MPF pede suspensão de ações sobre requisição direta de dados do Coaf
Gonet alerta para risco de impunidade e pede suspensão da prescrição enquanto o STF julga a constitucionalidade da requisição direta de RIFs pelo MP e Polícia.
Da Redação
quinta-feira, 31 de julho de 2025
Atualizado às 14:59
O procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, solicitou ao STF a suspensão, em caráter urgente, de todos os processos em trâmite no país que questionam a legalidade de provas obtidas por meio do compartilhamento direto de RIFs - Relatórios de Inteligência Financeira entre o Ministério Público, a polícia e o Coaf - Conselho de Controle de Atividades Financeiras, sem autorização judicial ou prévia instauração de inquérito policial.
O pedido foi apresentado no dia 30 de julho, no âmbito do RE 1.537.165 no qual o STF já reconheceu a repercussão geral, Tema 1440, que trata da constitucionalidade da requisição direta de RIFs por órgãos de persecução penal.
Além do sobrestamento nacional das ações até a decisão final do STF, o MPF também pede a suspensão dos prazos de prescrição dos crimes investigados nos processos paralisados. O objetivo é evitar que a demora no julgamento resulte na impunidade de delitos como corrupção, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e sonegação fiscal.
Combate à criminalidade
No pedido enviado ao STF, Gonet destacou que a controvérsia tem causado prejuízos expressivos ao combate à criminalidade. Segundo o PGR, já há "dezenas de inquéritos policiais trancados, centenas de prisões revogadas, milhões de reais em medidas patrimoniais anuladas e operações policiais invalidadas".
Relatórios da Câmara de Combate à Corrupção do MPF (5CCR) listam casos concretos. Em Mato Grosso do Sul, a Justiça Federal anulou a Operação Sordidum, que investigava tráfico de cocaína e lavagem de dinheiro. Na Bahia, foi invalidado o RIF da Operação El Patrón, que apurava crimes como exploração de jogos de azar, lavagem de dinheiro e receptação.
Para tentar reverter essas anulações do STJ, o MPF tem apresentado reclamações ao Supremo, com decisões favoráveis em alguns casos. No entanto, Gonet reforça que apenas um pronunciamento definitivo da Corte sobre o mérito poderá trazer estabilidade e segurança jurídica ao trabalho investigativo do Ministério Público e das forças de segurança.
Fio da meada
Em 2019, no julgamento do Tema 990, o STF reconheceu como constitucional o compartilhamento espontâneo de informações entre órgãos de controle e o MP, sem necessidade de autorização judicial. A decisão autorizou o envio de dados desde que ocorra:
- de forma documentada e sigilosa;
- no âmbito de um procedimento formal de investigação;
- com a devida identificação do número do procedimento;
- e por meio de comunicação oficial.
Entretanto, o julgamento não tratou da requisição ativa dessas informações pelo MP ou pela polícia, ponto central do novo recurso analisado pela Corte.
Divergências
Quase cinco anos depois, em abril de 2024, a 1ª turma do STF, por unanimidade, confirmou decisão do ministro Cristiano Zanin que validava o envio de dados do Coaf diretamente à polícia, sem necessidade de autorização judicial.
A decisão se baseou no Tema 990 e revogou acórdão do STJ que havia invalidado relatórios de inteligência financeira utilizados em investigação policial por terem sido requisitados diretamente, sem o crivo judicial.
O caso voltou para o STJ, onde a 6ª turma ressaltou entendimento diverso. É que, para o ministro Saldanha, relator do caso no STJ, haveria uma distinção entre o processo e o precedente do Supremo.
Mas, diante da ordem de Zanin, e em respeito à hierarquia entre as Cortes, os ministros validaram os relatórios do Coaf fornecidos sem autorização judicial.
No mesmo ano, a 2ª turma do STF, impediu o MP de requisitar diretamente à Receita Federal dados fiscais de contribuintes para uso em investigações criminais, sem autorização judicial. Por unanimidade, os ministros consideraram que, neste caso, os dados estão protegidos por sigilo constitucional, o que exige a prévia autorização de um juiz.
Na oportunidade, o relator, ministro Edson Fachin, reforçou que o entendimento do Tema 990 permite que o Fisco compartilhe dados com o MP, mas não autoriza o caminho inverso, ou seja, que o MP requeira dados diretamente ao Fisco sem controle judicial.
STJ
Apesar do precedente do Supremo, o STJ firmou entendimento mais restritivo, considerando que apenas o inquérito policial configura procedimento formal válido para fundamentar a solicitação de RIFs. Com isso, investigações têm sido anuladas, sob o argumento de que houve irregularidade no compartilhamento de dados.
A Corte fixou a seguinte tese:
"A solicitação direta de relatório de inteligência financeira pelo Ministério Público, ao Coaf, sem autorização judicial é inviável. O Tema 990 do STF não autoriza requisição direta de dados financeiros por órgão de persecução penal sem autorização judicial."
Divergiram do entendimento majoritário os ministros Ribeiro Dantas, Og Fernandes e Rogerio Schietti Cruz.
Ministro Og Fernandes sustentou que a controvérsia possui natureza eminentemente constitucional e, por isso, deveria ser decidida pelo STF,
Já ministro Rogerio Schietti defendeu o papel institucional do MP na condução de investigações criminais, ressaltando que eventuais abusos não podem servir de fundamento para impor restrições generalizadas à atuação do órgão. Além disso, considerou incoerente admitir o envio espontâneo de informações pelo Coaf e, ao mesmo tempo, vedar a possibilidade de requisição ativa desses dados pelo MP.
- Processo: RE 1.537.165
Informações: PGR.