COLUNAS

  1. Home >
  2. Colunas

Processo Disciplinar no Sistema OAB e atualidades jurídicas

Análise de casos e questões do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB.

Antonio Alberto do Vale Cerqueira
Também ilustrativo é o julgamento do recurso 49.0000.2023.006118-9/SCA, relatado pelo Conselheiro Federal Daniel Castro Gomes da Costa. O caso tratou novamente da ausência de dialeticidade, o que levou ao não conhecimento do apelo. O recorrente, ao invés de demonstrar como o acórdão recorrido teria violado dispositivos constitucionais, legais ou regimentais, restringiu-se a reafirmar argumentos anteriores, sem qualquer esforço dialético para impugnar as premissas que sustentaram a decisão seccional. A 2ª Câmara, de forma uníssona, asseverou que o recurso não atendia ao requisito do art. 89-A, § 3º, e, por conseguinte, não poderia ser conhecido. Recurso ao pleno da 2ª Câmara. Art. 89-A, § 3º, do regulamento geral. Ausência de demonstração de contrariedade do acórdão recorrido à Constituição, às leis, ao Estatuto da Advocacia e da OAB, a decisões deste Conselho Federal, ao regulamento geral, ao Código de Ética e Disciplina ou aos Provimentos. Pretensão ao reexame do mérito do acórdão recorrido. Reiteração das mesmas teses defensivas do recurso anterior, sem impugnação específica aos fundamentos do acórdão recorrido, em clara violação à dialeticidade recursal. Ausência dos pressupostos de admissibilidade. Recurso não conhecido. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da Segunda Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do regulamento geral, por unanimidade, em não conhecer do recurso, nos termos do voto do relator. Impedido de votar o representante da OAB/Minas Gerais. Brasília, 8/4/25. Christina Cordeiro dos Santos, presidente. Daniel Castro Gomes da Costa, relator. (Recurso 49.0000.2023.006118-9/SCA. EMENTA 032/2025/SCA. Relator: Conselheiro Federal Daniel Castro Gomes da Costa (MS). DEOAB, a. 7, n. 1597, 05.05.2025, p. 6) É importante ressaltar que a dialeticidade não se confunde com demasiado rigor formal a redundar em violação do direito de defesa. Ao contrário, serve justamente para que o Conselho Federal possa exercer seu mister constitucional e estatutário de forma técnica e isonômica, concentrando cognição nas questões efetivamente postas em debate. O recurso destituído de dialeticidade compromete não apenas a economia processual, mas a própria seriedade do procedimento disciplinar, que não pode se prestar a sucessivas tentativas de rediscutir fatos já apreciados. A questão adquire contornos ainda mais sensíveis quando se considera a natureza do processo disciplinar no âmbito da OAB. Trata-se de procedimento que não visa apenas a aplicação de sanções, mas sobretudo a preservação da dignidade da advocacia e a tutela da confiança social depositada na atuação dos profissionais do Direito. Daí porque o devido processo legal, com todas as suas garantias, deve ser conjugado à eficiência e à celeridade, evitando-se recursos meramente procrastinatórios. A dialeticidade, nesse cenário, atua como filtro necessário, permitindo ao Conselho Federal concentrar sua análise em recursos que efetivamente discutam a correção jurídica das decisões seccionais, à luz dos parâmetros normativos estabelecidos. Em síntese, o recurso ao Conselho Federal da OAB não se presta a rediscutir exaustivamente a matéria fática ou meramente reeditar teses já vencidas. Sua admissibilidade está condicionada à demonstração concreta de que o acórdão recorrido contrariou norma constitucional, legal, estatutária ou regulamentar aplicável. A dialeticidade, nesse contexto, não é apenas exigência técnica, mas expressão do devido processo legal em sua feição dialógica, que impõe ao recorrente o dever de efetivamente resistir ao conteúdo da decisão, apontando como e por que merece invalidação ou reforma na medida em que estaria a vulnerar o ordenamento jurídico legal ou administrativo. Portanto, partes, autoridades, advogados e advogadas que pretendam manejar recursos ao Conselho Federal devem estar cientes de que não basta manifestar inconformismo. É imperativo examinar detidamente o acórdão recorrido, identificar seus fundamentos e, então, formular argumentos que os enfrentem de forma específica, demonstrando onde residiria a suposta contrariedade aos dispositivos normativos. Esse ônus argumentativo não pode ser mitigado sob pena de desnaturar o sistema recursal e transformá-lo em via de revisão indiscriminada, em prejuízo da estabilidade das decisões e da efetividade do processo disciplinar. O reforço constante desse entendimento pelo Conselho Federal tem o mérito de prestigiar a seriedade dos recursos e assegurar que o aparato recursal ético-disciplinar da OAB seja utilizado dentro dos contornos que lhe são próprios. A dialeticidade, longe de ser um obstáculo arbitrário, é garantia de racionalidade, eficiência e respeito aos limites do contraditório. Sem ela, a instância máxima do sistema OAB se veria compelida a reapreciar interminavelmente teses já analisadas, em detrimento da segurança jurídica e do próprio prestígio institucional da advocacia. Assim, a dialeticidade se apresenta não apenas como pressuposto de admissibilidade recursal, mas também como vetor de estabilidade e coerência decisória no âmbito da Ordem. Sua observância assegura que os recursos sejam efetivamente instrumentos de correção de ilegalidades, e não meras repetições retóricas destinadas a postergar a solução definitiva de questões que, à luz do Estatuto e do regulamento geral, já encontraram adequada resposta no âmbito seccional. Ao impor esse ônus argumentativo, o sistema processual disciplinar da OAB fortalece não só o devido processo, mas a própria confiança da sociedade na integridade da advocacia. Por tudo o quanto exposto, a exigência da dialeticidade nos recursos ao Conselho Federal impõe que o recorrente confronte, ponto a ponto, os fundamentos do acórdão recorrido, apontando onde a decisão se contrapõe às normas de regência do sistema OAB. *Fale diretamente com o advogado e envie suas dúvidas por aqui (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira
A dialeticidade é um requisito essencial a qualquer recurso, porque trata da própria essência da impugnação. O princípio da dialeticidade é, assim, um dos pilares do sistema recursal brasileiro, estabelecendo como dever do recorrente combater os fundamentos da decisão recorrida, ou seja, o recurso a ser manejado deve conter argumentos que venham a demonstrar as incorreções da decisão, assim como as razões para o pedido de invalidação ou reforma. É dizer que a essência da dialeticidade enquanto requisito recursal reside na ideia de que o recurso não pode ser uma mera manifestação de inconformismo genérico ou a repetição de argumentos já expostos e rechaçados, mas sim um diálogo crítico e construtivo com a decisão recorrida. É abertamente aplicado pelo processo civil, conforme ensina o prof. Arruda Alvim: "Pelo princípio da dialeticidade, o recurso deverá ser sempre arrazoado, de forma que o recorrente expresse o porquê da necessidade de reforma da decisão. Só assim poderá o recorrido responder ao recurso, prestigiando-se o princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa. Em realidade, a dialética não se afere entre afirmações conclusivas, senão que ganha legitimidade tendo em vista os motivos, fundamentos e razões dessas afirmações."1 A súmula 182 do STJ declara: "É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada" Esse requisito é formalmente exigido no processo ético-disciplinar do sistema OAB. À primeira vista, tal exigência pode confundir-se com um mecanismo processual para cercear o acesso ao Conselho Federal da OAB, como seria, analogamente, a súmula 7 do STJ para o conhecimento do recurso especial, todavia, tal entendimento é infundado. Na verdade, a exigência da dialeticidade no recurso do sistema OAB se revela como verdadeiro sustentáculo do devido processo legal, pois uma vez julgado o processo disciplinar, é obrigatório que o recurso demonstre à instância ad quem o error da decisão guerreada, haja vista ser essa a forma de tornar possível a fundamentação do pedido de reforma.  Com efeito, o art. 75 da lei Federal 8.906/1994 prevê: Art. 75. Cabe recurso ao Conselho Federal de todas as decisões definitivas proferidas pelo Conselho Seccional, quando não tenham sido unânimes ou, sendo unânimes, contrariem esta lei, decisão do Conselho Federal ou de outro Conselho Seccional e, ainda, o regulamento geral, o Código de Ética e Disciplina e os Provimentos. Parágrafo único. Além dos interessados, o presidente do Conselho Seccional é legitimado a interpor o recurso referido neste artigo. A norma legal não deixa margem para dúvida quanto à necessidade de preenchimento de requisitos legais para o manejo do recurso ao Conselho Federal, exigindo que em caso de decisões unânimes, o recurso só será viável caso o acórdão venha a contrariar o EAOAB, decisões dos Conselhos Seccionais ou do Conselho Federal ou normativos do sistema OAB, como é o caso do Código de Ética e Disciplina, por exemplo. Esse entendimento é corroborado pelo regulamento geral da OAB, em seu art. 89-A, § 3º que repete ipsis litteris a exigência da lei, estabelecendo, contudo, a competência da 2ª Câmara para o julgamento: § 3º Das decisões das turmas caberá recurso para o pleno da 2ª Câmara quando não tenham sido unânimes ou, sendo unânimes, contrariem a Constituição, as leis, o Estatuto, decisões do Conselho Federal, este regulamento geral, o Código de Ética e Disciplina ou os provimentos. Em ambos os casos fica clara a exigência da dialeticidade no recurso, haja vista que para demonstrar a contrariedade da decisão atacada pelo recurso à "Constituição, as leis, o Estatuto, decisões do Conselho Federal, este regulamento geral, o Código de Ética e Disciplina ou os provimentos", exsurge nítida a necessidade de estabelecimento de correlação do conteúdo da decisão com as potenciais máculas normativas que o recurso atestará tenham ocorrido. Para essa direção aponta a jurisprudência do Conselho Federal que tem se consolidado de modo inequívoco nesse sentido. No recurso 25.0000.2022.000587-7/SCA, relatado pelo conselheiro Federal Eduardo de Mello e Souza, a 2ª Câmara, por unanimidade, não conheceu do recurso porque o recorrente limitou-se a reiterar as mesmas teses defensivas já apresentadas no recurso anterior, sem oferecer impugnação específica aos fundamentos do acórdão prolatado pelo Conselho Seccional de São Paulo. O acórdão recorrido permaneceu, assim, incólume, pois não foi possível sequer abrir a instância revisional ante a ausência do pressuposto dialético mínimo: Recurso ao Pleno da Segunda Câmara. Art. 89-A, § 3º, do regulamento geral. Ausência de demonstração de contrariedade do acórdão recorrido à Constituição, às leis, ao Estatuto da Advocacia e da OAB, a decisões deste Conselho Federal, ao regulamento geral, ao Código de Ética e Disciplina ou aos provimentos. Pretensão ao reexame do mérito do acórdão recorrido. Reiteração das mesmas teses defensivas do recurso anterior, sem impugnação específica aos fundamentos do acórdão recorrido, em clara violação à dialeticidade recursal. Ausência dos pressupostos de admissibilidade. Recurso não conhecido. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da 2ª Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do regulamento geral, por unanimidade, em não conhecer do recurso, nos termos do voto do relator. Impedido de votar o representante da OAB/São Paulo. Brasília, 8/4/25. Christina Cordeiro dos Santos, presidente. Eduardo de Mello e Souza, Relator. (Recurso 25.0000.2022.000587-7/SCA. EMENTA 026/25/SCA. Relator: conselheiro Federal Eduardo de Mello e Souza (SC) DEOAB, a. 7, n. 1597, 05.05.2025, p. 4) Da mesma forma, o recurso 25.0000.2022.000589-3/SCA, relatado pela conselheira Federal Amanda Lima Figueiredo, trilhou idêntico caminho. O recurso ali manejado buscava, em verdade, o reexame do mérito das conclusões alcançadas pelo acórdão da turma da 2ª Câmara, sem demonstrar qualquer contrariedade aos dispositivos normativos que balizam o exercício ético da advocacia. A simples repetição dos argumentos já vencidos não constitui dialeticidade; antes, revela tentativa de revolvimento fático-probatório vedado nessa instância recursal. Como bem ressaltou a relatora, o recurso não pode servir de sucedâneo para rediscussão da matéria, mormente quando despido de enfrentamento concreto das razões de decidir. Recurso ao pleno da 2ª Câmara. Acórdão unânime de turma da 2ª Câmara. Art. 89-A, § 3º, do regulamento geral. Ausência de demonstração de contrariedade do acórdão recorrido à Constituição, às leis, ao Estatuto da Advocacia e da OAB, a decisões deste Conselho Federal, ao regulamento geral, ao Código de Ética e Disciplina ou aos provimentos. Reiteração das mesmas teses defensivas do recurso anterior, sem impugnação específica aos fundamentos do acórdão recorrido. Impossibilidade. Recurso ao Conselho Federal da OAB não conhecido, a seu turno, por ausência dos pressupostos de admissibilidade do art. 75 do Estatuto da Advocacia e da OAB. Pretensão recursal destinada ao reexame de matéria fática e probatória. Recurso não conhecido. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da 2ª Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em não conhecer do recurso, nos termos do voto da Relatora. Impedido de votar o Representante da OAB/São Paulo. Brasília, 8/4/25. Christina Cordeiro dos Santos, Presidente. Amanda Lima Figueiredo, Relatora. (Recurso 25.0000.2022.000589-3/SCA. EMENTA 027/25/SCA. Relatora: conselheira Federal Amanda Lima Figueiredo (AP). DEOAB, a. 7, n. 1597, 05.05.2025, p. 4) (Continua na parte 2...) *Fale diretamente com o advogado e envie suas dúvidas por aqui (Clique aqui) ou pelo instagram @antonioalbertocerqueira 1 ALVIM, Eduardo Arruda, Daniel William Granado e Eduardo Aranha Ferreira. Direito Processual Civil. 6ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, pág. 
De todas as posições estudadas para soluções aos embargos de declaração considerados procrastinatórios, a mais acertada parece ser uma terceira via jurisprudencial também do Conselho Federal, que estabelece que a inexistência de recurso do § 5º1, em relação à decisão de não conhecimento, se dá em relação a novos embargos de declaração, mas não quanto à discussão de fundo, ou seja, quanto às teses recursais, para absolvição administrativa, reconhecimento da prescrição, desclassificação das condutas etc. Nesse sentido, confira-se: Interessado: Conselho Seccional da OAB/Goiás. Recurso ao Conselho Federal da OAB. Art. 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Anulação do julgamento realizado pelo Conselho Seccional da OAB/Goiás, de ofício. Declaração de intempestividade do recurso interposto pelo advogado, em razão do não conhecimento dos segundos embargos de declaração opostos em face da decisão do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB, tidos por meramente protelatórios. Artigo 138, §§ 3º e 5º, do regulamento geral do Estatuto da Advocacia e da OAB. Inexistência da intempestividade declarada. O art. 138, § 3º, do Regulamento Geral do EAOAB estabelece que os embargos de declaração são dirigidos ao relator da decisão recorrida, que lhes pode negar seguimento, fundamentadamente, se os tiver por manifestamente protelatórios, intempestivos ou carentes de seus pressupostos legais para interposição. E o § 5º do mesmo dispositivo normativo estabelece que contra essa decisão não cabe qualquer recurso. Implica dizer que não se admite que seja interposto recurso exclusivamente contra a decisão que considerou protelatórios os embargos de declaração, reservando a parte o recurso cabível contra a decisão então embargada para momento posterior, violando assim o princípio da unirrecorribilidade. Assim, não resta obstada a possibilidade de interposição de recurso em face da decisão de mérito, que restou embargada. Vale dizer, a decisão do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB, que julgou o mérito da representação, e que foi objeto dos embargos de declaração protelatórios, permanece desafiando o recurso previsto no art. 76 do Estatuto da Advocacia e da OAB. Não seria admissível, apenas recurso que se limitasse exclusivamente aos fundamentos da decisão que considerou protelatórios os embargos de declaração, de modo a interpor o recurso ao Conselho Seccional oportunamente, violando, assim, o princípio da unirrecorribilidade. Assim, de ofício, deve ser reformada a decisão do Conselho Seccional da OAB/Goiás, reconhecendo a tempestividade do recurso interposto pelo advogado com fundamento no art. 76 do Estatuto da Advocacia e da OAB, determinando o retorno dos autos para julgamento do mérito recursal. Análise das razões recursais a este Conselho Federal da OAB prejudicada. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da 1ª turma da 2ª Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do regulamento geral, por unanimidade, em declarar, de ofício, a nulidade do julgamento realizado pela seccional da OAB/Goiás, reconhecendo a tempestividade do recurso interposto pelo advogado e determinando o retorno dos autos à 2ª Câmara do Conselho Seccional para realização de novo julgamento, nos termos do voto do relator. Brasília, 18/10/21. Jedson Marchesi Maioli, Presidente em exercício. Ulisses Rabaneda dos Santos, Relator ad hoc. (Recurso 09.0000.2021.000004-8/SCA-PTU. EMENTA 103/21/SCA-PTU. Relator: Conselheiro Federal José Carlos de Oliveira Guimarães Júnior (MT). DEOAB, a. 3, n. 710, 20.10.2021, p. 3) No caso acima, a eloquência da ementa fala por si só. Se a OAB proferir decisão que não conheça de embargos de declaração, porque os considerou procrastinatórios, na forma do quanto estabelece o § 3º, essa decisão não decretará o trânsito em julgado, mas também não poderá ser recorrida por novos embargos, em face do óbice do § 5º. Estará, assim, aberto o prazo para o recurso principal, ou seja, aquele que efetivamente discutirá teses de mérito da demanda. Por óbvio, nesse novo recurso, poderá a parte construir preliminar de ausência de prestação jurisdicional pelo órgão a quo da OAB, a desafiar assim análise de eventual invalidação da decisão recorrida. Do quanto se tratou até aqui, exsurge clara uma profusão de jurisprudências acerca da matéria e não há soluções processuais simples. Assim, remanesce a pergunta: como deve agir o julgador caso verifique que os embargos de declaração opostos pela parte não mereçam análise, por que procrastinatórios em sentido latu?   Como o PAD na OAB é processo repressivo, com dimensão muito maior à ampla defesa, parece bem acertada uma combinação de entendimentos mais favorável à defesa. Isso posto, nos primeiros embargos declaratórios, ainda que o recurso aclaratório seja impertinente, o julgador deverá conhecer do recurso, mas julgar seus pedidos improcedentes. Já no caso dos embargos de declaração sobre os embargos de declaração, o decreto de trânsito em julgado decorrente da aplicação do § 3º do art. 158 do regulamento geral, confirmado pelo recurso 16.0000.2022.000187-8/SCA-TTU do Conselho Federal e já mencionado, parece solução processual que obsta o amplo exercício da defesa e deixa a parte refém. Nesse caso, ainda que entenda necessário recurso para aprimorar o julgado, a parte terá sempre sobre sua cabeça a "espada" do selo de imutabilidade da decisão ou trânsito em julgado, o que a intimidará ao manejo de todas as ferramentas processuais que entender adequadas para sua defesa. Por outro lado, a saída processual adotada pelo julgado 09.0000.2021.000004-8/SCA-PTU, acima citado, valoriza mais o direito de defesa e afasta a intimidação imposta pelo risco do decreto do trânsito em julgado, porque entende que a inexistência de recurso declarada pelo § 5º é apenas em relação a novos declaratórios, abrindo, assim, a via para os recursos de mérito previstos nos arts. 75 e seguintes do EAOAB, assim como nos normativos da OAB, como é o caso do regulamento geral. Mas, e se em decorrência da publicação desse acórdão que não conheceu dos embargos a parte opuser novo recurso aclaratório, insistindo em sustentar a presença dos vícios de fundamentação que já compunham seu primeiro recurso, ciente de que, novo decreto de não conhecimento ainda lhe permitirá o recurso de mérito, na forma do quanto decidido no CFOAB no acórdão do recurso 09.0000.2021.000004-8/SCA-PTU. Para esse caso a solução é igualmente simples: deverá o julgador proferir decisão monocrática que declare a impossibilidade recursal por se tratar do segundo recurso aclaratório e em aplicar o § 5º do art. 138 do regulamento geral, para assim conceder aos embargos a fungibilidade recursal e para acabar esse segundo recurso aclaratório como o recurso para o ad quem, abrindo prazo para o embargante adequar sua peça à instância superior, sob pena de preclusão. Um bom exemplo prático seria um despacho assim: "face ao caráter procrastinatório que reconheço, declaro que o recurso não reúne os requisitos legais para seu conhecimento, e, em face da irrecorribilidade da decisão prevista no art. 138, § 5º do Regulamento Geral, recebo os embargos de declaração como recurso à instância superior, facultando, sob pena de preclusão, ao embargante realizar a emenda no prazo legal". Com essas medidas, todos os problemas vinculados aos embargos de declaração procrastinatórios estarão resolvidos.   *Fale diretamente com o advogado e envie suas dúvidas por aqui (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira 1 § 5º Não cabe recurso contra as decisões referidas nos §§ 3º e 4º.
Caso os embargos de declaração sejam declarados manifestamente protelatórios, intempestivos ou carentes dos pressupostos legais para interposição na forma do §3º do artigo 138 do Regulamento Geral da OAB1, a possível consequência processual será a morte de toda e qualquer discussão acerca da matéria de mérito, ou seja, aquela que era essencialmente a motivação do recurso. Nesta situação, especialmente em face do quanto estabelece o §1º2, da decisão de não conhecimento do recurso e decreto do trânsito em julgado, poderá ainda a parte recorrer ao ad quem, todavia, não há dúvida, estará levantada barreira processual de difícil reversão, porque nessa situação, como a decisão recorrida não ingressou no mérito ao não conhecer o recurso, o novo recurso não poderá discutir seu conteúdo, ou seja, a verdadeira pretensão recursal não estará mais dentre o espectro do apelo, ficando o novo recurso adstrito à tese de invalidação da decisão de não conhecimento dos embargos declarados protelatórios. Essa vedação se dá especialmente em face da proibição estabelecida pelo §6º3, pois no novo julgamento desse recurso o ad quem apenas poderá declarar a invalidação do julgado, sem ingressar no mérito que realmente estaria a interessar ao recorrente, ou seja, inegável que sua situação processual passa a ser bem mais complicada. Nessa linha, ou seja, de que o não conhecimento dos embargos de declaração pelo §3º gera o trânsito em julgado, há recente precedente do Conselho Federal de lavra da Eminente Conselheira Cristiane Damasceno Leite:  Revisão de processo disciplinar (art. 73, § 5º, EAOAB c/c art. 68 CED/OAB). Acórdão unânime do Conselho Seccional da OAB/Paraná. Alegação de cerceamento de defesa. Reiteração. Inocorrência. Indeferimento de pedido de adiamento de julgamento devidamente fundamentado. Negado seguimento aos terceiros embargos de declaração por serem manifestamente protelatórios. Inteligência do § 3º do artigo 138 do RGEAOAB. Determinação de certificação do trânsito em julgado da decisão e aplicação da sanção, porquanto embargos protelatórios não interrompem o prazo recursal. Precedentes. Recurso que se nega provimento para manter o indeferimento do pedido de revisão dos autos do Processo Disciplinar n. 422/2016. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da Terceira Turma da Segunda Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Impedida de votar a Representante da OAB/Paraná. Brasília, 16 de outubro de 2023. Daniel Blume, Presidente em exercício. Jader Kahwage David, Relator ad hoc. (Recurso n. 16.0000.2022.000187-8/SCA-TTU. EMENTA N. 110/2023/SCA-TTU. Conselheira Federal Cristiane Damasceno Leite (DF). DEOAB, a. 5, n. 1226, 10.11.2023, p. 55).  Não há qualquer dúvida de que referido entendimento é altamente gravoso aquele que se defende, pois sempre que agitar os embargos de declaração terá o decreto de não conhecimento como uma espada sobre sua pretensão. Não é a posição mais acertada. O Conselho Federal estabeleceu outro entendimento nos julgados abaixo mais favorável aquele que tem interesse em recorrer: o não conhecimento do §3º só seria possível a partir do segundo recurso de embargos de declaração. Nesse sentido:  Interessado: Conselho Seccional da OAB/Rio de Janeiro. Embargos de declaração. Matéria de ordem pública. Prescrição prevista nos artigos 25-A e 43 da Lei n. 8.906/94. Inocorrência. Ausência de notificação pessoal. Nulidade afastada. Embargos rejeitados. 1) A prescrição da ação de prestação de contas de que trata o artigo 25-A argui-se em autos próprios da ação de prestação de contas. No Conselho Federal da OAB, no processo administrativo disciplinar que apura a falta de ética, a prescrição é regulada por dispositivo diverso, artigo 43 do Estatuto, sendo certo que a punição por ofensa ao inciso XXI, do artigo 34, leva o julgador à aplicação obrigatória e automática do parágrafo 2ª, do artigo 37, o qual expressa que a pena perdura até a "satisfação integral da dívida", dispositivo este que não foi revogado. 2) Não decorreu prazo superior a 05 anos sem julgamento, nem o processo permaneceu paralisado por mais de três anos pendente de decisão, nos termos do que dispõe ao art. 43 do EAOAB. 3) Não há que se falar em nulidade processual, vez que o recorrente fora devidamente intimado das sessões de julgamento, por meio do Diário Oficial. Inteligência do art. 137-D, § 4º, do REGEAOB. 4) Não aplicação do art. 138, § 3º e 5º do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB por tratar-se de oposição de primeiros embargos de declaração. 5) Embargos rejeitados. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros do Órgão Especial do Conselho Pleno do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em acolher o voto do relator, parte integrante deste, conhecendo e rejeitando os embargos de declaração. Impedido de votar o Representante da OAB/Rio de Janeiro. Brasília, 11 de abril de 2016. Felipe Sarmento Cordeiro, Presidente em exercício. Rogério Magnus Varela Gonçalves, Relator. (RECURSO N. 49.0000.2014.002037-1/OEP - ED. EMENTA N. 026/2016/OEP. Relator: Conselheiro Federal Rogério Magnus Varela Gonçalves (PB). DOU, S.1, 04.05.2016, p. 178)  Interessado: Conselho Seccional da OAB/São Paulo. Embargos de declaração. Ausência de ambiguidade, obscuridade, contradição, omissão ou erro material na decisão embargada. Mera reiteração de matéria já apreciada e afastada, sem a impugnação dos fundamentos da decisão embargada. Afastada a aplicação do artigo 138, § 3º e 5º, do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB, por tratar-se de oposição de primeiros embargos de declaração. Embargos de declaração conhecidos e não providos. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros do Órgão Especial do Conselho Pleno do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em acolher o voto do relator, parte integrante deste, conhecendo e negando provimento aos embargos de declaração. Brasília, 11 de abril de 2016. Felipe Sarmento Cordeiro, Presidente em exercício. Pedro Donizete Biazotto, Relator. (RECURSO N. 49.0000.2013.008382-9/OEP - ED. EMENTA N. 023/2016/OEP. Relator: Conselheiro Federal Pedro Donizete Biazotto (TO). DOU, S.1, 04.05.2016, p. 178)  Embora mais vantajosa, aqui ainda não deve a parte ser negligente, pois de forma idêntica, caso venha a agitar o segundo recurso de embargos de declaração, seu destino pode ser o mesmo do mencionado recurso 09.0000.2021.000004-8/SCA-PTU, ou seja, a OAB não conhece do segundo embargos de declaração, aplica a regra processual do §3º do artigo 138 do Regulamento Geral e decreta o trânsito em julgado, fulminando a possibilidade de a parte discutir seu direito. Para esses casos, entendendo remanescer na decisão a ser recorrida os vícios autorizadores do recurso aclaratório após o primeiro recurso, deve a parte agitar o recurso ao ad quem, construindo preliminar de vício de fundamentação, que, caso deferida, em face da vedação do §6º, acarretará a invalidação do julgado, com a devolução dos autos para aprimoramento dos vícios de fundamentação.   O ponto de destaca das decisões acima é que muito embora os recursos aclaratórios tenham sido considerados manifestamente protelatórios, intempestivos ou carentes dos pressupostos legais para interposição, acabaram conhecidos por serem o primeiro recurso, com negativa de provimento a seus pedidos, ou seja, não se decretou o trânsito em julgado. Continua na parte 5... *Fale diretamente com o advogado e envie suas dúvidas por aqui (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira __________ 1 §3º Os embargos de declaração são dirigidos ao relator da decisão recorrida, que lhes pode negar seguimento, fundamentadamente, se os tiver por manifestamente protelatórios, intempestivos ou carentes dos pressupostos legais para interposição. 2 §1º O juízo de admissibilidade é do relator do órgão julgador a que se dirige o recurso, não podendo a autoridade ou órgão recorrido rejeitar o encaminhamento. 3 §6º Excetuando-se os processos ético-disciplinares, nos casos de nulidade ou extinção processual para retorno dos autos à origem, com regular prosseguimento do feito, o órgão recursal deve logo julgar o mérito da causa, desde que presentes as condições de imediato julgamento.
Nas linhas superadas foi realizada ampla exposição acerca dos aspectos materiais e adjetivos dos embargos de declaração no sistema OAB. Na Parte 1 foram fornecidas as balizas gerais de aplicação do recurso1 e na Parte 2 foram desenvolvidas formas de ataque das decisões eivadas de vícios de fundamentação, mesmo após a oposição do primeiro recurso aclaratório.2 Nesses casos, ou seja, para os embargos de declaração pertinentes, opostos em face de contradições, omissões, ambiguidades, obscuridades ou erros materiais, é obrigação do julgador aprimorar o julgado, fazendo substituir a decisão embargada por outra nova, integrativa, sob pena de sua invalidação, desde que, claro, a defesa saiba explorar corretamente a matéria perante a instância administrativa ad quem. Essas oposições, por certo, são o cenário ideal para qualquer processo em que as partes auxiliem o julgador a aprimorar sua decisão, todavia, pode-se afirmar com grande margem de certeza que no sistema OAB, muito mais frequentes, em praticamente todos os processos, são aqueles recursos: (a) impertinentes; (b) com pretensão revisional; (c) pedidos de reconsideração travestidos de recurso; além do claro (d) método procrastinatório. É muito comum que as decisões proferidas pelos julgadores dos Tribunais de Ética e Disciplina da OAB de todo país sejam bem elaboradas, claras e sem defeitos de fundamentação, o que deveria desafiar o recurso cabível à posterior instância ad quem, que pode eventualmente ser o órgão especial do Tribunal de Ética, da Câmara responsável pelo julgamento, do Conselho Pleno da seccional ou mesmo do Conselho Federal. Ocorre que, por estratégia processual, é usual às defesas opor embargos de declaração contra decisões perfeitas em fundamentação, que não apontem vício, mas sejam efetivamente agitados com as incorretas missões acima descritas, ou seja, rediscutir matérias já decididas via de pretensão revisional ou de reconsideração ou até mesmo para ganhar tempo, todas as hipóteses que deveriam desafiar o não conhecimento do recurso. O ponto em discussão é exatamente descortinar como deve agir o julgador quando identificar recurso de embargos de declaração com caráter meramente procrastinatório ou que não reúna os pressupostos legais para interposição, ou seja, quando o recurso não apontar contradições, omissões, ambiguidades, obscuridades ou erros materiais. Para essas situações, deverá o julgador negar conhecimento ao recurso, sem ingressar no mérito. Nenhuma vírgula de (re)análise. Simples assim. O fundamento é o § 3º do art. 138 do regulamento geral da OAB: Art. 138. À exceção dos embargos de declaração, os recursos são dirigidos ao órgão julgador superior competente, embora interpostos perante a autoridade ou órgão que proferiu a decisão recorrida. § 1º O juízo de admissibilidade é do relator do órgão julgador a que se dirige o recurso, não podendo a autoridade ou órgão recorrido rejeitar o encaminhamento. § 2º O recurso tem efeito suspensivo, exceto nas hipóteses previstas no Estatuto. § 3º Os embargos de declaração são dirigidos ao relator da decisão recorrida, que lhes pode negar seguimento, fundamentadamente, se os tiver por manifestamente protelatórios, intempestivos ou carentes dos pressupostos legais para interposição. § 4º Admitindo os embargos de declaração, o relator os colocará em mesa para julgamento, independentemente de inclusão em pauta ou publicação, na primeira sessão seguinte, salvo justificado impedimento. § 5º Não cabe recurso contra as decisões referidas nos §§ 3º e 4º. § 6º Excetuando-se os processos ético-disciplinares, nos casos de nulidade ou extinção processual para retorno dos autos à origem, com regular prosseguimento do feito, o órgão recursal deve logo julgar o mérito da causa, desde que presentes as condições de imediato julgamento. Como o recurso é direcionado para o próprio relator da decisão embargada, que, portanto, mantém sua competência e cognição plenas sobre o julgamento, caberá a essa autoridade a realização do crivo de admissibilidade recursal imposto pela segunda parte do § 3º. Bastará, assim, declarar que os embargos de declaração são inadmissíveis por faltarem ao recurso os requisitos legais para seu cabimento, ou seja, os defeitos de fundamentação que autorizam esse recurso no processo penal e no civil. É muito importante reforçar que embora o § 3º do art. 138 do regulamento geral possa levar o exegeta a entender que os embargos de declaração possam ser resolvidos de forma monocrática, essa interpretação é incorreta. Esse recurso deverá, sempre, ter julgamento colegiado. O julgado abaixo bem demonstra a afirmação. Os embargos de declaração são entendidos como protelatórios e não conhecidos, todavia, em julgamento colegiado que acolhe o voto do relator: Embargos de declaração. Ausência de omissão, contradição, obscuridade ou erro material no acórdão embargado. Irresignação da embargante. Embargos com caráter meramente protelatórios. 1) A decisão embargada encontra-se devidamente fundamentada, não havendo contradição, omissão ou obscuridade a ser sanada. 2) Nos termos da jurisprudência deste Conselho Federal os embargos de declaração não se prestam ao reexame do mérito do acórdão embargado, pelo órgão julgador prolator da decisão, tendo em vista seu caráter integrativo. 3) Pretendendo, pois, apenas o reexame de questões fáticas e enfrentando o mérito do acórdão embargado, constata-se o caráter manifestamente protelatório dos presentes embargos de declaração, porquanto não mais cabível recurso na esfera administrativa, e, conforme preconiza o art. 138, § 3º, do Regulamento Geral do EAOAB, tendo-os por manifestamente protelatórios, a hipótese e de negar-lhes seguimento. 4) Embargos de declaração não conhecidos, por ausência dos pressupostos legais para a sua interposição. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros do Órgão Especial do Conselho Pleno do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do regulamento geral, por unanimidade, em não conhecer dos embargos de declaração, nos termos do voto da Relatora. Impedido de votar o Representante da OAB/São Paulo. Brasília, 18 de setembro de 2017. Felipe Sarmento Cordeiro, Presidente em exercício. (RECURSO N. 49.0000.2014.014527-6/OEP - EMENTA 122/2017/OEP. Valentina Jungmann Cintra, Conselheira Relatora. DOU, S.1, 29.09.2017, p. 215) Vê-se, pois, que a expressão "dirigidos ao relator da decisão recorrida, que lhes pode negar seguimento" que consta do § 3º não está a modificar a sistemática recursal do processo disciplinar para dar ao relator poderes monocráticos para, sozinho, obstar a marcha processual de recurso por seu não conhecimento. Pelo contrário, a expressão existe para afastar dúvida quanto à competência legal para julgamento do recurso. É dizer que a decisão do § 3º que não conhece do recurso não é decisão monocrática, mas, contrariamente, voto a ser levado ao colegiado para julgamento coletivo. Ponto bastante interessante é o claro conflito entre o efeito do não conhecimento do recurso aclaratório e a perda do prazo para a interposição do recurso correto, que deveria ter sido agitado em lugar dos embargos declaratórios. (Continua na parte 4). *Fale diretamente com o advogado e envie suas dúvidas por aqui (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira ________ 1 CERQUEIRA, Antonio Alberto do Vale. Embargos de Declaração na OAB - Parte 1. Disponível aqui. 2 CERQUEIRA, Antonio Alberto do Vale. Embargos de declaração na OAB - Parte 2 - Quando o acórdão substitutivo não supre o defeito de fundamentação. Disponível aqui. Coluna: Processo Disciplinar no Sistema OAB e atualidades jurídicas;
Conforme exposto anteriormente1, os embargos de declaração no sistema OAB serão cabíveis tanto nas hipóteses do artigo 619 do Código de Processo Penal2, quanto na do 1.022 do Código de Processo Civil3, ambos pela aplicação do artigo 68 do EAOAB4: Nesses julgamentos administrativos há inúmeros casos de aclaratórios cabíveis e pertinentes que não são corretamente respondidos, ou seja, não há integração do decisum embargado que venha a corrigir os defeitos de fundamentação existentes e devidamente apontados. Isso acontece por diversas razões, todavia, a mais frequente é realmente o erro de procedimento, quando o juiz, o relator ou o Tribunal que tenha prolatado a decisão embargada não reconhece a pertinência dos embargos para aprimoramento de sua própria decisão, negando-se à reanálise da matéria e, por consequência, eivando o julgado por vício de fundamentação. Essa "saída" processual é muito conhecida dos advogados em sua atuação contenciosa no Judiciário, quando o Juiz ou o Tribunal proferem decisão que, nada obstante a relevância dos embargos de declaração opostos, limita-se à aerada declaração: " - conheço do recurso mas não entendo presentes omissões, contradições ou obscuridades, razão pela qual nego provimento ao pedido recursal". Nessas hipóteses, no processo disciplinar da OAB, o que deve fazer a defesa do representado? O primeiro ponto, que nunca é demais lembrar, é que o advogado que sofre o processo nunca, sob nenhuma hipótese, deve atuar em sua própria defesa, em autorrepresentação. É a pior das escolhas que pode fazer. Pois bem, voltando à questão acima, quando o acórdão substitutivo do TED conhecer os embargos, mas julgar improcedentes seus pedidos, deve a defesa opor novos aclaratórios, um segundo recurso que insista na apreciação da matéria, todavia, dessa vez, apontando como consequência a mácula ao artigo 138 caput do Regulamento Geral5, assim como ao item 11.3 do Manual de Procedimentos do Processo Ético-Disciplinar.6 Essa estratégia processual deve compelir o julgador a enfrentar a matéria. Caso, todavia, seja mantido o vício no novo acordão, a violação desses normativos deve constar como fundamento do recurso à próxima instância administrativa, com pedido preliminar de invalidação do julgado por violação dos princípios constitucionais que regem o direito de defesa. Aqui, o interesse recursal - preliminar - é puro: deve o recorrente ter como pretensão o retorno dos autos à instância superada, a quo, com a determinação de novo julgamento, para que sejam supridos os vícios de fundamentação apontados no novo recurso.   Interessante ponto é que, em regra, a OAB não reconhece a ausência de fundamentação como vício de procedimento apto à invalidação do julgado e retorno do processo às instâncias inferiores, especialmente em razão do que determina o artigo 138, §6º do Regulamento Geral, que insere nesse micro-ordenamento a teoria da causa madura, muito embora a norma expressamente excepcione o PAD. Essa regra adjetiva passou a integrar o Regulamento Geral via da Resolução 03/2019 do Conselho Federal da OAB, todavia, por desconhecimento, tem pouca aplicação no processo disciplinar.  § 6º Excetuando-se os processos ético-disciplinares, nos casos de nulidade ou extinção processual para retorno dos autos à origem, com regular prosseguimento do feito, o órgão recursal deve logo julgar o mérito da causa, desde que presentes as condições de imediato julgamento.  Isso se dá por duas razões: a primeira e principal é que as defesas, em regra, não apontam os vícios de fundamentação como erros de procedimento aptos à nulidade dos processos, por puro desconhecimento de como realizar essa arguição; a segunda é que muitas vezes os próprios julgadores da OAB aplicam o §6º em todos os processos, esquecendo-se que a norma expressamente exclui os processos disciplinares dos julgamentos pela causa madura. A razão é óbvia, porque, tratando-se de processos repressivos, tais julgamentos importam em supressão de instância, retirando do representado/recorrente uma fase recursal. Há, entretanto, uma exceção ao caso: quando o julgador da instância administrativa ad quem perceber que, de fato, houve vício de fundamentação na instância superada, mas, pelas provas dos autos entender possível o julgamento, poderá sim adentrar o mérito e resolver o PAD, desde que em benefício do representado. Nesses casos, entendemos que o princípio da razoável duração do processo pode superar a supressão de instância administrativa, desde que, claro, seja em benefício daquele que se defende. Exemplo dessa situação na jurisprudência: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Artigo 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Acórdão unânime do Conselho Seccional da OAB/São Paulo. Alegação de suspeição de membro julgador. Reiteração. Ausência de provas. Conduta incompatível com a advocacia (art. 34, XXV, EAOAB) e violação ao dever de urbanidade (arts. 44 e 45 do CED). Infrações ético-disciplinares devidamente comprovadas. Dosimetria. Gravidade dos fatos. Ausência de fundamentação. Readequação. Reincidência. Parcial provimento. 1) A suspeição é vício subjetivo de imparcialidade, devendo a parte comprovar, por meio de incidente próprio e oportuno, a violação à parcialidade pelo julgado, não sendo admissível apenas a tentativa de reforma do julgado por via reflexa. 2) Restaram devidamente comprovadas as infrações ético-disciplinares de manter conduta incompatível com a advocacia e violação ao dever de urbanidade, em razão dos ataques feitos pelo advogado a membros do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/São Paulo, tendo o advogado, inclusive, afirmado que os membros do Tribunal eram influenciados pela ideologia nazista. 3) A seu turno, no tocante à dosimetria, embora tenha a decisão de origem majorado a reprimenda com base na gravidade dos fatos, deixou de fundamentar em que termos se justificaria a majoração ao máximo legal, não havendo outra razão para exasperar a sanção disciplinar acima do mínimo legal, senão a reincidência, impondo-se a readequação da dosimetria. 4) Recurso parcialmente provido, para reduzir o prazo de suspensão para 60 (sessenta) dias e para afastar a multa cominada, mantendo, no mais, a condenação disciplinar de origem. (Recurso n. 25.0000.2022.000222-2/SCA-TTU. Relator: Conselheiro Federal Daniel Blume Pereira de Almeida (MA). EMENTA N. 127/2023/SCA-TTU DEOAB, a. 5, n. 1226, 10.11.2023, p. 61). Importantíssima ponderação é que, nesses casos, a avaliação de julgamento em benefício do representado é absolutamente subjetiva do relator, o que autorizará, sempre, o representado a recorrer desta decisão, buscando ratificar a expressa disposição do §6º já mencionado, para uma vez reconhecido o vício de fundamentação da decisão a quo, a OAB tenha que declarar a invalidação do julgamento, com o retorno dos autos à instância administrativa superada, ainda que tenha sido beneficiado pela decisão. Ainda sobre esse ponto e por último, se situação concreta dessa natureza advier em processo, o ideal é que o Relator, com fundamento no princípio da não-surpresa insculpido no artigo 144-B do Regulamento Geral7, abra vista à parte sujeita à aplicação da causa madura, em regra o representado, para que se manifeste informando se tem preferência pelo julgamento da causa que o favoreça ou se deseja a invalidação da decisão e retorno dos autos. Adotando essa postura, o Tribunal não surpreende a parte e lhe concede o poder de decidir seu destino no processo, dentre os possíveis. Desta forma, por exemplo, em um processo em que a acolhida da causa madura venha importar na revisão na dosimetria, de suspensão para censura, pode ser que seja mais interessante à parte que o processo retorne por vício de fundamentação, para que então desenvolva melhor eventual tese absolutória. *Fale diretamente com o advogado e envie suas dúvidas por aqui (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira __________ 1 CERQUEIRA, Antonio Alberto do Vale. Embargos de declaração na OAB - Parte 1. 2 Art. 619. Aos acórdãos proferidos pelos Tribunais de Apelação, câmaras ou turmas, poderão ser opostos embargos de declaração, no prazo de dois dias contados da sua publicação, quando houver na sentença ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão. 3 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material. 4 Art. 68. Salvo disposição em contrário, aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil, nessa ordem.  5 Art. 138. À exceção dos embargos de declaração, os recursos são dirigidos ao órgão julgador superior competente, embora interpostos perante a autoridade ou órgão que proferiu a decisão recorrida. 6 3. Os embargos de declaração devem ser admitidos nos casos de ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão na decisão embargada (art. 68, EAOAB, c/c art. 619, CPP). Caso a parte embargante postule a concessão de efeitos modificativos ou o relator considere ser a hipótese, ainda que não requerida pela parte, deverá conceder prazo para a parte contrária apresentar contrarrazões, exceto nos casos de processo disciplinar que tramite de ofício. 7 Art. 144-B. Não se pode decidir, em grau algum de julgamento, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar anteriormente, ainda que se trate de matéria sobre a qual se deva decidir de ofício, salvo quanto às medidas de urgência previstas no Estatuto.
quinta-feira, 5 de junho de 2025

Embargos de declaração na OAB - Parte 1

Processualmente há um consenso de que os embargos de declaração, no processo disciplinar, servem para aprimorar a decisão que confrontam, apontando omissões, contradições, obscuridades, ambiguidades ou erros materiais.  Exemplo clássico de cabimento desse recurso no processo civil é o esquecimento, pela sentença, do enfrentamento de eventual tese subsidiária que tenha composto o rol de pedidos, após o pedido principal; no processo penal, de forma idêntica, o recurso seria cabível quando, por exemplo, uma sentença condenatória fundamenta suas razões de decidir afirmando que o réu teria confessado a prática do crime, todavia, na fase da dosimetria, o decisum afirma não fazer o réu jus a nenhuma causa atenuante de pena, esquecendo-se da regra geral do art. 65, III, "d" do CP. Os dois exemplos tratam de omissão e contradição, mas ainda há situações em que serão verificadas ambiguidades, obscuridades ou erros materiais. Em todos esses casos, o recurso será cabível na OAB.  Na verdade, o que se aplicar às normas processuais e ao processo administrativo em regra, também se aplicará no sistema OAB, nas lacunas de seu micro-ordenamento jurídico. O recurso de embargos de declaração, embora sempre admitido de forma supletiva no processo disciplinar, passou a integrar o sistema normativo da OAB em 1994, no art. 138 do Regulamento Geral. Sua redação atual é a seguinte: Art. 138. À exceção dos embargos de declaração, os recursos são dirigidos ao órgão julgador superior competente, embora interpostos perante a autoridade ou órgão que proferiu a decisão recorrida.  § 1º O juízo de admissibilidade é do relator do órgão julgador a que se dirige o recurso, não podendo a autoridade ou órgão recorrido rejeitar o encaminhamento.  § 2º O recurso tem efeito suspensivo, exceto nas hipóteses previstas no Estatuto. § 3º Os embargos de declaração são dirigidos ao relator da decisão recorrida, que lhes pode negar seguimento, fundamentadamente, se os tiver por manifestamente protelatórios, intempestivos ou carentes dos pressupostos legais para interposição. § 4º Admitindo os embargos de declaração, o relator os colocará em mesa para julgamento, independentemente de inclusão em pauta ou publicação, na primeira sessão seguinte, salvo justificado impedimento. § 5º Não cabe recurso contra as decisões referidas nos §§ 3º e 4º. § 6º Excetuando-se os processos ético-disciplinares, nos casos de nulidade ou extinção processual para retorno dos autos à origem, com regular prosseguimento do feito, o órgão recursal deve logo julgar o mérito da causa, desde que presentes as condições de imediato julgamento. Em dezembro de 2022 a OAB lançou o Manual de Procedimentos do Processo Ético-Disciplinar, trazendo mais detalhes sobre a aplicação dos embargos de declaração nos processos disciplinares da casa: 11. RECURSOS (...) 3. Os embargos de declaração devem ser admitidos nos casos de ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão na decisão embargada (art. 68, EAOAB, c/c art. 619, CPP). Caso a parte embargante postule a concessão de efeitos modificativos ou o relator considere ser a hipótese, ainda que não requerida pela parte, deverá conceder prazo para a parte contrária apresentar contrarrazões, exceto nos casos de processo disciplinar que tramite de ofício. Como se observa, a norma não previu o cabimento em caso de erro material, todavia, por imprecisão ou esquecimento. Nesses casos, o recurso será plenamente cabível e deve ser conhecido e provido, com aplicação supletiva no CPC. Na verdade, será cabível na forma dos arts. 619 do CPP1 e 1.022 do CPC2, ambos pela aplicação do art. 68 do EAOAB: Art. 68. Salvo disposição em contrário, aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil, nessa ordem. Não há qualquer óbice para que se apliquem regras do processo civil aos PAD's da OAB, desde que exista eventual lacuna que não encontre solução do sistema normativo interno da Ordem dos Advogados do Brasil ou pelo regramento processual penal.  As hipóteses de cabimento, portanto, seguem os seguintes conceitos: Omissão: Presente quando o juiz deixa de apreciar ponto relevante da demanda3, por exemplo, no sistema OAB, tese de imunidade profissional não apreciada pela decisão.  Contradição: Ocorre quando afirmações constantes da decisão são opostas entre si4. Exemplo no PAD da OAB seria decisão que afirma que o representado prestou contas, todavia, à frente, o condena pelo art. 34, inciso XXI do EAOB. Obscuridade: Ocorre quando não há clareza na redação da decisão judicial, de modo que não é possível que se saiba, com certeza absoluta, qual é o entendimento exposto na decisão5. Exemplo na OAB seria decisão que em caso de ausência de prestação de contas aplica a extensão da pena até o pagamento da dívida, todavia, não deixa claro qual o valor da dívida. Sobre esse ponto, aliás, destaca-se a importância da declaração do valor da dívida em casos de suspensão por locupletamento e ausência de prestação de contas, conforme já foi tratado anteriormente (clique aqui para ler).6 Ambiguidade: Quando a decisão, em qualquer ponto, permite duas ou mais interpretações7. Exemplo prático seria em decisão interlocutória em PAD da OAB o relator da instrução declarar que as partes devem apontar as provas que desejam produzir, mas, ao mesmo tempo, dizer que entende todas impertinentes.  Erro material: É muito importante não confundir erro material com erro de julgamento. Os erros de julgamento não desafiam o recurso de embargos de declaração e estarão presentes quando a decisão não acolher a pretensão de uma das partes a desafiar recurso, ou seja, o erro de julgamento depende da visão da parte sobre o processo. Assim, por exemplo, em caso de condenação em PAD da OAB, o representado recorrerá ao órgão superior alegando exatamente o erro de julgamento, porque, em seu entender, o resultado deveria ser sua absolvição administrativa. Já o erro material é aquele que advém, por exemplo, de erros de cálculo, erros gramaticais, nomes incorretos e outros. Exemplo de erro material no PAD da OAB seria em processo em que figuram JOÃO e ADÃO como representante e representado respectivamente, a decisão, ao final, declara a aplicação de sanção disciplinar a JOÃO, "o representado", quando, em verdade, JOÃO é o representante. Nesse caso, seria cabível o recurso para a correção da decisão e substituição do nome da parte.   Quando o recurso aclaratório abordar um dos temas acima, deverá ser entendido como cabível e adequado, transformando-se em poderosa ferramenta não só para as partes, mas para o próprio Tribunal, pois realmente serve a seu propósito de aprimorar os julgados. [Continua na parte 2] *Fale diretamente com o advogado e envie suas dúvidas por aqui (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira _____________________ 1 Art. 619. Aos acórdãos proferidos pelos Tribunais de Apelação, câmaras ou turmas, poderão ser opostos embargos de declaração, no prazo de dois dias contados da sua publicação, quando houver na sentença ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão. 2 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material.  3 CERQUEIRA, Larissa Bezerra Luz do Vale. Curso de Direito Processual Penal. Belo Horizonte: Casa do Direito, 2023. p. 477; 4 Idem, ibidem;  5 LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. Volume Único. 13ª ed. Atual. e ampl. - São Paulo:  Editora JusPodivm, 2024. p 1.692; 6 CERQUEIRA, Antonio Alberto do Vale. O pagamento da dívida para fim da suspensão do art. 37, §2º, da lei 8.906/96 exige a inclusão de juros de mora contabilizados desde o evento danoso;  7 LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. Volume Único. 13ª ed. Atual. e ampl. - São Paulo:  Editora JusPodivm, 2024. p 1.692;
Antecipando a conclusão: não se trata de uma sessão de julgamento, mas de uma audiência una de instrução e julgamento. Já tivemos a oportunidade de trazer três artigos1-2-3 sobre os aspectos gerais da suspensão preventiva do advogado prevista no art. 70, §3º da lei federal 8.906/1994 (clique aqui para ler), todavia, nas linhas que seguem, tratar-se-á dos aspectos processuais ligados à matéria, especificamente sobre a sessão especial ou extraordinária.  Prevê o mencionado §3º que: § 3º O Tribunal de Ética e Disciplina do Conselho onde o acusado tenha inscrição principal pode suspendê-lo preventivamente, em caso de repercussão prejudicial à dignidade da advocacia, depois de ouvi-lo em sessão especial para a qual deve ser notificado a comparecer, salvo se não atender à notificação. Neste caso, o processo disciplinar deve ser concluído no prazo máximo de noventa dias. Exsurge claro pela análise da norma que há pouquíssima carga adjetiva em seu conteúdo, limitando-se à obrigação do órgão, Tribunal de Ética ou Conselho Federal a depender do cargo ocupado no sistema OAB (clique aqui para ler sobre competência), "ouvir" o advogado. Na verdade, a dinâmica da sessão é regulada pela resolução 2 de 2015 do Conselho Federal da OAB, o Código de Ética e Disciplina, cujo art. 63 determina: Art. 63. Na hipótese prevista no art. 70, § 3º, do EAOAB, em sessão especial designada pelo presidente do Tribunal, serão facultadas ao representado ou ao seu defensor a apresentação de defesa, a produção de prova e a sustentação oral. Como resta de clareza solar, a defesa deverá ser apresentada na sessão, podendo vir acompanhada de pedidos de provas e sustentação oral, ou seja, como não poderia deixar de ser, a OAB garante ao Advogado o exercício da ampla defesa e do contraditório. É imperioso ressaltar, contudo, que é raríssimo observar seu correto uso em referidas sessões, o que demonstra um desconhecimento processual por parte de muitos profissionais e a norma também deixa clara a dimensão processual do comando, garantindo à defesa, na sessão, três diferentes atos: (1º) a apresentação de sua defesa; (2º) a produção da prova, que poderá ser ampla e irrestrita, contemplando não só documentos, mas prova oral, incluída a inquirição do advogado e (3º) a sustentação oral da defesa. Nesse contexto, insta salientar a importância da correta utilização dos instrumentos processuais disponíveis, sob pena de prejuízo irreparável à defesa do advogado. A suspensão preventiva, por sua natureza cautelar, exige uma atuação célere e eficaz, com a apresentação de argumentos robustos e a produção de provas contundentes, capazes de infirmar a gravidade dos fatos imputados e a alegada repercussão prejudicial à dignidade da advocacia. Para se ter uma ideia da carente aplicação do instituto, no TED OAB/DF, durante os seis anos que dividem 2019 de 2024, foram realizadas dezenas de sessões de suspensão preventiva, todavia, em nenhuma delas, sem exceção, foi produzida prova oral. Na verdade, aqui um desabafo, é impressionante ver o amadorismo como muitos advogados submetidos a tão grave procedimento lidam com a situação. Na grande maioria das vezes: (a) não se apresentam à sessão e deixam que o Tribunal decida sozinho seu destino e sua carreira; em outras, (b) em vez de contratarem um dos raros profissionais especializados na matéria, convocam um amigo ou colega de escritório para comparecer à sessão e "quebrar o galho" ou "fazer um favor", com o perdão do coloquialismo; e ainda há aqueles que (c) incrivelmente optam pela autorrepresentação, essa sim, a pior das escolhas. Por essa exata razão, os TEDs estão acostumados ao tratamento da sessão especial de suspensão preventiva como o julgamento de um processo pautado, ou seja, de acordo com o artigo 94, incisos I e II do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB: Art. 94. O julgamento de qualquer processo ocorre do seguinte modo: I - leitura do relatório, do voto e da proposta de ementa do acórdão, todos escritos, pelo relator; II - sustentação oral pelo interessado ou seu advogado, com o prazo de 15 minutos, a qual, em se tratando de embargos de declaração, somente será admitida se estes tiverem efeitos infringentes, caso em que a sustentação se dará no limite de cinco minutos, tendo o respectivo processo preferência no julgamento; III - discussão da matéria, dentro do prazo máximo fixado pelo Presidente, não podendo cada conselheiro fazer uso da palavra mais de uma vez nem por mais de três minutos, salvo se lhe for concedida prorrogação; IV - votação da matéria, não sendo permitidas questões de ordem ou justificativa oral de voto, precedendo as questões prejudiciais e preliminares às de mérito; V - a votação da matéria será realizada mediante chamada em ordem alfabética das bancadas, iniciando-se com a delegação integrada pelo relator do processo em julgamento; VI - proclamação do resultado pelo presidente, com leitura da súmula da decisão. É fundamental compreender que a aplicação do art. 94 do Regulamento Geral, embora possa parecer uma prática consolidada, não se coaduna com a natureza da sessão especial de suspensão preventiva. Esta, por sua essência, demanda uma instrução probatória ampla e aprofundada, com a produção de todas as provas admitidas em direito, para que o Tribunal possa formar seu convencimento de forma segura e justa. E é exatamente essa a razão pela qual vão se acumulando em pilhas os casos de suspensão preventiva de advogados, exatamente porque não sabem como se defender, e, de fato, não se defendem. Não é preciso declarar, porque conclusão lógica, a importância estratégica da sessão especial de suspensão preventiva para o processo disciplinar do advogado que tramita paralelamente à medida cautelar. Ora, eventual aplicação da gravíssima e radical cautelar de noventa dias significa um enorme passo à sua futura condenação, porque a prática revela que dificilmente o Tribunal voltará atrás de sua posição originária, que entendeu os fatos graves o suficiente para aplicar a medida cautelar de afastamento. É, portanto, inarredável se admitir o quão crucial é a elaboração de defesa contundente nesse delicado momento, que antecede o processo principal. Ainda que a advocacia não saiba como aplicar com precisão os mecanismos de defesa no sistema OAB, o mais correto é que os TEDs tenham, analogamente, a sessão extraordinária do art. 70, §3º do EAOAB como a audiência de instrução una prevista entre os arts. 400 e 405 do CPP, sendo essa a amplitude do art. 63 supratranscrito, devendo o Tribunal estar preparado para receber e analisar a defesa do advogado, para realizar a instrução completa do feito, ouvir a sustentação oral e só depois julgar a matéria. *Fale diretamente com o advogado e envie suas dúvidas por aqui (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira 1 Disponível aqui.  2 Disponível aqui.  3 Disponível aqui. 
A OAB - Ordem dos Advogados do Brasil, munus publicum essencial à administração da Justiça e esteio do Estado Democrático de Direito, alicerça sua atuação em um robusto sistema ético, cuja observância irrestrita garante a legitimidade e a credibilidade de seus atos, inclusive e, sobretudo, em seus processos internos. Nesse cenário, o art. 33 do CED/OAB - Código de Ética e Disciplina assume protagonismo, erigindo uma barreira intransponível à atuação de seus membros em processos que tramitam perante a entidade. A dicção do preceito normativo não deixa margem para dúvidas: Art. 33. Salvo em causa própria, não poderá o advogado, enquanto exercer cargos ou funções em órgãos da OAB ou tiver assento, em qualquer condição, nos seus Conselhos, atuar em processos que tramitem perante a entidade nem oferecer pareceres destinados a instruí-los. Parágrafo único. A vedação estabelecida neste artigo não se aplica aos dirigentes de seccionais quando atuem, nessa qualidade, como legitimados a recorrer nos processos em trâmite perante os órgãos da OAB.   A primeira ilação que se extrai da leitura atenta do art. 33 reside na amplitude da vedação. A expressão "perante a entidade" possui um alcance que transcende os limites da seccional em que o advogado possui assento. Compreende toda a estrutura orgânica da OAB, englobando o Conselho Federal (CFOAB), todas as seccionais e as subseções. Essa extensão é corolário lógico da necessidade de assegurar a mais absoluta imparcialidade em qualquer instância decisória da Ordem, afastando qualquer suspeita de tratamento diferenciado ou influência indevida, que poderia macular a lisura dos procedimentos. A ratio legis que subjaz ao art. 33 é a consagração do princípio da imparcialidade como pilar fundamental da atuação da OAB. Permitir que advogados vinculados à OAB atuem em processos internos da entidade criaria um ambiente propício a conflitos de interesse e colocaria em xeque a equidade dos julgamentos. A própria percepção da advocacia e da sociedade sobre a lisura dos processos seria inevitavelmente comprometida. Assim, da mesma forma que a vedação tem abrangência nacional para qualquer OAB, o mesmo ocorre com os cargos, sendo vedada a atuação para qualquer deles, ou seja, diretores, conselheiros, funcionários e especialmente membros das Comissões. Nesse diapasão, a autorizada voz de Paulo Lobo ressoa com particular pertinência: "O advogado, no exercício de qualquer função ou cargo na OAB, deve zelar pela sua dignidade e independência, pela respeitabilidade da instituição e pela valorização da advocacia."1 Embora o excerto trate de deveres gerais, a vedação imposta pelo art. 33 é uma manifestação específica da necessidade de preservar a independência e a dignidade dos membros da OAB no âmbito de seus processos internos, assegurando a respeitabilidade da instituição. A interpretação da expressão "atuar em processos que tramitem perante a entidade" deve ser ampla, abrangendo qualquer forma de participação que possa influenciar o curso ou o resultado do feito. Isso inclui, evidentemente, atos que não sejam propriamente de peticionar, como a apresentação de memoriais, a realização de sustentação oral e qualquer outra intervenção que configure defesa de interesses. De igual modo, a proibição de "oferecer pareceres destinados a instruí-los" visa evitar que a opinião de membros com poder de influência direcione as decisões dos órgãos julgadores. A pretensão do legislador administrativo é muito clara, o Código de Ética e Disciplinar deseja: (a) prevenir conflitos de interesse: ao impedir que membros da OAB com poder de influência atuem em processos internos, a norma busca evitar situações em que seus interesses pessoais ou de terceiros possam se sobrepor ao interesse público da Ordem e da advocacia; (b) assegurar a credibilidade da OAB: a imparcialidade nos processos internos é fundamental para manter a confiança da advocacia e da sociedade na integridade e na justiça das decisões da OAB; (c) promover a igualdade entre os advogados: a vedação também contribui para evitar que alguns advogados, em razão de seus cargos ou funções na OAB, possuam vantagens indevidas em processos disciplinares ou administrativos; (d) evitar  concorrência desleal: a atuação de membros da OAB em processos internos poderia configurar uma forma de concorrência desleal, utilizando a influência e o acesso à informação para patrocinar ou angariar causas; (e) manter a independência dos membros da OAB: a norma visa proteger a independência daqueles que exercem cargos na OAB, evitando que sua atuação profissional externa possa ser influenciada por sua posição institucional ou vice-versa; e, por último, (f) preservar a dignidade da instituição: ao evitar potenciais conflitos e assegurar a imparcialidade, o artigo 33 contribui para a manutenção da dignidade e da respeitabilidade da Ordem dos Advogados do Brasil. O parágrafo único do art. 33 excepciona a regra do caput nas hipóteses em que os dirigentes das Seccionais ou do Conselho Federal têm que atuar como legitimados a recorrer nos processos em trâmite perante os órgãos da OAB, como ocorre, por exemplo, no artigo 85, §1º do Regulamento Geral da OAB2, onde se autoriza o presidente do Conselho Federal a apresentar recurso de eventual decisão ao Órgão Especial. A mens legis dessa exceção reside na prerrogativa institucional conferida aos presidentes das seccionais de defender os interesses da advocacia e da própria OAB, exercendo o direito de recorrer em grau superior para garantir a uniformidade da jurisprudência interna e a correta aplicação das normas. Essa atuação, exercida pro institutione, não se confunde com a defesa de interesses particulares em processos disciplinares ou administrativos. A transgressão da vedação imposta pelo art. 33 acarreta sérias implicações éticas e práticas e pode configurar graves faltas disciplinares, inclusive sujeitando o advogado à exclusão dos quadros da advocacia, a depender do modus operandi utilizado. Assim, por exemplo, se conseguiu o cliente devido a seu cargo e lhe prometeu usar dessa influência para alterar o resultado do julgamento, tendo, de fato, atuado dessa forma, extrapolando a atuação nos autos e se utilizando de suas conexões para o próprio benefício, nos parece se tratar de caso gravíssimo, que tangenciaria a própria idoneidade do advogado, o que o sujeitaria a processo disciplinar apto à sua exclusão dos quadros da Ordem. Para dizer o mínimo, a utilização da influência e do acesso privilegiado à informação, decorrentes do exercício de cargos ou funções na OAB para patrocinar causas perante a própria entidade, seria conduta repulsiva e vil, a ser severamente repudiada e combatida. A OAB não é lar para a corrupção, de qualquer natureza. Seria, analogamente e interna corporis conduta análoga à do crime de advocacia administrativa3 previsto no art. 321 do Código Penal. Nada suficiente, por óbvias razões, acarretará a nulidade de todo o processo, como já decidiu o CFOAB: Recurso 16.0000.2023.000128-7/SCA-TTU. EMENTA N. 171/2024/SCA-TTU. Recurso ao Conselho Federal da OAB. Revisão de processo disciplinar. Art. 73, § 5º, EAOAB. Representação patrocinada por membro de OAB. Vedação. Integrante de Comissão à época da representação. Posterior exercício do mandato de Conselheira Seccional, sem renúncia aos poderes anteriormente outorgados. Art. 33 CED. Recurso parcialmente provido, para acolher a preliminar arguida e declarar nulo o processo disciplinar 6663/2012 desde a representação, e, em consequência, declarar prescrita a pretensão punitiva. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da 3ª turma da Segunda Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em dar parcial provimento ao recurso, e, consequentemente, declarar extinta a punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva, nos termos do voto do Relator. (Relator: Conselheiro Federal Jader Kahwage David (PA). DEOAB, a. 6, n. 1448, 27.09.2024, p. 41). Em conclusão, a imperatividade do art. 33 do Código de Ética e Disciplina da OAB é um pressuposto inarredável para a manutenção da integridade e da credibilidade do sistema OAB em sua totalidade.  A vedação imposta aos advogados que exercem cargos ou funções em qualquer órgão de todo o sistema OAB para nele atuar visa assegurar a mais absoluta imparcialidade nos processos internos, afastando qualquer possibilidade de influência indevida e garantindo a isonomia entre os membros da advocacia. A observância estrita desta norma não apenas fortalece a ética profissional, mas também coíbe práticas de concorrência desleal, preservando a confiança da classe e da sociedade na Ordem dos Advogados do Brasil. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira __________ 1 LOBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 15ª. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2023, p. 85. 2 § 1º Os recursos ao Órgão Especial podem ser manifestados pelo Presidente do Conselho Federal, pelas partes ou pelos recorrentes originários. 3 Art. 321 - Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário: Pena - detenção, de um a três meses, ou multa. Parágrafo único - Se o interesse é ilegítimo:Pena - detenção, de três meses a um ano, além da multa.
A revogação tácita da notificação pessoal ao advogado, art. 137-D, §1º do regulamento geral da OAB - (Necessidade de interpretação conforme a Constituição após o DEOAB) Conforme já tratado acerca da retrógrada forma de notificação por AR ao advogado representado, são inúmeros os problemas decorrentes da aplicação do art. 137-D, §1º do regulamento geral da OAB. Essa notificação é realizada, em regra, após a admissão do feito, para dar efetivo início do processo disciplinar contra o advogado. Art. 137-D A notificação inicial para a apresentação de defesa prévia ou manifestação em processo administrativo perante a OAB deverá ser feita através de correspondência, com aviso, enviada para o endereço profissional ou residencial constante do cadastro do conselho seccional.§ 1º Incumbe ao advogado manter sempre atualizado o seu endereço residencial e profissional no cadastro do conselho seccional, presumindo-se recebida a correspondência enviada para o endereço nele constante. Com a experiência de seis anos na presidência do TED OAB/DF, pode-se afirmar que grande percentual dos AR's enviados não alcança seus destinatários, haja vista ser bastante comum que com o passar do tempo o cadastro do advogado fique desatualizado junto à OAB, seja, por exemplo, porque se mudou de endereço; porque fechou o escritório para trabalhar em home office ou infinitas outras situações. Outro fato extremamente comum é que a correspondência AR chegue ao endereço cadastrado, mas acabe sendo recebida por terceiro, que pode ser um porteiro, um trabalhador de condomínio ou até um vizinho gentil. Em todos esses casos, em claro prejuízo da defesa, aplica-se até hoje a regra processual do §1º acima transcrita, tornando válida a notificação e onerando muito mais a OAB, motivada pela intensa atuação de defensores dativos, com teses genéricas. A controversa aplicação do dispositivo, entretanto, já foi enfrentada inúmeras vezes pelo Conselho Federal da OAB, que sempre a validou: RECURSO 49.0000.2014.009763-4/SCA-TTU. EMENTA 024/2015/SCA-TTU. Recurso ao Conselho Federal. Intempestividade. O prazo recursal de 15 dias estabelecido no art. 139 do Regulamento Geral se inicia da data do recebimento da notificação anotada pelo Correio. (...) Não suspende ou prorroga o prazo a entrega tardia da intimação pelo Correio recebida na portaria do prédio onde está localizado o escritório do recorrente, por atraso de um terceiro. As intimações oriundas dos correios não serão entregues pessoalmente quando o prédio possuir pessoa responsável por sua distribuição entre os condôminos das salas comerciais. A demora do recorrente em retornar ao seu escritório, não suspenderá ou obstará os prazos processuais de fluírem. Culpa exclusiva do recorrente (...). (Conselheira Federal Valéria Lauande Carvalho Costa (MA), DOU, S.1, 25/3/15, p. 136/138). Essa interpretação mais rígida à comunicação dos atos processuais do advogado decorreu de política administrativa da OAB e foi inegavelmente necessária e acertada, razão pela qual não se discute aqui a mais valia da imposição legal do art. 137-D, §1º do RG OAB, assim como a posição jurisprudencial do sistema OAB quanto à valoração do citado artigo, entretanto, deve-se admitir que esse entendimento importa em grave prejuízo à defesa e à qualidade do processo. Importante pontuar que não fosse esse entendimento, milhares de processos disciplinares teriam se perdido pela prescrição, razão pela qual, uma vez mais, é pertinente ratificar que a jurisprudência do CFOAB estava correta. Ocorre que doravante o advento do DIÁRIO ELETRÔNICO DA OAB, criado pela lei 13.688/18, não mais se justifica a rígida interpretação, que agora deve passar a autorizar a notificação pela publicação do edital eletrônico em homenagem à ampla defesa e ao contraditório. Essa publicação e sua regulamentação pelo Conselho Federal1 são realizadas por publicação em órgão oficial, conforme o art. 137-D, §4º do regulamento geral: § 4º As demais notificações no curso do processo disciplinar serão feitas através de correspondência, na forma prevista no caput deste artigo, ou através de publicação na imprensa oficial do Estado ou da União, quando se tratar de processo em trâmite perante o Conselho Federal, devendo, as publicações, observar que o nome e o nome social do representado deverão ser substituídos pelas suas respectivas iniciais, indicando-se o nome completo do seu procurador ou os seus, na condição de advogado, quando postular em causa própria. E é exatamente nesse ponto onde se vê a mais valia da ferramenta eletrônica, pois publicada notificação em seu nome, o advogado vem aos autos tomar ciência do quanto é acusado, anulando as intermináveis preliminares processuais dos PAD's da OAB acerca de vício na notificação, ou seja, ganham todos. Nos dias de hoje, o envio de correspondência pelo correio é procedimento atrasado, arcaico, dispendioso, em desuso e o mais grave: tem menos eficácia que a via eletrônica. Por essa exata razão, também é hora de mudar o entendimento quanto à presunção de recebimento do AR prevista na segunda parte do dispositivo legal em comento. De forma a reforçar essa ideia, importante lembrar que a lei 14.195/21 alterou a redação do art. 246 do CPC2 para tornar a citação eletrônica a preferencial no rito do processo civil brasileiro, sendo os correios apenas a modalidade supletiva na forma do §1º-A, inciso I do mesmo artigo3, ou seja, todo o exposto impõe que também a OAB venha a evoluir sua forma de notificação ao advogado. Em conclusão, após o advento do DEOAB decorrente da lei 13.688/18 e em homenagem ao direito à ampla defesa e ao contraditório encampado no art. 5º, LV da Constituição Federal brasileira4, nas hipóteses em que o AR de notificação inicial do art. 137-D, §1º do regulamento geral da OAB não alcançar diretamente o advogado representado, deve ter dada interpretação restritiva conforme a Constituição à presunção, tornando obrigatória a publicação do edital previsto no §2º e assegurando, assim, por dupla via, a validade da notificação originária. § 2º Frustrada a entrega da notificação de que trata o caput deste artigo, será a mesma realizada através de edital, a ser publicado no Diário Eletrônico da OAB. 1 Provimentos 182/18 e 183/18 do CFOAB. 2 Art. 246. A citação será feita preferencialmente por meio eletrônico, no prazo de até dois dias úteis, contado da decisão que a determinar, por meio dos endereços eletrônicos indicados pelo citando no banco de dados do Poder Judiciário, conforme regulamento do Conselho Nacional de Justiça. 3 § 1º-A A ausência de confirmação, em até três dias úteis, contados do recebimento da citação eletrônica, implicará a realização da citação: I - pelo correio. 4 LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
Como já mencionado em outras oportunidades é bastante comum o desconhecimento das nuances do processo administrativo disciplinar da OAB não só para a população, mas para a própria advocacia.  A título de exemplo, nos processos judiciais em que antigos clientes que representaram advogados no Tribunal de Ética e Disciplina por ato de locupletamento ingressam com ações cíveis para ressarcimento de seus prejuízos, nunca se vê, entre tais iniciativas, a utilização de outras ações da mesma natureza como prova subsidiária de um modus operandi ou comportamento reiterado, mas muito pelo contrário, tal iniciativa é praticamente inédita.  Isso não é feito porque o atual advogado da parte lesada, que patrocina a ação cível e a ação disciplinar, desconhece que pode ter acesso aos processos disciplinares findos contra o representado/requerido. Nas ações indenizatórias dessa natureza contra advogado, o magistrado a julgar o feito sempre se vê diante de um difícil dilema sobre os fatos que julga, duvidoso entre as alegações do antigo cliente e do profissional que se defende, que, claro, terá contundentes argumentos para sua defesa, como acerto de honorários verbal acima do pactuado em contrato; compensação de créditos adiantados; pagamento de outras atuações e inúmeras outras teses de grande relevância.  Em regra, são ações longas e difíceis de se vencer, que exigem a atuação de advogados capacitados e acostumados com a lida com esse tipo de processo.  Ora, nesses casos, certamente seria um grande reforço à atividade judicante daquele que julga o feito ter como prova, por exemplo, diversos outros casos em que o mesmo advogado respondeu pela mesma falta disciplinar.  Isso posto, não se olvida quanto ao sigilo dos processos disciplinares no sistema OAB, nos termos do art. 72 da lei Federal 8.906/94, entretanto, aqui se destaca a expressão "até seu término" que consta do §2º: Art. 72. O processo disciplinar instaura-se de ofício ou mediante representação de qualquer autoridade ou pessoa interessada. § 1º O Código de Ética e Disciplina estabelece os critérios de admissibilidade da representação e os procedimentos disciplinares. § 2º O processo disciplinar tramita em sigilo, até o seu término, só tendo acesso às suas informações as partes, seus defensores e a autoridade judiciária competente. Como se vê pela inequívoca redação, o sigilo dos autos terá sua duração até o trânsito em julgado administrativo do feito, devendo, a posteriori, ser aberto seu acesso às partes que o solicitarem. 
É bastante comum que advogados reclamem da divulgação de seus nomes nos processos disciplinares do sistema OAB. Afirmam tratar-se de violação de sua privacidade, exposição da intimidade e prejuízo profissional, todavia, claramente, há um enorme desconhecimento da norma no que toca à matéria.  O primeiro ponto, todavia, é se destacar que nesses casos o advogado está realizando sua própria defesa, um dos maiores erros que pode cometer. Daí, se seu nome não é divulgado, sustenta como tese a violação da ampla defesa, porque não tomou conhecimento do processo disciplinar, no que obviamente lhe assiste razão. Confira-se: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Notificações. Art. 137-D do Regulamento Geral. As notificações, no curso do processo disciplinar, podem ser feitas através de publicação no Diário Eletrônico da OAB, devendo, as publicações observar que o nome e o nome social do(a) representado(a) deverão ser substituídos pelas suas respectivas iniciais, indicando-se o nome completo do(a) procurador(a) ou os seus, na condição de advogado(a) em causa própria. Assim, veiculando-se publicação da qual não constou o nome da advogada por extenso, eis que patrocinava a defesa em causa própria, tem-se a nulidade do ato de notificação. Anulação do processo disciplinar desde a publicação de fls. 240. (...) (Recurso n. 25.0000.2023.000076-4/SCA-PTU. EMENTA 113/24/SCA-PTU. Relator: Conselheiro Federal Caio Cesar Vieira Rocha (CE). (DEOAB, a. 6, n. 1401, 23.07.2024, p. 4). Como muitas vezes já afirmado, não há local mais preciso para a aplicação do entendimento de que todo advogado que atua em causa própria tem em seu cliente o maior dos tolos, haja vista que a pessoalidade de sentimentos no processo é extremamente desvantajosa para a boa técnica, sem falar no constrangimento para despachos, sustentação oral e outros atos que obrigatoriamente uma boa defesa deve agregar, e que são altamente prejudicados quando o próprio representado é o advogado. Ora, hipoteticamente, basta imaginar situação em que advogado representado é acusado de agredir brutalmente colega de trabalho, advogada. Embora os julgadores dos tribunais de ética de todo o país mereçam todos os elogios, pois exercem trabalho de tamanha responsabilidade de forma graciosa, é inegável se admitir certo constrangimento em tal ato, que só prejudica a defesa.  Pois bem, diante do "dilema" acima, ou seja, publicar o nome do advogado nos processos disciplinares para preservar a ampla defesa ou não publicar, a OAB nunca teve escolha, sendo, claro, a única opção possível a primeira, pois garantir o contraditório é o pilar de todo processo em um estado democrático de direito, sendo, no Brasil, garantia fundamental da pessoa humana. Com tais parâmetros foi que o Conselho Federal da OAB criou o art. 137-D do regulamento geral, cujo §4º dá solução ao caso: § 4º As demais notificações no curso do processo disciplinar serão feitas através de correspondência, na forma prevista no caput deste artigo, ou através de publicação na imprensa oficial do Estado ou da União, quando se tratar de processo em trâmite perante o Conselho Federal, devendo, as publicações, observarem que o nome do representado deverá ser substituído pelas suas respectivas iniciais, indicando-se o nome completo do seu procurador ou o seu, na condição de advogado, quando postular em causa própria.  É a última parte do parágrafo que bem explica a solução aplicada pela OAB. Em todas as publicações dos processos disciplinares em que o advogado estiver atuando em causa própria e realizado sua autodefesa, seu nome será publicado duas vezes. A primeira, completo, como advogado. A segunda, só com as iniciais, como representado.  Não se olvida que referida publicação pode, de fato, expor o advogado, pois ao mais atento que realizar pesquisas de publicações por seu nome pode realmente encontrar o PAD, realizado a correlação com as iniciais, todavia, não há alternativa à OAB, cuja norma apenas e tão somente seguiu a lógica legal de publicações, respeitando os princípios maiores da publicidade, do contraditório e da ampla defesa. A norma é corretíssima no ponto. Isso posto, o ensinamento é que não bastasse ser altamente desaconselhável que o advogado opte pela autorrepresentação em processos disciplinares, de fato seu nome será exposto em processos em que atuar em causa própria, recomendando-se, sempre, a contratação de profissional técnico e capacitado (afinal é o nome e a carreira do representado que está em jogo) para o patrocínio de sua defesa.
O anonimado não é bem recebido no ordenamento jurídico brasileiro, conforme faz constar o art. 5º, inciso IV da CF/881. No sistema OAB não é diferente, pois há expressa previsão legal no código de ética e disciplina que declara não se considerar fonte idônea aquela que consistir em denúncia anônima: Art. 55. O processo disciplinar instaura-se de ofício ou mediante representação do interessado. § 1º A instauração, de ofício, do processo disciplinar dar-se-á em função do conhecimento do fato, quando obtido por meio de fonte idônea ou em virtude de comunicação da autoridade competente. § 2º Não se considera fonte idônea a que consistir em denúncia anônima. Em recente decisão o CFOAB ratificou a dimensão da expressão "fonte idônea" que consta do §2º acima transcrito, declarando que o processo com fundamento em denúncia anônima violaria o direito de defesa, fulminando, assim, a pretensão punitiva administrativa a gerar o arquivamento. Recurso ao Conselho Federal da OAB. Denúncia anônima. Vedação. Recurso provido. 1) A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso IV, assegura a todos a livre manifestação do pensamento, vedando o anonimato. Referida norma constitucional encontrava-se reproduzida no art. 51 do Código de Ética e Disciplina da OAB anterior, e, atualmente, está regulada pelo artigo 55, § 2º, do Código de Ética e Disciplina da OAB, a qual dispõe que não se constitui em prova idônea aquela que tiver por origem exclusivamente a denúncia anônima. 2) No caso dos autos, o processo disciplinar foi instaurado de ofício, com base em cópias de páginas de site de internet, sem informações a respeito de eventuais diligências realizadas e da origem dos documentos, constituindo-se situação de instauração de processo disciplinar em decorrência de denúncia anônima, restando prejudicado o exercício do contraditório e da ampla defesa. 3) Recurso provido, para determinar o arquivamento do processo disciplinar. (Recurso n. 49.0000.2023.005172-8/SCA-PTU. EMENTA N. 195/2024/SCA-PTU. Relator: Conselheiro Federal Ricardo Souza Pereira (MS). DEOAB, a. 6, n. 1444, 23.09.2024, p. 26). No mesmo sentido: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Artigo 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Acórdão unânime do Conselho Seccional da OAB/Minas Gerais. Revisão de processo disciplinar. Art. 73, § 5º, EAOAB c/c art. 68 CED. Denúncia anônima. Vedação. Recurso provido. 1) A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso IV, assegura a todos a livre manifestação do pensamento, vedando o anonimato. Referida norma constitucional encontrava-se reproduzida no artigo 51 do Código de Ética e Disciplina da OAB anterior, e, atualmente, está regulada pelo artigo 55, § 2º, do Código de Ética e Disciplina da OAB, a qual dispõe que não se constitui em prova idônea aquela que tiver por origem exclusivamente a denúncia anônima. 2) No caso dos autos, o processo disciplinar foi instaurado de ofício, por Presidente de Subseção da OAB, ao fundamento de que recebeu diversas denúncias de outros advogados imputando aos advogados ora recorrentes a prática de diversos atos de angariação de causas por meio de publicidade irregular e, embora tenha declinado o Presidente da Subseção que houve a apuração, não constam dos autos documentos ou elementos relativos às diligências eventualmente instauradas, apenas a relação de processos judiciais patrocinados pelos advogados, retirada do site do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, bem como um panfleto apócrifo, sem identificação ou menção aos advogados, não permitindo concluir que fora por eles confeccionado, circunstâncias que ensejariam, na origem, a não instauração de processo disciplinar. 3) Recurso provido, para deferir a revisão do processo disciplinar n. 9117/2014 e ali julgar improcedente a representação, determinando-se o arquivamento dos autos. (Recurso n. 49.0000.2021.010050-1/SCA-STU. EMENTA N. 026/2023/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal Luiz Augusto Reis de Azevedo Coutinho (BA). DEOAB, a. 5, n. 1074, 03.04.2023, p. 18). De outro lado, a jurisprudência também se coloca favorável ao papel dos tribunais de ética ao atuarem de ofício, com impulsionamento próprio, na forma do quanto prescrevem os art. 70, §1º e 72 do EAOAB: Art. 70. O poder de punir disciplinarmente os inscritos na OAB compete exclusivamente ao Conselho Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração, salvo se a falta for cometida perante o Conselho Federal. § 1º Cabe ao Tribunal de Ética e Disciplina, do Conselho Seccional competente, julgar os processos disciplinares, instruídos pelas Subseções ou por relatores do próprio conselho.  Art. 72. O processo disciplinar instaura-se de ofício ou mediante representação de qualquer autoridade ou pessoa interessada. Confira-se a posição do Conselho Federal: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Artigo 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Acórdão unânime do Conselho Seccional da OAB/São Paulo. Composição de órgão julgador recursal. Participação de Conselheiros Seccionais suplentes. Possibilidade. Inexistência de nulidade. Diferentemente deste Conselho Federal da OAB, no âmbito dos Conselhos Seccionais da OAB os Conselheiros Seccionais suplentes, ao tomarem posse, são detentores dos mandatos de Conselheiros Seccionais nas mesmas condições que os titulares. O tema de relevância citado pelos advogados, no julgamento realizado pela Segunda Câmara do Conselho Federal da OAB, não tem a ver com a vedação à convocação de conselheiros suplentes para composição de órgãos julgadores, mas sim que sejam valorados apenas os votos proferidos em processo de exclusão e desfavoráveis ao advogado, circunstância diversa do presente caso. Arguição de nulidade sob a alegação de tratar-se de denúncia anônima. Inexistência. Processo disciplinar instaurado de ofício, devidamente instruído pelo Presidente do TED com página de site comprovando a publicidade irregular. Violação ética de conhecimento público e poder-dever da OAB de apurar a conduta de seus inscritos. Teor das publicações veiculadas que não foram contestadas. Angariação de causas (Art. 34, IV, EAOAB), por meio da rede social facebook. Infração disciplinar configurada. Inobstante qualquer regulamentação específica, o Código de Ética e Disciplina da OAB já assevera que a publicidade profissional do advogado tem caráter meramente informativo e deve primar pela discrição e sobriedade, não podendo configurar captação de clientela ou mercantilização da profissão (art. 39, CED), o que restou constatado nos autos. Recurso não provido. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da Primeira Turma da Segunda Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em rejeitar a preliminar arguida e no mérito negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, com os acréscimos do Conselheiro Stalyn Paniago Pereira (MT). Brasília, 27 de fevereiro de 2024. Rafael Braude Canterji , Presidente em exercício. Lara Diaz Leal Gimenes, Relatora ad hoc. (Recurso n. 25.0000.2022.000587-7/SCA-PTU EMENTA N. 027/2024/SCA-PTU. Relator: Conselheiro Federal Márcio Brotto de Barros (ES). DEOAB, a. 6, n. 1315, 20.03.2024, p. 7). Exsurge, portanto, a óbvia dúvida: quais os limites para atuação de ofício e em que situações estar-se-ia diante de denúncias anônimas, e, portanto, inválidas. A solução é simples. Os Tribunais de Ética e Disciplina de todo o país recebem diariamente centenas de denúncias de violações ético disciplinares e têm, como dever, apurar seu conteúdo. Pois bem, para alguns casos, não há se falar em anonimato, como em representações realizadas por autoridades, representações formalizadas por uma parte etc. O problema reside sempre nos casos em que o tribunal toma conhecimento de alguma irregularidade e instaura o procedimento preliminar sem a devida investigação, sem os cabíveis registros, configurando, assim, de fato, violações à necessária transparência do processo. É o caso, com recorrência, da publicidade irregular realiza em redes sociais e sites patrocinados, como o google ads. Nesses casos, a depender da construção do processo, haverá a violação do direito de defesa por via indireta, porque, em verdade, viola-se o contraditório, pois à defesa, em regra, deve-se facultar conhecer seu acusador, até porque muitas vezes a identidade daquele que acusa pode ser fato gerador de teses resistivas. Isso posto e em resumo, cabe aos tribunais de ética e disciplina, nos processos instaurados de ofício, provocar, antes, a Comissão de Fiscalização da Atividade da Advocacia de suas Seccionais (quando houver) ou setores do próprio tribunal para que registrem as máculas disciplinares de forma correta, assumindo, assim, a legitimidade processual para a representação e afastando o quanto eventualmente tenha sido informado por fonte anônima. Em outras palavras, a fonte anônima é reconhecida como apta para levar os fatos ao conhecimento do tribunal, todavia, tudo o que informar deverá ser desprezado, utilizado apenas e tão somente como guia para busca, identificação e registro pelo órgão do TED, que, a partir do que apurar, poderá dar início a procedimento de ofício. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira ________ 1 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
O último ponto a se abordar nesse estudo é a clara responsabilidade civil do advogado, em relação a seu cliente, por danos causados em função de invalidação de seus atos, porquanto advogando enquanto suspenso. Antes, todavia, cumpre relembrar que a relação entre advogado e cliente não é de consumo. O acórdão paradigma abaixo, do Colendo STJ, já tem mais de uma década desde sua produção, mas ainda é o condutor da posição jurisprudencial no país:  RECURSO ESPECIAL. SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. CONTRATO. NÃO INCIDÊNCIA DO CDC. DEFICIÊNCIA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. NEGATIVA DE QUE FORA EFETIVAMENTE CONTRATADO PELO CLIENTE. DANOS MORAIS. CARACTERIZAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. 1.- As relações contratuais entre clientes e advogados são regidas pelo Estatuto da OAB, aprovado pela Lei n. 8.906/94, a elas não se aplicando o Código de Defesa do Consumidor. Precedentes. 2.- A convicção a que chegou o Tribunal de origem quanto ao nexo de causalidade entre a conduta do advogado que negou que fora contratado e recebera procuração do cliente para a propositura de ação de cobrança e os danos morais suportados por esse decorreu da análise do conjunto fático-probatório, e o acolhimento da pretensão recursal demandaria o reexame do mencionado suporte, obstando a admissibilidade do especial à luz da Súmula 7 desta Corte. 3.- Sendo a ação de indenização fundada no direito comum, regular a aplicação do art. 177 do Código Civil, incidindo a prescrição vintenária, pois o dano moral, na presente hipótese, tem caráter de indenização, de reparação de danos e pela regra de transição (art.2.028 do Novo Código Civil) há de ser aplicado o novo prazo de prescrição, previsto no art. 206, § 3º, IV do mesmo diploma legal. 4.- Recurso Especial improvido. (REsp n. 1.228.104/PR, relator Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 15/3/2012, DJe de 10/4/2012.)  Desta forma, eventual direito indenizatório será regulado pela lei Federal 8.906/94 (EAOAB), pelas normas administrativas do sistema OAB e pelo Código Civil, artigos 186 e 927.  Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.    Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.  Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.  O EAOAB estabelece que:  Art. 32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa.  Pois bem, como já explicamos em artigo anterior (clique aqui para ler) a sanção disciplinar de suspensão retira do advogado toda sua capacidade postulatória, além de suas prerrogativas. Exatamente por essa razão, estabelece o artigo 4º do EAOAB que:  Art. 4º São nulos os atos privativos de advogado praticados por pessoa não inscrita na OAB, sem prejuízo das sanções civis, penais e administrativas. Parágrafo único. São também nulos os atos praticados por advogado impedido - no âmbito do impedimento - suspenso, licenciado ou que passar a exercer atividade incompatível com a advocacia.  Vê-se, pois, que, uma vez peticionando enquanto suspenso e sendo o fato descoberto por uma das partes do processo, os atos do advogado naquele feito serão considerados nulos de pleno direito. A questão já foi vista e revista por Tribunais de todo o país, especialmente porque impõe prejuízo a terceiro que desconhecia a situação, o cliente. Nada obstante, ainda prevalece o entendimento de que ausente a capacidade postulatória do advogado, o ato será nulo. Assim, por exemplo, eventual recurso assinado por advogado suspenso, não será conhecido. O assunto já chegou ao STF, que pacificou a matéria com o seguinte entendimento:  RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO INTERPOSTO POR ADVOGADO COM A INSCRIÇÃO SUSPENSA NA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. AUSÊNCIA DE CAPACIDADE POSTULATÓRIA. NÃO CONHECIMENTO. ILEGALIDADE FLAGRANTE. INOCORRÊNCIA. PACIENTE CONDENADO PELO DELITO DE RECEPTAÇÃO QUALIFICADA. REGIME INICIAL ABERTO. IMPOSSIBILIDADE. NULIDADE NA SESSÃO DE JULGAMENTO DO WRIT MANEJADO NO STJ. INEXISTÊNCIA. RECURSO NÃO CONHECIDO. I - O advogado que subscreveu a petição de interposição do recurso ordinário está com a inscrição suspensa na OAB/MG, não possuindo, portanto, capacidade postulatória para a prática do ato. II - Esta Corte entende que o recorrente deve possuir capacidade postulatória para interpor recurso ordinário em habeas corpus, ainda que tenha sido o impetrante originário, por tratar-se de ato privativo de advogado. III - Nos termos do art. 4º, parágrafo único do Estatuto da Advocacia e da OAB, são nulos os atos privativos de advogado praticados por aquele que esteja com a inscrição suspensa. IV - A fixação do regime inicial semiaberto parece estar devidamente justificada, nos termos do art. 33, § 2º, b, do CP. V - Não se verifica, de plano, a alegada nulidade na sessão de julgamento na qual foi apreciado o writ manejado em favor do ora recorrente no STJ, uma vez que o ato parece ter atendido aos ditames do Regimento Interno daquela Corte Superior. VI - Recurso ordinário não conhecido. (RHC 121722, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 20/05/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-194 DIVULG 03-10-2014 PUBLIC 06-10-2014)  O entendimento se espalhou pelo país e hoje é amplamente aplicado:  PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DO DEVEDOR. APELAÇÃO CÍVEL. NECESSIDADE DE RECONHECER DE OFÍCIO AUSÊNCIA DE UM DOS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS. FALTA DE PROCURAÇÃO. ADVOGADA COM INSCRIÇÃO SUSPENSA NA OAB. SUBSTABELECIMENTO INVÁLIDO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. REMESSA DE CÓPIA DOS AUTOS À OAB. RECURSO PREJUDICADO. Por se tratar de matéria de ordem pública deve ser reconhecida ex officio a ausência de um dos pressupostos processuais, no caso em tela a falta de capacidade postulatória para litigar em juízo. Isto porque, não existe procuração nos autos da advogada que subscreveu a petição inicial, além disso sua inscrição estava suspensa perante a OAB, o que torna todos os seus atos nulos. O juízo a quo, atendendo ao disposto no art. 13 do Código de Processo Civil, determinou à embargante que nomeasse outro patrono para a causa, todavia, esta quedou-se inerte, vindo a advogada a "substabelecer" poderes que não possuía. Assim, diante da ausência de capacidade postulatória, a extinção do processo sem resolução do mérito é medida que se impõe, com fulcro no art. 267, IV do Código de Processo Civil, restando prejudicado o presente apelo. (TJPR - 15ª Câmara Cível - AC - Manoel Ribas. Rel.: DESEMBARGADOR FABIO HAICK DALLA VECCHIA - Unânime -  J. 11.07.2007)  APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL E PROCESSO CIVIL. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS PARA PROPOSITURA E ACOMPANHAMENTO DE QUEIXA-CRIME. AÇÃO PENAL PRIVADA. ATIVIDADE MEIO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO ADVOGADO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE AÇÃO. COMPROVAÇÃO DE CULPA. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE APLICÁVEL. DANO MATERIAL E DANO MORAL CONFIGURADOS. REDUÇÃO DO QUANTUM DA COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. O mandato é uma das formas de contrato previstas no Código Civil e impõe responsabilidade de natureza contratual do advogado perante os seus clientes (arts. 653 e 667 do CC). 2. A obrigação assumida por advogado para prestação de serviços jurídicos é de meio e não de resultado e sua responsabilidade civil é subjetiva, sendo imprescindível que o cliente descreva e comprove a culpa ou dolo do advogado no patrocínio de sua causa, a fim de alcançar a indenização pelos danos sofridos. 3. Para aplicação da teoria da perda de uma chance, no caso de responsabilidade de profissionais de advocacia por condutas apontadas como negligentes ou imperitas, a incerteza da vantagem não experimentada deve ser ponderada a partir de detida análise acerca das reais possibilidades de êxito do postulante, eventualmente perdidas em razão da desídia do causídico. Embora isso não signifique que o advogado seja obrigado a garantir o sucesso da demanda, implica dizer que, no exercício do seu mister, o profissional deverá ser diligente, técnico, eficaz, comprometido com o êxito da demanda e procurar sempre buscar a melhor forma de solucioná-la, sem causar prejuízos ao mandante. 4. Se a decadência do direito de propositura de ação penal privada, com plausível possibilidade de êxito, decorreu exclusivamente dos graves e sucessivos equívocos cometidos pelos advogados contratados especificamente para esse fim, deve ser reconhecida a responsabilidade dos causídicos pelos danos materiais e morais causados à outorgante. 5. Deve ser reduzido o quantum arbitrado a título de compensação por danos morais quando o valor fixado se mostrar excessivo, diante das peculiaridades do caso concreto. 6. Recurso conhecido e parcialmente provido. (Acórdão 1418741, 07114156620208070001, Relator(a): JOSAPHA FRANCISCO DOS SANTOS, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 4/5/2022, publicado no DJE: 11/5/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada.)  Nesses casos, claro, é inegável o prejuízo ao cliente, o que lhe pode ser fato gerador de indenização. Entretanto, se de um lado houve o prejuízo processual, de outro é impossível prever que sua tese, caso conhecida, fosse vitoriosa. Para exemplificar, imagine que concurseiro seja impedido de ingressar na sala para prestar a prova do concurso por um atraso de um minuto, encontrando os portões fechados. Via processo judicial, posteriormente, acaba conseguindo provar que o relógio do fiscal de prova que fechou os portões estava adiantado em dois minutos, sendo reconhecida, assim, a ilicitude no ato que lhe impediu realizar a prova. Nesse exemplo, nunca se poderia afirmar que o candidato seria aprovado, todavia, é certo afirmar que perdeu a oportunidade naquela disputa. Aplica-se, então, em seu favor, o que se convencionou ser a teoria da perda de uma chance, de forma a poder ser indenizado em valor que o Judiciário, na análise do caso concreto, entender pertinente.  No caso do advogado, da mesma forma, a questão também pode ser resolvida pela perda de uma chance, ou seja, não é certo que o cliente prejudicado ganharia a demanda que acabou não sendo conhecida em face da suspensão de seu advogado, todavia, é certo que por culpa do advogado não teve a oportunidade de ver sua questão discutida junto ao judiciário. __________ *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui (clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira
A conduta de burlar sanção administrativa prevista por órgão é sempre gravíssima, como restou bem demonstrado pelo exemplo do Código de Trânsito brasileiro, exatamente porque a sanção disciplinar é a norma coercitiva que deve ter o poder de reprimir, retificar e punir a conduta daquele a ela sujeito, seja como indivíduo da sociedade, como é o condutor de veículo automotor; seja de profissional, como são os servidores públicos e profissionais ligados a conselhos de classe, advogados, engenheiros, contadores, médicos, enfermeiros e outros. Caso se desprestigie o poder da norma sancionadora disciplinar, estar-se-á a atacar direitamente o poder de regulação do aplicador do direito. Não é comum apenas à OAB a previsão de punição em caso de desobediência de suas decisões, também o CRM1 e outros Conselhos e/ou órgãos têm dispositivos análogos. Essas conclusões vêm apenas reforçar a ideia de que a aplicação do art. 34, inciso I do EAOAB para os casos em que o profissional suspenso mantenha-se realizando atos privativos de advogado compromete em absoluto a efetividade e a eficiência do sistema OAB, haja vista a previsão de sanção administrativa mais branda do que aquela que está a desobedecer. Isso, claro, sem se falar no prestígio e grandeza da advocacia, que acabam altamente desvalorizados à luz da aparente impunidade decorrente da desobediência. Não bastasse, portanto, ser gravíssima do ponto de vista administrativo a nova mácula disciplinar decorrente dessa desobediência, a jurisprudência do STJ se consolidou definindo que tal prática configura o crime previsto no art. 205 do Código Penal, o que, de forma idêntica, reforça a incorreção da interpretação por aplicação de sanção administrativa tão branda como a do inciso I. Exercício de atividade com infração de decisão administrativa Art. 205 - Exercer atividade, de que está impedido por decisão administrativa: Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou multa. A decisão paradigma para se definir por esse crime para os casos dessa conduta foi tomada no Conflito de Competência CC 165.781/MG, de relatoria da ministra Laurita Vaz: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PENAL E PROCESSUAL PENAL. EXERCÍCIO DA ADVOCACIA COM A INSCRIÇÃO NA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SUSPENSA. CONFIGURAÇÃO DO DELITO DO ART. 205 DO CÓDIGO PENAL. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO FEDERAL SUSCITANTE. 1. Hipótese em que a controvérsia apresentada cinge-se à definição do tipo penal a que se amolda a conduta da Interessada, a qual teria exercido a advocacia com a inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil suspensa, em razão de infração reconhecida pelos órgãos disciplinares competentes. 2. A questão difere daquela relativa ao inadimplemento de anuidade, na qual esta Corte tem entendido que se configura a contravenção penal do art. 47 do decreto-lei 3.688/41, porque "não representa verdadeira punição disciplinar, mas apenas mero ato administrativo de saneamento cadastral e, por consequência, não se amolda ao conceito penal de decisão administrativa proibitiva do exercício da profissão" (CC 164.097/SP, rel. min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 11/03/2019). 3. Tendo sido a suspensão da inscrição determinada pela autoridade competente, qual seja, no caso, a OAB, em processo administrativo, está configurado o crime do art. 205 do Código Penal, qual seja, "Exercer atividade, de que está impedido por decisão administrativa". 4. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Federal, o Suscitante. (CC 165.781/MG, rel. ministra LAURITA VAZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/10/2020, DJe 21/10/2020) No ano seguinte, novamente, o STJ confirmou o acerto da decisão, também em conflito de competência, tendo o ministro Antonio Saldanha Palheiro aplicado o aresto acima como referência: CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 169078 - MG (2019/0319513-3). DECISÃO Trata-se de conflito negativo de competência no qual figuram como suscitante o JUÍZO FEDERAL DA 1A VARA DE POÇOS DE CALDAS - SJ/MG e como suscitado o JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. Consta dos autos ter sido lavrado termo circunstanciado pela Polícia Civil de Minas Gerais contra advogada que supostamente exercera a profissão mesmo estando suspensa dos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil em razão de processo administrativo disciplinar. O Juízo estadual acatou o parecer ministerial e declarou-se incompetente ao argumento de que os fatos narrados eram tipificados no art. 205 do Código Penal, praticado contra autarquia federal especial, motivo pelo qual, nos termos do art. 109, IV e VI, da Constituição Federal, competiria à Justiça Federal processar e julgar o feito. O Juízo federal, por sua vez, também acolheu a manifestação ministerial, declarou-se igualmente incompetente e suscitou o conflito de competência por concluir que "o STJ assentou o entendimento de que o advogado que, após sofrer suspensão disciplinar pela OAB, pratica o exercício da profissão, não comete o crime previsto no artigo 205 do Código Penal, mas sim a contravenção penal do artigo 47 do decreto-lei 3.688/41" (e-STJ fl. 210), o que afastaria a competência da Justiça Federal. O Ministério Público Federal manifestou-se pela competência do Juízo estadual (e-STJ fls. 226/230). É, em síntese, o relatório. Decido. Conheço do conflito, pois trata-se de controvérsia instaurada entre juízes vinculados a tribunais distintos, a teor do que preceitua o art. 105, inciso I, alínea d, da Constituição Federal. Como antes relatado, a investigação penal apura a prática de ilícito envolvendo advogada que exerceu a profissão mesmo estando suspensa dos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil em razão de processo administrativo disciplinar. Conforme relatado pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, há indícios de habitualidade delitiva, uma vez que "não remanesce aqui uma simples situação de exercício irregular de profissão ou de atividade econômica (art. 47 da LCP), e sim de uma casuística mais gravosa, qual seja, a de uma advogada, já suspensa de suas funções por força de decisão administrativa da OAB, que continuava postulando em vários processos, infringindo, assim, o poder disciplinar de seu próprio órgão de classe" (e-STJ fl. 189). Levando-se em conta os elementos constantes do presente conflito de competência suscitado no curso de investigação em andamento, a conduta imputada à acusada, ao que parece, e na linha da orientação firmada no âmbito desta Corte, subsome-se ao tipo previsto no art. 205 do Código Penal, da competência da Justiça Federal, senão vejamos: "CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PENAL E PROCESSUAL PENAL. EXERCÍCIO DA ADVOCACIA COM A INSCRIÇÃO NA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SUSPENSA. CONFIGURAÇÃO DO DELITO DO ART. 205 DO CÓDIGO PENAL. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO FEDERAL SUSCITANTE.(...) 1. Hipótese em que a controvérsia apresentada cinge-se à definição do tipo penal a que se amolda a conduta da Interessada, a qual teria exercido a advocacia com a inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil suspensa, em razão de infração reconhecida pelos órgãos disciplinares competentes. 2. A questão difere daquela relativa ao inadimplemento de anuidade, na qual esta Corte tem entendido que se configura a contravenção penal do art. 47 do Decreto-Lei n. 3.688/1941, porque "não representa verdadeira punição disciplinar, mas apenas mero ato administrativo de saneamento cadastral e, por consequência, não se amolda ao conceito penal de decisão administrativa proibitiva do exercício da profissão" (CC n. 164.097/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 11/03/2019). 3. Tendo sido a suspensão da inscrição determinada pela autoridade competente, qual seja, no caso, a OAB, em processo administrativo, está configurado o crime do art. 205 do Código Penal, qual seja, "Exercer atividade, de que está impedido por decisão administrativa". 4. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Federal, o Suscitante. (CC 165.781/MG, rel. Ministra LAURITA VAZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/10/2020, DJe 21/10/2020)" Ante o exposto, conheço do conflito e dou por competente o Juízo suscitante. (CC n. 169.078, Ministro Antonio Saldanha Palheiro, DJe de 09/02/2021.) Como se vê, é indiscutível à luz da jurisprudência atual que referida conduta é tão grave a ponto de desafiar a aplicação da ultima ratio, seja entendendo-a como a contravenção penal do art. 47 da lei de contravenções penais, 3.688/41 ou como o crime previsto no art. 205 do Código Penal: Art. 47. Exercer profissão ou atividade econômica ou anunciar que a exerce, sem preencher as condições a que por lei está subordinado o seu exercício: Pena - prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis. Exercício de atividade com infração de decisão administrativa Art. 205 - Exercer atividade, de que está impedido por decisão administrativa: Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou multa. Não há dúvida que os limites da tipicidade são bem próximos nesse caso, todavia, como visto, o STJ pacificou a matéria, entendendo que referida prática configura crime e não contravenção penal, o que parece ser a posição mais acertada, pois na comparação entre os tipos punitivos, a dolosa violação da decisão de suspensão encontra melhor enquadramento no preceito primário do art. 205 do Código Penal. Pois bem, embora com poucos casos no Brasil, cumpre afirmar que a prática pode também configurar outros crimes, como os patrimoniais. Ora, em situação hipotética, imagine-se que homem vai até escritório de advocacia e contrata advogado para a elaboração de recurso de apelação, sem saber que o profissional está suspenso. O advogado se apresenta, escuta o problema, fornece algumas opiniões e cobra o valor de seus honorários; as partes assinam contrato e o agora cliente também assina a procuração, ou seja, todos até aqui atos privados da advocacia. O advogado não informa que está com sua OAB suspensa, e, portanto, não tem capacidade postulatória para o exercício da advocacia. Nada obstante, confecciona o recurso, assina e o protocoliza no Tribunal, acabando o órgão por dele não conhecer, uma vez ciente da sanção administrativa aplicada. Ora, considerando que a advocacia não se restringe à atuação nos Tribunais, todos os atos acima foram realizados em direta afronta à suspensão aplicada, desde a apresentação do infrator como advogado, passando pela primeira reunião, cobrança de honorários, assinatura do contrato e da procuração, até o protocolo do recurso. Como visto, esse proceder pode configurar o crime previsto no art. 205 do Código Penal, todavia, não é só, pois o advogado também pode haver cometido contra o cliente o crime de estelionato, haja vista que dolosamente o manteve em erro ao não informar sua impossibilidade de advogar, obtendo vantagem ilícita.   Estelionato Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis Também pode estar presente o crime de falsidade ideológica, porque ao produzir e assinar documentos estando impedido de fazê-lo, o ato pode se amoldar ao preceito primário do art. 299 do Código Penal: Falsidade ideológica Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular. Parágrafo único - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte. Nos casos de suspensão, como já mencionado, o advogado perde todos os seus direitos junto ao Judiciário, incluindo sua capacidade postulatória:   PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NA PETIÇÃO. ADVOGADO COM INSCRIÇÃO NA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SEÇÃO JUDICIÁRIA DE MINAS GERAIS -OAB/MG SUSPENSA. AUSÊNCIA DE CAPACIDADE POSTULATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO CONHECIDO. 1. A decisão agravada não identificou qualquer ilegalidade na decisão proferida por desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais - TJMG que impediu o ora agravante de encaminhar petições àquele Tribunal Estadual, por estar com sua inscrição na OAB/MG suspensa. 2. Referida suspensão foi confirmada em resposta a ofício encaminhado ao Diretor Secretário Geral da OAB/MG, em 12/4/2024. Diante disso, o presente agravo regimental é inadmissível por ausência de capacidade postulatória do agravante. 3. Agravo regimental não conhecido. (AgRg na Pet n. 16.216/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 1/7/2024, DJe de 3/7/2024.) Os efeitos da suspensão são tão contundentes na vida do profissional, que suas prerrogativas também são suspensas, como o diferenciado direito de ser recolhido à sala de Estado maior em caso de prisão: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. DECISÃO ADEQUADAMENTE FUNDAMENTADA. REITERAÇÃO DELITIVA. ACUSADA CONDENADA EM OUTRO PROCESSO E QUE RESPONDE A VÁRIOS FATOS DELITUOSOS. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE MANIFESTA. RECOLHIMENTO EM SALA DE ESTADO MAIOR. DIREITO DO ADVOGADO NÃO SUSPENSO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE. 1. A prisão é medida extrema sujeita à existência de elementos concretos de comprovação da necessidade de proteção da ordem pública, garantia de aplicação da lei penal e conveniência da instrução criminal. 2. Na hipótese, não há patente ilegalidade a ser reconhecida, pois a custódia preventiva restou firmada para o resguardo da ordem pública pelo risco da reiteração delitiva, na medida em que a acusada tem contra si outros processos criminais e é conhecido por ser traficante de drogas. 3. Quanto ao direito ao recolhimento em sala de Estado Maior, o advogado só faz jus a essa prerrogativa se estiver no livre exercício da profissão, o que não é o caso dos autos porque a pretendente encontra-se suspensa dos quadros da OAB. 4. Ordem denegada. (HC 368.393/MG, rel. ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 20/09/2016, DJe 30/09/2016) Até aqui, portanto, pode-se expor as seguintes conclusões: (a) embora a OAB entenda que a conduta de advogar enquanto suspenso configure a mácula disciplinar prevista no art. 34, inciso I da lei federal 8.906/94, melhor interpretação é que o inciso I, que estabelece a mais branda das infrações disciplinares, trate apenas dos impedimentos do art. 30. Assim, a conduta gravíssima em debate estaria enquadrada nas hipóteses mais graves da lei, incisos XXV, XXVII e XXVIII. Ademais, essa interpretação corrige a inegável distorção advinda da desproporcionalidade por se punir de forma igual aquele que viola o art. 30 do EAOAB com aquele que, por exemplo, está suspenso por 12 meses porque se apropriou indevidamente de elevada quantia de cliente, cometendo potencialmente o crime de apropriação indébita e ainda assim continua a advogar. Esse exemplo revela às escâncaras o problema aqui exposto, pois se esse último advogado mantém sua advocacia em desprezo à decisão da OAB, ficará sujeito à mesma sanção daquele que apenas viola o art. 30 do EAOAB. A outra conclusão é que (b) referida conduta é tão grave que pode configurar diferentes crimes praticados pelo infrator, incluindo o tipo penal do art. 205 do CP, além de estelionato e falsidade ideológica. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira __________ 1 Art. 18. Desobedecer aos acórdãos e às resoluções dos Conselhos Federal e Regionais de Medicina ou desrespeitá-los.
Após os parâmetros traçados na primeira parte deste escrito, que trouxeram não só visão geral sobre o tema, mas os efeitos da sanção disciplinar de suspensão da carreira do advogado, passa-se agora às consequências daquele profissional que, suspenso pela OAB, continua a advogar, ignorando a sanção que lhe foi imposta. De início, cumpre declarar que há nova infração disciplinar cometida, haja vista a gravidade do fato, ou seja, após a OAB impor seu poder disciplinar por falta tão grave a ponto de decretar a suspensão, essa sanção é ignorada e o profissional continua a praticar atos privativos à advocacia, à revelia do comando de seu órgão de classe. No ponto, a jurisprudência do Conselho Federal se formou de forma extremamente branda para tal prática, haja vista que pacificamente entende violado o inciso I do art. 34 da lei federal 8.906/94, ou seja, a mais branda de todas as infrações disciplinares. Art. 34. Constitui infração disciplinar: I - exercer a profissão, quando impedido de fazê-lo, ou facilitar, por qualquer meio, o seu exercício aos não inscritos, proibidos ou impedidos; O precedente abaixo, de recente data, bem reflete a posição do CFOAB sobre a matéria: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Artigo 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Decisão definitiva e unânime de Conselho Seccional da OAB. Prescrição. Inocorrência. Exercer a advocacia enquanto suspenso do exercício profissional (art. 34, I, EAOAB). Infração disciplinar configurada. 1) No caso dos autos, não se constata a prescrição arguida pelo advogado, face à ausência de transcurso de lapso temporal superior a 05 (cinco) anos de tramitação do processo disciplinar entre as causas interruptivas do curso da prescrição quinquenal, ou a paralisação do processo disciplinar por mais de 3 anos, pendente de despacho ou julgamento, razão pela qual deve ser rejeitada. 2) Advogado que promove atos privativos da advocacia durante o período em que se encontrava suspenso. 3) Recurso improvido. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da Segunda Turma da Segunda Câmara do Conselho Federal da OAB, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Brasília, 23 de maio de 2023. Emerson Luis Delgado Gomes, Presidente e Relator. (Recurso n. 25.0000.2022.000126-7/SCA-STU. EMENTA N. 056/2023/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal Emerson Luis Delgado Gomes (RR). DEOAB, a. 5, n. 1116, 05.06.2023, p. 9). O entendimento coloca-se em posição diametralmente oposta à hermenêutica jurídica, no que toca às interpretações lógica1 e teleológica. A primeira, deseja entender o alcance na norma segundo sua lógica e a segunda sua finalidade social. É um grande contrassenso punir o advogado que, uma vez suspenso, continua a advogar em desprezo à ordem emanada por seu órgão de classe com uma mácula disciplinar mais amena do que a sanção original. Trata-se de um grave antagonismo que leva a uma quimera jurídica, porque basta que o advogado suspenso deixe de se preocupar com a sanção de suspensão que lhe foi imposta e continue normalmente a exercer sua profissão, pois será punido apenas com a pena de censura. Não faz sentido. Não se olvida, claro, à redação do art. 37, inciso II do EAOB, que permite a aplicação da suspensão em caso de reincidência em infração disciplinar, todavia, nesse caso, a aplicação da sanção mais severa dependerá de interpretação jurídica do aplicador do direito, que nem sempre é utilizada. Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de:     II - reincidência em infração disciplinar. A título de exemplo, vale a analogia com o Código de Trânsito Brasileiro, cujo art. 263 prevê a cassação da CNH do condutor que dirige seu veículo estando suspensa seu autorização para condução de veículo automotor: Art. 263. A cassação do documento de habilitação dar-se-á: I - quando, suspenso o direito de dirigir, o infrator conduzir qualquer veículo; O mesmo código torna crime tal desobediência: Art. 307. Violar a suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor imposta com fundamento neste Código: Penas - detenção, de seis meses a um ano e multa, com nova imposição adicional de idêntico prazo de suspensão ou de proibição. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre o condenado que deixa de entregar, no prazo estabelecido no § 1º do art. 293, a Permissão para Dirigir ou a Carteira de Habilitação. Em ambos os casos, como resta claro, há uma valorização das ordens emanadas pelo órgão, de forma a valorizar o órgão, seu poder disciplinar e sua missão institucional, o que é logicamente correto. É certo que o exegeta se apegará ao princípio da legalidade e à reserva legal para afirmar um aprisionamento interpretativo ao inciso I em comento, todavia, data venia, não é o caso. Parece mais adequado entender que o impedimento citado pelo inciso I não seria o cumprimento de sanção disciplinar de suspensão, mas aquele previsto no art. 30 da lei 8.906/942, ou seja, o impedimento profissional não comunicado à OAB decorrente do exercício de outra profissão, como a de servidor público. Ter-se-ia, assim, para os casos de advogados que uma vez suspensos venham a desprezar a sanção disciplinar aplicada pela OAB, a capitulação em artigos previstos para condutas mais graves, sem que isso viesse a ser considerado marginalização da lei para satisfação do caso concreto.3 E isso porque, tipos administrativos com a conduta incompatível do inciso XXV; o de tornar-se inidôneo para o exercício da advocacia do inciso XXVII; ou até a prática de crime infamante do inciso XXVIII, são abertos, exatamente para que em caso de violações gravíssimas à grandeza da advocacia, possa o intérprete aplicar o direito com a correta interpretação da norma. Para além, como se verá à frente, tal prática pode configurar diferentes tipos de crimes. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira __________ 1 FERRAZ Jr., Tercio Sampaio. A Ciência do Direito. São Paulo: Atlas, 1980, p. 77-79. 2 Art. 30. São impedidos de exercer a advocacia: I - os servidores da administração direta, indireta e fundacional, contra a Fazenda Pública que os remunere ou à qual seja vinculada a entidade empregadora; II - os membros do Poder Legislativo, em seus diferentes níveis, contra ou a favor das pessoas jurídicas de direito público, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas, entidades paraestatais ou empresas concessionárias ou permissionárias de serviço público. Parágrafo único. Não se incluem nas hipóteses do inciso I os docentes dos cursos jurídicos. 3 FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica. Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 1997, p.14-15
Os muitos anos de prática junto ao Tribunal de Ética e Disciplina ensinam que ainda há uma parcela de advogados que acredita em uma OAB conivente a condutas antiéticas, que seja classista e omissa para proteger infratores, o que é o maior dos enganos. A OAB sempre foi rigorosa na aplicação do Direito e na manutenção dos elevados valores que norteiam a advocacia, todavia, nos últimos anos, talvez na última década, esse rigor vem aumentando exponencialmente. Não há razões claras para esse movimento, pode ser, por exemplo, que seja um fenômeno ligado à absoluta e completa distorção do Brasil em relação ao número de advogados por habitante, pois tem-se um advogado para cada grupo de 146 pessoas, somando cerca de 1.300.000 advogados.1 Comparativamente, em 2024 estima-se que a China tenha 1,4 bilhão de pessoas, com cerca de 200.000 advogados. É um fato que esse crescimento causou distorções severas na qualidade da atuação do advogado, o que, incondicionalmente, afeta a população atendida, especialmente em face do valor dos bens jurídicos vinculados ao exercício da profissão, como o patrimônio, a liberdade, a família e outros. Assim, uma possível motivação para esse recrudescimento seja a necessidade da OAB, como nunca foi tão importante, exercer seu papel constitucional previsto no art. 133 da Carta Maior2, o que contemplaria também punir de forma mais rigorosa advogados transgressores das normas regentes da carreira. O que é certo é que os Tribunais de Ética e Disciplina nunca estiveram tão preparados e trabalharam tanto. Ainda sobre esse ponto, não é sem razão que em 29/10/19 o Conselho Federal fez editar a portaria 1.473/19 para criar a Coordenação Nacional de Fiscalização da Atividade Profissional da Advocacia, ligada à Corregedoria da OAB. Esse novo órgão da OAB gerenciou em todas as Seccionais a criação de Comissões de Fiscalização, cuja missão é diariamente fiscalizar não só a advocacia no mundo dos fatos (delegacias do trabalho, postos no INSS e análogos), mas também a atividade do advogado on line, seja nas redes sociais, em sites institucionais, na criação das chamadas landing pages, assim como, claro, na fase de execução das sanções disciplinares, especialmente a atividade de advogados suspensos. Pois bem, as sanções disciplinares de suspensão são bastante comuns nos Tribunais de Ética e Disciplina, porque podem ser imputadas em todas as faltas disciplinares, à exceção daquelas punidas com exclusão. Primeiramente, serão cabíveis naquelas previstas no art. 37, inciso I3, todavia, em caso de prévia condenação por falta disciplinar punida com censura, poderá também ser aplicada a suspensão em face da reincidência prevista no inciso II4 do mesmo artigo. Neste ponto, importante destacar que a reincidência só poderá ser considerada a partir do trânsito em julgado do processo anterior, face à presunção de inocência, e desde que o enquadramento legal tenha sido por infração disciplinar (EAOAB) e não por infração ética (CED). Já diferenciamos os tipos de infrações em escrito anterior.5 Nesse sentido também entendem Beatriz Gaguer e Rafael Júnior Soares.6 Os efeitos da suspensão não despem o profissional de sua condição de advogado, mas suspendem todos os seus direitos referentes ao exercício da advocacia, inclusive e especialmente suas prerrogativas, ou seja, não fica apenas impedido de advogar, mas efetivamente deixa de gozar dos direitos inerentes à profissão, como por exemplo ter a presença de alguém da OAB em caso de sua prisão em flagrante7, conforme incisos IV do art. 7º do EAOAB. Essa é a posição pacífica do Conselho Federal: VIOLAÇÃO DE PRERROGATIVAS. ADVOGADO SUSPENSO. Os direitos e prerrogativas conferidas aos advogados pressupõem o exercício da profissão, o que não se coaduna com a aplicação de sanção disciplinar, já que, estando suspenso, o advogado está impedido de exercer a profissão, sob pena de incidir em infração (art. 34, I, EAOAB). (RECURSO 49.0000.2015.007964-5/PCA. Ementa 021/2016/PCA. Relator: Conselheiro Federal André Francelino de Moura (TO). DOU, S.1, 04.03.2016, p. 271) Consulta. Advogado suspenso ou licenciado de seu exercício profissional. Cabimento de assistência em situação de violação às prerrogativas. Consulta. A defesa quanto à violação das prerrogativas profissionais praticada antes da aplicação da penalidade de suspensão ou da determinação do licenciamento, pode ser objeto de defesa e atuação dos órgãos da OAB, sobretudo quando transcenderem o interesse subjetivo do advogado. Aquelas garantias que são ínsitas ao exercício profissional não devem ser objeto de atuação dos órgãos da OAB na hipótese de terem sido violadas durante o prazo da pena aplicada, em razão da suspensão ou diante do licenciamento, por força do parágrafo único do art. 4º e do §1º, art. 37, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Consulta respondida. (CONSULTA 49.0000.2020.001819-0/OEP. Ementa 007/2021/OEP. Fábio Jeremias de Souza, Relator. DEOAB, a. 3, 550, 03.03.2021, p. 3). Conforme o art. 37, §1º do EAOAB8, a suspensão poderá ser aplicada por no mínimo trinta dias até o máximo de doze meses, entretanto, na hipótese de condenação pelo inciso XXI9 do art. 34, a suspensão irá perdurar até que o advogado satisfaça a dívida na forma do §2º.10 Embora o preceito secundário da norma punitiva estabeleça que o pagamento deve ser acrescido de correção monetária, o Conselho Federal já decidiu que também são cabíveis os juros de mora - acesse aqui.11 Como se vê, são funestos os efeitos à carreira do advogado a sanção de suspensão aplicada pelos Tribunais de Ética e Disciplina, todavia, nada obstante, vê-se como prática rotineira que o advogado suspenso ignore essa condição e continue, despreocupadamente, a exercer a profissão, peticionando em processos, realizando reuniões, assinando contratos, audiências etc. Falaremos mais em nosso próximo encontro. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira __________ 1 Disponível aqui. 2 Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei; 3 I - infrações definidas nos incisos XVII a XXV e XXX do caput do art. 34 desta Lei; 4 II - reincidência em infração disciplinar. 5 Disponível aqui. 6 WINTER, Marilena Indira, Luiz Fernando Casagrande Pereira, Marion Bach. Organizador: Ricardo Miner Narravo. Comentários às Normas da Advocacia: Constituição Federal, Estatuto da Advocacia e OAB: Vol. I. Londrina, PR: Troth, 2023. P. 631; 7 IV - ter a presença de representante da OAB, quando preso em flagrante, por motivo ligado ao exercício da advocacia, para lavratura do auto respectivo, sob pena de nulidade e, nos demais casos, a comunicação expressa à seccional da OAB; 8 § 1º A suspensão acarreta ao infrator a interdição do exercício profissional, em todo o território nacional, pelo prazo de trinta dias a doze meses, de acordo com os critérios de individualização previstos neste capítulo. 9 XXI - recusar-se, injustificadamente, a prestar contas ao cliente de quantias recebidas dele ou de terceiros por conta dele; 10 § 2º Nas hipóteses dos incisos XXI e XXIII do art. 34, a suspensão perdura até que satisfaça integralmente a dívida, inclusive com correção monetária. 11 Disponível aqui.
Dúvida comum perante a advocacia, assim como da sociedade, é se o advogado pode responder perante o Tribunal de Ética e Disciplina por atos de sua vida privada.  Ainda é comum observar decisões de arquivamento de representações com o uso desse pensamento, ou seja, se o ato do advogado não se deu no exercício da advocacia, faltaria ao Tribunal de Ética e Disciplina competência legal para conhecer da matéria, porque, tanto as infrações éticas como as infrações disciplinares estariam sempre ligadas ao exercício da profissão. Esse entender é incorreto e não deve haver dúvidas sobre isso. Primeiro porque desde os primórdios da advocacia brasileira já havia previsão legal para punição do advogado por ato da vida privada, conforme o revogado artigo 110, parágrafo único, alíneas "a", "b" e "c" da lei federal 4.215/63, o antigo Estatuto da OAB: Art. 110. A pena de suspensão é aplicável: Parágrafo único. Considera-se conduta incompatível com o exercício da profissão: A prática reiterada de jogo de azar, como tal definido em lei; A incontinência pública e escandalosa; A embriaguez habitual. Da redação da norma resta de clareza solar que o legislador arrolou nas alíneas do parágrafo exemplos de condutas que poderiam imputar responsabilização ao advogado por atos de sua vida privada, pois, obviamente, ninguém praticará jogos de azar no exercício da advocacia. Aquele rol, ademais, era exemplificativo.  A lei federal 8.906/94, o EAOAB, revogou a norma 4.215/1963, todavia, ainda assim, manteve a regra material em seu artigo 34, §1º, alíneas "a", "b" e "c": Art. 34. Constitui infração disciplinar: XXV - manter conduta incompatível com a advocacia; §1º Inclui-se na conduta incompatível:    Prática reiterada de jogo de azar, não autorizado por lei; Incontinência pública e escandalosa; Embriaguez ou toxicomania habituais. Prescindível qualquer outra regra de hermenêutica que não a interpretação gramatical jurídica para entender que ao menos desde 1963, portanto há quase 60 anos, a OAB permite que o advogado seja responsabilizado por seus atos da vida privada, não se limitando, vale destacar, às condutas previstas na norma legal, pois, como dito, trata-se de rol exemplificativo.  Sobre este mérito, vale mencionar que entender de forma contrária é cercear o poder disciplinar da OAB para os casos mais graves, haja vista que, os crimes mais abjetos, como o estupro, o tráfico de drogas, a pedofilia, a agressão às mulheres, o feminicídio e outros análogos, nunca são cometidos com a respeitável toga de tão grandiosa profissão. Em data recente o Conselho Federal ratificou essa interpretação ao criar a súmula 9/19, com a seguinte redação: INIDONEIDADE MORAL. VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER. ANÁLISE DO CONSELHO SECCIONAL DA OAB. Requisitos para a inscrição nos quadros da OAB. Inidoneidade moral. A prática de violência contra a mulher, assim definida na "Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher - 'Convenção de Belém do Pará' (1994)", constitui fator apto a demonstrar a ausência de idoneidade moral para a inscrição de bacharel em Direito nos quadros da OAB, independente da instância criminal, assegurado ao Conselho Seccional a análise de cada caso concreto. Ora, por óbvio, se a violência contra a mulher, independente de atuação no exercício da profissão e de instância criminal e, portanto, do trânsito em julgado da decisão penal condenatória, é fato apto a retirar a idoneidade necessária para a inscrição nos quadros da advocacia brasileira, na forma do quanto prescreve o artigo 8º, inciso VI do EAOAB, também será apta a promover contra o advogado processo ético disciplinar por esse fato pelo inciso XXVII do art. 34 da lei, cuja pena é a exclusão dos quadros da advocacia: Art. 34. Constitui infração disciplinar: XXVII - tornar-se moralmente inidôneo para o exercício da advocacia; Art. 38. A exclusão é aplicável nos casos de: II - infrações definidas nos incisos XXVI a XXVIII do art. 34. Nesse sentido, é recentíssimo julgado abaixo: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Art. 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Acórdão unânime de Conselho Seccional da OAB. (...) Tornar-se moralmente inidôneo para o exercício da advocacia (art. 34, XXVII, EAOAB). Violência contra a mulher. Os atos de agressão contra a mulher, ainda mais atos de agressão física, praticados pelo advogado devidamente inscrito na OAB, resultam a perda de inidoneidade moral para o exercício da advocacia, e, consequentemente, infração disciplinar (art. 34, XXVII, EAOAB), independentemente de decorrerem ou tiverem qualquer relação com o exercício da profissão. A OAB não pode permitir a permanência de agressores de mulheres em seus quadros. Precedentes do Conselho Federal da OAB, no sentido de que a infração disciplinar de tornar-se moralmente inidôneo para o exercício profissional não demanda o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, pois não está vinculada à prática de crime (art. 34, XXVIII, EAOAB), mas dela também podendo decorrer, ressalvada a hipótese de decisão que negue a existência do fato ou sua autoria. Recurso não provido. (Recurso n. 49.0000.2021.003027-7/SCA-TTU. EMENTA N. 084/2022/SCA-TTU. Relatora: Conselheira Federal Ana Cláudia Pirajá Bandeira (PR). DEOAB, a. 4, 949, 29.09.2022, p. 46). Vale destaque para o trecho "Os atos de agressão contra a mulher, ainda mais atos de agressão física, praticados pelo advogado devidamente inscrito na OAB, resultam a perda de inidoneidade moral para o exercício da advocacia, e, consequentemente, infração disciplinar (art. 34, XXVII, EAOAB), independentemente de decorrerem ou tiverem qualquer relação com o exercício da profissão", restando inarredável o entendimento ora defendido. Mas, não bastasse, em 2020, portanto depois do advento da súmula, mas antes do julgado acima, o CFOAB respondeu à consulta 49.0000.2018.012292-5/OEP, da seguinte forma: Consulta. Fatos cometidos por advogado sem estar no desempenho da profissão, dentro ou fora do território brasileiro. Notícia jornalística, redes sociais ou blogs. Possibilidade de instauração de representação junto ao competente TED - Tribunal de Ética e Disciplina. Limites de atuação da OAB. (...) Fatos co-metidos por advogado sem estar no desempenho da profissão, dentro ou fora do território brasileiro. Notícia jornalística, redes sociais ou blogs. Possibilida-de de instauração de representação junto ao competente TED. 1. Conduta incompatível para fins disciplinares, significa qualquer ato omissivo ou comissivo, que não se coadune com a postura exigida para o exercício da advocacia. Não se escusa o advogado, sob o argumento de que tenha adotado esta ou aquela conduta na qualidade de cidadão comum, e não no efetivo exercício da profissão, porquanto é impossível separar estas duas situações, no que respeita a advocacia. 2. Um advogado deverá, em todo momento, manter a honra e a dignidade de sua profissão. Deverá, tanto em sua atividade profissional como na sua vida privada, abster-se de ter con-duta que possa redundar em descrédito da profissão a que pertence. 3. Espera-se do advogado atitudes condizentes com a sua função social, não sendo aceitável ambiguidades entre o exercício da profissão e sua vida pessoal, vez que devem atender aos preceitos éticos inerentes à advocacia, que não venham a denegrir e/ou manchar a dignidade da profissão. Consulta respondida. (CON-SULTA 49.0000.2018.012292-5/OEP. EMENTA N. 041/2020/OEP. Relator: Conselheiro Federal Luiz Cláudio Silva Allemand (ES). DEOAB, a. 2, 427, 3.09.2020, p. 4) Em conclusão, é plenamente possível que o advogado venha a responder administrativamente junto aos Tribunais de Ética e Disciplina do Brasil, caso, em sua vida privada, venha a cometer atos que não se coadunem com a grandeza da profissão e com a honra e a dignidade que se exige do advogado em sua postura pessoal.   *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira
quinta-feira, 1 de agosto de 2024

A quebra do sigilo profissional do advogado

Representações de clientes por quebra do sigilo profissional são bem comuns aos Tribunais de Ética e Disciplina, porque, de fato, são rotineiramente violadas. Isso ocorre muito em face de interesses pessoais, o que, acertadamente, deve ser objeto de atenção da OAB, todavia, com muita frequência se verifica a ocorrência de tais infrações disciplinares em face da falta de conhecimento dos parâmetros, limites e exceções do instituto, que são pouco conhecidos pelos operadores do direito, incluindo a advocacia, a magistratura e o Ministério Público. Como se verá à frente, ocorrem, em sua grande maioria, nos casos de demandas que tiveram início com potencial acordo entre as partes e que depois se tornaram litigiosas, optando o advogado por atender uma das partes, mas ciente dos segredos de outra; assim como em casos de advogados ex-empregados de pessoas jurídicas ou que tiveram seus contratos de prestação de serviços rescindidos, e passam a advogar contra essas empresas, representando ex-funcionários demitidos em face das informações privilegiadas que possam possuir.   O conceito de sigilo profissional não está expresso na lei, mas pode ser alcançado por exercício de hermenêutica, especialmente pela leitura do capítulo VII do Código de Ética e Disciplina, arts. 35 ao 38:   CAPÍTULO VII DO SIGILO PROFISSIONAL Art. 35. O advogado tem o dever de guardar sigilo dos fatos de que tome conhecimento no exercício da profissão. Parágrafo único. O sigilo profissional abrange os fatos de que o advogado tenha tido conhecimento em virtude de funções desempenhadas na Ordem dos Advogados do Brasil. Art. 36. O sigilo profissional é de ordem pública, independendo de solicitação de reserva que lhe seja feita pelo cliente. § 1º Presumem-se confidenciais as comunicações de qualquer natureza entre advogado e cliente. § 2º O advogado, quando no exercício das funções de mediador, conciliador e árbitro, se submete às regras de sigilo profissional. Art. 37. O sigilo profissional cederá em face de circunstâncias excepcionais que configurem justa causa, como nos casos de grave ameaça ao direito à vida e à honra ou que envolvam defesa própria. Art. 38. O advogado não é obrigado a depor, em processo ou procedimento judicial, administrativo ou arbitral, sobre fatos a cujo respeito deva guardar sigilo profissional. É tão importante para o exercício da advocacia que o legislador o elegeu como prerrogativa da profissão, na letra do artigo 7º, inciso XIX1 da lei federal 8.906/94. A doutrina2 anota que: "O sigilo profissional é de ordem pública, implícito, presumido e natural da relação entre advogado e cliente, que está justamente pautada na confiança. O sigilo profissional interessa à própria sociedade, tendo em vista que assegura o pleno direito de defesa do cidadão, garantindo ao cliente a inviolabilidade dos fatos por ele expostos ao seu advogado, daí seu status de ordem pública. A privacidade se dá não só em relação aos fatos de que o advogado tome conhecimento no exercício da profissão, mas também aos fatos a que tenha tido acesso em razão de funções desempenhadas dentro da OAB, não apenas no que toca às correspondências escritas, mas de qualquer ordem, e-mail, telefonemas, mensagens etc. O dever de sigilo profissional é ainda mais forte do que o dever de sigilo em geral, pois no caso da advocacia decorre de expressa disposição de lei, enquanto no trato da vida civil diária, decorre da cláusula geral da boa-fé e dos deveres de consideração a ela inerentes (quando não previstos em contrato)". Os arts. 20 e 21 do CED estão a tratar das relações do advogado com seu cliente, mas têm mérito específico em disciplinar o dever de sigilo profissional com ex-clientes. Como dito, são essas hipóteses que, à toda evidência, causam a maioria das representações ético-disciplinares pela quebra do sigilo profissional. Art. 20. Sobrevindo conflito de interesses entre seus constituintes e não conseguindo o advogado harmonizá-los, caber-lhe-á optar, com prudência e discrição, por um dos mandatos, renunciando aos demais, resguardado sempre o sigilo profissional. Art. 21. O advogado, ao postular em nome de terceiros, contra ex-cliente ou ex-empregador, judicial e extrajudicialmente, deve resguardar o sigilo profissional. Esse dever de sigilo profissional do advogado em relação a seu ex-cliente é tão sério que há duas potenciais condutas criminais previstas no Código Penal que podem se amoldar a tais infrações, a violação do segredo profissional do art. 1573 e o crime de patrocínio infiel, conforme a redação do art. 355 caput4 do Código Penal brasileiro. Muito já se fala no papel institucional dos Tribunais de Ética e Disciplina em contribuir como o Judiciário, tornando-se cada vez mais comum decisões que determinam seja oficiado o Ministério Público local para apuração dos fatos. O art. 20 do CED tutela contratações que têm início com partes que se entendem e o advogado é buscado por duas ou mais, não interessando se pessoas físicas ou jurídicas. São exemplos dissolução societária, divórcio, acordo de alimentos, réus ou partes requeridas comuns em ações penais ou cíveis, fusões empresariais e outros. Vale ponderar que a norma classifica expressamente as partes como "constituintes", ou seja, deve haver uma formalização da contratação, como uma consulta jurídica prestada pelo advogado, um contrato ou a outorga de uma procuração de forma a tornar vigente entre as partes a regra do sigilo. No decorrer do serviço, as partes constituintes do trabalho do advogado entram em conflito de interesse, sendo-lhe impossível atuar para ambas. Deverá, então, optar por uma delas, todavia, não terá o direito de utilizar-se de segredos revelados pela outra, sob pena da infração disciplinar em comento. É muito comum no cotidiano dos Tribunais de Ética e Disciplina representações disciplinares por essa razão, que não raro vêm acompanhadas de boletins de ocorrência pela prática dos citados crimes, razão pela qual é ideal, se possível, que ao deixar o cliente, o advogado com ele assine um termo de confidencialidade acerca os segredos sob os quais não poderá utilizar em sua atuação, ou seja, quais informações foram partilhadas que estejam classificadas no sigilo profissional. Por óbvio, haverá casos em que o ex-cliente não desejará assinar, daí surge a necessidade de uma notificação com esse conteúdo. É uma garantia ao advogado para evitar um longo e duradouro processo disciplinar. Assim, por exemplo, em um divórcio que tenha iniciado de forma consensual, optando o advogado por atuar para a mulher posteriormente ao conflito de interesses entre as partes, não poderá divulgar que o homem tem uma amante, algo que lhe foi confidenciado por seu então constituinte; não poderá divulgar seus impostos de renda, que lhe foram disponibilizados sem o conhecimento da então esposa; uma eventual renda extra; um sociedade em imóvel que esteja em nome do sócio, desconhecida da mulher etc. É fato que omitir tudo isso, no papel de advogado que estará a representar a parte ex adversa, é uma árdua missão, todavia, faz parte do compromisso de advogar. Caso o advogado não se sinta apto para bem representar a parte que escolheu em razão do conflito pelo sigilo profissional que deve manter, o mais correto é que abandone a causa, recomendando a contratação de outro colega. A situação do art. 21 é mais comum nas relações de trabalho, quando ex-empregador deseja responsabilizar advogado que atuava para a empresa. Quase sempre se trata de representações que vêm acompanhadas da acusação de infração aos incisos III e IV do art. 34, ou seja, o advogado é acusado de captar clientes demitidos da empresa, sendo beneficiado pelo conhecimento de informações sigilosas decorrentes do trabalho que exercia, chamadas de inside information, o que seria facilmente solucionado pela assinatura de um termo de quarentena remunerado. Esse problema é bastante comum na atividade empresarial e, de fato, o advogado que acaba de ser demitido de uma empresa tem realmente uma vantagem sobre os outros, sendo bastante comum ser procurado para demandas trabalhistas, entretanto, isso não quer dizer que esteja a captar clientes ou a revelar segredos em benefício próprio. Nesse sentido, recomenda-se fortemente que a empresa realize um acordo de quarentena trabalhista no momento de sua saída, onde mediante a paga de determinado valor o advogado se comprometa a não advogar, não prestar consultoria, não auxiliar ou indicar outros advogados, não estabelecer parcerias e não receber profissionalmente ex-funcionários da empresa para questões trabalhistas e outras disposições, durante determinado período de tempo, sob pena do pagamento de uma multa.   Aqui, o sigilo profissional está ligado apenas a informações não públicas, sigilosas e apenas de conhecimento da empresa, confidenciadas ao advogado para o exercício de seu trabalho. Nesse sentido, se o advogado toma conhecimento que durante determinado ano a empresa deixou de pagar o FGTS de funcionários por seis meses, em eventual contratação para reclamação trabalhista posterior, poderá utilizar-se dessa informação, que é pública, bastando ao futuro reclamante pedir na CEF o extrato de depósitos de seu fundo de garantia. Não é disso que se trata o sigilo profissional no caso concreto. Cabe pontuar que na infração disciplinar em comento o advogado, sem justa causa, quebra o dever de sigilo acima tratado, divulgando dados dos quais tomou conhecimento pelo exercício da profissão. A justa causa tem status de causa justificante administrativa, ou seja, caso a quebra do sigilo profissional ocorra nessa perspectiva, não há se falar em infração disciplinar. Conforme transcrito acima, o art. 37 do CED conceitua a justa causa como "circunstância excepcional" mencionando como hipóteses justificantes a "grave ameaça ao direito à vida e à honra ou que envolvam defesa própria". Esse rol é exemplificativo em face da preposição "como" que consta no artigo, ou seja, pode haver outras situações que autorizem a quebra do sigilo profissional que não estejam expressamente citadas no artigo, especialmente se tratar-se de questões ilícitas ou moralmente inaceitáveis. A título de exemplo, se hipoteticamente advogado demitido de empresa passa a advogar para seus ex-funcionários sem um contrato de quarentena e revela conta corrente secreta em nome de gerente da empresa, funcionária, utilizada para se esquivar de débitos trabalhistas, tornando a empresa insolvente aos olhos de seus credores e da justiça nas execuções que sofre, poder-se-ia estar diante de uma causa justificante, exatamente porque referida prática estaria potencialmente classificada como o crime de fraude à execução previsto no art. 179 do Código Penal5, sem falar na potencial litigância de má-fé e ato atentatório à dignidade da justiça, institutos do processo civil. O Conselho Federal da OAB é bastante resistente em condenar advogados pelo inciso VII do EAOAB, exatamente porque seu enfrentamento perpassa muito pelo livre exercício da profissão e pelas prerrogativas. Ora, no exemplo acima, resta claríssima a profunda discussão jurídica que tomaria palco no processo, no embate entre a liberdade de advogar, a função constitucional de auxiliar na administração da Justiça6 e os limites do sigilo profissional. Por essa exata razão, em casos de clientes pessoas físicas ou jurídicas que se entendam lesadas por referida prática, é fundamental a contratação de profissional especializado para patrocinar a representação ético-disciplinar, assim como, no caso dos advogados, sempre importante se resguardar para não infringir o inciso. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira _________ 1 Art. 7º São direitos do advogado: (...) XIX - recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que constitua sigilo profissional; 2 GONZAVA, Álvaro de Azevedo, Karina Penna Neves, Roberto Beijado Júnior, Estatuto da Advocacia e Novo Código de Ética e Disciplina da OAB, 5ª ed., Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. p. 122; 3 Violação do segredo profissional. Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa de um conto a dez contos de réis.   4 Patrocínio infiel. Art. 355 - Trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando interesse, cujo patrocínio, em juízo, lhe é confiado: Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa. 5 Fraude à execução. Art. 179 - Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou simulando dívidas: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa. 6 Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.
Há inúmeros precedentes do Conselho Federal que punem advogados com as gravíssimas infrações de locupletamento e falta de prestação de contas, porque, ao receberem valores em seus nomes por seus clientes, via do levantamento de alvarás ou pagamento de acordos, por exemplo, realizaram a glosa de seus honorários ou despesas processuais devidas.  (...) Recurso ao Conselho Federal. Decisão não unânime do Conselho Seccional. Advogado que recebe valores pertencentes ao cliente e promove o desconto de despesas processuais, sem demonstrar sua natureza e sem qualquer autorização ou expressa previsão contratual. Locupletamento e recusa à prestação de contas. Infrações disciplinares configuradas. Recurso não provido. (...) (RECURSO N. 49.0000.2016.010587-1/SCA-PTU. EMENTA N. 095/2017/SCAPTU. Relator: Conselheiro Federal Alexandre Mantovani (MS). DOU, S.1, 07.04.2017, p. 127)  (...) Recurso ao Conselho Federal. Decisão não unânime do Conselho Seccional. Advogado que recebe valores pertencentes ao cliente e promove o desconto dos honorários advocatícios e alegadas despesas processuais, sem qualquer autorização do cliente ou expressa previsão contratual. Condenação por violação ao art. 34, XXI, do EAOAB. Recurso não provido. (...) (RECURSO N. 49.0000.2016.007598-5/SCA-PTU.  EMENTA N. 065/2017/SCA-PTU. Relator: Conselheiro Federal Valdetário Andrade Monteiro (CE). DOU, S.1, 20.03.2017, p. 154)  Como visto, a prática não é autorizada e, não bastasse, capaz de gerar consequências gravíssimas, inclusive a prorrogação de eventual sanção de suspensão até que o advogado devolva ao cliente todos os valores que forem apurados como glosados indevidamente. Os precedentes estão corretos, pois em face da hipossuficiência técnica do contratante em relação a seu advogado, assim como da grandeza da profissão e responsabilidade social atribuída à advocacia, é de suma importância a mais absoluta transparência e correção na lida com o dinheiro de outrem, o que justifica a dura postura do sistema OAB. A norma explicativa a justificar tais condenações fazia parte do antigo Código de Ética e Disciplina da OAB, na letra de seu artigo 35, §2º1 e acabou sendo incorporada à redação da Resolução n.º 02 de 2015 do CFOAB, o novo CED, agora no artigo 48, §2º2, com pequenas alterações. A exegese do dispositivo revela que embora o novo CED tenha validado os contratos verbais com a inserção da expressão "preferentemente" no caput, eventuais descontos e glosas em valores recebidos em nome do cliente, a que título ocorrerem, devem ter como espeque expressa autorização contratual, que, claro, só pode ser realizada em contratos escritos. Outra exigência jurisprudencial é a específica e detalhada prestação de contas no momento do repasse, que deve afastar qualquer dúvida sobre as glosas, ou seja, não basta apenas o contrato prever a possibilidade do desconto, que deve ser realizado com minuciosa descrição da operação para bem demonstrar o que se está a descontar. Já falamos sobre o tema em artigo anterior (clique aqui para ler) Vale lembrar, por oportuno, que nada impede que o advogado ou até o cliente alterem seus contratos em vigor via de aditivo para fazer constar referida cláusula, de forma a deixar registradas as tratativas, valores, autorizações e demais disposições em relação ao trabalho que vem sendo realizado. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira __________ 1 Art. 35. Os honorários advocatícios e sua eventual correção, bem como sua majoração decorrente do aumento dos atos judiciais que advierem como necessários, devem ser previstos em contrato escrito, qualquer que seja o objeto e o meio da prestação do serviço profissional, contendo todas as especificações e forma de pagamento, inclusive no caso de acordo. (...) § 2º A compensação ou o desconto dos honorários contratados e de valores que devam ser entregues ao constituinte ou cliente só podem ocorrer se houver prévia autorização ou previsão contratual. 2 Art. 48. A prestação de serviços profissionais por advogado, individualmente ou integrado em sociedades, será contratada, preferentemente, por escrito. (...) § 2º A compensação de créditos, pelo advogado, de importâncias devidas ao cliente, somente será admissível quando o contrato de prestação de serviços a autorizar ou quando houver autorização especial do cliente para esse fim, por este firmada.
O art. 34, inciso V da lei federal 8.906/94 criou tipo administrativo pouco utilizado pela advocacia, talvez por falta de conhecimento sobre a matéria, que é a mácula disciplinar decorrente do plágio, da cópia, da reprodução fiel como menor esforço, do "furto" intelectual.   O preceito primário da norma é assim redigido: "V - assinar qualquer escrito destinado a processo judicial ou para fim extrajudicial que não tenha feito, ou em que não tenha colaborado". A conduta nuclear é "assinar", ou seja, via de assinatura com sua escrita ou por meio digital, o infrator atesta a terceiros tratar-se de obra de sua autoria, nas formas previstas na lei.  A principal vontade do legislador foi a de evitar a delegação extrema de atos privativos do advogado infrator e o plágio de petições ou documentos extrajudiciais.  A conduta é aberta e pode ser realizada de várias formas, todavia, a prova nesses casos é sempre muito difícil, conforme atesta o Conselho Federal, que exige ser cabal e conclusiva para eventual condenação (RECURSO 49.0000.2013.009269-2/SCA-STU. EMENTA 015/2014/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal Luciano Demaria (SC). DOU, S.1, 25.02.2014, p. 161/164). O principal caso a demonstrar referida conduta seria o plágio de petições, bastante comum atualmente. Com a disseminação do processo eletrônico, hoje, à distância de poucos cliques de mouse, a advocacia tem acesso a qualquer petição, de qualquer advogado, de qualquer matéria.  Pois bem, não há mácula disciplinar se o advogado se utiliza de teses criadas por colegas para reforçar suas defesas e petições, como seria o caso de aproveitar tese de exceção de incompetência realizada por outro colega em ação penal com muitos réus, para o próprio cliente, não é disso que trata a norma. Nesse caso, o que a lei proíbe é que o advogado copie o incidente, levando-o aos autos do feito como se seu fosse. Deve, portanto, aproveitar a tese, escrevendo sua petição.  Também é caso dessa infração o advogado que exige que outros trabalhando para seu escritório criem teses e apresentem petições ou proponham ações e não possam assinar em nome próprio ou conjuntamente, desde que nenhum desses trabalhos tenha contado com a colaboração do pretenso infrator.  Essa colaboração, todavia, pode ser ínfima, porque não há gradação na lei. Assim, a mera orientação do advogado sobre qual petição fazer, uma especificação de provas, por exemplo, já seria considerada colaboração, ainda que não tenha sequer visto a petição pronta e protocolizada.  Esse tipo administrativo bem admite a aplicação do princípio da insignificância, haja vista a possibilidade de enquadramento de situações do cotidiano da advocacia que acabem por se amoldar às condutas previstas, todavia, praticadas em um contexto sem reprovabilidade, não alcançando assim a nominada tipicidade material.  Também é possível o cometimento da infração em escritos extrajudiciais, como seria o caso de um escritório de advocacia copiar o contrato de outro para passar a utilizar com seus clientes, ou um termo de confidencialidade e assim por diante.  Por óbvio, a autorização do escritório proprietário do contrato exclui a mácula disciplinar. Vale ainda pontuar que a expressão "fim extrajudicial" que consta da lei não se limita à atividade da advocacia, podendo estar vinculada à vida privada do advogado. Nesse sentido, por exemplo, se em curso de pós-graduação o advogado compra tese de monografia ou copia outra, já pronta, estaremos diante da conduta do inciso V, caso não esteja configurada outra mais grave, lembrando que há muitos anos o Conselho Federal já pacificou a ideia que as infrações ético/disciplinares podem ocorrer fora da atividade da advocacia, por atos da vida privada do advogado.  Assim, se sua advocacia já foi vítima desse tipo de conduta há menos de cinco anos, ainda há possibilidade de responsabilização do eventual infrator.   *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)
O drama do sistema OAB para manutenção da qualidade dos julgados disciplinares é de todos conhecido, especialmente no desproporcional duelo entre a multiplicação descontrolada no número de advogados e a falta de recursos disponibilizada aos Tribunais de Ética e Disciplina espalhados pelo Brasil. Literalmente, uma disputa entre Davi e Golias, todavia, nesse caso, Davi não tem a iluminação divina. Nunca é demais lembrar que os Membros dos Tribunais de Ética e Disciplina são bravos e valorosos advogados e advogadas que optam por trabalhar de forma graciosa para o sistema OAB, sem qualquer incentivo, remuneração e, às vezes, até mesmo reconhecimento. Exatamente por essa situação, muitas vezes falta ao intérprete da lei em sua nobre e difícil missão de bem aplicar o direito administrativo repressivo a necessária capacitação técnica para cargo de tamanha responsabilidade, o que acarreta algumas distorções em julgamentos, aprimorados, posteriormente, pela via recursal acessada apenas por experientes advogados de defesa especializados no processo disciplinar na OAB. São raros. Isso posto, é bastante comum condenações tratadas pela jurisprudência como dupla capitulação, que ocorrem quando apenas uma conduta no mundo dos fatos é duplamente punida pelos Tribunais de Ética e Disciplina, que capitulam o ato em duas ou mais hipóteses do CED ou do EAOAB. Essa interpretação não é válida, por configurar o bis in idem, conforme julgados abaixo: Recurso ao Conselho Federal. Preliminares. Mérito. Locupletamento, facilitação do exercício profissional a pessoa não inscrita nos quadros da OAB, captação de causas e conduta incompatível com a advocacia. Fatos não negados pelo advogado. Alegação de nulidades processuais ocorridas no curso da instrução, somente arguidas após a condenação pelo Tribunal de Ética e Disciplina. Vedação à utilização dos meios processuais como instrumentos difusores de estratégias, de modo a arguir nulidades processuais somente no momento em que for oportuno à parte. Ausência de qualquer prejuízo à defesa. Pleno exercício do contraditório e ciência dos fatos objeto de apuração, tanto que o advogado informou que houve posterior acordo judicial entre as partes. Dupla capitulação pelos mesmos fatos. Vedação ao bis in idem. Afastamento da condenação por conduta incompatível com o exercício da advocacia, tipificada no artigo 34, XXV, do EAOAB. Consequente redução da pena de suspensão de 12 (doze) para 10 (dez) meses. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da Terceira Turma da Segunda Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por maioria, em dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto divergente do Conselheiro Federal Silvio Pessoa de Carvalho Júnior (PE). Brasília, 8 de maio de 2017. (RECURSO N. 49.0000.2016.005131-9/SCA-TTU, EMENTA N. 095/2017/SCA-TTU. Relator: Conselheiro Federal José Agenor Dourado (MA). Relator para o acórdão: Conselheiro Federal Silvio Pessoa de Carvalho Júnior (PE). DOU, S.1, 11.05.2017, p.171)  Capitulação do mesmo fato como dupla infração disciplinar. Arbitrária subsunção punitiva. Desrespeito ao princípio do bis in idem. Impossibilidade. Se a conduta do recorrente vem tipificada como hipótese de angariação de clientela, não se pode identificar tal conduta, concomitantemente, como incompatível com a advocacia, sob pena de arbitrária subsunção punitiva e inaceitável bis in idem. Recurso admitido e provido em parte para restringir a condenação apenas à infração disciplinar prevista no inc. IV, do art. 34, do EAOAB, com aplicação da pena de suspensão de trinta (30) dias, tendo em vista condenação anterior pelo mesmo fato, de acordo com o disposto no art. 37, II do Estatuto. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os Senhores Conselheiros integrantes da 1ª Turma da Segunda Câmara do CFOAB, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Relator. Brasília, 06 de dezembro de 2010. Gilberto Piselo do Nascimento, Presidente da 1ª Turma da Segunda Câmara. Carmelino de Arruda Rezende, Relator. (RECURSO 2009.08.07008-05/SCA. EMENTA 282/2010/SCA-PTU. Rel.: Conselheiro Federal Carmelino de Arruda Rezende (MS). DJ. 23/12/2010, p. 11)  Nesses casos, umas das possíveis soluções é a aplicação do princípio da especialidade, via de interpretação gramatical à norma legal, ou seja, compara-se a conduta do mundo real às hipóteses legais cujo enquadramento seja possível, classificando a infração disciplinar na redação normativa que encontrar a mais perfeita tipicidade administrativa, descartando-se a outra. Também é bastante comum que a dupla condenação advenha da realização de infração ética ou disciplinar que tenha sido um meio para levar o infrator ao cometimento de outra, mais grave. Exemplo ipsis litteris do que aqui se trata foi objeto de escrito anterior (clique aqui para ler), onde se demonstrou que até mesmo infrações disciplinares mais brandas, como a captação de clientela dos incisos III e IV do artigo 34 da Lei Federal 8.906-94, podem, na verdade, estar a esconder conduta muito mais grave, como a conduta incompatível com a advocacia prevista no inciso XXV, sujeita à suspensão disciplinar e muitas vezes até à suspensão preventiva prevista no artigo 70, §3º do EAOAB. Em casos análogos, é comum aos Tribunais de Ética a condenação por todos os incisos, ou seja, no caso acima, pelo III, IV e XXV do artigo 34. Não é essa a solução correta em face do princípio da consunção, também chamado de absorção ou lex consumens derogat legi consumptaetem, que se verifica quando o cometimento de um crime, ou, em caso, de uma infração disciplinar, é estritamente funcional1 para o advogado cometer outra, mais grave, hipótese na qual a última absorve a mais branda. Analogamente ao direito penal, são as hipóteses dos chamados crimes progressivos, como ensina o mestre Nelson Hungria "Crime progressivo: ocorre quando, da conduta inicial que realiza um tipo de crime, o agente passa a ulterior atividade, realizando outro tipo de crime, de que aquele é etapa necessária ou elemento constitutivo (reconhecida a unidade jurídica, segundo a regra do ubi major, minor cessai). Distingue-se do crime continuado poque o crime anterior (menos grave) insere-se na própria estrutura do crime subsequente (mais grave)"2. Desta forma, cabe sempre à defesa, e posteriormente ao Julgador, perquirir se há intersecção nas condutas em julgamento, de forma a evitar o bis in idem. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) _____________ 1 MARINUCCI, Giorgio; DOLCINI, Emilio. Manuale di diritto penale. 3. ed. Milano: Giuffrè, 2009. 2 HUNGRIA, Nélson e Heleno Cláudio Fragoso. Comentários ao Código Penal, Volume I, Tomo II. Arts. 11 ao 27. 5ª Ed. Rio de Janeiro, Forense, 1978. p. 47.
Uma das mais severas punições disciplinares previstas no sistema OAB é exatamente a ausência de prestação de contas, que consta do inciso XXI da Lei Federal 8.906/94, logo após a repudiada prática do locupletamento. Em que pese o senso comum acreditar que a pior das práticas a ser atribuída a um colega advogado seja exatamente locupletar-se às custas de seu cliente, a verdade é que a negativa de prestação de contas é tida pelo legislador como muito mais grave e séria, tanto assim que a lei apenas autoriza, nesses casos, que a sanção de suspensão aplicada perdure até que a dívida seja integralmente satisfeita, inclusive com juros de mora e correção monetária, conforme já dissemos (clique aqui para ler)   É dizer que, ao advogado que se locupleta, mas presta contas, não caberia, em tese, a temida prorrogação da suspensão, haja vista que o artigo 37, §2º do EAOAB1, trata apenas dos incisos XXI e XXIII do artigo 34, todavia, o STF declarou a inconstitucionalidade quanto ao inciso XXIII no RE 647885, o que inclusive fez gerar o tema de repercussão geral 7322. Restou, assim, a possibilidade de prorrogação da suspensão apenas para o inciso em comento. Na aplicação prática dos processos disciplinares no sistema OAB, entretanto, é comum que ambas as condutas caminhem juntas, ou seja, o locupletamento unido da ausência de prestação de contas, o que ocorre, em regra, porque o advogado indisciplinado que comete o locupletamento, por exemplo nos casos de apropriação indébita de valores de cliente, não irá prestar contas confessando o crime potencial, o que se revela um dos casos mais comuns de condenações. Nada obstante a hipótese acima, há uma infinidade de outros casos de condenação por locupletamento que acabam arrastando a condenação por ausência de prestação de contas, impondo ao advogado a severa prorrogação. Os exemplos mais comuns são o recebimento de valores sem a contraprestação dos serviços e diferenças quanto ao percentual dos honorários. O cliente afirma que restaram pactuados 20%, todavia, o advogado reteve 30%, além de outros. Para os casos acima, uma correta e transparente prestação de contas afastaria a imputação do inciso XXI, e, portanto, a prorrogação da suspensão para além do prazo do acórdão, ainda que sobreviesse a condenação por locupletamento. Importante ainda lembrar da alteração legal trazida ao EAOAB pela lei 11.902/09, que criou a prescrição quinquenal para a prestação de contas. Em outras palavras, a Lei limitou a prorrogação da suspensão do artigo 37, §2º ao prazo de 5 (cinco) anos. Não há dúvida, todavia, que suspensão tão longa do direito de advogar é suficiente para afetar gravemente a advocacia de qualquer um, acarretando danos irreparáveis à profissão condenado. Assim, é de singular importância ao advogado que em casos de divergências com o cliente, realize a correta prestação de contas, para que, na eventual hipótese de representação disciplinar por locupletamento, possa ser afastado o inciso que trata da prestação de contas.     *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ______________ 1 Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de: (...) § 2º Nas hipóteses dos incisos XXI e XXIII do art. 34, a suspensão perdura até que satisfaça integralmente a dívida, inclusive com correção monetária 2 Tese: É inconstitucional a suspensão realizada por conselho de fiscalização profissional do exercício laboral de seus inscritos por inadimplência de anuidades, pois a medida consiste em sanção política em matéria tributária.
O pior e mais injusto labeling atribuído à OAB e aos Tribunais de Ética e Disciplina é a funesta ideia de conveniência em seus julgamentos, como se os órgãos de fiscalização e controle da Ordem dos Advogados do Brasil fossem redutos de políticas menores e convenientes. Contrariamente, assim como ocorre no CNMP e no CNJ por exemplo, a OAB tem um fortíssimo sistema de controle de seus administrados, que ao longo do tempo e especialmente pelo fenômeno de multiplicação dos advogados, tem se tornado cada vez mais rígido. É missão da Ordem dos Advogados do Brasil não perder controle sobre a advocacia, posicionando-se sempre como um farol guia para manutenção das boas práticas, da ética e da disciplina no exercício profissional, principalmente em face da importância e grandeza da profissão, bem definidas no artigo 133 da Constituição Federal de 19881. A garantir essa qualidade na atuação, até pelo quanto disciplina do artigo 68 do EOAB2, têm aplicação no processo disciplinar da OAB todos os princípios de regência aplicáveis aos Juízes, com especial ênfase à imparcialidade e ao princípio do juiz natural decorrente do art. 5º, inciso XXXVII da Constituição Federal3. Realizados os destaques sobre o eficaz sistema fiscalizatório punitivo da OAB, ganha importância e relevância a defesa técnica, onde a sustentação oral é ato essencial. O ato de realizar a sustentação oral carrega importantes valores ao direito de defesa e ao direito público, pois é capaz de (a) aperfeiçoar o processo de adjudicação da causa, pela reflexão coletiva dos julgadores e oportunidade das partes explicarem pessoalmente suas versões sobre a defesa; (b) assegurar o direito de audiência (day in court) das partes, em decorrência da atenção pessoal dispensada pelos integrantes do colegiado votante à questão quando o advogado está presente a sustentar; (c) legitimar o julgamento recursal aos olhos da sociedade; e (d) educar as partes sobre os critérios decisórios dos julgadores, o que leva ao aumento da qualidade da litigância recursal a longo prazo4.  O STJ também ratifica o valor do ato à defesa, conforme se vê pela recente decisão no HC n. 666.179/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, citando decisão já firmada no Tribunal Cidadão pelo julgamento do HC 364.512/RJ ainda em 2017, esse com relatoria do Ministro Rogério Schietti Cruz: HABEAS CORPUS ORIGINÁRIO. NULIDADE DA SESSÃO DE JULGAMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. NEGATIVA DE SUSTENTAÇÃO ORAL PERANTE O TRIBUNAL DE ORIGEM. NÃO ATENDIMENTO AO PEDIDO DE INSCRIÇÃO PARA SUSTENTAÇÃO ORAL FEITO 48 HORAS ANTES DA SESSÃO VIRTUAL DE JULGAMENTO. ORDEM CONCEDIDA. 1. Não há falar em habeas corpus substitutivo do recurso próprio quando o constrangimento ilegal apontado pelo impetrante teria sido praticado pelo próprio Tribunal de origem, ao negar o direito à sustentação oral defensiva no julgamento do recurso apelatório, o que possibilita a impetração do habeas corpus originário (art. 105, inciso I, alínea "c", da Constituição Federal de 1988). 2. Como é de conhecimento, o direito de sustentar oralmente constitui prerrogativa de essencial importância, cuja frustração afeta o princípio constitucional da amplitude de defesa (HC 364.512/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, julgado em 15/12/2016, DJe de 6/2/2017). 3. Conforme o art. 5º, parágrafo único, da Resolução n. 314 do Conselho Nacional de Justiça, eventuais pedidos de inscrição prévia para sustentação oral podem ser feitos após a disponibilização da pauta na imprensa oficial, mediante requerimento a ser enviado, preferencialmente, com 72 horas de antecedência ao início da sessão, observado o limite de 24 horas que a antecederia. 4. Na hipótese, afigura-se ilegal a fundamentação da Corte local para negar ao advogado do paciente o direito de realizar sustentação oral, visto que, 48 horas antes do julgamento virtual da apelação, dentro, portanto, do prazo mínimo de 24 horas, o causídico enviou o seu pedido, no endereçamento correto ([email protected]), para sustentar oralmente, conforme o documento trazido à e-STJ fl. 9. 5. Ordem concedida para anular o julgamento do Apelação Criminal n. 0001132-39.2018.8.26.0624 para que outro seja proferido, dessa vez, com a sustentação oral da defesa, determinando, ainda, a revogação da custódia cautelar do paciente, com o restabelecimento do comando contido na sentença para que o réu possa recorrer em liberdade. (HC n. 666.179/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 28/9/2021, DJe de 4/10/2021.) Para além dos critérios técnicos a valorar a importância da sustentação oral, os anos de prática na Presidência do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/DF ensinaram que todos os julgamentos de processos disciplinares em órgãos colegiados têm um forte apelo emocional, pois aqueles que julgam estão decidindo o futuro de seus pares. Na OAB não é diferente. Embora impere no sistema OAB a correção nos julgamentos e a imparcialidade dos julgadores, vale lembrar que esse direito não é sinônimo de neutralidade. Como ensina CASARA, enquanto a imparcialidade do juiz é uma garantia do jurisdicionado; a neutralidade é impossível, um mito5. No ponto, é inafastável assumir que a atuação do julgador sofrerá influências conscientes ou inconscientes por suas experiências pessoais e condicionantes internos, como valores e aprendizados ao longo da vida sobre os campos socioeconômicos, político-ideológicos, morais, estéticos, religiosos, vieses cognitivos e outros. De forma idêntica, influências externas, somadas às internas já citadas, também podem ser mecanismo influenciador de decisões, como ocorre com a pressão da mídia6. Para melhor ilustrar vale o seguinte exemplo: um julgador do Tribunal de Ética, no passado, teria sido condenado à sanção disciplinar de suspensão por 60 (sessenta) dias pelo inciso XVII do artigo 34 do EAOAB7, pois supostamente influenciou seu cliente a erigir construção em área verde onde o ato era proibido. À época, em sua defesa, sustentou que nunca incentivou o cliente, mas, contrariamente, sempre o orientou sobre os riscos de referida ação. De nada adiantou e adveio a condenação, que sempre causou grande revolta e sentimento de indignação no profissional. Agora, imagine que referido julgador é designado relator de um caso praticamente idêntico, onde o advogado representado sustenta tese análoga àquela que utilizou no passado em sua própria defesa. É de rigor assumir que inevitavelmente suas experiências passadas irão influenciar no julgamento, sem que com isso esteja impedido ou suspeito para o julgamento. De igual forma, a Julgadora que já tenha sido vítima de violência doméstica terá uma visão diferente de um processo com esse mérito daquela de outro julgador, homem, ainda não desmascarado, que cometa esse triste ato de violência no silêncio de sua casa.   Estabelecido que imparcialidade não é neutralidade, advém o inexorável reconhecimento da importância da sustentação oral, que será o momento em que a parte que é julgada terá condição de expor suas razões de defesa a seus pares, julgadores e julgadoras, que também vivem em seu cotidiano as agruras e dificuldades da advocacia. Assim e em conclusão, dentre os atos da defesa no processo disciplinar da OAB a sustentação oral é importantíssima, devendo sempre ser realizada por advogado da confiança do representado, apto à lida nos Tribunais de Ética e Disciplina e preparado para bem expor as teses resistivas. *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto com o advogado. Acesse o perfil no Instagram: @antonioalbertocerqueira __________ 1 Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. 2 Art. 68. Salvo disposição em contrário, aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil, nessa ordem. 3 XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção; 4 MALAN, Diogo. Disponível em https://www.conjur.com.br/2021-abr-07/diogo-malan-advocacia-criminal-arte-sustentacao-oral apud AMERICAN ACADEMY OF APPELLATE LAWYERS. Oral Argument Task Forte Report (2015)). Disponível aqui. 5 CASARA, Rubens R. R. Mitologia Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 2015, p.144; 6 CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. DUARTE, Bernardo Augusto Ferreira. Além do Positivismo Jurídico. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2013, p. 165. 7 XVII - prestar concurso a clientes ou a terceiros para realização de ato contrário à lei ou destinado a fraudá-la.
Conforme exposto nos comentários referentes ao princípio da publicidade no processo disciplinar da OAB (clique aqui para ler), aplicam-se todas as regras processuais e legais relacionadas, especialmente à luz do quanto prescrevem os normativos constitucionais sobre a matéria e a lei federal 13.668/18 que criou o Diário Eletrônico da Ordem dos Advogados do Brasil. Pois bem, referidas normas são para dar publicidade extra-autos, mas o princípio da publicidade também guarda correlação com o que é inserido no processo disciplinar. Nesse sentido, para além da juntada aos autos de todas as provas produzidas e manifestação das partes, assim como das decisões proferidas, também é imprescindível que quando existentes, sejam juntados aos autos tanto o voto-vista, quanto eventualmente o voto divergente, harmonizando no processo publicidade, contraditório e ampla defesa. Para reforçar a premissa, cumpre destacar que há recursos no sistema OAB que têm seu cabimento exatamente relacionado ao resultado dos julgamentos. Quando há julgamento por maioria, eventualmente pode ser admissível recurso, como é o caso daquele previsto no artigo 89-A, §3º do Regulamento Geral da OAB:  Art. 89-A. A Segunda Câmara será dividida em três Turmas, entre elas repartindo-se, com igualdade, os processos recebidos pela Secretaria. § 3º Das decisões não unânimes das Turmas caberá recurso para o Pleno da Segunda Câmara. Esse modelo recursal em regra é copiado internamente nas Seccionais pelos regimentos internos dos Tribunais de Ética e Disciplina, valendo como exemplo o artigo 8º, inciso III do Regimento Interno do TED OAB/DF:  Art. 8º - Compete ao Tribunal Pleno: III- julgar em grau de recurso, as decisões proferidas pelo Presidente e não unânimes das Turmas;  Vê-se, pois, a necessidade da juntada de ambos ao processo, ou seja, tanto do voto-vista quando do voto divergente. O Regulamento Geral da OAB trata das Sessões dos órgãos colegiados do Conselho Federal, sendo que seus normativos inspiram também as Sessões dos órgãos das Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil, que têm liberdade para disciplinar regimentalmente alterações na forma de julgamento de seus processos via de seus regimentos internos, mas que, todavia, não podem fazê-lo no que toca ao processo disciplinar, por força do quanto determina o parágrafo único do artigo 154.  Art. 154. Os Provimentos editados pelo Conselho Federal complementam este Regulamento Geral, no que não sejam com ele incompatíveis. Parágrafo único. Todas as matérias relacionadas à Ética do advogado, às infrações e sanções disciplinares e ao processo disciplinar são regulamentadas pelo Código de Ética e Disciplina.  Por sua vez, o CED OAB, Resolução 02/15, disciplina a forma do voto no processo disciplinar da OAB em seus artigos 61 e 62:  Art. 61. Do julgamento do processo disciplinar lavrar-se-á acórdão, do qual constarão, quando procedente a representação, o enquadramento legal da infração, a sanção aplicada, o quórum de instalação e o de deliberação, a indicação de haver sido esta adotada com base no voto do relator ou em voto divergente, bem como as circunstâncias agravantes ou atenuantes consideradas e as razões determinantes de eventual conversão da censura aplicada em advertência sem registro nos assentamentos do inscrito. Art. 62. Nos acórdãos serão observadas, ainda, as seguintes regras: § 1º O acórdão trará sempre a ementa, contendo a essência da decisão. § 2º O autor do voto divergente que tenha prevalecido figurará como redator para o acórdão. § 3º O voto condutor da decisão deverá ser lançado nos autos, com os seus fundamentos. § 4º O voto divergente, ainda que vencido, deverá ter seus fundamentos lançados nos autos, em voto escrito ou em transcrição na ata de julgamento do voto oral proferido, com seus fundamentos. § 5º Será atualizado nos autos o relatório de antecedentes do representado, sempre que o relator o determinar.  Como bem se vê, não é necessária a juntada aos autos do voto divergente ou do voto-vista que não tenham prevalecido no julgamento. Essa prescindibilidade decorre da menor formalidade ligada a esses votos e ao incentivo aos debates e à celeridade processual. Ora, pode ser que eventual divergência surja no momento da sustentação oral e um dos julgadores tome a palavra na fase de debates para realizar um voto divergente instantâneo, ou seja, naquele momento. É absolutamente prescindível e seria altamente ineficaz exigir daquele julgador que se manifestou a confecção de um voto escrito sobre sua manifestação para ser juntado aos autos. A óbvia e única consequência seria o desestímulo aos debates e o prejuízo à qualidade do julgamento. De outro lado, todavia, é direito daquele que está sendo julgado, na forma da publicidade já comentada, ter acesso ao conteúdo dos debates e do julgamento. A forma de solucionar o problema é tornar imperioso que o Presidente da Sessão conceda o tempo necessário, assim como auxílio técnico, para que o secretário do ato tome notas cuidadosas sobre o teor de referidas manifestações, evitando assim incorreções ou omissões e, portanto, nulidades. Daí também exsurgir a conclusão de que a gravação da Sessão é importantíssima ferramenta ao bom trabalho do órgão da OAB, pois sempre será fonte de consulta em caso de alguma dúvida sobre o conteúdo do voto. No caso de não juntada do voto e sua substituição pelo extrato do julgamento na ata da Sessão, o norte sobre o quanto deve constar na ata é exatamente permitir que a fundamentação seja suficiente para o manejo do recurso. Se no momento administrativo posterior à Sessão, quando for realizada a confecção, a formalização e a revisão para o fechamento da ata, o secretário da Sessão de julgamento não estiver apto à reprodução de tudo quanto foi julgado, votado e decidido, deverá pedir que o relator do voto-vista ou do voto-divergente forneça suas razões por escrito, evitando assim prejuízo à parte e, portanto, nulidade; caso seja medidas mais simples, poderá apenas consultar a gravação da Sessão.  Exigir-se-á, todavia, a juntada do voto-vista ou do voto divergente integral quando seu conteúdo prevalecer totalmente, pois nesse caso altera-se o relator natural do processo. Nessa hipótese, obrigatoriamente, devem compor os autos ambos os votos. No caso de voto divergente que tenha fração prevalente no julgamento, como, hipoteticamente, um caso em que são julgadas concomitantemente cinco infrações disciplinares cometidas pela parte representada e há voto divergente vencedor que sustenta apenas a prescrição de uma delas, acompanhando o relator quanto às demais, também será prescindível a juntada do voto, bastando as referências completas na ata de julgamento da sessão quanto à parte vencedora. Por último, vale lembrar que eventual publicação que dê início ao prazo recursal sem que os autos estejam completos na forma acima, será causa de nulidade processual por violação do direito de defesa e do contraditório, pois não é possível o exercício de recurso sem a materialização do julgamento no processo, com a presença de todos os votos e manifestações, dependendo, sempre, à luz dos artigos 68 do EAOAB e 563 do CPP, da prova do prejuízo, que deverá ser demonstrada pela defesa em face da aplicação no Brasil do princípio  pas de nullité sans grief. ____________ *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto (clique aqui) com o advogado.
Um dos princípios mais importantes ao estado democrático de direito é o da publicidade dos atos públicos, tanto assim que para além de encampar todos os códigos de processo do ordenamento jurídico brasileiro, encontra previsão constitucional não só no artigo 371 da Carta Maior, mas no rol das garantias individuais, cláusulas pétreas, citado diretamente nos incisos LX2, XXXIII3 do artigo 5º. Esse princípio é de tamanha envergadura que se torna corolário de todo o sistema de garantias, pois sem a publicidade, não há se falar em ampla defesa, no contraditório, na necessidade de fundamentação das decisões e no devido processo legal, todos pilares de sustentação do processo. Na OAB não é diferente, pois sempre se respeitou a necessidade da publicidade dos atos. Antes de 2018, todavia, a observância à básica regra processual era um fardo ao processo disciplinar da OAB, pois para se dar a publicidade dos atos, fazia-se necessário a intimação pessoal do representado por correspondência, para todo e qualquer ato. Com o advento da lei Federal 13.668/2018, a OAB criou o Diário Eletrônico da Ordem dos Advogados do Brasil, que muito otimizou os processos. A norma alterou o EAOAB, cujo artigo 69, §2º passou a ter a seguinte redação: Art. 69. Todos os prazos necessários à manifestação de advogados, estagiários e terceiros, nos processos em geral da OAB, são de quinze dias, inclusive para interposição de recursos. (...) § 2º No caso de atos, notificações e decisões divulgados por meio do Diário Eletrônico da Ordem dos Advogados do Brasil, o prazo terá início no primeiro dia útil seguinte à publicação, assim considerada o primeiro dia útil seguinte ao da disponibilização da informação no Diário.  A nova ferramenta foi um divisor de águas no processo disciplinar, pois importou em grande incremento na celeridade do processo e é reconhecida pelo Conselho Federal como mecanismo de publicidade das sanções disciplinares: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Artigo 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Acórdão unânime de Conselho Seccional da OAB. Revisão de processo disciplinar. Indeferimento. Ausência dos pressupostos de admissibilidade do artigo 73, § 5º, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Edital de suspensão. Publicação no Diário Eletrônico da OAB. Advogado recolhido em sala de Estado Maior ao tempo da publicação do edital de suspensão do exercício profissional. Irrelevância. Ato administrativo que tem por finalidade dar publicidade ao ato de execução da sanção disciplinar, dando publicidade à punição imposta pela OAB, materializando-se o princípio da publicidade dos atos administrativos. (...). Brasília, 21 de junho de 2022. (Recurso n. 16.0000.2021.000113-9/SCA-STU. EMENTA N. 050/2022/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal Emerson Luis Delgado Gomes (RR). DEOAB, a. 4, n. 886, 1º.07.2022, p. 20). Nada obstante, o princípio da publicidade não está apenas e tão somente na comunicação dos atos oficiais, mas também na materialização de seu conteúdo no processo, especialmente pela juntada das decisões proferidas nos julgamentos, sejam elas favoráveis ou desfavoráveis à parte. Nesse sentido, para dar validade ao processo e se observar a necessária publicidade, sempre que se for dar cumprimento a qualquer decisão, é necessário que seu conteúdo componha os autos, como, por exemplo, um acórdão. Assim, a título de exemplo e embora vigente com vigor no sistema OAB o princípio pas de nullité sans grief4, não se pode dar efetividade ao quanto decidido por órgão colegiado da OAB sem que o referido acórdão esteja nos autos, não sendo suficiente a publicação do extrato de julgamento no Diário Eletrônico da OAB, haja vista o claro prejuízo do direito ao recurso, o que violaria por consequência a ampla defesa e o contraditório. Outro exemplo bastante importante são os votos vista, assim como os votos divergentes. Embora não encontrem previsão legal para juntada física no processo disciplinar, ou seja, sua juntada completa é prescindível e podem ser lançados nos autos por simples extrato na ata de julgamento que reflita e contenha os fundamentos mínimos do voto, não há como o processo avançar sem referido conteúdo, tanto assim que é comum no sistema OAB o cabimento de recurso de decisões não unânimes, o que encontra previsão em quase todos os regimentos internos Seccionais e também no artigo 89-A, §3º do Regulamento Geral da OAB: Art. 89-A. A Segunda Câmara será dividida em três Turmas, entre elas repartindo-se, com igualdade, os processos recebidos pela Secretaria. (...) § 3º Das decisões não unânimes das Turmas caberá recurso para o Pleno da Segunda Câmara Em conclusão, o princípio da publicidade foi integralmente recepcionado pelo sistema OAB e não se materializa apenas e tão somente na publicação dos atos no Diário Eletrônico, mas também na imperiosa necessidade de que todas as decisões que gerem efeitos no mundo dos fatos estejam previamente à publicação, a compor os autos, façam parte do processo, incluídas as decisões monocráticas, colegiadas, os votos divergentes e os votos vista. *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto com o advogado (clique aqui). __________ 1 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: 2 LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; 3 XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; 4 Recurso a Terceira Câmara do Conselho Federal da OAB. (...) Supressão das alegações finais, aplicação do princípio "pas de nullité sans grief", não se declara a nulidade de um ato sem que seja evidenciado o prejuízo causado por ele, aplicação do art. 277 do Código de Processo Civil, a finalidade das alegações finais foi alcançada pela sustentação oral, aplicação do princípio da finalidade e economia processual. (...) Brasília, 21 de junho de 2022. (RECURSO N. 49.0000.2022.000359-7/TCA. EMENTA N. 035/2022/TCA. Relatora: Conselheira Federal: Silvia Virginia Silva de Souza (SP). DEOAB, a. 4, n. 881, 24.06.2022, p. 8).
Dentre as mais graves condutas disciplinares praticadas pelo advogado contra seus clientes estão o locupletamento previsto no artigo 34, inciso XX1 e a consequente ausência de prestação de contas, ainda mais grave, prevista no inciso XXI2, ambos da lei Federal 8.906/94. Tecnicamente, o verbo locupletar-se do inciso não quer dizer apenas apropriar-se de dinheiro do cliente. Seria exemplo de locupletamento todo ato que violasse gravemente as regras negociais normais, como por exemplo cobrar honorários excessivamente altos e perenes de pessoa idosa e hipossuficiente técnica, como haver para si, a título de honorários, 40% do valor da aposentaria mensal da aposentada por atuação em causa dessa natureza.  Nada obstante, no dia a dia dos Tribunais de Ética, vê-se que praticamente todos os casos de locupletamento estão intimamente ligados a condutas que beiram ou alcançam o crime de apropriação indébita com aumento de pena por exercício da profissão, previsto no artigo 168, §1º, inciso III do Código Penal3. Pois bem, em absolutamente todos os casos esse tipo de conduta é omitido da vítima, ou seja, do cliente, causando imediatamente e por consequência o também enquadramento da conduta lesiva no inciso XXI do artigo 34, pela ausência da prestação de contas. Ora, não se espera (e isso não ocorre) que um advogado retenha indevidamente do cliente o valor de seu alvará e confesse o crime. No sistema OAB a conduta de não prestar contas prevista no inciso XXI pode importar em grave sanção disciplinar, que imponha, para além de uma potencial suspensão de trinta dias até doze meses, a manutenção dessa sanção até a satisfação integral da dívida, conforme artigo 37, §2º do EAOAB:  Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de:      I - infrações definidas nos incisos XVII a XXV do art. 34; II - reincidência em infração disciplinar. § 1º A suspensão acarreta ao infrator a interdição do exercício profissional, em todo o território nacional, pelo prazo de trinta dias a doze meses, de acordo com os critérios de individualização previstos neste capítulo. § 2º Nas hipóteses dos incisos XXI e XXIII do art. 34, a suspensão perdura até que satisfaça integralmente a dívida, inclusive com correção monetária. (Vide RE 647885) § 3º Na hipótese do inciso XXIV do art. 34, a suspensão perdura até que preste novas provas de habilitação. Da redação da norma repressiva vê-se que a suspensão só será levantada no caso de pagamento integral da dívida, com correção monetária. Pois bem, embora a norma seja silente quanto à incidência dos juros de mora, é importantíssimo destacar seu cabimento, haja vista sua indissociabilidade da ideia de valores devidos, ainda mais quando ligados ao locupletamento do advogado. Nesse sentido, por força do artigo 684 do EAOAB, já que não há vedação no sistema OAB para a cobrança dos juros de mora, é imediatamente aplicável a regra do artigo 4065 do Código Civil, que, ligada ao artigo 161, §1º6 do Código Tributário Nacional, impõe a fixação dos juros de mora em 1% ao mês. É esse, também, o entendimento do Conselho Federal da OAB: Recurso ao Conselho Federal. Locupletamento. Levantamento de valores de alvará. Repasse de valor em percentual superior a 30%, sem contrato escrito, fazendo-se compensação referente a outros processos, de modo não autorizado pelo cliente. Inteligência do art. 35, caput, e 35, § 2º do Código de Ética e Disciplina. 1) Advogado que recebe valores constantes de alvará judicial e não repassa imediatamente os valores destinados a seu cliente, havendo controvérsia quanto ao percentual descontado e recusando-se o cliente a receber, comete a infração disciplinar prevista no art. 34, inciso XX, da Lei nº 8.906/94. (...) 3) Juros e correção monetária incidirão sobre os valores devidos e não pagos, a teor do art. 37, § 2º do Estatuto, sendo os juros o consectário decorrente da mora. 4) Dosimetria da pena que não merece alteração, por força do atraso na prestação de contas e na ausência de devolução dos valores devidos e não pactuados com o cliente, já revistos na instância de base. Recursos conhecidos, mas improvidos. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da 3ª Turma da Segunda Câmara do CFOAB, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em acolher o voto da relatora, parte integrante deste, conhecendo e negando provimento aos recursos. Brasília, 2 de dezembro de 2014. Renato da Costa Figueira, Presidente. Valéria Lauande Carvalho Costa, Relatora. (RECURSO N. 49.0000.2014.006372-3/SCA-TT, EMENTA N. 151/2014/SCA-TTU. Relatora: Conselheira Federal Valéria Lauande Carvalho Costa (MA), DOU, S.1, 10.12.2014, p. 180/182).  Reiterada retenção indevida de valores do cliente, enseja suspensão do exercício profissional pelo prazo de doze meses cumulada com multa no valor correspondente a 6 (seis) anuidades, face as circunstâncias agravantes, perdurando a suspensão até a data do efetivo repasse à Recorrida do valor retido acrescido de juros de mora e correção monetária. Inteligência dos arts. 34, XXI c/c 37, I e II e § 2º c/c 39, todos da Lei 8.906/94. ACÓRDÃO: Vistos, examinados e relatados os presentes autos, acordam os integrantes da 1ª Turma da Segunda Câmara do Conselho Federal, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso para manter a decisão recorrida pelos seus próprios fundamentos. Brasília. 08 de dezembro de 2007. Romeu Felipe Bacellar Filho. Presidente "ad hoc" da 1ª Turma da Segunda Câmara. Reginaldo Santos Furtado. Relator. (RECURSO Nº 2007.08.03222-05/1ª Turma - SCA, EMENTA Nº 113/2007/1ªTSCA, Relator: Conselheiro Federal Reginaldo Santos Furtado (PI). DJ, 20.12.2007, p. 41, S1) O início da incidência dos juros será a data do evento danoso pela aplicação da Súmula 54 do STJ, haja vista que a responsabilidade in casu é extracontratual. *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto com o advogado. (Clique aqui) __________ 1 XX - locupletar-se, por qualquer forma, à custa do cliente ou da parte adversa, por si ou interposta pessoa; 2 XXI - recusar-se, injustificadamente, a prestar contas ao cliente de quantias recebidas dele ou de terceiros por conta dele; 3 Art. 168 - Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. § 1º - A pena é aumentada de um terço, quando o agente recebeu a coisa: (...) III - em razão de ofício, emprego ou profissão. 4 Art. 68. Salvo disposição em contrário, aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil, nessa ordem. 5 Art. 406. Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. 6 Art. 161. O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição das penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei ou em lei tributária. § 1º Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados à taxa de um por cento ao mês.
O estudo dos normativos do sistema OAB revela que a competência para apreciar a tempestividade de recurso caberia apenas e tão somente ao relator ad quem, ou seja, aquele que conhecerá do recurso, superada a autoridade recorrente. É essa a interpretação que exsurge dos artigos 71, §6; 138, §1, e 140, todos do Regulamento Geral da OAB, confira-se: Art. 71. Toda matéria pertinente às finalidades e às competências do Conselho Federal da OAB será distribuída automaticamente no órgão colegiado competente a um relator, mediante sorteio eletrônico, com inclusão na pauta da sessão seguinte, organizada segundo critério de antiguidade. § 6º Compete ao relator manifestar-se sobre as desistências, prescrições, decadências e intempestividades dos recursos, para decisão do Presidente do órgão colegiado.  Art. 138. À exceção dos embargos de declaração, os recursos são dirigidos ao órgão julgador superior competente, embora interpostos perante a autoridade ou órgão que proferiu a decisão recorrida. § 1º O juízo de admissibilidade é do relator do órgão julgador a que se dirige o recurso, não podendo a autoridade ou órgão recorrido rejeitar o encaminhamento.  Art. 140. O relator, ao constatar intempestividade ou ausência dos pressupostos legais para interposição do recurso, profere despacho indicando ao Presidente do órgão julgador o indeferimento liminar, devolvendo-se o processo ao órgão recorrido para executar a decisão. Parágrafo único. Contra a decisão do Presidente, referida neste artigo, cabe recurso voluntário ao órgão julgador. Não suficiente, vale ainda lembrar a conhecida redação do artigo 77 da lei 8.906/94, que concede a todos os recursos do sistema OAB, salvo as exceções que cita, efeito suspensivo.  Art. 77. Todos os recursos têm efeito suspensivo, exceto quando tratarem de eleições (arts. 63 e seguintes), de suspensão preventiva decidida pelo Tribunal de Ética e Disciplina, e de cancelamento da inscrição obtida com falsa prova. Parágrafo único. O regulamento geral disciplina o cabimento de recursos específicos, no âmbito de cada órgão julgador. A conjugação desses dispositivos leva à inarredável conclusão de que uma vez interposto qualquer recurso, a decisão anterior, que, por exemplo, tenha suspendido o advogado, não poderá ser levada a efeito até que se instale o selo de imutabilidade da última decisão, ou seja, o trânsito em julgado administrativo. Considerando a amplitude recursal do sistema OAB, muitas vezes isso significará anos de trâmite processual. Pois bem, postas as regras acima, está criada uma grave falha jurídico processual no sistema recursal do processo disciplinar OAB, pois todo e qualquer recurso intempestivo, e, portanto, processo resolvido pelo trânsito em julgado, terá idêntico trâmite aqueles normais, cujos recursos são interpostos de forma tempestiva. Essa conclusão decorre da combinação do §1º do artigo 138, que veda à autoridade que proferiu a decisão recorrida a rejeição do encaminhamento do recurso ao ad quem, assim como o parágrafo único do 140, que declara que mesmo reconhecida a intempestividade posterior e liminar pelo Presidente do órgão ad quem, é facultado ao representado o recurso voluntário, que, na forma do quanto prescreve o artigo 77 do EAOAB, obrigatoriamente terá efeito suspensivo. Na prática cotidiana do trabalho na OAB, isso quer dizer exatamente o quanto afirmado acima, ou seja, qualquer processo com recurso maculado pela intempestividade, terá o mesmo trâmite processual de outro, regular. Essa ideia gera gravíssimas distorções, bastando imaginar exemplo de Tribunal de Ética e Disciplina que por suas inúmeras ocupações demora mais de sessenta dias para publicar o acórdão condenatório de advogado suspenso até a satisfação integral da dívida[1]. O advogado que deveria estar suspenso protocoliza seu recurso com quarenta e cinco dias de intempestividade. Nessa hipótese, embora seja clara e indiscutível a intempestividade do recurso, o Tribunal de Ética não poderia conhecer da matéria, sendo obrigado à remessa do recurso ao ad quem para processamento, dando início à cadeia processual já descrita acima. Isso não está correto. Tais distorções podem ser corrigidas por estratégias processuais de trâmite interno dos órgãos da OAB, como a declaração de preclusão do ato com fundamento no artigo 507 do Código de Processo Civil:  Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão. Assim, aos TED's,e aos Conselhos Plenos basta baixar normativo interno de que toda juntada de recurso deve ser precedida de certidão do Tribunal de eventual trânsito em julgado. Dessa forma, o recurso intempestivo seria oposto ou interposto após a declaração formal no feito de fim do processo, o que obstaria o processamento do recurso, pois precluso o ato. Nada obstante, todavia, a problemática bem revela a ineficácia do sistema recursal nesse ponto e a necessidade de reforma. Solução possível seria a revogação do §1º do artigo 138 do Regulamento Geral e a extensão das possibilidades do "agravo" do artigo 144-A, também do Regulamento, hoje cabível apenas contra a decisão de suspensão preventiva:  Art. 144-A. Para a formação do recurso interposto contra decisão de suspensão preventiva de advogado (art. 77, lei 8.906/94), dever-se-á juntar cópia integral dos autos da representação disciplinar, permanecendo o processo na origem para cumprimento da pena preventiva e tramitação final, nos termos do artigo 70, § 3º, do Estatuto. (NR)153   Tal reforma impactaria imediatamente em todo o sistema recursal OAB, otimizando o trâmite processual de milhares de recursos e incrementando em muito a eficiência do processo. *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto com o advogado (Clique aqui). __________ 1 Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de: (...) § 2º Nas hipóteses dos incisos XXI e XXIII do art. 34, a suspensão perdura até que satisfaça integralmente a dívida, inclusive com correção monetária.
O sistema punitivo do processo disciplinar da OAB está previsto entre os artigos 35 e 42 da lei Federal 8.906/94. Tem início com a previsão das sanções disciplinares existentes para, a partir desse ponto, estabelecer a forma como deverão ser impostas.  É lá que o legislador ordinário estabelece quando será cabível cada sanção. A sanção de censura será cabível para as infrações definidas nos incisos I a XVI e no XXIX, assim como para violações ao Código de Ética e Disciplina. Outrossim, essa sanção poderá ser convertida em advertência de ofício reservado. A suspensão terá lugar para as infrações previstas nos incisos XVII a XXV, assim como para a reincidência em infração disciplinar. A mais severa das punições, a exclusão caberá quando existirem três suspensões ou para as infrações dos incisos XXVI a XXVIII. Também nesses artigos situam-se as causas administrativas atenuantes e as agravantes. Não é só, as regras adjetivas e materiais também estabelecem regras sobre a aplicação da multa, do pedido de reabilitação, do impedimento do exercício profissional e outros. Outras normas do sistema OAB estabelecem regras adjetivas para o processo, como ocorre com o Código de Ética e Disciplina, com o Regulamento Geral e com os Regimentos Internos de cada Seccional.   Não há, contudo, nada sobre a unificação de processos, sobre eventual concurso material, formal ou sobre a continuidade infracional, todos institutos aplicáveis ao processo disciplinar pelo quanto estabelece o artigo 68 do EAOAB1. É muito comum na atividade judicante dos Tribunais de Ética e Disciplina o recebimento de representações sequenciais por atos idênticos e/ou análogos, realizados dentro do mesmo contexto fático e espaço de tempo. Tratar-se-á agora da continuidade delitiva infracional, ou seja, hipóteses em que o advogado comete, por mais de uma vez o mesmo ato, podendo ser os demais considerados uma extensão do primeiro. Exemplo bastante contemporâneo desse fenômeno deu-se em tempos de COVID-19 no Distrito Federal. A Seccional da OAB/DF celebrou com a SESIPE - Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Distrito Federal acordo de colaboração nominado de parlatório virtual, uma importantíssima ferramenta que passou a permitir que o advogado atendesse seu cliente virtualmente, por uma ligação de vídeo, realizada do interior de seu escritório e/ou de qualquer lugar onde quisesse levar seu computador ou seu celular. O ato de entrevista entre advogado e cliente, por óbvio, é personalíssimo, sigiloso e reservado, ou seja, naquele ato, só podem estar o advogado e seu cliente, preso. Ocorre que muitos advogados, por ocasião da aplicação da nova ferramenta, passaram a colocar parentes dos presos em frente à tela no momento das entrevistas, de forma a lhes permitir um mínimo contato com o encarcerado. Embora fosse ato humanitário, essa conduta violou grosseiramente a portaria que criou o parlatório virtual e o Código de Ética e Disciplina, passando a ser entendida como infração ética, até porque, para ofertar o "benefício" aos parentes, os advogados envolvidos cobravam valores da família, ou seja, estavam a praticar atos de mercancia sobre algo proibido. Tais fatos deram início à remessa ao TED OAB/DF de dezenas de representações disciplinares. Pois bem, em um dos casos levados à apreciação do Tribunal, o advogado permitiu que três diferentes pessoas conversassem com o preso na mesma entrevista. Esse fato gerou representação disciplinar enviada pela SESIPE capaz de bem demonstrar a aplicação do instituto ora em comento. Não há qualquer dúvida da presença de três infrações ético-disciplinares praticadas pelo advogado, uma para cada pessoa que permitiu tivesse contato com o preso, todavia, a discussão é se as sanções disciplinares deveriam ser somadas para aplicação de uma pena mais dura, como ocorre com o concurso material do artigo 69 do Código Penal2. A resposta é negativa, pois a correta interpretação do direito repressivo no caso concreto desafia o reconhecimento da continuação infracional, pela aplicação analógica do artigo 71 do Código Penal, que trata do crime continuado: Crime continuado Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.          Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código.   A grande diferença é que em vez de ter as sanções disciplinares somadas, o representado/condenado as terá reconhecidas, todavia, na fase da dosimetria, o aplicador do direito aplicará apenas uma delas, com o acréscimo de um sexo a dois terços. Vale atentar que a tese da continuidade delitiva deve sempre que possível encampar as defesas disciplinares quando a representação envolve mais de uma infração disciplinar, todavia, é raríssimo vislumbrar a construção dessa tese em qualquer manifestação, ficando, assim, o representado sempre à mercê do reconhecimento de ofício pelo Tribunal.   *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto com o advogado. __________ 1 Art. 68. Salvo disposição em contrário, aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil, nessa ordem. 2 Art. 69 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela. 
Não é sem motivo que a Ordem dos Advogados do Brasil sempre figura em pesquisas populares como uma das instituições mais confiáveis da sociedade civil brasileira. Essa titulação, aliás, vem apenas ratificar à sociedade a importância concedida à OAB pelo legislador constitucional, que fez inserir no artigo 133 de nossa Carta Maior o seguinte: Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. E, de fato, vê-se ser a Ordem sempre vanguardista no que toca aos direitos sociais e à proteção dos maiores valores da sociedade, tanto assim que foram em suas fileiras os primeiros passos da paridade de gênero, com iniciativas para a divisão de seus Conselhos de forma paritária entre homens e mulheres. Também foi uma grande luta da OAB a alteração da lei Federal 8.906/94, pela lei 13.353/2016, para garantir direitos especiais às mulheres advogadas, e, inclusive, tornar criminosa sua violação: Art. 7º-A. São direitos da advogada:                I - gestante:              a) entrada em tribunais sem ser submetida a detectores de metais e aparelhos de raios X;           b) reserva de vaga em garagens dos fóruns dos tribunais;           II - lactante, adotante ou que der à luz, acesso a creche, onde houver, ou a local adequado ao atendimento das necessidades do bebê;           III - gestante, lactante, adotante ou que der à luz, preferência na ordem das sustentações orais e das audiências a serem realizadas a cada dia, mediante comprovação de sua condição;           IV - adotante ou que der à luz, suspensão de prazos processuais quando for a única patrona da causa, desde que haja notificação por escrito ao cliente.           § 1º Os direitos previstos à advogada gestante ou lactante aplicam-se enquanto perdurar, respectivamente, o estado gravídico ou o período de amamentação.          § 2º Os direitos assegurados nos incisos II e III deste artigo à advogada adotante ou que der à luz serão concedidos pelo prazo previsto no art. 392 do Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943 (Consolidação das Leis do Trabalho § 3o O direito assegurado no inciso IV deste artigo à advogada adotante ou que der à luz será concedido pelo prazo previsto no § 6o do art. 313 da Lei no 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).          Art. 7º-B Constitui crime violar direito ou prerrogativa de advogado previstos nos incisos II, III, IV e V do caput do art. 7º desta Lei:       Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.     Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.     Pois bem, incansável na defesa do quanto é certo, das boas práticas e especialmente dos direitos daqueles menos afortunados (como são as vítimas dos atos aqui tratados), no dia 13/03/2023 o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil acabou por aprovar proposta encaminhada pela Comissão Nacional da Mulher Advogada, presidida pela Conselheira Federal pela OAB/DF, Cristiane Damasceno, também coautora desse escrito, no sentido de conclamar o legislativo nacional a realizar nova reforma no EAOAB, desta vez para fazer inserir no rol das sanções disciplinares o inciso XXX, com a seguinte redação: XXX - Praticar assédio moral, sexual ou discriminação. O primeiro acerto da norma foi o de não realizar diferenciação de gênero, ou seja, a proteção é para todos. Por óbvio, são conceitos abertos o assédio moral, o sexual e a discriminação, todavia, a proposta de alteração legislativa também veio com carga explicativa normativa, para inserir um §2º no texto legal, assim idealizado: § 2° Para os fins desta Lei, considera-se: I - Assédio moral, no exercício profissional ou em razão dele, a repetição deliberada de gestos, palavras (orais ou escritas) e/ou comportamentos os quais expõem o (a) estagiário (a), o advogado (a), ou qualquer outro profissional que esteja prestando seus serviços, a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de lhes causar ofensa à personalidade, à dignidade, à integridade psíquica ou física, com o objetivo de excluí-los (as) das suas funções, desestabiliza-lo emocionalmente, deteriorando o ambiente de trabalho. II - Assédio sexual, no exercício profissional ou em razão dele, a conduta de conotação sexual manifestada fisicamente, por palavras, gestos ou outros meios, propostas ou impostas às pessoas contra sua vontade, causando-lhes constrangimento e violando a sua liberdade sexual. III - Discriminação a conduta que consiste em ação comissiva ou omissiva que dispense um tratamento diferenciado (inferiorizado) a uma pessoa ou grupo de pessoas, em razão da sua pertença a uma determinada raça, cor, sexo, nacionalidade, origem étnica, orientação sexual, identidade de género, etária, religiosa ou outro fator. Como se vê, as explicações fornecidas pela norma são bem completas e suficientes à boa delimitação das condutas, valendo destaque para o fato de que, aparentemente, a conduta de assédio moral exigirá habitualidade, enquanto no assédio sexual ou na discriminação, apenas uma única conduta poderá configurar a falta comportamental. Vale ainda destacar que o grande mérito da OAB foi a aprovação do texto inicial, que, sem embargos, poderá ainda sofrer aprimoramentos com o amadurecimento da questão perante as casas legislativas. As novas sanções disciplinares serão punidas com a pena de suspensão, pois a proposta sugere a alteração do artigo 37, inciso I para a seguinte: Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de:   I - Infrações definidas nos incisos XVII a XXV e XXX do art.34. Sem prejuízo, todavia, vale lembrar o quanto já mencionado sobre a tipificação administrativa das condutas e a possibilidade de seu agravamento. Em comentário anterior à matéria, destaca-se a possibilidade de que condutas mais brandas sujeitas à censura sejam reclassificadas, a depender da lesividade do ato, para conduta incompatível com a advocacia, impondo ao infrator a suspensão em vez da pena de censura. Pois bem, ao caso concreto, não é diferente. Em caso de alteração da lei, que já se declara muito desejada, aquele que cometer o assédio moral, o sexual ou ato de discriminação em regra ficará sujeito à pena de suspensão, todavia, a depender da gravidade do caso, não há dúvida que também pode ser realizada a reclassificação da conduta para a imediatamente mais grave, ou seja, a sanção disciplinar de exclusão, pela combinação entre os artigos 34, XXVII e XXVIII e 38, II da lei 8.906/94. Nesse sentido, imagine-se exemplo onde advogado proprietário de escritório passe a contratar jovens estagiárias para lhe auxiliar, todavia, de forma recorrente, lhes ataca com o crime de assédio sexual. Em determinado dia uma delas resolve quebrar o silêncio e registrar uma ocorrência policial sobre o fato, sendo seguida de outras cinco colegas, com as mais graves narrativas sobre propostas de ascensão profissional ou prejuízo no trabalho, sempre vinculadas a favores sexuais. Ao final das investigações, ouvidas diversas testemunhas, há comprovação cabal dos crimes. No exemplo acima, aparentemente as condutas foram de gravidade tal que se amoldam muito mais ao conceito de crime infamante, sendo que sem dúvidas esse advogado não terá mais a inidoneidade apta ao exercício da profissão, sujeitando-se, assim, ao processo de exclusão.   Em conclusão e com essas simples considerações, parabeniza-se a OAB pela elogiosa iniciativa, que vem premiar toda a sociedade. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)