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Sessão | STF

STF dá prazo ao Congresso para proteger trabalho frente à automação

Legislativo tem 24 meses para produzir regulamentação a respeito do tema.

Da Redação

quinta-feira, 9 de outubro de 2025

Atualizado às 19:18

Nesta quinta-feira, 9, STF entendeu, por unanimidade, que o Congresso Nacional foi omisso ao não regulamentar o art. 7º, XXVII, da CF, que prevê o direito à proteção do trabalhador em face da automação. A Corte deu 24 meses para que o Legislativo produza lei sobre o tema.

A ação foi proposta pela PGR, que sustentou que a ausência de legislação específica compromete a efetividade do direito constitucional e agrava os impactos sociais da substituição do trabalho humano por máquinas e tecnologias.

Entenda o caso

A ADO 73 foi ajuizada pela PGR contra o Congresso Nacional, apontando omissão na regulamentação do direito previsto no art. 7º, XXVII, da CF, que garante proteção ao trabalhador diante da automação.

Esse direito busca mitigar os efeitos negativos da substituição do trabalho humano por sistemas automatizados e, mais recentemente, pela inteligência artificial.

Segundo a PGR, o avanço tecnológico, intensificado pela pandemia de Covid-19 e pela adoção de ferramentas de IA, exige resposta legislativa urgente. A falta de norma específica comprometeria a eficácia do direito constitucional e exporia trabalhadores a riscos como o desemprego estrutural, perda de postos de trabalho e impactos à saúde e à segurança.

A tese da procuradoria é de que o direito à proteção frente à automação deve ser interpretado em conjunto com o direito à redução dos riscos laborais (art. 7º, XXII, da CF).

O Senado e a Câmara dos Deputados defenderam que não há omissão legislativa, uma vez que diversos projetos de lei sobre o tema já foram apresentados.

A AGU, por sua vez, opinou pela improcedência da ação, sustentando que impor prazos ao Legislativo violaria a separação dos Poderes e que o simples trâmite de propostas parlamentares demonstra atuação suficiente.

Voto do relator

Ao votar, o relator, ministro Luís Roberto Barroso reconheceu a omissão do Congresso Nacional na regulamentação do direito constitucional à proteção do trabalhador em face da automação (art. 7º, XXVII, da CF).

O relator fez uma longa reflexão sobre o impacto histórico das revoluções tecnológicas na economia e no emprego, citando o economista Joseph Schumpeter e o conceito de "destruição criativa" - segundo o qual a inovação, ao criar novas formas de produção, inevitavelmente substitui as anteriores.

Barroso relembrou que desde a Primeira Revolução Industrial, com a substituição da força humana por máquinas a vapor, a humanidade vivencia transformações profundas nas formas de trabalho.

Mencionou ainda a revolução digital e afirmou que, agora, o mundo vive "uma nova revolução industrial, talvez a mais disruptiva de todas: a da inteligência artificial", que poderá suprimir mais da metade dos empregos existentes.

"O problema é que o motorista de Uber não vai se transformar em programador de computador. É preciso garantir capacitação e redes de proteção social", afirmou o ministro.

Barroso ressaltou que a automação não deve ser interrompida, mas sim gerida com políticas públicas que assegurem transição justa aos trabalhadores.

Defendeu que o suprimento da omissão legislativa deve se dar com providências de capacitação profissional e mecanismos de proteção social, como programas de requalificação e amparo em caso de desemprego decorrente da automação.

"Não é possível parar o progresso tecnológico. As sociedades capitalistas vivem mesmo dessa destruição criativa. O que cabe ao Estado é preparar os trabalhadores para a nova economia", declarou.

Durante a exposição, Barroso também demonstrou preocupação com os rumos da inteligência artificial, destacando o risco de avanço rumo à chamada "singularidade" - momento hipotético em que a IA desenvolveria consciência de si mesma e vontade própria.

"A maior de todas as preocupações é com a chamada singularidade, que é o risco de a inteligência artificial desenvolver consciência de si mesma e vontade própria. Parece ficção científica, mas os cientistas estimam em 10% a chance disso acontecer", afirmou.

O ministro citou o autor do best seller Sapiens: Uma breve história da humanidade, Yuval Harari, e fez uma analogia:

"Quando li esse dado, achei que 10% era um risco baixo. Mas ele faz a pergunta fatídica: você entraria num avião se o projetista dissesse que há 10% de chance de ele cair? Eu não entraria."

O relator, contudo, não fixou prazo para que o Legislativo edite a norma, reconhecendo que "algum grau de legislação já existe", mas que o tema exige tratamento específico voltado à proteção dos trabalhadores diante das novas tecnologias.

Assim, propôs julgar procedente o pedido, reconhecendo a omissão do Congresso, sem imposição de prazo, e reforçando que a automação também desempenha papel essencial em atividades de risco, como no uso de robôs para proteção da vida humana.

Prazo necessário

Ministro Flávio Dino acompanhou o relator reconhecendo a omissão do Congresso Nacional na regulamentação do direito constitucional à proteção do trabalhador em face da automação (art. 7º, XXVII, da CF).

Em voto marcado por reflexões filosóficas e humanistas, Dino classificou o tema como "um dos mais importantes do nosso tempo", ao lado das mudanças climáticas, por envolver "a própria subsistência do ser humano e do humanismo como valor fundante do Direito".

O ministro destacou que a atual revolução científico-tecnológica tem natureza qualitativamente distinta das anteriores, pois não substitui apenas a força de trabalho manual, mas também o engenho intelectual humano, com a ascensão da inteligência artificial.

"Vivemos o limiar de uma era de desemprego tecnológico. O que o constituinte determinou não foi impedir a automação - o que seria impossível -, mas assegurar uma legislação protetiva quanto aos seus efeitos", afirmou.

Dino defendeu que a omissão legislativa é ainda mais grave no contexto da hiperautomação, que ameaça o equilíbrio previdenciário, a livre iniciativa e os valores sociais do trabalho, pilares do Estado brasileiro.

Segundo o ministero, é necessário que o Parlamento debata soluções fiscais e sociais para os impactos da automação, lembrando que "a conta não fecha" diante do aumento da longevidade da população e da redução do número de contribuintes ativos.

O ministro propôs divergência parcial em relação ao relator, defendendo a fixação de prazo de 18 meses para que o Congresso Nacional edite a norma prevista no art. 7º, XXVII, da CF.

"Todos conhecemos o Congresso e sua crise deliberativa. Fixar prazo não é constranger o Parlamento, mas instigá-lo a cumprir seu dever constitucional", ponderou.

Dino encerrou o voto afirmando que cabe ao Direito "ser a instância do não", capaz de conter a "marcha da insensatez" diante de impulsos econômicos e tecnológicos desmedidos.

"Se o Direito e os tribunais não disserem não, e a sociedade fluir ao sabor da ganância e do lucro a qualquer custo, o próprio constitucionalismo se tornará obsoleto", concluiu.

Constituição profética

Ministro Kássio Nunes Marques acompanhou o relator. Destacou que a cláusula constitucional, incluída em 1988, colocou o Brasil "na singular posição de possuir uma das poucas Constituições do século passado a prever expressamente esse tipo de proteção", o que considerou "quase profético".

Segundo o ministro, o dispositivo nasceu de um diagnóstico social claro nos debates da Assembleia Constituinte, quando já se percebia que a modernização tecnológica eleva a produtividade, mas desequilibra o mercado de trabalho, afetando grupos específicos de trabalhadores.

O ministro fez um resgate histórico dos 17 projetos de lei apresentados ao longo de três décadas sobre o tema, destacando o PL 2.902/89, de autoria do então senador Fernando Henrique Cardoso, que propunha medidas como inclusão do ensino de informática nos currículos escolares, indenização em dobro para dispensas motivadas por automação e programas de requalificação obrigatória.

Nunes Marques afirmou que, embora várias iniciativas parlamentares tenham reconhecido a necessidade de disciplinar o tema, nenhuma foi aprovada em mais de 30 anos, o que evidencia a complexidade da questão, agora agravada pelo avanço da inteligência artificial.

O ministro ressaltou que, se antes a automação se restringia a processos industriais, hoje ela afeta inclusive o trabalho intelectual, com "robôs de conversação e grandes modelos de linguagem capazes de simular cognição e comunicação humanas".

Defendeu, assim, que não há solução única para o problema do desemprego tecnológico, sendo necessário que a legislação adote respostas setoriais e regionais, com instrumentos de transição justa e incentivos à requalificação.

"O caminho estratégico é tratar a regulação como política industrial de longo curso, com neutralidade tecnológica, metas de capacitação e fortalecimento da capacidade estatal computacional", afirmou.

O ministro também citou o AI Act europeu, aprovado em 2024, como exemplo de abordagem gradual e setorial, e concluiu que "a Constituição pediu proteção em face da automação, não contra a automação", defendendo uma transição justa financiada por quem captura os maiores ganhos produtivos.

Nunes Marques acompanhou o relator sem fixar prazo para o Congresso, destacando que o próximo ano eleitoral dificultaria a tramitação de eventual projeto e que o tema exigirá um arcabouço normativo complexo, com múltiplas leis e regulamentações específicas.

Seguimento aos PLs

Ministro Luiz Fux acompanhou o relator Luís Roberto Barroso ao reconhecer a omissão legislativa quanto à regulamentação do direito à proteção do trabalhador em face da automação, mas sem fixar prazo para o Congresso Nacional.

Fux citou o historiador Eric Hobsbawm e o escritor Yuval Harari para destacar que a humanidade vive uma nova fase de transformação tecnológica, marcada pela inteligência artificial. Segundo o ministro, o desafio não é conter o avanço das inovações, mas garantir que a sociedade e o Estado consigam acompanhá-las.

Fux ressaltou que há diversos projetos de lei tramitando no Congresso para dar efetividade ao art. 7º, XXVII, da CF, mas que todos estão parados. Diante disso, defendeu autocontenção judicial e o respeito à competência do Legislativo.

O ministro propôs que o Supremo, ao reconhecer a omissão, comunique formalmente o Congresso, recomendando que dê andamento aos projetos já existentes, sem necessidade de fixação de prazo específico.

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