STF nega inclusão direta de empresa na fase de execução trabalhista
Exceções foram admitidas apenas nos casos de sucessão empresarial ou abuso da personalidade jurídica.
Da Redação
domingo, 12 de outubro de 2025
Atualizado às 09:32
STF decidiu que não é possível incluir, na fase de execução trabalhista, empresa que não tenha participado da fase de conhecimento do processo, ainda que pertença a grupo econômico.
Entretanto, a Corte reconheceu exceções para os casos de sucessão empresarial ou abuso da personalidade jurídica, situações em que a inclusão direta da empresa na execução poderá ser admitida, desde que observados os requisitos legais e garantido o contraditório.
O julgamento de relatoria do ministro Dias Toffoli, foi finalizado no plenário virtual nesta sexta-feira, 10, mas desde o último dia 6, já havia maioria consolidada em favor da tese do relator.
S. Exa. foi acompanhada pela ministra Cármen Lúcia e pelos ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin, André Mendonça, Nunes Marques, Luiz Fux, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso.
Ministro Edson Fachin divergiu e foi acompanhado por Alexandre de Moraes.
A seguinte tese foi aprovada:
"1 - O cumprimento da sentença trabalhista não poderá ser promovido em face de empresa que não tiver participado da fase de conhecimento do processo, devendo o reclamante indicar na petição inicial as pessoas jurídicas corresponsáveis solidárias contra as quais pretende direcionar a execução de eventual título judicial, inclusive nas hipóteses de grupo econômico (art. 2°, §§ 2° e 3°, da CLT), demonstrando concretamente, nesta hipótese, a presença dos requisitos legais;
2 - Admite-se, excepcionalmente, o redirecionamento da execução trabalhista ao terceiro que não participou do processo de conhecimento nas hipóteses de sucessão empresarial (art. 448-A da CLT) e abuso da personalidade jurídica (art. 50 do CC), observado o procedimento previsto no art. 855-A da CLT e nos arts. 133 a 137 do CPC;
3 - Aplica-se tal procedimento mesmo aos redirecionamentos operados antes da Reforma Trabalhista de 2017, ressalvada a indiscutibilidade relativa aos casos já transitados em julgado, aos créditos já satisfeitos e às execuções findas ou definitivamente arquivadas."
Veja o placar:
Entenda
O recurso foi interposto pela Rodovias das Colinas S.A., incluída em execução trabalhista movida por ex-empregado de uma destilaria sob o argumento de pertencer ao mesmo grupo econômico.
A empresa alegou nunca ter participado da fase de conhecimento e denunciou violação ao devido processo legal.
O caso deu origem ao Tema 1.232 da repercussão geral, e em 2023 o ministro Toffoli determinou a suspensão nacional de todas as execuções trabalhistas sobre a matéria até o julgamento definitivo.
Do físico ao virtual
O caso começou a ser julgado em plenário físico, em agosto.
Na sessão, a Corte havia formado maioria no sentido do voto do ministro Cristiano Zanin, que vedava a inclusão de empresas apenas na fase de execução, salvo nas hipóteses excepcionais de desconsideração da personalidade jurídica.
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Naquele momento, o julgamento foi novamente suspenso para que os ministros buscassem um ponto de equilíbrio quanto à eventual declaração de invalidade de dispositivos da CLT.
A tese sugerida por Zanin naquela ocasião tinha a seguinte redação:
"I - O cumprimento da sentença trabalhista não poderá ser promovido em face de empresa que não tiver participado da fase de conhecimento do processo, devendo o reclamante indicar, na petição inicial, as pessoas jurídicas corresponsáveis, solidárias, contra as quais pretende direcionar a execução de eventual título judicial, inclusive nas hipóteses de grupo econômico, art. 2º, §2º e §3º da CLT.
II - Admite-se excepcionalmente o redirecionamento da execução trabalhista ao terceiro que não participou do processo de conhecimento, quando verificada a existência de fato superveniente à propositura da reclamação trabalhista e desde que observado o procedimento previsto no art. 855-A da CLT e 133 e seguintes do CPC.
III - Aplica-se tal procedimento mesmo aos redirecionamentos operados antes da Reforma Trabalhista de 2017, ressalvados os casos transitados em julgado e as execuções findas, os créditos satisfeitos e as execuções definitivamente arquivadas."
No plenário virtual, Toffoli incorporou ajustes propostos por Zanin, Dino e André Mendonça, suprimindo a referência ao "fato superveniente" e uniformizando a tese em torno da exigência do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, com aplicação mesmo aos redirecionamentos anteriores à Reforma Trabalhista.
Voto do relator
Ministro Dias Toffoli abriu o voto com uma referência ao romance O Processo, de Franz Kafka, para ilustrar os riscos de um sistema judicial que ignora suas próprias garantias.
Segundo S. Exa., a Justiça não pode pode suprimir o contraditório em nome da celeridade.
"A violação de princípios jurídicos fundamentais, como os do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa e da razoável duração do processo, torna o processo um fim em si mesmo, revestindo-o de caráter arbitrário, além de conduzir à insegurança jurídica e ao descrédito nas leis, no direito e no Poder Judiciário", escreveu o relator.
O ministro criticou a prática consolidada na Justiça do Trabalho de incluir, já na fase de execução, empresas de um mesmo grupo econômico que não participaram da ação principal.
Segundo Toffoli, tal conduta fere o cerne da coisa julgada e cria um cenário de insegurança jurídica incompatível com o Estado Democrático de Direito.
Ainda, Toffoli observou que o art. 513, §5º, do CPC e o art. 855-A da CLT impõem o incidente de desconsideração da personalidade jurídica como condição para responsabilização de terceiros.
Na fundamentação, Toffoli destacou que a ampliação indiscriminada da execução trabalhista gera insegurança para o ambiente econômico e aos trabalhadores.
Após ajustes sugeridos pelos ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin e André Mendonça, na sessão de julgamentos ocorrida presencialmente, o relator formulou a tese que obteve maioria.
- Confira o voto e o complemento.
Ajustes propostos
Em voto vogal, ministro Cristiano Zanin acompanhou integralmente o relator no mérito, e propôs ajustes na redação da tese de repercussão geral, buscando reforçar os critérios para eventual responsabilização de terceiros.
Frisou que a regra geral é a participação do corresponsável na fase de conhecimento, e que a inclusão direta em execução só se admite em três hipóteses excepcionais: sucessão empresarial, abuso de personalidade jurídica ou inclusão superveniente em grupo econômico.
"Sem que seja oportunizado o contraditório e a produção probatória em momento processual adequado (ampla defesa), a pessoa jurídica estranha à pretensão inaugural da lide não poderá ser prejudicada ou sofrer limitação e constrição de direitos.", afirmou o ministro.
- Confira o voto.
Ministro Gilmar Mendes, a seu turno, advertiu que decisões da Justiça do Trabalho que ignoram o art. 513, §5º, do CPC violam a Constituição e a Súmula Vinculante 10.
O decano da Corte defendeu a aplicação integral do CPC ao processo trabalhista e criticou o cancelamento da Súmula 205 do TST.
- Leia o voto.
Ministro Nunes Marques também acompanhou o relator, desenvolvendo reflexão histórica e conceitual sobre o devido processo legal.
Para Nunes Marques, o redirecionamento de execução sem contraditório e ampla defesa "não apenas atentam contra sua esfera jurídica, mas também contra todo o ordenamento jurídico, na medida em que cria obrigações e institutos de responsabilização não previstos em lei, criando precedentes perigosos à segurança jurídica do país".
Ressaltou que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica é a via adequada e constitucional para garantir a efetividade do processo sem atropelar direitos fundamentais.
- Veja o voto.
Ministro André Mendonça acompanhou o relator destacando que a inclusão de empresas em execução trabalhista sem participação na fase de conhecimento viola o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.
Para o ministro, o art. 513, §5º, do CPC impede o cumprimento de sentença contra quem não integrou o processo de origem, e a mera existência de grupo econômico não autoriza a responsabilização automática.
É indispensável comprovar fraude, confusão patrimonial ou abuso da personalidade jurídica, com a instauração do incidente de desconsideração, previsto nos arts. 133 a 137 do CPC e no art. 855-A da CLT.
Mendonça reforçou que a regra aplica-se com base na teoria maior da desconsideração (art. 50 do CC), que exige prova concreta de abuso, e não pela mera insolvência da empresa.
Leia o voto.
- Processo: RE 1.387.795