essência profissional. Para Vicente, a retirada dessa obrigatoriedade enfraqueceria as prerrogativas e comprometeria a segurança institucional dos advogados públicos.
Destacou ainda o papel da OAB como casa comum da advocacia e instância de defesa da categoria, especialmente importante para os advogados públicos municipais, que não contam com a mesma proteção constitucional assegurada aos federais e estaduais.
Ele também afastou a aplicação do entendimento firmado no Tema 1.074 do STF, que trata da Defensoria Pública, ao caso em análise.
Para o representante da OAB, a Defensoria já alcançou grau elevado de autonomia funcional e administrativa, o que não ocorre com a advocacia pública, que, segundo ele, ainda está em processo de consolidação como função constitucional plena.
Voto do relator
O relator do caso, ministro Cristiano Zanin, reiterou no plenário físico o voto que havia proferido anteriormente no plenário virtual.
Para S. Exa., os advogados públicos, embora exerçam atividades jurídicas típicas da advocacia, são selecionados por concurso público e se submetem aos estatutos próprios dos órgãos aos quais estão vinculados, conforme determinam os arts. 131 e 132 da Constituição Federal.
Zanin observou que, apesar das semelhanças com a atuação dos advogados privados, os advogados públicos não estão sujeitos às mesmas normas aplicáveis à advocacia privada - entendimento que, segundo ele, deve ser estendido também aos procuradores estaduais.
O ministro destacou que a LC 73/93 não exige a inscrição na OAB como condição para o exercício das funções institucionais dos membros da AGU.
Contudo, caso esses profissionais venham a exercer a advocacia privada - mediante autorização legal -, deverão obrigatoriamente cumprir as exigências previstas no Estatuto da Advocacia (lei 8.906/94), como a inscrição na Ordem, o pagamento da anuidade e a submissão à fiscalização ética e disciplinar.
Zanin também defendeu que a inscrição voluntária na OAB deve ser permitida, especialmente nos casos em que o advogado público deseja participar de listas para composição de tribunais, como ocorre nos chamados quintos constitucionais.
Nesse contexto, considerou legítima a celebração de convênios ou atos administrativos entre órgãos públicos e a OAB, permitindo, por exemplo, o repasse de anuidades e o desenvolvimento de ações institucionais conjuntas.
Votando para negar provimento ao recurso da OAB/RO, o ministro propôs, inicialmente, a seguinte tese para o tema 936:
"(i) É inconstitucional a exigência de inscrição do Advogado Público nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, para o exercício das atividades inerentes ao cargo público.
(ii) A inscrição de advogados públicos nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil poderá ocorrer de forma voluntária, individualizadamente, ou mediante ato administrativo a ser firmado entre o órgão de representação estatal e a Ordem dos Advogados do Brasil."
Veja o voto:
Entretanto, após ponderações do ministro Gilmar Mendes, o relator aceitou a sugestão de suprimir o item (ii) da tese.
Com essa alteração, o voto do relator foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Flávio Dino.
Divergência parcial
Ministro Gilmar Mendes, ao se manifestar no plenário, acompanhou o voto do relator, mas fez ressalvas quanto à proposta original de permitir a celebração de atos administrativos conjuntos entre órgãos públicos e a OAB.
Destacou a importância de preservar a autonomia institucional da AGU, observando que, historicamente, a advocacia pública federal sempre operou sob um modelo funcional próprio, independente da inscrição na OAB para o exercício de suas atribuições.
Embora reconheça a possibilidade de inscrição voluntária, Gilmar Mendes foi enfático ao afirmar que impor tal exigência de forma obrigatória contraria a lógica funcional das carreiras públicas, como as de Advogado da União, Procurador da Fazenda Nacional e Procurador Federal.
O ministro ainda comentou experiências de sua passagem pela AGU.
Relatou que, em momentos de tensão institucional, houve ameaças de processos disciplinares pela OAB contra sua atuação como advogado-geral da União.
Para o decano da Corte, tal cenário demonstra os riscos de uma vinculação obrigatória entre as funções públicas e a entidade de classe. "Havia ameaça, por conta de interesses contrariados à atuação da própria AGU, de processo contra o próprio advogado-geral da União na OAB", afirmou.
Veja o momento:
Diante disso, manifestou-se contrário ao segundo item da tese inicialmente proposta por Zanin, argumentando que a autorização para atos administrativos conjuntos com a OAB seria excessiva e potencialmente geradora de conflitos institucionais no futuro.
Divergência
Ministro Edson Fachin apresentou voto divergente no julgamento, defendendo a obrigatoriedade de inscrição na OAB para o exercício da advocacia pública.
Em sua fundamentação, o ministro sustentou que a CF de 1988 não estabelece distinção entre a advocacia pública e a privada.
"A função essencial à Justiça da advocacia não pode ser compartimentada em duas categorias distintas, pois, em essência, trata-se de uma única profissão", afirmou.
Fachin argumentou que separar o exercício da advocacia pública e privada contraria o princípio da unidade da carreira jurídica, consagrado pela Constituição.
Ressaltou ainda que os advogados públicos integram a carreira da advocacia, mesmo que estejam submetidos a um regime jurídico específico dos servidores públicos.
Nesse sentido, pontuou que tais profissionais estão sujeitos simultaneamente às normas do Estatuto da OAB e ao Código de Ética da advocacia, ao mesmo tempo em que obedecem às regras específicas da carreira pública, como é o caso da Lei Orgânica da AGU.
O ministro também destacou o art. 2º do Estatuto da OAB, que reconhece a advocacia como serviço público e função social, inclusive quando exercida em caráter privado.
Para Fachin, esse dispositivo reforça a ideia de que todo advogado - público ou privado - exerce um verdadeiro munus público, o que justifica a exigência dos mesmos critérios de habilitação e fiscalização profissional.
Além disso, o ministro fez uma distinção relevante entre a advocacia pública e a Defensoria Pública.
Recordou que o STF já declarou a inconstitucionalidade da exigência de inscrição na OAB para defensores públicos, mas explicou que essa função possui natureza distinta: trata-se de uma atividade estatal autônoma, voltada especificamente à promoção do acesso à Justiça para populações vulneráveis.
Veja trecho do voto:
Também em voto divergente, ministro André Mendonça alinhou-se ao entendimento de que o exercício da advocacia pública não constitui uma profissão distinta da advocacia privada, estando ambas submetidas às mesmas exigências legais e éticas.
Mendonça enfatizou que a CF não promove uma cisão entre advocacia pública e privada, tratando-as como manifestações de uma única profissão.
Embora haja dispositivos constitucionais específicos sobre a advocacia pública - como os arts. 131 e 132, que tratam da AGU e das procuradorias estaduais -, o ministro defendeu que esses dispositivos devem ser interpretados em harmonia com o art. 133, que estabelece a advocacia como função essencial à administração da Justiça.
O ministro também lembrou que o próprio ordenamento infraconstitucional reconhece a natureza advocatícia da atuação pública desses profissionais.
Como exemplo, mencionou o art. 28 da LC 73/93, que veda aos membros da AGU o exercício da advocacia fora de suas atribuições. Para Mendonça, essa vedação confirma que, no âmbito de suas atribuições, o exercício da advocacia permanece caracterizado.
Concluiu que é plenamente possível a convivência entre as normas específicas da carreira pública e as regras gerais aplicáveis à advocacia.
Segundo Mendonça, as prerrogativas e deveres inerentes ao cargo público não afastam, por si só, os deveres e impedimentos previstos para o exercício da advocacia - salvo quando expressamente excepcionados por lei.
Ao final, propôs a seguinte tese para fins de repercussão geral:
"É constitucional a exigência de inscrição dos advogados nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, inclusive daqueles que exercem a advocacia pública."
Confira parte do voto:
Posição intermediária
Ministro Luiz Fux apresentou posição intermediária. Para S. Exa., a decisão do STF deve considerar as diferentes realidades das carreiras jurídicas em todo o país, com atenção especial àquelas que permitem o exercício concomitante da advocacia privada.
"Há carreiras jurídicas em todo o Brasil que permitem que esses exercentes de advocacia pública possam advogar. Então, nesses casos, eu acho imperiosa a inscrição na OAB da seccional", destacou o ministro.
Fux dividiu sua análise em dois pontos centrais:
- Concursos públicos que exigem inscrição prévia: para o ministro, quando o edital do concurso estabelece como requisito a inscrição na OAB, essa obrigatoriedade já está dada no ingresso do cargo. No entanto, uma vez comprovado o impedimento legal para advogar após a posse, Fux entende que não há necessidade de manter ativa essa inscrição nem de cumprir obrigações como o pagamento da anuidade.
- Carreiras públicas que admitem advocacia privada: Já nas hipóteses em que o exercício da advocacia privada é compatível com o cargo público, a inscrição na OAB seria obrigatória. Fux ressaltou que essa obrigatoriedade garante o controle ético e profissional pelo órgão de classe, especialmente em atividades que extrapolam a atuação institucional.
O ministro usou como exemplo sua própria experiência ao prestar concurso para a magistratura, ocasião em que foi exigida a comprovação de anos de inscrição na OAB.
Após a nomeação e o início da atuação como juiz, deixou de cumprir os deveres associados à inscrição, por estar legalmente impedido de advogar.
"Então, eu fico, talvez, nessa posição intermediária, eu esteja, digamos assim, numa posição de continência que vai acabar sendo absorvida por alguma dessas teses que eu não terei a menor dificuldade de ceder para podermos chegar a uma conclusão satisfatória", concluiu Fux.
Veja o voto:
- Processo: RE 609.517